ÁREAS VERDES COMO ESPAÇOS EDUCACIONAIS NÃO CONVENCIONAIS DENTRO DAS UNIVERSIDADES: SEUS POTENCIAIS PARA A FORMAÇÃO NA PERSPECTIVA AMBIENTAL
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE HUMANIDADES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
DOUTORADO EM EDUCAÇÃO
RITA PARADEDA MUHLE
ÁREAS VERDES COMO ESPAÇOS EDUCACIONAIS NÃO
CONVENCIONAIS DENTRO DAS UNIVERSIDADES: SEUS POTENCIAIS PARA A
FORMAÇÃO NA PERSPECTIVA AMBIENTAL
Porto Alegre
2018
RITA PARADEDA MUHLE
ÁREAS VERDES COMO ESPAÇOS EDUCACIONAIS NÃO
CONVENCIONAIS DENTRO DAS UNIVERSIDADES: SEUS POTENCIAIS PARA A
FORMAÇÃO NA PERSPECTIVA AMBIENTAL
Tese de doutorado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Educação da Escola de
Humanidades da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul, como requisito
para obtenção do título de Doutor em
Educação. A pesquisa conta com o apoio do
Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (Bolsa integral
CNPq).
Orientadora: Profa. Dra. Isabel Cristina de Moura Carvalho (março de 2014 a julho de 2017)
Profa. Dra. Mónica de la Fare (agosto de 2017 a fevereiro de 2018)
Porto Alegre
2018
Rita Paradeda Muhle
ÁREAS VERDES COMO ESPAÇOS EDUCACIONAIS NÃO CONVENCIONAIS
DENTRO DAS UNIVERSIDADES: SEUS POTENCIAIS PARA A FORMAÇÃO NA
PERSPECTIVA AMBIENTAL
Tese apresentada como requisito para obtenção
do título de Doutor em Educação pelo
Programa de Pós-Graduação em Educação da
Escola de Humanidades da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Aprovado em: _____ de_______________de_________.
BANCA EXAMINADORA
Profa. Dra. Mónica de la Fare - PUCRS
Prof. Dr. Marcos Villela Pereira - PUCRS
Profa. Dra. Isabel Cristina de Moura Carvalho - UFRGS
Profa. Dra. Lorena Fleury - UFRGS
Prof. Dr. Marcelo Gules Borges - UFSC
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha eterna Orientadora Isabel Carvalho por acreditar neste trabalho e
me dar liberdade e auxílio para conduzí-lo. De forma arbitrária e injusta quando da sua
demissão a nossa relação mestre e aprendiz foi ceifada dentro das paredes institucionais da
academia, mas isso somente reforçou nossos laços de uma amizade sobrenatural e
sobrenaturezas. Agradeço também pela generosidade da minha também Orientadora Mónica
de la Fare que em momentos de turbulência acolheu este trabalho e a mim, dando condições
para que eu seguisse até o final com suas contribuições.
Faço um agradecimento essencial aos interlocutores desta pesquisa que dividiram
comigo suas histórias com as áreas verdes estudadas e me permitiram retratar aqui estas
relações. Com essas histórias este trabalho ganhou vida.
Agradeço ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq) pela bolsa integral e o auxílio bancada que recebi ao longo dos anos do doutorado e
que me permitiram a dedicação à esta tese e às viagens pelo Rio Grande do Sul. Agradeço
também à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela
bolsa Programa Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE) que recebi para a realização do
estágio doutoral na Universidade de Saskatchewan (Canadá), onde pude vivenciar grandes e
enriquecedoras experiências acadêmicas e de vida.
A special thanks to Janet McVittie, my supervisor in the University of Saskatchewan.
The things I learned there helped me to finish this thesis. Also, thanks to all the faculty and
university members for their contributions. I had a great time there. Thank you Dante, Taiga,
Anie, Parker and Bear.
Um muito obrigada para meus generosos colegas e amigos pelas contribuições e
momentos de leveza, pois juntos nos fortalecemos e seguimos. Agradeço também à minha
família e amigos próximos, pois a minha vida e da pesquisadora são uma só, seguem um
mesmo caminho, um mesmo fluxo.
Árvore
Um passarinho pediu a meu irmão para ser sua árvore.
Meu irmão aceitou de ser a árvore daquele passarinho.
No estágio de ser essa árvore, meu irmão aprendeu de
sol, de céu e de lua mais do que na escola.
No estágio de ser árvore meu irmão aprendeu para santo
mais do que os padres lhes ensinavam no internato.
Aprendeu com a natureza o perfume de Deus.
Seu olho no estágio de ser árvore aprendeu melhor
o azul.
E descobriu que uma casca vazia de cigarra esquecida
no tronco das árvores só presta para poesia.
No estágio de ser árvore meu irmão descobriu que as
árvores são vaidosas.
Que justamente aquela árvore na qual meu irmão se
transformara, envaidecia-se quando era nomeada para
o entardecer dos pássaros.
E tinha ciúmes da brancura que os lírios deixavam nos
brejos. Meu irmão agradeceu a Deus aquela
permanência em árvore porque fez amizade com muitas
borboletas.
Manoel de Barros
De tudo, ficaram três coisas: a certeza de que estamos sempre começando... A certeza
de que precisamos continuar... A certeza de que seremos interrompidos antes de terminar...
Portanto devemos: fazer da interrupção um caminho novo. Da queda, um passo de dança. Do
medo, uma escada. Do sonho, uma ponte. Da procura, um encontro.
Adaptado de Fernando Sabino
RESUMO
A temática de interesse desta pesquisa de doutorado está relacionada ao uso de áreas
verdes, preservadas ou não, pelas universidades e como esses usos estão integrados a
processos educativos que tomem em conta a presença de ecossistemas, jardins, fauna, flora,
entre outros elementos naturais presentes no espaço universitário de formação dos estudantes,
da comunidade acadêmica e de gestão ambiental de um modo geral. A esta progressiva
internalização da preocupação ambiental na formação dos sujeitos universitários e na gestão
chamamos ambientalização da universidade. Quando a universidade faz uso ou é possuidora
de áreas verdes pode ter em suas mãos uma importante ferramenta com potencial de
contribuir com sua sustentabilidade. Desta forma, a pesquisa buscou compreender como são
constituídos estes espaços educacionais não convencionais e como eles são pensados e
percebidos pelas universidades dentro de um contexto que busca sustentabilidade e
engajamento ético-ambiental. Procurou também identificar os elementos em comum presentes
nestas relações e pretende com isso contribuir no reconhecimento das potencialidades de usos
destes espaços, como por exemplo outdoor education. Como campo de pesquisa foram
delimitadas oito universidades do Rio Grande do Sul Brasil, que possuem áreas verdes sob
sua responsabilidade legal e/ou gestão. As áreas verdes localizadas foram horto e jardins
botânicos, Áreas de Preservação Permanente, Reservas Legais, Reservas Particulares do
Patrimônio Natural e Refúgio de Vida Silvestre. A abordagem qualitativa foi o método
utilizado que privilegiou técnicas de observação-participante, entrevistas semi-estruturadas, o
relato das pessoas envolvidas com estes lugares e análise documental. Neste percurso
metodológico destacam-se duas etapas importantes e complementares, que em última análise
evidenciam as técnicas utilizadas: pesquisa bibliográfica e o trabalho de campo nas
Instituições de Educação Superior citadas, que se inserem neste contexto de possuintes de
áreas verdes e políticas de gestão ambiental e sustentabilidade. A pesquisa procurou
fundamentar teoricamente o estudo a partir dos referenciais da Antropologia, Filosofia,
Psicologia Ambiental e Sociologia, articulando-se com o campo da Educação e da Educação
Ambiental. Os resultados apontaram para algo que poderia ser visto como esvaziamento do
sentido de lugar destes espaços e como sua existência depende das pessoas engajadas para
além da responsabilidade das instituições. As universidades estão se defrontando com os
processos de ambientalização, mas o lugar das áreas verdes é incerto e frágil. A reflexão sobre
a inserção de uma ecologia menor e uma educação menor no uso das áreas poderia trazê-las
de volta à vida.
Palavras-chave: áreas verdes, ambientalização, universidades sustentáveis, ética ambiental,
educação ao ar livre.
ABSTRACT
This doctoral research theme of interest is related to the use of green areas, preserved
or not, by universities and how the use of these areas are integrated with the educational
processes considering the presence of ecosystems, gardens, fauna, flora, among other natural
elements in the university space for student´s training, academic community and
environmental management in general. To this progressive internalization of environmental
concern in management and in training of university subjects we call university's
environmentalization (greening process). When the university uses or possesses green areas, it
can have an important tool in hands with the potential to contribute to its sustainability. In this
way, the research sought to understand how these non-conventional educational spaces are
constituted and how they are thought and perceived by the universities within a context that
seeks sustainability and ethical-environmental engagement. It also sought to identify the
common elements present in these relations and aims to contribute to the recognition of the
potential uses of these spaces, such as outdoor education. As a field of research, eight
universities in Rio Grande do Sul - Brazil, which have green areas under their legal
responsibility and / or management, were delimited. The green areas were gardens and
botanical gardens, Permanent Preservation Areas, Legal Reserves, Private Natural Heritage
Reserves and Wildlife Refuge. The qualitative approach was the method used that privileged
participant observation techniques, semi-structured interviews, the report of the people
involved with these places, and document analysis. In this methodological path, two
important and complementary stages stand out, which ultimately show the techniques to be
used: bibliographic research and the field work in the mentioned Higher Education
Institutions that are included in this context of possessing green areas and environmental
management and sustainability policies. The research sought to base the study theoretically
based on the references of Anthropology, Philosophy, Environmental Psychology and
Sociology, articulating with the field of Education and Environmental Education. The results
pointed to something that could be seen as emptying the sense of place of these spaces and
how their existence depends on the people engaged beyond the responsibility of the
institutions. Universities are struggling with greening processes, but the places of the green
spaces are uncertain and fragile. Reflection on the insertion of a smaller ecology and a smaller
education in the use of areas could bring them back to life.
Keywords: green areas, greening, sustainable universities, environmental ethics, outdoor
education.
