Antinomias pós-modernas sobre a natureza
trabalho é substituído pela linguagem, pelo símbolo, por uma economia política da significação. Aí o
conceito de uma natureza dessubstancializada e transformada num mero substrato vazio à disposição
dos caprichos humanos é trocada pelo de um simulacro (mais que perfeito) hiper-realizado do mundo.
Aqui, opera-se uma dupla elisão: a do sujeito e a do objeto, e a única coisa que sobrevive é a linguagem,
um sistema de signos sem significação. O simulacro expropria do homem e da natureza todas as suas
relações, interpondo-se entre um e outro” (p.128).
14 Como exemplo, a hipótese-Gaia, de Lovelock, estaria mais próxima dessa tendência (Vincent, 1995,
p.221), como também as éticas não antropocêntricas de Taylor (1989) e Rolston (1981).
15 Recorremos também a Braida (1992) para a leitura interpretativa das ideias de Nietzsche aqui expostas.
Lembramos novamente tratar-se de um filósofo-chave para o discurso pós-moderno.
16 Um pequeno polvo que nadava feliz num tanque de águas poluídas da baía de onde fora retirado e
morreu ao ser colocado num tanque com água ‘limpa’.
17 Como aponta Vincent (1995, p.223): “O mais grave de tudo isso é a dificuldade de perceber qual a
noção de natureza da abordagem intrínseca e de sua ligação com a teoria de Gaia. Se os homens são
parte da natureza, na posição ‘indiferente’ de Gaia, então provavelmente somos livres, assim como todos
os outros animais, para utilizar o mundo à nossa volta. Se é da nossa natureza explorar e se portanto nos
destruirmos, o universo não ligará a mínima”.
18 “Nossas estações do ano são produtos pós-naturais e pós-astronômicos, da televisão e da mídia,
triunfalmente artificiais por meio da força das imagens do canal da National Geographic ou da
meteorologia – simulam ritmos, antes naturais, para a conveniência comercial” (Jameson, 1997, p.32).
19 “A agricultura – culturalmente distinta e identificada na superestrutura como o Outro da Natureza –
torna-se agora uma indústria como qualquer outra, e os camponeses, simples operários cujo trabalho é
classicamente mercantilizado em termos de equivalências de valor” (Jameson, 1997, p.40).
20 Para uma discussão sobre o modo como a globalização, por meio de distintas e específicas demandas,
convive com a valorização da diferença dos localismos e regionalizações e a estimula, ver Featherstone
(1996), Ortiz (1996), Yáñez (1998), Souza (1997), Froehlich (1999), entre outros.
21 O ‘recorte’ que conta a história de determinada região ou localidade para produzir mais atratividade
(turismo rural, turismo ecológico, turismo histórico etc.), elencando aspectos folclóricos, reconstituição
de produtos, trabalhos, tradições, jogos e cantares, comidas típicas, entre outros, pode ser encarado,
nesse sentido, como ‘construção’. Ver, a respeito, Champagne (1977), Cavaco (1996), Mormont (1996),
Mathieu (1996) e Froehlich (2003), entre outros.
22 “Nos territórios de forte conteúdo de ciência, tecnologia e informação não há mais sentido contrapor
a cidade ao campo, o urbano ao rural, nem tampouco insistir na distinção entre os clássicos setores da
atividade econômica” (Rodrigues, 2004, p.33).
23 Gilberto Freyre (1982, p.117-118), ao comentar estilos de desenvolvimento urbanista e regional, já
tivera insight pertinente sobre os elementos pós-modernos articulados e presentes na sua proposta de
rurbanização (como, por exemplo, a valorização do passado, do antigo, do arcaico compondo e
justapondo com o moderno, o tecnológico, o cosmopolita): “Tanto uma orientação como a outra, a
Regionalista francesa e a do Recife – a ela pioneiramente anterior – prestam-se a ser acusadas de
romanticoidemente arcaizantes e anti-industriais e antiurbanas, através de suas valorizações de valores
regionais e tradicionais, por muitos associados principalmente a vivências arcaicamente rurais. Mas serão
válidas essas acusações? Serão as formas rurais de vivência, necessariamente antiprogressistas ou
antimodernas, por constituir opostos a formas urbanas e urbano-industriais? Ou haverá em atitudes
supostamente arcaizantes, antecipações de formas pós-modernas de equilíbrio ou de contemporização
entre valores urbanos transferíveis a áreas rurais e desejos, da parte até de jovens dos nossos dias, de
desfrutarem de um convívio com águas, árvores, plantas, animais rurais, impossível dentro dos muros
estritamente urbanos?. Não será possível pós-modernamente conciliar-se experiências telúricas com o
gozo de modernas conveniências urbanas?” .
24 Jameson (1997, p.58) comenta: “A natureza é, então, com toda a certeza, o grande inimigo de qualquer
antifundamentalismo ou antiessencialismo: termo final e conteúdo de qualquer essência ou axioma, de
qualquer pressuposição última ou metafísica, de qualquer limite ou destino que possa ser colocado.
Dispensar os últimos remanescentes da natureza e o natural enquanto tal é, certamente, o sonho secreto
e o desejo de todo o pensamento contemporâneo ou pós-contemporâneo, pós-moderno – mesmo
sendo um sonho que este último sonha com uma certa ressalva secreta de que a ‘natureza’, para começo
de conversa, nunca existiu mesmo”.
v.17, n.3, jul.-set. 2010, p.627-641
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