A. Kuhnen & cols.
água. Alguns estudos vêm sendo realizados buscando com-
preender esses fenômenos. Dentro desse escopo encontra-se
esta pesquisa.
Segundo Corral-Verdugo, Armenta, Urías, Cabrera e
Gallego (2002) e Vargas e Paula (2002), as atitudes, informa-
ções e expectativas dos usuários da água são fundamentais
para garantir uma gestão sustentável dos recursos hídricos.
Sendo assim, para que se possa envolver os usuários no pro-
cesso de gestão dos recursos hídricos é necessário entender
a maneira como percebem e interagem com o ambiente.
Segundo Corral-Verdugo (2001, 2002, 2003), as motivações
para economia estão entre os preditores psicológicos de
conservação de água significativos de ações pró-ambientais.
Essas motivações podem ser agrupadas em três instâncias: a
água é economizada para cooperar com alguma campanha
de conservação; para pagar menos pelo recurso; ou ainda,
devido à punição pelo consumo excessivo. Cabrera, Gallego
e Lomeli (2002) e Corral-Verdugo (2002) apontam variáveis
demográficas e contextuais que influenciam na economia de
água, tais como sexo, lugar de origem, escolaridade, renda e
conhecimento ambiental.
No que diz respeito à percepção ambiental do recurso
água, Vargas e Paula (2003) concluem que apesar de existi-
rem estudos objetivando conhecer a percepção da água, em
geral tais estudos focam aspetos fragmentados da relação
que temos com o recurso água. Buscando dar amplitude à
temática, esses autores verificaram que a percepção da água
é marcada pela falta de conhecimentos acerca de mananciais
de abastecimento, do tratamento, da legislação e mesmo do
consumo familiar e do custo da água.
Ribeiro e Galizzoni (2003) investigaram os usos locais
da água para compreender de que forma tais usos dialogam
ou conflitam com as leis e técnicas propostas pelas agências
reguladoras do recurso. Em suas conclusões, referem que
qualidade e sensibilidade estão associadas também à cap-
tação. A boa água, ou água fina é conseguida em brotos,
olhos d’água, nascentes preservadas, com mato em volta,
ou surge sobre pedras, possuindo sentido daquilo que é
puro e intocado, nascido da terra. Dessa forma, as distintas
hierarquias de usos das águas estão relacionadas à disponi-
bilidade de fontes e de sua qualidade: existe água para beber,
para consumo animal, para lavar roupa e regar. Vale dizer
que há uma percepção de escassez que pode ser, ao mesmo
tempo, qualitativa e quantitativa. Qualidade aí faz relação
com classificações culturais, captação e partilha; por isso o
importante é zelar prioritariamente pelas pequenas águas, não
as grandes; estas últimas estão fora do entendimento que a
população costuma conceber para a ação humana. Mesmo na
escassez, há resistência à idéia de armazenar água. Inclusive,
o acesso à água corrente e nascente está associado à própria
ideia de um direito natural de todos.
O que esses e outros estudos parecem advertir é que face
à amplitude dos problemas relacionados á água, a preocupa-
ção maior da época contemporânea parece ser a questão da
natureza dentro da esfera interrogativa sobre a relação cons-
truída entre os seres humanos e o ambiente. A preocupação
com a água talvez seja um dos símbolos mais prementes de
uma mutação necessária na relação do ser humano com esse
recurso. A gestão dos recursos hídricos tem sido identificada
como a questão de maior poder integrador entre as questões
ambientais e a sociedade. O ano de 2005 marcou o início da
Década Internacional da Água para a Vida, que visa reduzir
pela metade, até 2015, o número de pessoas sem acesso à água
potável e ao saneamento básico, e acabar com a exploração
insustentável dos recursos hídricos.
Mas, infelizmente, o distanciamento entre ciência,
tecnologia e políticas públicas faz com que as atitudes e
os comportamentos da população venham sendo avaliados
pelas autoridades e serviços públicos a partir de estereótipos
que consideram as reações individuais relativas ao uso da
água como indiferença, ignorância e desperdício, embora o
olhar devesse combinar estratégias político-tecnológicas e
sócio-comportamentais. A base desta pesquisa ancora-se no
postulado de que, para intervir no segundo plano, devem ser
identificados os determinantes dos comportamentos que se
quer manter ou modificar em relação aos recursos naturais
(Corral-Verdugo, 2003). Portanto, organizou-se o estudo em
torno do objetivo de investigar processos subjacentes aos
conhecimentos e comportamentos relativos ao abastecimento
de água, buscando trazer à tona as representações sociais de
seus usuários.
Sendo assim, este estudo aponta para uma dimensão
onde se inscrevem junto às representações outros fenômenos
psicológicos, como: crenças (conceitos), motivos (valores),
atitudes (avaliação), habilidades (ação) e normas (ética).
Esse conjunto de fenômenos culmina, então, por promover
representações sociais muitas vezes paradoxais, ora am-
bientalmente antropocêntricas, ora ecológicas e relevantes
para que se inscrevam novos modelos de relação entre a
humanidade e o ambiente. Esse encontro de novas e velhas
idéias num movimento dialético é próprio do fenômeno
humano chamado por Moscovici (1981, 1989) de Repre-
sentação Social. Enquanto imagens, opiniões e atitudes
somente traduzem a posição e a escala de valores de uma
informação circulante na sociedade, representações ainda
produzem comportamentos e se relacionam com o meio. É
um conhecimento espontâneo, do senso comum e que orienta
a comunicação, servindo de interação com o mundo e com
os outros. O conceito de representação social pressupõe
que o próprio processo de representação constrói o objeto
de representação, ou seja, é produto e processo. Portanto,
vale lembrar que meio ambiente, por se tratar de um tema
complexo, apresenta-se em representações não regidas pelo
princípio da não-contradição (Castro, 2003). Um dos desafios
talvez seja, entendendo como se dá esse processo, intervir
conciliando e articulando ideias que estão mais perto ou mais
longe dos ideais ecológicos.
Método
Participantes
O critério de escolha dos participantes foi essencialmen-
te serem usuários dos serviços de abastecimento de água.
Para definir o tamanho da amostra, optou-se pelo critério
psicométrico usado para escalas de atitude, o qual busca
identificar o número de respondentes necessários para gerar
um grau de saturação do fenômeno ou característica medida,
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Psic.: Teor. e Pesq., Brasília, Jul-Set 2009, Vol. 25 n. 3, pp. 453-460