LISTA DE FIGURAS
Imagem 1: O “mato” do Horto ................................................................................................. 82
Imagem 2: Imagens do livro sobre o Horto Botânico da Universidade Alfa ........................... 84
Imagem 3: Vista aérea de parte do morro onde está localizado o Refúgio de Vida Silvestre..85
Imagem 4: Área de Preservação Permanente da Universidade Gama em Uruguaiana ............ 90
Imagem 5: Fazenda experimental da Universidade Gama ....................................................... 92
Imagem 6: Área de preservação da Universidade Delta no campus em São Leopoldo ........... 94
Imagem 7: Praça da Universidade Delta .................................................................................. 95
Imagem 8: Placa da entrada do Jardim Botânico da Universidade Épsilon ............................. 98
Imagem 9: Viveiro e setor das plantas carnívoras do Jardim Botânico da Universidade Épsilon
................................................................................................................................................ 100
Imagem 10: Vista da entrada do Jardim Botânico de Caxias do Sul......................................104
Imagem 11: Cactário do Jardim Botânico de Caxias do Sul .................................................. 105
Imagem 12: Cartazes com as promessas do Ecoparque Caxias ............................................. 108
Imagem 13: Uma das Áreas de Preservação Permanente da Universidade Zeta ................... 110
Imagem 14: A seta indica ao fundo da imagem a Reserva Particular do Patrimônio Natural da
Universidade Etá..................................................................................................................... 112
Imagem 15: Uma das Áreas de Preservação Permanente da Universidade Etá no campus de
Passo Fundo ............................................................................................................................ 115
Imagem 16: Entrada da Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Teta .... 117
Imagem 17: Centro de Visitantes da Reserva Particular do Patrimônio Natural da
Universidade Teta...................................................................................................................119
Imagem 18: Quedas d’água do Salto do Rio Pardinho...........................................................120
Imagem 19: A árvore que venceu a figueira-mata-pau na entrada do Horto Botânico .......... 124
Imagem 20: Um lugar de amor...............................................................................................125
Imagem 21: Reportagem sobre o Horto Florestal no jornal Diário da Manhã ....................... 126
Imagem 22: Ocupação irregular no Morro ............................................................................. 131
Imagem 23: Descarte incorreto de resíduos nos arroios do Morro.........................................132
Imagem 24: Alunos do curso de Tecnologia em Acquicultura em aula prática no arroio dentro
do campus Uruguaiana da Universidade Gama......................................................................133
Imagem 25: Mesa de Nelson Félix no campus de Uruguaiana da Universidade Gama.........135
Imagem 26: Viveiro de mudas nativas no campus Dom Pedrito da Universidade Gama......136
Imagem 27: Trilha da Divisa Universidade Delta ............................................................... 138
Imagem 28: Trilha do Lago Universidade Delta ................................................................. 138
Imagem 29: Trilha pelo Jardim Botânico da Universidade Épsilon.......................................141
Imagem 30: Bioconstrução de bambu no Jardim Botânico da Universidade Épsilon............ 141
Imagem 31: Bosque da Universidade Épsilon ....................................................................... 143
Imagem 32: Caminhos do Jardim Botânico de Caxias do Sul ............................................... 144
Imagem 33: Alunos da Educação Infantil usando as áreas verdes do campus da Universidade
Zeta para um piquenique após visita ao Zoológico ................................................................ 145
Imagem 34: Resultados da pesquisa com armadilhas fotográficas no campus da Universidade
Etá em jornal local .................................................................................................................. 147
Imagem 35: Placas de atenção aos animais no campus da Universidade Etá. Uma das
conquistas do uso das Áreas de Preservação Permanente ...................................................... 148
Imagem 36: Publicações do Projeto de Educação Ambiental da Universidade Teta ............. 152
LISTA DE SIGLAS
APP - Área de Preservação Permanente
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEIDA - Centro de Extensión Universitaria e Divulgación Ambiental de Galicia
CGA - Comitê de Gestão Ambiental
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
EAL - Experiencing the Australian Landscape (Experimentando a Paisagem Australiana)
ESALQ - Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz
FAPERGS - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul
FEPAM Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luís Roessler
FIES Fundo de Financiamento Estudantil
FZB Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul
IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis
IES Instituição de Educação Superior
IMA - Instituto do Meio Ambiente
ISO - International Organization for Standardization (Organização Internacional para
Padronização)
MEC Ministério da Educação
NRS - Natural Reserve System (Sistema de Reserva Natural)
ONGs - Organizações Não Governamentais
PBE - Place-Based Education (Educação Baseada no Lugar)
PDI Plano de Desenvolvimento Institucional
PDSE Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior
PIBID - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
PROUNI Programa Universidade para Todos
PUCRS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
RL - Reserva Legal
REVIS - Refúgio de Vida Silvestre
RPPN Reserva Particular do Patrimônio Natural
SAMAE - Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto
SEC Secretaria da Educação do Rio Grande do Sul
SEUC - Sistema Estadual de Unidades de Conservação
SEMMA Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Caxias do Sul
SGA/USP - Superintendência de Gestão Ambiental da Universidade de São Paulo
SMAM Secretaria Municipal do Meio Ambiente de Porto Alegre
SNUC - Sistema Nacional de Unidades de Conservação
TAC - Termo de Ajustamento de Conduta
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TEOS - Transcultural European Outdoor Studies (Estudos ao ar livre transculturais europeu)
UC Unidade de Conservação
UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul
UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura)
USP - Universidade de São Paulo
13
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 15
1 LER, VER, OUVIR, SENTIR, PERCEBER E ESCREVER .......................................... 21
1.1 Questões éticas na pesquisa .................................................................................... 26
2 PRIMEIRAS INCURSÕES ............................................................................................... 27
3 AS NOÇÕES DE NATUREZA E A GRANDE DIVISÃO .............................................. 40
3.1 A Grande Divisão .................................................................................................... 40
3.2 A Natureza intocável ............................................................................................... 46
3.3 Educação na natureza e a natureza na educação ................................................ 53
4 NATUREZA, POLÍTICA E UNIVERSIDADES ............................................................ 71
4.1 Ambientalização e Universidades ......................................................................... 72
4.2 A política nas relações entre universidades e áreas verdes ................................ 77
5 APRESENTAÇÃO DO CAMPO DE PESQUISA ........................................................... 80
5.1 Sobre a criação das áreas verdes: conjecturas sonhadas e contextos reais ....... 80
5.1.1 Horto Botânico Universidade Alfa................................................................81
5.1.2 O Refúgio de Vida Silvestre Universidade Beta.............................................84
5.1.3 Áreas de Preservação Permanente Universidade Gama ............................... 89
5.1.4 Áreas verdes - Universidade Delta ................................................................... 93
5.1.5 O Jardim Botânico e o Bosque Universidade Épsilon ................................... 98
5.1.6 O Jardim Botânico de Caxias do Sul Universidade Zeta.............................103
5.1.7 Reserva Particular do Patrimônio Natural - Universidade Etá ..................... 111
5.1.8 Reserva Particular do Patrimônio Natural - Universidade Teta....................117
5.2. Sobre como são utilizadas as áreas verdes ......................................................... 123
5.2.1 Um lugar de amor - Horto Botânico da Universidade Alfa ............................ 123
5.2.2 Um laboratório ao ar livre O Refúgio de Vida Silvestre da Universidade
Beta........................................................................................................................... 128
5.2.3 O Pampa com potencial Universidade Gama .............................................. 133
5.2.4 As trilhas Áreas verdes da Universidade Delta ........................................... 137
5.2.5 Mais do que uma trilha com nomes Jardim Botânico da Universidade Épsilon
.................................................................................................................................. 139
5.2.6 Áreas verdes da cidade Jardim Botânico e campus da Universidade Zeta .. 143
5.2.7. Espacos de aula APPs e RPPN da Universidade Etá..................................146
14
5.2.8 Lugar de conservação - Reserva Particular do Patrimônio Natural da
Universidade Teta..................................................................................................... 149
6 TONS DE CINZA NAS RELAÇÕES ENTRE AS UNIVERSIDADES E AS ÁREAS
VERDES ................................................................................................................................ 154
6.1 Das Instituições......................................................................................................154
6.1.1 Como tornar invisível um lugar ...................................................................... 157
6.1.2 Como tornar opaco um lugar .......................................................................... 160
6.1.3 Construção de espaços ou lugares? ................................................................ 163
6.2 Dos Usos ................................................................................................................. 166
6.3 Da Solitude Ambiental .......................................................................................... 167
6.4 Da Gestão Ambiental ............................................................................................ 174
7 A INSUSTENTABILIDADE DA ECOLOGIA MAIOR E A RESSIGNIFICAÇÃO
DOS ESPAÇOS .................................................................................................................... 181
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................205
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 207
APÊNDICE I - TERMO DE ESCLARECIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO .............. 215
APÊNDICE II - FOTOS DE ARTE E POESIA EM ÁREAS VERDES UNIVERSITÁRIAS
................................................................................................................................................ 216
ANEXO I SISTEMA DE RESERVAS NATURAIS DA UNIVERSIDADE DA
CALIFÓRNIA ........................................................................................................................ 217
ANEXO II CENTRO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E DIVULGAÇÃO
AMBIENTAL DA GALÍCIA (CEIDA)................................................................................. 218
15
INTRODUÇÃO
A temática de interesse desta pesquisa de doutorado está relacionada ao uso de
espaços verdes, naturais ou não, mantidos pelas universidades. Nossa questão é discutir em
que medida estes usos instituem processos educativos que tomem em conta a presença de
ecossistemas, jardins, fauna, flora, entre outros elementos naturais presentes no espaço
universitário, na formação dos estudantes e da comunidade acadêmica de um modo geral.
Também é discutir como estas áreas verdes são inseridas na gestão ambiental destas
instituições. A esta progressiva internalização das questões ambientais na formação dos
sujeitos universitários e na gestão, chamaremos ambientalização da universidade. Desta
forma, esta pesquisa busca compreender como ocorrem os usos destes espaços educacionais
não convencionais e como eles são pensados e vistos pelas universidades em suas políticas
ambientais e dentro de um contexto que busca educar para a sustentabilidade e para uma
cidadania socioambiental.
Como campo de pesquisa foram delimitadas oito universidades do Rio Grande do Sul.
São universidades localizadas em diversas regiões do estado que possuem sob seu domínio e
gestão áreas verdes. A escolha da categoria Universidade dentro das categorias de Instituições
de Educação Superior se deu pelas caracterísitcas necessárias para a obtenção deste título,
como por exemplo, possuir um padrão satisfatório de qualidade e pela indissociabilidade
requerida das atividades de ensino, pesquisa e extensão. Com estas características, a pesquisa
entende a grandiosidade das instituições denominadas Universidade e com isso devem estar
atentas à sua responsabilidade social e ambiental. Estas responsabilidades são indissolúveis e
estão diretamente ligadas à gestão destas áreas verdes como será possível observar ao longo
da tese.
A escolha da denominação áreas verdes corresponde ao fato que algumas das áreas
abordadas nesta pesquisa não são áreas naturais e também não fazem parte das categorias das
áreas protegidas. Todavia, áreas naturais também foram encontradas e ao usar áreas verdes, a
pesquisa entende estar contemplando todas estas categorias. Na descrição destas áreas serão
encontrados Jardins e Horto Botânicos, Reservas Legais, Áreas de Preservação Permanente,
Reservas Particulares do Patrimônio Natural e Refúgio de Vida Silvestre. Esta multiplicidade
configura a relação das universidades e suas áreas verdes que serão aqui apresentadas.
A tese de doutoramento parte da hipótese de que há potencialidades no uso das áreas
verdes, naturais ou não, como espaços educacionais não convencionais para a formação
16
integral dos estudantes universitários e que estes espaços podem auxiliar nos processos de
ambientalização institucional. Assume-se formação integral como uma trajetória universitária
comprometida com a formação ético-ambiental de seus futuros profissionais, para além de
uma formação técnica e conteudista. O uso destes espaços também pode auxiliar nos
processos de ambientalização das universidades quando eles passam a ser inseridos e
valorizados em seu planejamento estratégico.
A frequentação de áreas verdes possui importante papel educacional, pois pode
proporcionar uma experiência estética sensibilizante frente às questões ambientais e isso se
torna fundamental na formação de profissionais engajados ambientalmente independente da
área de atuação.
Enquanto estrutura de organização da tese, após este capítulo da Introdução, será
apresentado o capítulo sobre a metodologia usada para a construção deste trabalho. Sob o
título de Ler, Ver, Ouvir, Sentir, Perceber e Escrever, serão apresentados os caminhos
seguidos para chegar até as universidades e suas áreas verdes, com seus múltiplos filamentos
e fluxos que me levaram até a inflexibilidade de estruturas universitárias, histórias de
resistência, de invisibilidade das áreas verdes e dos seus atores. A abordagem qualitativa foi o
método utilizado neste estudo. Quanto aos procedimentos, privilegiaremos o enfoque de uma
pesquisa aberta, generosa e humilde dando voz aos atores encontrados e valendo-nos de
técnicas como observação-participante, entrevista semi-estruturada e análise documental. Esta
opção se alinha com os pressupostos teórico-metodológicos que fundamentaram a pesquisa,
no sentido de não condicinonar as respostas dos participantes e apreender de um modo mais
completo suas experiências.
A pesquisa bibliográfica foi um procedimento contínuo durante o desenvolvimento da
tese de doutorado e procurou fundamentar o estudo a partir dos referenciais da Antropologia,
Filosofia, Psicologia Ambiental e Sociologia, articulando-se com o campo da Educação e da
Educação Ambiental. Para além de ser o procedimento balizador da tese, o estudo dessas
temáticas também foi foco de aprofundamento durante as discussões do Grupo de Pesquisa
SobreNaturezas (UFRGS).
Na sequência deste capítulo metodológico, está o capítulo Primeiras Incursões, onde
trago exemplos nacionais e internacioais de universidades que fazem uso de áreas verdes e
que me auxiliaram a pensar sobre este tema. Um dos exemplos é o da University of California
e seu Natural Reserve System (NRS) que abriga uma considerável quantidade de áreas
conservadas com diferentes projetos de uso e gestão; o outro exemplo apresentado é o Centro
de Extensión Universitaria e Divulgación Ambiental de Galicia que está localizado em uma
17
área natural de relevante valor histórico e de preservação, operando através da Universidade
de Coruña e uma rede de cooperação internacional que inclui diversas universidades e
instituições. Estes exemplos fizeram parte da pesquisa exploratória do projeto permitindo que
fossem traçados paralelos entre exemplos do Brasil e fora dele. Entretanto, será dado maior
destaque a dois exemplos, as Reservas Florestais da Universidade de São Paulo, que fizeram
parte do Projeto de Qualificação desta pesquisa; e das áreas verdes usadas pela Universidade
de Saskatchewan (Canadá) onde realizei o estágio doutoral no ano de 2017.
