Paidéia, 27(Suppl. 1), 395-403
pró-ambientalidade (Pol, 2007). Considerando os contextos
sociais e históricos, com o foco nas dimensões do cotidiano,
dos estilos de vida e escolhas comportamentais, buscamos
lançar luz sobre como pessoas, dentro dos modos de vida das
sociedades ocidentais, se apropriam dessa questão a ponto de
adotarem práticas do cuidado ambiental, incorporando-o em
suas relações e rotinas pessoais, domésticas, de formação, de
trabalho.
Nesse sentido, levantamos elementos que auxiliem no
entendimento a respeito de como, diferentemente da maioria
da população, algumas pessoas aderem a um compromisso
que compreende uma relação de caráter positivo com o meio
ambiente, e passam a responsabilizar-se e interessar-se por
ele. Entende-se que esse compromisso tem uma orientação
pró-ecológica, ou seja, tem como foco a manutenção das di-
ferentes formas de vida e o equilíbrio ambiental. É composto
por um conjunto de dimensões psicossociais – conhecimen-
tos, atitudes, crenças, normas, valores, visões de mundo –
que, dependendo de fatores situacionais, concretizam-se em
práticas de cuidado e conservação do ambiente (Gurgel &
Pinheiro, 2011).
Partimos do entendimento de que por mudarem com o
tempo e serem relativos ao período em que se manifestam,
os fenômenos sociais trazem em si uma carga histórica. Para
além, pode-se dizer que tais fenômenos têm memória porque
são, também, resultantes da história de sua produção, das
peculiaridades da cultura, das tradições e modos de vida da
sociedade em que são produzidos. Assim, a forma como se
manifestam no presente mantém relação intrínseca com sua
genealogia, sendo decorrentes das práticas e relações sociais
a partir das quais foram sendo constituídos (Gergen, 1985,
1996; Ibáñez, 2003).
O compromisso pró-ecológico (CPE) – compreendido
como um fenômeno psicossocial sob essa perspectiva – se
constitui a partir das práticas e relações circunscritas numa
dada cultura, em um dado momento histórico. Há ainda outro
fator central que concorre para sua constituição: o ambiente,
que pode ser compreendido em suas múltiplas acepções, des-
de o espaço físico a seus aspectos simbólicos. Desse modo,
trata-se de um fenômeno “psicossocioambiental” que vem se
formando no bojo do debate ecológico e do verdejar da opi-
nião pública, há mais de cinco décadas. Sua produção tem
como condições o reconhecimento dos diversos efeitos nega-
tivos da ação humana no meio ambiente, e a emergência de
uma preocupação com os riscos dessa ação.
A questão ambiental vem sendo debatida de forma pro-
gressiva desde o início dos anos de 1960, quando os cientistas
passaram a alertar a população em geral sobre o aumento da
poluição e da degradação ambiental, atreladas à escassez de re-
cursos que traria riscos para a vida humana no planeta (Comis-
são Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1991).
A difusão desse debate coube, em grande parte, à atuação dos
movimentos ambientalistas que teve início, no Brasil, a partir
dos anos de 1970. Começou marcada pela denúncia da degra-
dação ambiental em campanhas com mínimas repercussões na
opinião pública, passando por um momento de politização du-
rante o período da redemocratização, marcado por um caráter
bissetorial (grupos de base e agências estatais ambientais) até
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o ano de 1985 e, finalmente, evoluindo para um movimento
multissetorial e complexo a partir da segunda metade da década
de 1980, tendo como marco posterior a Rio-92 (Viola & Leis,
1995). Embora a agenda ambiental não tenha tido os avanços
esperados nas últimas duas décadas, houve um aumento da
participação da sociedade civil em dispositivos e órgãos go-
vernamentais (Cordeiro, 2014; Losekann, 2012). Ressalta-se,
também, a emergência de novos movimentos socioambientais
como a permacultura, as ecovilas, e movimentos voltados para
pautas urbanas como a mobilidade, ocupação do espaço públi-
co e o direito à cidade.
Cabe destacar, então, as transformações nas acepções e
os discursos sobre ambiente que acompanham as mudanças
nos contextos sociais e históricos que demarcam a evolução
dos movimentos ambientalistas no Brasil e no mundo des-
de meados do século passado e o momento mais recente, nas
primeiras décadas do século XXI. Desse modo, uma das ca-
racterísticas específicas do nosso tempo em comparação com
outros momentos históricos é o uso das palavras ambiente e
ambientalismo, as quais possuem uma intersecção semânti-
ca com outros termos também de corrente associação com
o termo natureza, como: ecologia, ecologismo, naturalismo,
ecocentrismo, antropocentrismo, biocentrismo, ecofeminis-
mo, gaianismo, desenvolvimento sustentável, verdes, ecossis-
temas, entre outros. De acordo com Castro (2005) foi apenas
nas últimas décadas que o termo ambiente passou a “habitar
um novo – e denso – campo semântico onde a cor predomi-
nante é o verde” (p. 172). O que a autora chama de “explosão
semântica” nos leva a refletir sobre a evolução destes concei-
tos e a importância que os mesmos vêm assumindo dentro e
fora da academia.
O verdejar da opinião pública sobre os temas ambientais
é de fundamental interesse para pensar e planejar interven-
ções que favoreçam transformações nos estilos de vida nas
sociedades capitalistas. A pró-ambientalidade, como uma de
suas expressões, tem sido foco de um número crescente de
investigações, comportando diferentes nomenclaturas (exem-
plo, comportamento pró-ambiental, comportamento de con-
servação, atitudes ambientais, conduta sustentável), mas com
objetivo comum de compreender os comportamentos com im-
pactos positivos para o ambiente, e identificar os determinan-
tes envolvidos em sua promoção. Tais investigações recor-
rem, tradicionalmente, a escalas que abordam predisposições
do comportamento, como atitudes, crenças, motivações e va-
lores com orientação pró-ecológica. Tal fragmentação impõe
limites ao próprio conhecimento sobre o fenômeno, como já
vem sendo apontado em alguns estudos (Gaspar de Carvalho,
Palma-Oliveira & Corral-Verdugo, 2010; Hill, Figueredo &
Jacobs, 2010; Vaccari, Cohen & Rocha, 2016).
Nesse sentido, a noção de CPE representa uma relação
com o meio ambiente que sintetiza diversos indicadores in-
vestigados separadamente, aproximando-se da ideia de preo-
cupação tal como decorre da tradução do termo corrente em
inglês “environmental concern”, porém com um caráter posi-
tivo, visto sua relação com a noção de cuidado como algo a
ser buscado e não evitado (Pinheiro, 2002). Representa, tam-
bém, o interesse pelo recurso a uma linguagem mais acessível
a diferentes áreas de conhecimento, como a educação ambien-