A fundamentação teórica da tese está articulada entre dois capítulos. O primeiro deles
chamado de As Noções de Natureza e a Grande Divisão traz o tópico A Grande Divisão onde
apresentará de forma breve o pano de fundo histórico-filosófico da tese, e trará a história
recente das relações estabelecidas ao longo dos séculos entre os seres-humanos e a natureza
dualidade essa não natural, e suas implicações atuais nos modelos universitários ocidentais.
Essas reflexões tem sido um dos temas que tem fomentado investigações no Grupo de
Pesquisa SobreNaturezas (UFRGS). Esta perspectiva da história recente das relações e
percepções dos ambientes naturais conduz a uma busca através de novos modos de ver e
compreender o mundo, assumindo referências ecológicas que permitem compreender as
relações com o ambiente vistas de um outro ponto, não mais com afastamentos ou
externalidades, mas como partes integrantes de um mesmo cosmos, independente da
representação e da ação humana. No tópico A Natureza intocável é abordado o modelo de
isolamento de áreas naturais e afastamento do ser humano visando a preservação desses
espaços. A intenção é refletir sobre como esse comportamento pode ter modificado nossa
relação com a natureza e como isso pode ter tornado incerto seu lugar em algumas situações,
como por exemplo, nas estruturas universitárias. Encerrando este capítulo, no tópico
Educação na Natureza e a Natureza na Educação, serão trazidos exemplos de práticas
educacionais que se constituíram ao longo do tempo em uma relação bastante íntima com a
natureza, como por exemplo a pedagogia romântica de Rousseau e a disciplina do Escotismo.
Projetos de educação ambiental, educação ao ar livre e educação baseada no lugar também
serão abordados como atividades no uso destes espaços naturais, bem como a ideia de uma
aprendizagem junto ao caminhar trazida por autores como Ingold e Masschelein.
Por serem valorizados atualmente como representação de comprometimento ambiental
frente à sociedade, estas áreas verdes podem se configurar unicamente como um poder
simbólico não efetivo exercido pelas universidades. As responsabilidades inerentes a este
compromisso são muitas, e dependem de qual tipo de envolvimento que as instituições
assumem. Quando reprodutoras do modelo de natureza intocável, com acesso restrito à
18
poucas pessoas especializadas como pesquisadores e estudantes de biologia, as
universidades restringem o potencial de uso desses lugares. Quando agregam ao espaço
possibilidades de uso mais amplas, contemplando outras esferas institucionais e comunidade,
os resultados poderão ser melhores e mais eficazes.
Dentro deste contexto, o segundo capítulo da fundamentação é Natureza, Política e
Universidades que terá um caráter mais político, menos histórico-filosófico. O tópico
Ambientalização e Universidades abordará o tema sobre como a formação de uma postura
responsável ambientalmente tem sido almejada por algumas universidades devido às
exigências da sociedade em que estão inseridas e parâmetros mundiais de sustentabilidade.
Interessa-nos, diante deste cenário, indagar quais os elementos e quais as teias de sentido
unem os discursos referentes a essa relação universidade/área verde. Ao percorrer esse
caminho a pesquisa também procurou identificar os pontos convergentes e divergentes das
relações entre as áreas verdes e as oito universidades. Para tanto, a pesquisa identificou como
as universidades citadas utilizam suas áreas verdes e como estes espaços se configuram dentro
da concepção de universidades sustentáveis. No tópico A política nas relações entre
universidades e áreas verdes são trazidas questões norteadoras que ajudaram a manter uma
postura crítica na condução da pesquisa e suas análises, levando em conta uma simetria
ampliada entre os atores operantes nestas relações.
Cada um destes capítulos trará aspectos que permitirão estabelecer conexões e
aproximações entre estas áreas, criando disposições que se mostrarão fundamentais para o
entendimento dos efeitos das relações históricas sobre os atores do presente. Além do mais,
permitirá transitar de uma esfera histórico-filosófica para a contemporaneidade das relações
entre as universidades e suas áreas verdes, incluindo os aspectos políticos que desenham estas
relações.
Após os capítulos da fundamentação da tese, é trazido o capítulo da Descrição do
Campo, subdivido em Sobre a criação das áreas verdes: conjecturas sonhadas e contextos
reais, onde serão apresentadas as áreas verdes das universidades que compõem esta pesquisa,
a história da sua criação e a situação atual; e Sobre como são utilizadas as áreas verdes, no
qual é dado destaque as atividades sonhadas para estes espaços e o contexto atual real.
O capítulo das análises dos dados obtidos ao longo da pesquisa chama-se Tons de
cinza nas relações entre as universidades e as áreas verdes e tem a intenção de mostrar como
são múltiplas as situações resultantes da relação das universidades com suas áreas verdes.
Este capítulo está dividido em quatro categorias de análises: Das Instituições, Dos Usos, Da
Solitude Ambiental e Da Gestão Ambiental. A primeira catagoria analisada, Das Instituições,
19
está subdividida em três tópicos, Como tornar invisível um lugar, Como tornar opaco um
lugar e Construção de espaços ou lugares?, e demonstrará como a inflexibilidade
instituicional condiciou a situação atual das áreas verdes estudadas. A segunda categoria, Dos
Usos, detalhará o tipo de uso que é feito destas áreas verdes no contexto atual e também quais
foram os usos idealizados no momento de sua constituição. Da Solitude Ambiental, a terceria
categoria, traz a história dos personagens envolvidos com as áreas verdes, seja na criação
destes lugares, ou na manutenção da existência deles. Ao longo dos quatro anos em que esta
pesquisa se moldou, fui surpreendida pelo protagonismo destas histórias de um contexto
recente que idealizava estas áreas verdes como lugares inovadores, de comprometimento
ambiental, e repletos de potencial. Na atual conjectura, tanto as áreas verdes, como as
histórias das pessoas que são apresentadas aqui neste trabalho, são a expressão de resistência
de um ideal. Encerrando o capítulo de análises, a categoria da Gestão Ambiental abordará
como efetivamente as áreas verdes são inseridas nas políticas de gestão ambiental das
universidades e qual o papel que elas ocupam nos processos de ambientalização. Será possível
ver que existe uma movimentação das universidades com relação aos processos de
ambientalização, seja por questões legais ou iniciativas próprias. Entretanto, também será
possível identificar que o lugar que as áreas verdes ocupam dentro desta gestão ambiental é
incerto.
Aprofundando um debate sobre os elementos trazidos neste trabalho, mas certamente
não esgotando o tema, o capítulo Insustentabilidade da Ecologia Maior e a Ressignificação
dos espaços tenciona a reflexão sobre os resultados obtidos a partir das análises. Para isso,
propõe a reflexão das relações das áreas verdes e as universidades a partir dos conceitos de
Ecologia Maior e ecologia menor de Godoy (2008), conceitos oriundos de Deleuze e Guattari
(2003) e sua literatura menor. Esta reflexão também intenta pensar uma educação menor para
reviver estas áreas verdes e habitá-las na sua totalidade. Universidade e Responsabilidade
retomará a importância e dever das universidadese em assumir um comprometimeto
ambiental, incluindo aqui a gestão de suas áreas verdes. Como pensar uma ética ambiental e
uma ecologia menor nestas relações? Talvez o conceito de rizoma, entendido como um
modelo aberto de linhas de intensidade e de resistência às hierarquias, possar lançar alguma
luz sobre estas questões. Ecologia menor, educação menor induz sobre pensar a vida dentro
das áreas verdes através dos fluxos trazidos pela literatura, artes, música, etc.
Finalizando a tese, o capítulo sobre Considerações Finais se propõe a alinhavar os
tópicos e objetivos da pesquisa de uma forma objetiva, mas ao mesmo tempo deixando em
aberto o campo para novas reflexões.
20
Os conceitos e as abordagens propostas por esta pesquisa convergem para uma região
do debate teórico-filosófico contemporâneo, o que Carvalho e Steil (2013) chamam de
epistemologias ecológicas. A tese pretende assumir conceitos como estética, percepção e
ambientalização que visam propor uma crítica às pretensões de uma verdade universal e única
e aventam o reconhecimento da legitimidade dos múltiplos saberes. Os autores que são
citados neste projeto buscaram, de formas distintas, romper com dicotomias forjadas ao longo
da consolidação da ciência moderna, tais como natureza e cultura, sujeito e objeto, corpo e
mente, e sujeito e sociedade.
21
1 LER, VER, OUVIR, SENTIR, PERCEBER E ESCREVER
Como já foi colocado na introdução do trabalho, a pesquisa selecionou trabalhar com
Instituições de Educação Superior da categoria Universidade. Esta escolha ocorreu em virtude
da grandiosidade original destas instituições, principalmente com suas responsabilidades
sociais e ambientais. Segundo o Ministério da Educação (MEC), para uma instituição obter a
condição de Universidade deve possuir um funcionamento regular e possuir um padrão
satisfatório de qualidade. Além destas características, as Universidades também devem se
caracterizar “pela indissociabilidade das atividades de ensino, pesquisa e extensão. São
instituições pluridisciplinares de formação dos quadros profissionais de nível superior, de
pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber humano” (MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO, 2016a).
As universidades devem ser capazes de gerar produção intelectual institucionalizada
através de estudos dos temas e problemas relevantes, seja nas esferas científicas ou culturais,
regionais, nacionais ou internacionais. Estas insituições devem ser compostas por um corpo
docente qualificado, sendo o mínimo exigido de um terço deste corpo composto por
professores com titulação acadêmica de mestrado ou doutorado. Elas contemplam um
universo maior de produção, de áreas do saber e comunidade acadêmica do que as Faculdades
e Centros Universitários.
Por estas condições exigidas para o recebimento do título de Universidade, a pesquisa
entende estas instituições como Instituições de Educação Superior de referência, de qualidade
e por isso detentoras de uma responsabilidade maior frente às suas ações e a consequente
devolução que dá à sociedade. Dentro deste contexto, as Universidades foram as instituições
selecionadas para o inventariamento e diagnóstico das suas relações com suas áreas verdes.
Foram selecioandas as universidades do Rio Grande do Sul na intenção de contribuir
de forma local com os dados obtidos, auxiliando na construção de um panorama com oito
instituições do estado e suas relações com suas áreas verdes. Desta forma, a pesquisa espera
contribuir com análises e reflexões feitas sobre este contexto.
Através do Sistema e-MEC do Ministério da Educação foram identificadas 18
Instituições de Educação Superior na categoria Universidades do Rio Grande do Sul1. Como a
1 O e-MEC é um sistema eletrônico de acompanhamento dos processos que regulam a educação superior no
Brasil. Pela internet, as instituições de educação superior fazem o credenciamento e o recredenciamento, buscam
22
intenção da pesquisa era trabalhar com áreas verdes que fossem geridas e de propriedade de
universidades, identificou-se oito instituições que atendiam a estes critérios. Das 18
universidades, não eram todas as que possuiam esta condição. Das instituições que
apresentavam um perfil condizente com os objetivos do trabalho e que aceitaram participar da
pesquisa, oito foram selecionadas.
Na intenção de preservar a identidade dos interlocutores da pesquisa, optou-se por
mantê-los no anonimato, bem como substituir o nome das univeridades. No propósito de
englobar a multiplicidade das relações entre universidades e suas áreas verdes, a pesquisa não
fez distinção entre universidades públicas e particulares. Para que pudessem ser identificadas
nas suas particularidades, as universidades foram chamadas de Universidade Alfa,
Universidade Beta, Universidade Gama, Universidade Delta, Universidade Épsilon,
Universidade Zeta, Universidade Etá e Universidade Teta.
O trabalho de campo desta pesquisa percorreu dois caminhos de forma concomitante e
complementar. Para compreender como se desenham as relações das universidades e suas
áreas verdes e como isto está configurado nos projetos universitários de ambientalização
foram realizadas análises de documentos oficiais das universidades como, por exemplo,
planos de desenvolvimento institucionais (PDIs), planos socioambientais, relatórios, entre
outros. As informações obtidas foram confrontadas com as informações retiradas das
entrevistas semi-estruturadas com gestores dos espaços naturais, diretores de departamentos
com envolvimento direto com as áreas verdes, professores que fazem uso destes espaços e
demais atores que vieram a contribuir para esta investigação. Através desse cruzamento a
pesquisa pode reconstruir as relações objetivas e subjetivas entre os diversos agentes
envolvidos e formatar um olhar crítico sobre as relações estudadas.
Além da análise dos documentos e das entrevistas semi-estruturadas, a visita às áreas
verdes se fez imprescindível, não somente para conhecer a fisionomia do local, mas também
os elementos humanos e não humanos que as compõem. Esta abordagem deu um caráter de
inspiração antropológica a esta pesquisa de Educação, baseada na observação participante, a
partir da qual foram gerados diários de campos e fotografias para desenhar o contexto da
pesquisa. Estas técnicas foram utilizadas durante a investigação em momentos distintos e
procuraram se alinhar no sentido de permitir acessar e experienciar as práticas no campo
educativo ambiental com o enfoque desta investigação.
autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos. Em funcionamento desde janeiro de
2007.
23
Esta pesquisa não tem a intenção de fazer um estudo comparativo entre as
universidades, na realidade ela procurou se basear na compilação de diferentes exemplos, o
que permitiu configurar os resultados em múltiplas situações e relações que poderão
contribuir com suas particularidades e singularidades entre si e também com outras
instituições de ensino (formais e não formais).
Abaixo apresentamos um quadro das universidades e suas áreas verdes (Quadro 1),
elas serão detalhadas no capítulo Descrição do Campo. As áreas verdes foram identificadas
nas universidades através de pesquisas nos sites instituicionais, contatos com professores e
visitas aos locais. Após esta primeira identificação, a coleta de materiais bibliográficos, as
entrevistas semi-estruturadas, a confecção do diário de campo e outras visitas seguiram.
As entrevistas semi-estruturadas consistiam basicamente em questões referentes à qual
a origem daqueles lugares; quais usos eram feitos nas áreas verdes; quem costumava
frequentar (quais os cursos, disciplinas, pesquisas, alunos, professores, escolas, público geral);
se existia algum projeto educacional relacionado às áreas verdes; qual a relação institucional
das universidades e suas áreas verdes; qual o setor universitário era o responsável pela gestão
das áreas verdes; se as áreas recebiam algum financiamento para sua manutenção; e se
existiam projetos futuros para as áreas verdes.
Quadro 1: Relação das universidades e suas áreas verdes estudadas
UNIVERSIDADE
Universidade Alfa
Universidade Beta
Universidade Gama
Universidade Delta
Universidade Épsilon
Universidade Zeta
Universidade Etá
Universidade Teta
Fonte: Muhle (2016).
ÁREA VERDE
Horto Botânico
Refúgio de Vida Silvestre
Área de Preservação Permanente
Áreas Verdes
Jardim Botânico e Bosque
Jardim Botânico e Área Verde
Reserva Particular do Patrimônio Natural e Áreas de
Preservação Permanente
Reserva Particular do Patrimônio Natural
Abaixo são apresentados (Quadro 2) as datas dos encontros com personagens da
pesquisa, as datas das visitas feitas às áreas verdes e o acompanhamento de atividades. O
24
detalhamento destes encontros, com as memórias dos personagens e as informações
fornecidas por eles, e a triangulação com as informações obtidas através de documentos e
pesquisas deram origem ao capítulo Descrição do Campo.
Quadro 2: Datas dos encontros e visitas às áreas verdes.
UNIVERSIDADES
Universidade Alfa
23.06.16 Visita ao Horto Botânico. Entrevistas semi-estruturadas com a Professora de
Botânica da universidade e o Professor pupilo aposentado.
27.06.16 Contatos telefônicos com o Professor.
Universidade Beta
16.05.16 Encontro com uma professora da universidade que atualmente é integrante da
comissão que lida com as assuntos referentes ao Refúgio de Vida Silvestre. Em decorrência
da negativa de entrevista com responsável pela gestão ambiental da universidade, os dados
deste encontro não puderam ser aproveitados.
03.06.16 Encontro e entrevista semi-estruturada com a Professora idealizadora do
Refúgio de Vida Silvestre.
20.07.16 Novo encontro com a Professora para coletar documentos e trabalhos referentes
ao Refúgio de Vida Silvestre.
Universidade Gama
22 e 23.08.16 Visita à unidade acadêmica de Uruguaiana para conhecimento do campus e
Área de Preservação Permanente. Realização de entrevistas semi-estruturadas com dois
professores e o Diretor do campus.
24.08.06.16 Visita à unidade de Alegrete para entrevista semi-estruturada com o Pró-
Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação.
26 e 27.09.16 Visita à unidade de Dom Pedrito para conhecimento do campus e da
fazenda experimental. Realização de entrevistas semi-estruturadas com o Diretor do
campus e professores que coordenam projetos de educação ambiental.
28.09.16 Visita à unidade de Caçapava do Sul para conhecimento do campus e suas áreas
verdes e realização de entrevista semi-estruturada com a Diretora do campus.
Universidade Delta
17.05.16 Encontro com o grupo de educação ambiental da universidade e entrevista semi-
estruturada com a Coordenadora do grupo.
25
21.05.16 Acompanhamento da Trilha da Divida na universidade conduzida por
integrantes do grupo de educação ambiental para estudantes universitários.
04.07.16 Entrevista semi-estruturada com a Assistente Administrativa do Sistema de
Gestão Ambiental da universidade.
03.08.16 Participação no treinamento para funcionários ministrado pela equipe do
Sistema de Gestão Ambiental.
Universidade Épsilon
18.07.16 Visitas ao Jardim Botânico e ao Bosque da universidade. Acompanhamento das
atividades realizadas com uma escola ao Jardim. Entrevista semi-estruturada com o
Professor Diretor do Jardim Botânico.
19.07.16 Entrevista semi-estruturada com a Professora e Coordenadora da Comissão de
Planejamento Ambiental e o Engenheiro Químico Chefe do Setor de Planejamento
Ambiental.
Universidade Zeta
21 e 22.09.16 Visita ao campus da universidade para conhecimento de suas áreas verdes,
incluindo suas Áreas de Preservação Permanente. Entrevistas semi-estruturadas com a
Professora responsável pelo setor de gestão ambiental da universidade e com a Professora
responsável pela cogestão do Jardim Botânico.
23.09.16 Visita ao Jardim Botânico da cidade que possui cogestão da Universidade Zeta.
Universidade Etá
09.06.16 Contato telefônico e entrevista prévia com o Professor de Ciências Biológicas.
13 e 14.06.16 Vista ao campus de Passo Fundo da universidade para conhecimentos das
Áreas de Preservação Permanente e Reserva Particular do Patrimônio Natural. Entrevistas
semi-estruturadas com as Professoras de Ecologia e Zoologia, e com a Coordenadora da
Divisão de Saneamento Ambiental.
15.06.16 Entrevistas semi-estruturadas com o casal de Professores de Ciências Biológicas
e com o Professor de Agronomia.
Universidade Teta
01 e 02.06.16 Conhecimento do campus em Santa Cruz do Sul da universidade. Visita à
Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Teta no município de Sinimbu,
com o acompanhamento da gestora da área.
03.06.16 Entrevista semi-estruturada com os professores que tem relação frequente com a
reserva.
26
10.10.17 Entrevista estruturada on-line com o Coordenador da área ambiental da
Universidade Teta
Fonte: Muhle (2016).
1.1 Questões éticas na pesquisa
Vivenciamos um importante momento de debate sobre a regulamentação das pesquisas
nas ciências humanas, aqui especilamente a área da Educação. Entende-se a necessidade de
regulamentar questões éticas presentes nas situações das pesquisas como, por exemplo,
entrevistas e abordagens etnográficas - como a observação participante. Entretanto, sabe-se
também que as resoluções do Conselho Nacional de Saúde nº 196 e nº 466 (de 1996 e de
2012 respectivamente) não contemplam as necessidades dos trabalhos desenvolvidos pelas
ciências humanas, justamente por se tratarem de áreas com diferentes abordagens, objetivos e
metodologias de pesquisa.
Afortunadamente estas questões têm sido debatidas e existe um reconhecimento das
necessidades de uma regulamentação específica para as ciências humanas, tornando mais
reais e efetivos os cuidados éticos nas pesquisas. Essa Resolução é a nº 510, de 2016, a partir
da qual os cuidados éticos deste trabalho foram baseados.
Na tentativa de manter íntegra a pesquisa, bem como a relação com todos os
envolvidos nela, foi desenvolvido o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
aplicado nas entrevistas (APÊNDICE I). Através deste documento, os participantes tiveram o
conhecimento dos objetivos da pesquisa e como as informações geradas pelos mesmos seriam
utilizadas. A pesquisa contou também com o instrumento das cartas de apresentação com a
autoria da orientadora Isabel Carvalho, apresentando a pesquisadora e referenciando as
intenções e objetivos da pesquisa. Em todos os casos se procurou deixar claro para os
interlocutores que se tratava de uma pesquisa e que as informações prestadas poderiam ser
utilizadas.
Como já referido, optou-se pelo anonimato dos interlocutores da pesquisa, bem como
das instituições envolvidas para assegurar a confiabilidade que me foi repassada durante o
trabalho. Algumas referências foram suprimidas para evitar a identificação destes autores e
universidades. Todavia, para aquele leitor que se interessar, é possível inferir quais as
instituições são aqui relaciondas, o que não configurará nenhuma arbitrariedade, uma vez que
as informações obtidas a patir dos documentos institucionais disponibilizados pelas
instituições trazidas nesta pesquisa são de domínio público.
27
2 PRIMEIRAS INCURSÕES
Neste capítulo mostraremos exemplos de universidades em processos de
ambientalização que fazem uso de áreas naturais/verdes sob sua gestão e através desta
conexão executam projetos com comprometimento ambiental entre a comunidade acadêmica
e também a comunidade na qual estão inseridas. A escolha destes casos se deu pelos contatos
surgidos nas primeiras aproximações da pesquisa exploratória e que ajudaram no desenho
atual da tese.
Perseguindo a temática foi possível conhecer de forma virtual as reservas naturais da
University of California (EUA). O que levou a trazer esta universidade como um exemplo
para a pesquisa foi a grandiosidade do seu sistema de gestão para suas 39 áreas naturais
distribuídas pelos seus nove campi. Pude trocar e-mails com a supervisora geral do Natural
Reserve System (NRS) e seu retorno foi bastante positivo, inclusive abrindo espaço para
possíveis visitas às áreas. Também pude ter contato com materiais informativos e documentos
sobre os projetos desenvolvidos em cada área e sobre como funcionam alguns aspectos de sua
gestão e uso educativo/público. Mais detalhes dos projetos e atividades desenvolvidos nestes
espaços e informações sobre seu manejo serão mostrados a seguir.
Durante o III Congresso Internacional de Educação Ambiental dos Países e
Comunidades de Língua Portuguesa realizado em Murtosa Portugal, no mês de julho de
2015, pude participar de uma mesa redonda intitulada “A Rede Pardela: trabalho en rede para
melhorar a gestão das áreas naturais protegidas”. Neste evento pude conhecer o trabalho desta
rede, que é uma rede hispano-lusófona para gestores de áreas naturais protegidas, cujo
objetivo é criar um espaço de intercâmbio de experiências sobre gestão das áreas para
colaboração mútua entre todo o mundo, mas especialmente países de língua portuguesa e a
Espanha. Esta atividade me permitiu principalmente conhecer o Centro de Extensión
Universitaria e Divulgación da Galicia (CEIDA), que é o local físico onde o projeto da Rede
Pardela é desenvolvido e mantido e que está localizado dentro de uma área natural de
importante valor histórico e de preservação ambiental. O CEIDA mostrou-se como um
importante exemplo para esta pesquisa, pois sua gestão é coordenada pela Universidade da
Coruña e desenvolve um programa de gestão em cooperação com outras universidades e
órgãos ambientais. Além disso, desenvolve uma série de projetos que envolvem as
28
comunidades universitárias, mas também a comunidade da Galícia, conforme será mostrado a
seguir.
Durante a primeira fase da estruturação da tese, o Projeto de Qualificação incluiu a
Universidade de São Paulo (SP) e suas reservas florestais como um campo a ser trabalhado. O
Campus de Luiz de Queiroz (ESALQ) na cidade de Piracicaba foi o local visitado e lá foi
possível conhecer os projetos desenvolvidos e como ocorrem as gestões dessas áreas. Lá
também foi possível presenciar como elementos não-humanos podem influenciar e alterar o
uso desses lugares. Apesar de não fazer mais parte do campo de pesquisa, esse exemplo foi
importante para o desenho da tese e será detalhado a seguir.
Entre os meses de maio a agosto do ano de 2017 realizei estágio de doutoramento
financiado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
através do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE). O estágio ocorreu na
Universidade de Saskatchewan, na cidade de Saskatoon Canadá. Como pesquisadora
visitante do Departamento de Fundações Educacionais (Department of Educational
Foundations) do Colégio de Educação (College of Education) da universidade pude conhecer
áreas verdes geridas pela universidade e os processos de ambientalização desta instituição. A
visita e a proximidade a estas áreas verdes permitiu identificar situações recorrentes às das
universidades do Rio Grande do Sul apresentadas na pesquisa, bem como possibilidades de
uso. Uma descrição mais detalhada destas vivências será apresentada a seguir.
Os exemplos trazidos nesta parte do projeto configuram universidades que possuem
relação de gestão e uso de áreas verdes preservadas. As relações diferem entre si pelos modos
de gestão e extensão, mas desenvolvem projetos socioambientais relevantes para as
universidades às quais estão ligadas. Dediquei-me a buscar experiências fora do Brasil com a
intenção de colocar em diálogo as experiências nacionais e internacionais e seus processos de
ambientalização, em especial as vividas na Universidade de Saskatchewan. Da maneira como
venho tentando demonstrar e promover, as universidades que fazem uso de áreas
naturais/verdes sobre sua gestão/domínio deveriam incorporar nas suas tentativas de
tornarem-se sustentáveis uma relação íntima com essas áreas, utilizando-as não somente como
áreas de preservação, mas como ferramentas de formação de seus futuros profissionais e
aproximação da comunidade. Além do mais, essas instituições assumem responsabilidades
sociais e ambientais e necessitam de ações reais e eficazes para justificar a retenção destes
espaços, dando um retorno à sociedade.
Dentro deste contexto, os exemplos abaixo trazem algumas das dificuldades
enfrentadas pelas universidades nesta gestão das áreas que também irão aparecer nas análises
29
das instituições que compõem esta tese. Trazem também exemplos de que parecem estar
desempenhando de forma satisfatória os objetivos de uma relação profícua
universidades/ambientalização/áreas verdes. Esta multiplicidade de situações contribuiu para
o entendimento de que o constituí as relações das universidades e suas áreas verdes é um
complexo de filamentos, fluxos, atores (humanos e não humanos), instituições, flexibilidades
e inflexibilidades de gestão.
Natural Reserve System (NRS) University of California
A Universidade da Califórnia - Estados Unidos, com seu Sistema de Reservas Naturais
é um exemplo de universidades que possuem áreas naturais de preservação com atividades
educacionais de pesquisas científicas, projetos de educação ambiental e projetos de utilização
pública diferenciada. Possui um total de 39 áreas protegidas que se distribuem pelos seus
nove campi: UC Berkeley, UC Davis, UC Los Angeles, UC Merced, UC Irvine, UC
Riverside, UC San Diego, UC Santa Barbara e UC Santa Cruz (ANEXO I). Com a
pretensiosa missão de entender e gerenciar sabiamente a Terra e seus sistemas naturais, o
NRS propõe isso através do suporte do ensino universitário, pesquisa e serviços públicos nas
áreas protegidas ao longo da Califórnia (UNIVERSITY OF CALIFORNIA, 2006).
Fundado em 1965, o NRS foi criado na intenção de manter preservadas parcelas de
terras adquiridas ou disponibilizadas à universidade por todo o estado da Califórina. Estas
terras deveriam representar os diversos ecossistemas existentes no estado. A intenção era
preservar ambientes naturais das perturbações humanas, por exemplo, crescimento econômico
e populacional, para que fossem mantidos estes espaços para que a geração atual e futura de
estudantes e demais integrantes da comunidade acadêmica pudessem conhecer e desenvolver
pesquisas (UNIVERSITY OF CALIFORNIA, 2006). Por este motivo, as atividades
desenvolvidas em cada um dos espaços devem respeitar suas condições particulares de
conservação, seguindo uma espécie de zoneamento das áreas e suas possibilidades de uso.
Os programas de ensino e extensão são à base da existência das reservas naturais da
universidade, sendo os serviços públicos considerados uma esfera complementar e cada um
destes pilares é conduzido pelos gestores locais com o aval de uma superintendência geral e
um comitê superior. O sistema que gerencia as áreas possui uma série de publicações que
divulgam o que é realizado em cada local. Materiais como jornais eletrônicos, brochuras com
informações específicas de cada reserva e vídeos criados para o público geral podem ser
30
livremente acessados pelo site da NRS, iniciativa que visa atingir o público estudantil, mas
também qualquer interessado.
O acesso ao público é limitado, ficando restrita a participação em alguma atividade
que as reservas oferecem durante o ano, como palestras, eventos especiais e abertura do local
para conhecimento das pesquisas e ensino que são desenvolvidos ali. Desenvolvem também
parcerias de pesquisa, assessoramento e treinamento para variados grupos. Há também
parcerias com outras instituições do ensino, públicas ou privadas, que queiram conhecer as
reservas e/ou desenvolver pesquisas nos espaços. Além dos recursos provenientes da
universidade, as reservas ainda contam com doações individuais ou institucionais de
interessados nas contribuições trazidas pela preservação das áreas. Em contrapartida, a
Universidade da Calífórnia possui uma maneira interessante de se mostrar grata por essas
ações nomeando reservas, programas, centros, prédios ou facilidades com o nome dos
doadores. Além deste tipo de arrecadação, há também a cobrança de algumas taxas de acordo
com o uso das reservas. Normalmente essa cobrança é diferenciada para pessoas da UC e de
outras instituições, e também de acordo com o tipo de atividade (se é necessário o uso de
transporte, veículos específicos, hospedagem por mais de uma noite, alimentação...).
A maioria das reservas possui facilidades de hospedagem, espaços para acampamentos
e alimentação para pesquisas e saídas de campo de longa duração. Geralmente possuem
também laboratórios, bibliotecas, escritórios e computadores conectados em rede com as
outras reservas para uso dos diversos programas de pesquisa. O objetivo é otimizar o trabalho
realizado em campo com a pronta realização de análises. Os resultados obtidos, segundo
cientistas da universidade, podem de forma rápida contribuir com outras pesquisas realizadas
local e globalmente, agregando informações aos estudos de preocupações ambientais.
As reservas naturais recebem estudantes universitários dos mais variados cursos da
universidade, desde a tradicional Biologia passando pelos cursos de Geografia, Geologia,
Arqueologia, até mesmo os cursos de Jornalismo e Antropologia, que vão até as áreas para
desenvolver atividades práticas.
Com relação aos programas desenvolvidos nas reservas cabe destacar o Programa K-7
e K-12, cujo objetivo é oferecer subsídios para escolas do ensino fundamental e ensino médio2
trabalharem temas da educação de ciências ambientais. O programa traz os alunos e
professores para uma das reservas e promovem atividades práticas experenciais de educação
ambiental. As edições do K-12 acontecem através de saídas de campo e até mesmo através de
2 Correspondem aos primary and secundary school nas escolas dos Estados Unidos.
31
programas de férias de verão. Os alunos aprendem sobre Ecologia, Botânica, animais,
qualidade da água, florestas e solo, entre outros temas da história natural. Mas o diferencial do
projeto está nas atividades de escrita ambiental criativa, artes visuais, criação de filmes e
peças teatrais e estudo do legado dos nativos americanos. O projeto também oferece um
treinamento específico nas reservas para os professores poderem trabalhar em sala de aula
sobre esses aspectos, ajudando além do treinameto com materiais didáticos. Destaque também
para os cursos de imersão de escrita criativa e cursos para floristas, que fogem um pouco do
padrão das atividades desenvolvidas nestes espaços e podem envolver um público
diversificado (UNIVERSITY OF CALIFORNIA, 2015).
Em algumas reservas é possível desenvolver programas diferenciados, como o
Programa Desafio de Aventura, que promove intensas atividades de liderança ao ar livre e
alfabetização da língua inglesa para os estudantes do ensino básico. Uma das unidades
mantém um boletim de notícias sobre suas atividades destinadas para os moradores vizinhos
da estação, pesquisadores e demais interessados, aproximando e divulgando seus objetivos e a
comunidade do entorno. Outra atividade é o programa que recebe alunos voluntários de
escolas do ensino médio para serem assistentes dos pesquisadores, plantar mudas nativas e
auxiliar na restauração vegetal da reserva e manutenção do site. Algumas estações recebem
cursos de fotografia e também realizam atividades de pintura de paisagens, estudantes com
necessidades especiais de aprendizagem e físicas também são incluídos através de programas
especiais (UNIVERSITY OF CALIFORNIA, 2015).
Centro de Extensión Universitaria e Divulgación Ambiental de Galicia (CEIDA)
A sede do CEIDA está localizada no Castelo de Santa Cruz, na Ilha de Santa Cruz,
situada na costa de Oleiros cidade de Coruña, Espanha. Sua localização se encontra em uma
das formações costeiras mais singulares da Galícia. O Castelo, contruído em 1594, era parte
do sistema defensivo da cidade de Coruña contra invasões navais e hoje é considerado
patrimônio de interesse cultural. Somando-se ao valor cultural do lugar, a pequena ilha
também possui grande relevância enquanto patrimônio natural por receber diversas espécies
de aves migratórias e pelos seus jardins que abrigam espécies endêmicas e centenárias
(ANEXO II). Ainda nas proximidades da ilha, há duas áreas naturais de elevado interesse
ambiental, o Monumento Natural da Costa de Dexo e a Ría de Burgo.
O uso deste espaço natural pelas universidades se configura através de um consórcio
entre a Universidade de Coruña; Conselho do Meio Ambiente, Território e Infraestrutura da
32
Junta de Galícia e o Conselho de Oleiros. O CEIDA também opera através de uma rede de
cooperação internacional que inclui diversas universidades e instituições.
Segundo seus idealizadores, a ideia da criação deste centro nasceu através dos debates
gerados em encontros internacionais3 sobre a importância de centros regionais de referência
capazes de coordenar e dinamizar atividades de educação ambiental e conservação (CENTRO
DE EXTENSIÓN UNIVERSITARIA E DIVULGACIÓN AMBIENTAL DE GALICIA,
2011). O CEIDA, criado em 1992, é responsável por elaborar e avaliar programas específicos
de educação ambiental e contribuir para formação ambiental da sociedade, com ênfase no seu
trabalho com formadores e mediadores. Administra também documentos e publicações
ambientais que se encontram a disposição de educadores, especialistas e também para o
público em geral. O local ainda funciona como centro de pesquisas, e por ter seu uso e acesso
abertos aos interessados funciona também como um ponto de intercâmbio de experiências.
Entre seus inúmeros objetivos está a intenção de colaborar com instituições
universitárias para a elaboração de linhas de pesquisa, projetos de educação ambiental e
projetos que resultem no benefício da comunidade através de um modo de vida sustentável. A
Universidade de Coruña não retém sobre seu domínio fechado a gestão de um espaço natural
e cultural. A configuração de um espaço compartilhado de educação ambiental entre
universidades e sociedade civil parece se mostrar promissor frente aos objetivos de
sustentabilidade almejados pelas instituições universitárias.
As Reservas Ecológicas da Universidade Federal de São Paulo
A escolha da Universidade de São Paulo (USP) como parte integrante dessa pesquisa
quando da sua qualificação se deu pelo caráter particular de seu envolvimento com áreas de
conservação. A universidade é composta por oito campi distribuídos pelo estado de São
Paulo, sendo eles localizados nas cidades de Piracicaba, São Carlos, Pirassununga, Anhembi,
Ribeirão Preto, Lorena, Itatinga e São Paulo. Sob o argumento de assumir sua
responsabilidade frente às questões ambientais e afirmando que a preservação de ambientes
naturais é fundamental para conservação da biodiversidade e dos serviços naturais, a USP cria
em 2012 uma rede de reservas ecológias que está distribuída em seis dos seus campi - São
Paulo, Pirassununga, Piracicaba, São Carlos, Ribeirão Preto e Lorena. As reservas totalizam
3 Seminário Internacional de Educação Ambiental de Belgrado (1975), Conferência Intergovernamental de
Educação Ambiental de Tiblisi (1977) e Estratégia Mundial para a Conservação da Natureza (1992) (CENTRO
DE EXTENSIÓN UNIVERSITARIA E DIVULGACIÓN AMBIENTAL DE GALICIA, 2011).
33
juntas quase três mil hectares. A denominação de reserva ecológica foi criada com a intenção
de separar a classificação destes espaços das unidades de conservação geridas pelo Sistema
Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), podendo assim a universidade assegurar seu
total domínio e legislação (DELITTI; PIVELLO, 20174). Entretanto, muitas dessas áreas
naturais já se constituíam Áreas de Preservação Permante (APPs) e Reservas Legais (RLs), já
previstas e implamentadas pela legislação ambiental vigente, o que faz com que, em alguns
casos, a proteção seja feita na esfera particular e pública.
O Campus Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo foi o campus visitado no
ano de 2015, quando o projeto desta pesquisa ainda estava sendo estruturado. Localizada em
Piracicaba (SP), essa área da USP possui um total de 3.825,4 hectares, distribuídos entre o
campus central Luís de Queiroz (914,5 hectares) e as estações experimentais em Anhembi,
Anhumas e Itatinga (2.910,9 hectares). Também conhecido como Escola Superior de
Agricultura “Luiz de Queiroz” (ESALQ), esse espaço da USP oferece cursos relacionados à
àrea ambiental, como Ciências Agrárias, Ciências Ambientais, Ciências Biológicas e também
Ciências Sociais aplicadas.
A parte central do campus, segundo relatos de funcionários e estudantes do local, é
vista pelos moradores como um parque de lazer, aonde vão para praticar exercícios como
caminhadas e corridas. Aos finais de semana, o espaço costuma ser preenchido por grupos
que realizam piqueniques e também vão até lá para contemplação. Inclusive foi relatado que
nem todos estes usuários sabem que o espaço se trata de um campus universitário, acreditando
ser unicamente um parque de Piracicaba. Entretanto, a própria Universidade reconhece, além
dos valores científicos, os valores estéticos do local, dando a ele o nome de Parque da Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz.
No Museu e Centro de Ciências, Educação e Artes “Luiz de Queiroz”, também situado
dentro do campus, encontramos uma galeria dedicada a Renato Wagner, pintor nascido em
Piracicaba em 1921, com importante reconhecimento internacional. Esse artista, considerado
um paisagista que preferia pintar ao ar livre, ministrou aulas de desenho para alunos da
ESALQ no ano de 1978. A paisagem do local influenciou a pintura de “Parque da Escola
Agrícola”, uma das obras preferidas do pintor, segundo informações do Museu.
As áreas de preservação existentes dentro dos limites do campus são geridas
atualmente pelo Grupo de Trabalho Uso do Solo, sendo um dos eixos que compõem o Plano
Diretor Socioambiental da ESALQ. Um enfoque maior passou a ser dado ao uso do solo
4 No ano 2015 a pesquisa teve contato com o esboço do livro ainda não publicado. No ano de 2017 é lançada sua
publicação.
34
quando a USP recebeu, em 2002, um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) visando a
recuperação das áreas degradadas, principalmente das Áreas de Preservação Permanente,
ações exigidas pelo Ministério Público Estadual. Dentro desse contexto, a USP também viu a
necessidade de definir as áreas de Reservas Legais para elaborar sua política de uso e gestão.
O TAC assinado pela ESALQ parece ter assumido o papel de responsável pela preocupação
que a universidade passou a ter com seus espaços verdes. Segundo relatos, pressões internas e
externas (governo federal e do estado de São Paulo) obrigaram a universidade a adotar
processos de ambientalização5 dessas áreas que vinham sendo relegadas e ficando em segundo
plano dos investimentos da instituição.
Atualmente o campus tem sofrido com uma intensa proliferação de carrapatos estrela
(Amblyomma cajennense), responsável pela transmissão da bactéria que causa a febre
maculosa6. A febre maculosa, por sua vez, é uma enfermidade grave que se não tratada a
tempo pode levar a óbito. Como o campus está inserido nesta reserva florestal, possui uma
grande diversidade de flora e fauna compondo a paisagem, entre esses elementos não-
humanos está presente em grande quantidade a capivara que, segundo relatos, podem ser
obervadas durante a noite no jardim central do campus. A capivara é parasitada pelo carrapato
estrela, o que é considerado normal dentro das relações ecológicas. Entretanto, neste local a
capivara não possui um predador natural, o que faz com que sua população aumente
consideravelmente em números, consequentemente levando a esta proliferação de carrapatos e
febre maculosa. Alternativas para remediar esse desequilíbrio ecológico estão sendo estudadas
por pesquisadores da ESALQ, sendo uma delas a castração das capivaras, uma vez que a
retirada delas do ambiente em que se encontram não é possível.
O perigo maior de contágio é no interior das reservas florestais, o que levou à
suspensão das atividades que eram desenvolvidas lá com estudantes da ESALQ e também
projetos de educação ambiental com alunos das escolas de Piracicaba. Apesar da aparente
gravidade da situação (relata-se dentro do campus, a morte pela febre maculosa), fora dessas
5 Em seu artigo Sobre processos de “ambientalização” dos conflitos e sobre dilemas de participação, Leite
Lopes (2006) aborda o exemplo da Companhia Siderúrgica Nacional localizada em Volta Redonda (RJ), que nos
anos 80 sofreu pressões populares e governamentias para ser responsabilizada por suas ações poluentes. Apesar
de todo o poder que exercia na cidade, a empresa foi obrigada a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta,
comprometendo-se a se engajar ambientalmente em mudanças no método de suas produções. Leite Lopes
argumenta, através deste e de outros exemplos, que aspectos que antes era “naturalizados” (como a liberação de
poluentes não tratados na atmosfera) passam a ser denunciados como problemas ambientais por diferentes
grupos sociais que se sentem atingidos em determinado contexto e época. O exemplo de Volta Redonda ocorre
em uma época em que as problemáticas ambientais começam a se instituir como argumentos legítimos para
reinvindições de novos comportamentos.
6 Esta problemática parece estar presente em todo o Estado de São Paulo e parece acontecer também em outros
campi da USP.
35
suspensões, as atividades no campus central seguem normais. Materiais informativos sobre o
carrapato e o ciclo, transmissão e sintomas da febre maculosa foram elaborados e distribuídos
para divulgação do problema, inclusive através da elaboração de um livro (MEIRA et al,
2013). Há também placas informativas nas entradas das matas e áreas onde as capivaras
costumam frequentar alertando sobre os carrapatos.
Nesses espaços das reservas florestais ocorriam atividades como realização de trilhas e
aulas práticas, o que necessitou ser revisto por questões de segurança e responsabilidade da
universidade. Um desses projetos chama-se “Florestas do Futuro”, criado pelo Grupo
Florestal Monte Olimpo ESALQ/USP e destinado a crianças em situação de vulnerabilidade
social de Piracicaba. As atividades ministradas por alunos da graduação da ESALQ tinham o
intuito de “oferecer aos estudantes experiências que contribuam para a prática humana e
proporcionem o bem estar e a educação de outras pessoas” (GRUPO FLORESTAL MONTE
OLIMPO, 2015). As atividades incluiam a trilha ecológica, que adentrava o espaço das
reservas, e a trilha no pomar, área com espécies frutíferas, que pela proximidade entre elas e a
existência dos carrapatos, tiveram que ser suspensas.
Outro projeto que se utilizava dos espaços das reservas florestais é o Projeto Ponte, um
programa de extensão universitária da ESALQ que realiza intervenções educacionais de
caráter interdisciplinar, vivencial, experimental e crítico em Escolas Públicas de Piracicaba
SP. Busca proporcionar a troca de experiências e conhecimentos entre a Universidade e as
Escolas Públicas, fortalecendo e aprimorando a interação entre ambos. Desde 2008, ano em
que deu início às suas atividades, o programa já trabalhou com cerca de 20 escolas estaduais,
realizando mais de 200 intervenções junto aos estudantes e elaborou quatro publicações de
cadernos pedagógicos. Atualmente o projeto continua ativo, mas impossibilitado de usar as
reservas (PROJETO PONTE, 2015).
University of Saskatchewan
A Universidade de Saskatchewan, no Canadá, possui três áreas verdes pertencentes ao
College of Agriculture and Bioresources, chamadas Kernen Prairie, Biddulph Natural Area e
Matador Grassland. Todas essas áreas são distantes da localidade da universidade e durante
meu estágio doutoral, realizado de maio à agosto de 2017, pude visitar duas delas, Kernen
Prairie e Matador Grassland, junto com o professor responsável e seus alunos de doutorado.
Essas três áreas são utilizadas por pesquisadores e alunos do Colégio de Agricultura que
36
realizam pesquisas basicamente sobre espécies de gramíneas que ocorrem nas respectivas
regiões.
Kernen Prairie é uma área remanescente de pradaria com 130 hectares, localizada a
cerca de um quilômetro de Saskatoon. Essa área, além das pesquisas sobre agricultura,
também vem sendo utilizada por uma disciplina do curso de Gestão de Terras Indígenas, cuja
a prática é coordenada por um professor do Colégio de Educação da universidade. Esta área
foi doada especificamente para o Colégio de Agricultura da Universidade de Saskatchewan
por Fred W. Kernen Jr. com a condição de que este espaço “... seja preservado em seu estado
nativo... para pesquisas ecológicas sobre plantas e animais nativos” (COLLEGE OF
AGRICULTURE AND BIORESOURCES, 2017)7. Apesar desta premissa estipulada pelo
doador da área, durante minha ida ao local veio à tona os possíveis interesses da instituição
universitária em vender o terreno. Segundo o professor responsável pela gestão da área, a
universidade não dá nenhum apoio financeiro e os recursos que são empregados no local
provém de verbas para as pesquisas que ele e sua equipe realizam. A especulação e o avanço
imobiliário no entorno também são preocupações para a manutenção dessa área, inclusive por
afetarem diretamente os experimentos que são realizados lá, como por exemplo, alteração do
solo e da direção do vento com a construção de casas e edifícios. Por outro lado, o local não
sofre com problemas de descarte irregular de resíduos, nem invasões.
A área de Matador Grassland está localizada cerca de 35 quilômetros de Saskatoon e
é considerada a maior área natural não cultivada que ainda resta dos solos de argila lacustre
nas Grandes Planícies do Norte. É uma área de relevante interesse do Colégio de Agrilcultura
para suas pesquisas sobre pastagens e também para seus programas de ensino. Ambas as áreas
verdes visitadas, Kernen Prairie e Matador Grassland, são locais onde não ocorrem
visitações e uso público e não possuem nenhum tipo de infraestrutura. A utilização desses
espaços se dá basicamente para a realização de pesquisas e aulas do Colégio de Agricultura e
Biorecursos.
A Universidade de Saskatchewan também possui um campus chamado Kenderdine
Campus, também localizado longe do campus central. Desde 2012 esse local está com suas
atividades suspensas por motivos de orçamento e manutenção. Era um local de preservação
ambiental usado por artistas, estudantes de biologia e demais interessados. Não foi possível
visitá-lo pelo motivo de seu fechamento e questões de segurança, uma vez que a estrutura
física não tem recebido manutenção. Entretanto, a pesquisa pode entrevistar pessoas
7 “…be preserved in its native state... for ecological research on native plants and animals.” Tradução minha.
37
relacionadas ao local que relataram a conexão que era feita entre estudantes de artes e de
ciências e como isso enriquecia a formação dos alunos. Existem movimentos organizados por
alunos e ex-alunos na tentativa de reabrir a área, mas isso é ainda algo distante do orçamento
universitário ainda que a instituição afirme manter o interesse pelo local.
Visitas ao Meewasin Valley Authority e suas áreas preservadas também foram
realizadas durante o período do PDSE. O Meewasin é uma instituição criada originalmente
pelos moradores e ambientalistas de Saskatoon, preocupados com a preservação de suas áreas
verdes. Atualmente sua gestão é feita pela Prefeitura da Cidade, pela Província de
Saskatchewan e a Universidade de Saskatchewan. Além de programas de conservação
ambiental, também promovem atividades educativas com escolas e a própria universidade. As
áreas preservadas são usadas pelos alunos da universidade para aulas práticas e vivências,
algumas dessas atividades são conduzidas pelos professores universitários e também pelos
técnicos do Meewasin Valley. Existe uma relação profunda desta instituição e a população de
Saskatoon, não só por ter sido uma iniciativa dos moradores, mas também pelo fato que estas
áreas preservadas circundam o rio que atravessa a cidade, o South Saskatchewan River. A
cidade possui uma vida ativa em torno desse rio e acaba desenvolvendo parcerias com o
Meewasin Valley Authority em projetos e festivais. Com relação ao envolvimento efetivo da
universidade, esta relação se dá de uma forma informal, estabelecida entre professores,
técnicos e alunos.
O Prairie Habitat Garden é uma pequena área verde coordenada pela Professora Janet
McVittie, localizada dentro da Universidade de Saskatchewan, em uma área adjacente ao
Colégio de Educação. O local é mantido pela professora e por doações de mudas nativas e
terra por parceiros e não recebe recursos da universidade. O objetivo da área é ser um jardim
didático de plantas nativas da região de Saskatchewan que possa servir a vários tipos de uso:
de local de prática para estudantes de Biologia para identificação de plantas até um lugar onde
são feitas obras de arte (APÊNDICE II).
Apesar de seu tamanho diminuto, o lugar foi palco de inúmeras atividades
educacionais que a pesquisa pode acompanhar. Entre essas atividades, destaque para
Workshop Land Art (Oficina Arte Terrestre), conduzido por alunos de graduação em Artes
para estudantes do ensino fundamental. A oficina tinha o objetivo de auxiliar os alunos a
relacionar elementos presentes na arte com elementos da natureza e permitir que eles criassem
suas próprias obras de arte. Workshop Nature Poetry (Oficina Poesia da Natureza), oficina de
poesia para crianças das séries iniciais usando palavras que se referem a elementos presentes
na natureza. Tipi Building (Construção de Tendas), construção de tenda indígena para ser
38
colocada permanentemente no Prairie Habitat Garden. Atividade conduzida por um ancião
indígena e crianças da educação infantil. Um evento repleto de rituais e simbologias, que com
a construção da tenda estão inseridas de forma efetiva na universidade. The Celestial Circle
(O Círculo ou Roda Celestial), construção deste elemento presente na cultura indígena no
jardim didático. Atividade conduzida por uma estudante de mestrado que usa esse elemento
como seu campo de pesquisa. A atividade envolveu uma anciã indígena e público interessado.
Exploring shapes and solids through the gift of Cree (Explorando formas e sólidos através do
dom dos Cree), oficina conduzida por um estudante de pós-graduação em Matemática, que
relacionava o ensino da matemática através da linguagem indígena Cree. Construção de
figuras geométricas em 3D com alunos do ensino funamental para usá-las na brincadeira com
bolhas de sabão no jardim. Learning in nearby nature (Aprendendo na natureza próxima),
oficina com crianças pequenas para explorar a natureza e aprender a sentí-la.
O Prairie Habiat Garden consegue ser um jardim didático dentro da universidade que
contempla com suas atividades alunos da graduação e pós-graduação de diferentes cursos,
alunos da rede básica de ensino, a relação entre o saber indígena e o saber acadêmico, a
aproximação com a arte e a poesia e a valorização da flora nativa.
***
As experiências trazidas neste capítulo permitiram criar o desenho desta pesquisa,
identificando as múltiplas possibilidades de usos de áreas verdes pelas universidades.
Exemplos de pesquisas ambientais, educação ao ar livre, educação ambiental, fotografia,
artes, entre outras atividades, mostraram que existe potencial educativo nestes lugares, que
eles podem contribuir na formação dos estudantes universitários, nos projetos de
ambientalização e gestão ambiental das universidades, além de fomentar uma relação profícua
com a comunidade externa à estas instituições. Permitiu também identificar dificuldades que
a relação entre as áreas verdes e essas instituições podem apresentar. Foram mostrados
exemplos da interferência não humana no uso dessas áreas, como no caso do carrapato estrela;
dificuldades orçamentárias na definição destes lugares como prioridades de investimento,
como no exemplo do campus Kenderdine; e também dificuldades na gestão.
As áreas verdes apresentadas aqui são diversas, de variados tamanhos, localização e
usos. O que elas possuem em comum é que são de responsabilidade de instituições
universitárias e essa diversidade auxiliou a identificar áreas verdes como essas no Rio Grande
do Sul. Como será visto na descrição do campo, as experiências encontradas pela pesquisa
39
também são múltiplas, tanto no diferente perfil dos lugares, quanto nos usos que são feitos
deles e condições atuais. Além desssas questões, perfil e uso, o trabalho também permitiu
identificar e dar voz aos interlocutores da pesquisa e seus envolvimentos com as áreas verdes
do estado.
40
3 AS NOÇÕES DE NATUREZA E A GRANDE DIVISÃO
A fundamentação da tese está dividida em duas grandes áreas que procuraram dialogar
entre si: a filosofia das ideias de natureza e a ambientalização das universidades. Objetivamos
estabelecer conexões entre elas no decorrer dos tópicos dos capítulos. Nesta primeira parte
será trabalhada a natureza no campo filosófico das ideias, criando disposições e sentidos que
se engajarão posteriormente na segunda parte da fundamentação que se referirá às questões
políticas da ambientalização das universidades.
Este capítulo compreenderá os tópicos que servirão de aporte histórico e filosófico
para auxiliar na compreensão de pensamentos e concepções que ocorreram em algumas
sociedades ocidentais e refletem diretamente sobre nossas orientações de como nos
relacionamos com a natureza. A Grande Divisão é o tópico que abre esta reflexão, trazendo
para o debate os efeitos da consolidação da ciência moderna, com seus acertos e falhas que se
refletem de forma intensa nas práticas universitárias atuais. No tópico seguinte, A Natureza
Intocável, discutiremos a concepção de uma natureza intocável que apesar dos seus ideais de
preservação e conservação acabou por apartar ainda mais o humano da natureza, reforçando
uma dicotomia gerada pela grande divisão Natureza/Cultura. Esse modelo de isolamento dos
espaços naturais para a preservação parece estar inculcado nas práticas das universidades que
são detentoras das áreas naturais/verdes.
No terceiro tópico, A Natureza na Educação e a Educação na Natureza é feito um
breve histórico de práticas educacionais relacionadas intimamente aos espaços naturais, na
tentativa de demonstrar diferentes possibilidades de uso e o potencial dessas práticas.
3.1 A Grande Divisão
A ideia de criarem-se áreas naturais preservadas sofreu a influência da concepção de
isolamento destes espaços para proteção. Este isolamento também permitiu ver como a
externalidade do ser humano como parte integrante da natureza influenciou em nossa
concepção de mundo moderno e passou a constituir um bom exemplo da segregação ser
humano/natureza. Por certo a percepção de natureza e nosso comportamento frente a isso já
41
tiveram suas variações ao longo dos séculos. Neste capítulo nos interessa refletir sobre como a
relação ser humano e natureza de uma história ocidental recente se deu e influenciou a
constituição e consolidação da ideia de ciência que está presente de forma dominante dentro
das instituições acadêmicas.
Esta separação entre as esferas humana/natural, ser humano/natureza, civilizado/
selvagem a qual a tese se refere, teve seu início com o avanço da ciência moderna após o fim
da Idade Média e foi sendo intensificada no século XVII. A intensa racionalização lógica do
pensamento moderno enxergava na natureza uma série de leis a serem desvendadas por ela
que poderiam explicar todos os fenômenos de ordem natural. Demarcando essa relação ser
humano/natureza, já se firmava a condição de superioridade humana frente às demais
espécies. Com grande influência do Cristianismo, os questionamentos sobre a existência
humana e sua finalidade na Terra, levaram ao pensamento de que o homem seria o único ente
com capacidade para acessar o conhecimento e às leis que regem a natureza, sendo permitida
a ele sua governança. Os seres humanos teriam sido criados para cuidar da natureza,
tornando-os exteriores e superiores a tudo que era não-humano. As palavras de Descola sobre
o posicionamente da época expressam essa superioridade que encontra reflexos nos dias
atuais (2012, p. 115),
Como o homem também foi criado, toma sua significação desse acontecimento
fundacional. Portanto, não tem seu lugar na natureza como um elemento entre
outros, não é “por natureza” como as plantas e os animais, e tem transcendido o
mundo físico; sua essência e seu devir competem diante da graça, que está mais
além da natureza.
O pensamento dessa época de uma sociedade moderna ocidental era que tudo presente
na natureza era para usufruto do humano, o destinatário de Deus, e ele poderia dominar os
seres inferiores, demais animais e plantas, para seu uso. Nada na natureza era considerado
sem um propósito divino, para usufruto ou punição do humano, que poderia se beneficiar de
tudo, mas também era o responsável possuidor da razão e humildade.
A natureza, que antes era tida como expressão de Deus e seus fenômenos considerados
intervenção divina de aprovação ou reprovação, passou a ser explicável com o avanço da
ciência moderna. Ao ter seus fenômenos explicados pela ciência, o domínio dessa natureza
passa a ser necessário para o enfraquecimento de crenças religiosas da criação, punição e
intervenção divina. Agora esses fenômenos podem ser previstos e explicados de maneira
42
lógica atrás das descobertas das leis da natureza, projeto que se tornará base da ciência
moderna ocidental8.
Segundo Descola (2012, p. 108),
A dimensão técnica da objetificação do real é, desde logo, essencial nessa revolução
mecanicista do século XVII, que representa o mundo a imagem de uma máquina
cujas engranagens podem ser desmontadas pelos cientistas e não como uma
totalidade composta por humanos e não-humanos e dotada de uma significação
intrínsica pela criação divina.
A objetificação da subjetividade presente no mundo dito natural poderia dar conta de
enquadrá-lo dentro de uma metodologia cartesiana. Segundo Descola (2012), essa
objetificação do subjetivo criou uma distância entre o ser humano e o mundo, uma vez que
coloca em suas mãos a sistematização e organizaçãodo deste universo exterior a ele. Nesse
contexto, não mais os fenômenos naturais eram explicados como expressões divinas, mas
poderiam ser explicados pela ciência. Mais adiante, com o advento da invenção de novas
tecnologias, como o microscópio, o telescópio e a cartografia, a maneira de estar no mundo e
como ele é percebido foi se modificando, com o sentido da visão tomando bastante destaque
em detrimento das outras faculdades sensíveis. Nesta mesma época se desenvolvem saberes
técnicos que permitem reproduzir experiências em laboratórios e a constante dissociação e
recomposição dos fenômenos que produzem os objetos da ciência. Aqui a razão aparece para
organizar a vida humana dentro da desordem da subjetividade, fator que favoreceu o
desenvolvimeto das ciências exatas, como a Física, a Matemática e a Biologia, responsáveis
por importantes avanços na área médica e tecnológica através dos séculos seguintes
(CARVALHO, 2009).
Assim a concepção de natureza enquantro um constructo oposto à cultura efetivamente
começa a se enraizar, tendo seu ápice no século XVIII. Nessa separação, cada mundo, o da
Natureza e o da Cultura, passa a contar com um modo particular de ser pesquisado e
compreendido pela ciência. Para Descola (2012), essa nova relação do homem com o mundo
surge, não do acúmulo de conhecimento, descobertas e aperfeiçoamento de técnicas, mas sim
8 Importa para a pesquisa ressaltar aqui a existência de pensamentos ocidentais que não se tornaram
mecanicistas. Reconhecemos as críticas feitas à Descola quando enquadra todos os pensamentos ocidentais em
um mesmo caminho. Todavia, reforçamos que o interesse da pesquisa em expor essa breve reflexão da história
recente da dicotomia ser humano/natureza tem a intenção de vislumbrar de forma mais objetiva o pensamento
ocidental mecanicista que influenciou esta separação e como isso veio a refletir na maneira de como é produzido
conhecimento dentro das universidades que sofreram esta influência. Dentro deste contexto, as contribuições de
Descola (2012) são bastante propícias.
43
de seu posicionamento frente a natureza. A natureza se torna mecânica, organizada e
sistematizada por padrões e regida por leis que podem ser descobertas e controladas.
Perante essa divisão Natureza/Cultura, separam-se os temas de cada área para serem
estudados. No Ocidente Moderno do século XIX, as questões referentes ao mundo da
natureza, possuidora de leis a serem descobertas, são estudadas de forma separada das
questões filosóficas referentes ao homem. Com o surgimento da Antropologia, está criada
uma área própria para pesquisas referentes ao homem e suas relações com o meio
(DESCOLA, 2012). E é nas ciências naturais que a Antropologia vai se espelhar para
construir um modelo de legitimação epistemológica quando vai buscar rigorosidade
metodológica para descobrir padrões universais nesta multiplicidade de relações.
Esse Monismo Naturalista que prega a procura por uma única realidade padrão que
pode ser conduzida para a descoberta de suas regras, e o Relativismo Cultural com suas
universalidades e particularidades, seguem num continuum epistemológico para a busca de
explicações entre as relações entre as sociedades e seus meios (DESCOLA, 2012). Sejam
essas relações de caráter biológico (genes, instintos, redes neurais, influência geográfica) ou
culturais (signos, símbolos e representações), passam a ser estudadas separadamente uma da
outra como se não mais houvesse relação entre elas. Estabelece-se assim, o que Descola
(2012) chamará de A Grande Divisão: ciências da natureza x ciências do espírito. É inegável
afirmar que esse dualismo permitiu um enorme desenvolvimento das ciências por encontrar
na natureza regras próprias, mas também é inegável que esta divisão resultou em
consequências contraditórias e insuficientes, cujo resgate de elementos preteridos vem sendo
discutidos na atualidade.
Ao falar de elementos preteridos, refiro-me aqui à questões como a retomada da
estética como argumento legítimo dentro das ciências humanas; o reconhecimento da
percepção para além do cognitivo e também as experiências do ser no/do mundo; a ampliação
da simetria entre humanos e não-humanos; legitimação e validação das múltiplas
racionalidades e sua equiparação à racionalidade científica ocidental; entre outras questões
que inspiraram a tese de doutoramento.
Busca-se agora o enfrentamento destas questões para que se possa construir e/ou
resgatar diferentes percepções ser-humano/natureza. Segundo Descola (2012, p. 134),
O dualismo não é um mal em si, e pecaríamos de ingenuidade se o estigmatizá-lo
por razões puramente morais, a maneira das filosofias ecocêntricas do meio
ambiente, ou o façamos responsável de todos os males da época moderna, desde a
expansão colonial até a destruição dos recursos não renováveis, passando pela
reificação das identidades sexuais ou as distinções de classe.
44
A objetificação necessária para os objetos de estudo da ciência moderna acabou
escanteando outras formas de racionalidade que poderiam contribuir para o conhecimento
daquilo que ela não é capaz de explicar. É a questão da subjetividade inerente à existência
humana e não-humana neste cosmos. As relações que o homem tece com seu ambiente
percorrem caminhos de racionalidade e irracionalidade que se complementam e passam a
configurar seu comportamento em relação a ele.
O rechaço ao dualismo não deve conduzir nem a um relativismo absoluto, nem a uma
busca por um retorno aos antigos modos de pensamento obsoletos, mas sim permitir uma
reflexão sobre os diferentes costumes presentes no mundo (DESCOLA, 2012). O mundo se
apresenta, desde sempre, em uma profusão contínua e enxergá-lo separado em pedaços já se
mostra ultrapassado para enfrentarmos os dilemas atuais da cultura e do ambiente. Essa
distinção gerada pelo naturalismo do Ocidente Moderno colocou a natureza como
representação exterior a ele, consequentemente tornando-a incomunicável com a Cultura.
Para Latour (1994), se o ideal do projeto da Modernidade era apartar a ciência da
política e a natureza da sociedade, ele nunca teria realmente sido vitorioso. Esse pensamento
nunca teria se concretizado, pois esses elementos sempre estiveram atrelados uns nos outros,
não sendo coisas purificadas ou passíveis de purificação, como queria essa grande divisão.
Seria a divisão dos humanos entre eles e das coisas em si, como se eles pudessem formar
dinâmicas sociais puras e dinâmicas naturais puras.
O autor critica os cientistas modernos por tentarem desmembrar os processos de
articulação entre elementos sociais/técnicos e elementos da natureza, na tentativa de purificar
as áreas das ciências, reforçando a separação em três conjuntos distintos: fato, poder e
discurso. Para ele, esses processos de articulação caracterizariam o que ele vai chamar de
redes sociotécnicas, que por sua vez não podem ser reduzidas a um caráter objetivo, ou social,
nem efeito de discurso. São ao mesmo tempo reais, coletivas e discursivas e estão presentes
em todas as esferas que nos rodeiam. O exemplo abaixo trazido por Latour é capaz de
esclarecer o conceito agregador das redes sociotécnicas (LATOUR, 1994, p. 12):
O buraco de ozônio é por demais social e por demais narrado para ser realmente
natural; as estratégias das firmas e dos chefes de Estado, demasiado cheias de
reações químicas para serem reduzidas ao poder e ao interesse; o discurso de
ecosfera, por demais real e social para ser reduzidos a efeitos de sentido. Será nossa
culpa se as redes são ao mesmo tempo reais como a natureza, narradas como o
discurso, coletivas como a sociedade?
45
Latour (2001) vai falar sobre a ciência dos híbridos para tentar quebrar o
bipartidarismo da ciência moderna. A natureza das coisas e o contexto social estão sempre
interligados entre si, sem, contudo, reduzir-se nem a uma coisa nem a outra. A citação acima
esclarece como os fenômenos naturais (buraco na camada de ozônio, enchentes,
desmoronamentos, seca, mudanças climáticas, etc.) são demasiadamente sociais e políticos
para serem encarados através de uma só fonte.
Ao promover o renascimento do ser humano pela sua capacidade de usar a razão, a
modernidade promoveu também o nascimento assimétrico dos elementos não humanos, como
das coisas e objetos, e o escanteamento de um Deus que ficará suprimido frente à
racionalidade científica. Com sua postura ácida frente aos objetivos almejados pela ciência
moderna, de colocar o humano como livre para controlar uma natureza limitada, capaz de
isolar e categorizar cada não humano existente e assim ser detentor de uma verdade única,
Latour (1994, p. 40) vai afirmar:
O obscurantismo das idades passadas, que misturavam indevidamente necessidades
socias e realidade natural, foi substituído por uma aurora luminosa que separava
claramente os encadeamentos naturais e a fantasia dos homens. As ciências naturais
definiam a natureza e cada disciplina foi vivenciada como uma revolução total
através da qual ela se separava enfim do Antigo Regime. Ninguém é moderno se não
sentiu a beleza desta aurora e não vibrou com as suas promessas.
Ao lidar com os problemas e situações atuais da sociedade, a modernidade e seu
projeto se veem no desafio de desvelar ou resgatar meios capazes de suprir os anseios e
angústias do presente, expressos por uma crise ambiental, política e social. Uma vez que a
aurora prometida pela ciência moderna alcançou muitas vitórias e conquistas, sua postura
purificadora não foi atingida por todos, bem como o cumprimento integral de suas promessas.
Existem elementos que ultrapassam sua metodologia. Faz-se necessário a reinvenção ou o
resgate de uma ciência híbrida que veja os humanos e não humanos com uma amplitude um
pouco mais simétrica. De acordo com Latour (2001, p. 30): “Vivemos num mundo híbrido,
feito ao mesmo tempo de deuses, pessoas, estrelas, elétrons, usinas nucleares e mercados;
cabe a nós transformá-lo em ‘desordem’ ou em ‘todo orgânico’, num cosmos como reza o
texto grego”.
Frente a esta singela descrição do que Descola chamou de A Grande Divisão,
especialmente concentrada no modelo de ciência moderna ocidental e cartesiana, e das críticas
de Latour ao projeto da modernidade, se faz necessário argumentar que esta relação de
segregação do ser humano da natureza e as consequências geradas por isso influenciaram nas
46
formas em como se pesquisa, se ensina, se aprende e como nos relacionamos com a natureza.
Existe um forte reflexo disto na constituição das instituições universitárias e sua burocracia
instituída, bem como no modelo de ciência que domina dentro destes espaços.
3.2 A Natureza intocável
Paralelo a este paradigma dominante que se consolidava, a ideia de dominação dos
espaços naturais passou a imperar nos séculos XVII, XVIII, e início do século XIX, como
ideal de civilização. A natureza não dominada pelo humano era selvagem, contrária ao ideário
de Cultura (CARVALHO, 2009). Aqueles locais em que o humano havia interferido e que
costuma frequentar diariamente passaram a ser considerados locais culturais, e nestes espaços
estavam as construções, edificações e jardins cujas plantas estavam devidamente domadas e
organizadas. Enquanto os locais pouco frequentados pelo humano e que não haviam passado
por sua intervenção eram classificados como naturais. Formam-se aqui duas concepções de
meio ambiente que serão muito expressivas no Ocidente, inclusive com sistemas de valores
mutualmente excludentes: o doméstico e o selvagem (DESCOLA, 2012).
A percepção desses dois sistemas de valores foi recebendo diferentes pesos ao longo
dos séculos, reforçando a concepção de uma natureza cuja valoração é dependente da época e
do local onde é percebida. Segundo Descola (2012), essas distinções geradas pelo naturalisno
forçado do Ocidente Moderno não são algo universal e não se dão de forma linear e muito
menos contínua, inúmeras populações, antigas e atuais, não possuem diferenciação entre
humanos e não humanos e para elas estes teriam as mesmas qualidades cognitivas, morais e
sociais análogas ao ser humano.
Apenas com a intenção de exemplificar brevemente o que Carvalho (2009) denominou
as várias naturezas da natureza, é importante destacar que o mundo natural teve diferentes
significações para o ser humano ao longo do tempo. No início do período de civilização da
sociedade ocidental, a natureza era vista como fonte inesgotável de recursos que serviriam
para expansão dos impérios e suprimento para guerras e a cada novo território conquistado,
novos recursos naturais eram adquiridos. Ao mesmo tempo, para os povos originários dessas
terras descobertas, a natureza também fornecia os suprimentos necessários para sua
subsistência, mas a separação natureza/cultura, doméstico/selvagem, não acontecia tal como
veio a configurar-se na modernidade. A natureza para os ameríndios, habitantes originais das
américas por exemplo, não era um espaço selvagem, mas sim um espaço familiar habitado por
47
gerações. Posteriormente (séculos XVI e XVII) preocupações com a manutenção destes
recursos surgiram, mas ainda não era levado em conta o valor intrínseco da natureza.
Após a Revolução Industrial do século XVIII, com o ar insalubre que começava a
imperar nos grandes centros industrializados, especialmente na Inglaterra, e outras mudanças
estruturais que passaram a ocorrer nas sociedades, como o aumento populacional, a natureza
passa a ser vista como ideal de perfeição estética e moral (THOMAS, 2010). Importante
ressaltar que essa valorização da natureza não aconteceu de forma homogênia, assim como o
próprio ideário romântico da segunda metade do século XVIII. Segundo Pádua (2005, p. 62),
O mundo natural foi louvado por alguns românticos no seu aspecto rural-agrícola,
seja com base no viver simples das comunidades de camponeses e artesãos, seja na
ligação entre a família patriarcal e a terra estabelecida através da grande propriedade
aristocrástica. Repetiu-se aqui a tendência pós-renascentista de reduzir a imagem da
‘natureza’ à paisagem dos jardins e dos campos arados. Em outros momentos,
através de um importante esforço de inovação intelectual, o romantismo consagrou a
imagem da natureza no seu aspecto selvagem, através da visão de sociedades tribais
ou viajantes vivendo em harmonia com amplas e sublimes paisagens de florestas,
savanas, cordilheiras ou desertos.
Com o Romantismo do século XIX, surge uma nova leitura sobre o selvagem
encabeçada por pensadores da época como Henry David Thoreau e John Muir. O surgimento
do conceito de wilderness9 demonstra, na época, a vontade de valorizar os espaços naturais
como locais de grande valor estético e contemplativo. A frequentação das montanhas e lagos
norte-americanos trariam uma existência mais livre e autêntica frente a um mundo em pleno
desenvolvimento industrial.
Alguns intelectuais da época insistiam na vontade de viver o mais próximo possível
desta natureza idílica. No ano de 1845, Thoreau decide largar sua vida na cidade Concord
Massachusetts (EUA) para viver dois anos à beira do Lago Walden em uma cabana construída
por ele próprio. Sua intenção era comprovar que a natureza poderia prover tudo o que ele
precisaria para viver e a partir dessa experiência ele escreve sua obra homônima ao lago,
Walden (1854). As palavras de Thoreau sobre suas intenções em abdicar do conforto da vida
em uma cidade (THOREAU, 2012, p. 96):
Fui para a mata porque queria viver deliberadamente, enfrentar apenas os fatos
essenciais da vida e ver se não poderia aprender o que ela tinha a ensinar, em vez de,
vindo a morrer, descobrir que não tinha vivido. Não queria viver o que não era vida,
tão caro é viver; tampouco queria praticar a resignação, a menos que fosse
absolutamente necessário. Queria viver profundamente e sugar a vida até a medula,
9 Expressão que remete a mundo selvagem e natural, que para muitos autores reforça essa ideia de uma
representação imaginária de dois mundos opostos, o urbano/cultural e o natural/selvagem (THOMAS, 2010;
CARVALHO, 2009; DIEGUES, 1994).
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viver com tanto vigor e de forma tão espartana que eliminasse tudo o que não fosse
vida, recorta-lhe um largo talho e passar-lhe rente um alfanje, acuá-la num canto e
reduzí-la a seus termos mais simples e, se ela se revelasse mesquinha, ora, aí então
eu pegaria sua total e genuína mesquinharia e divulgaria ao mundo essa
mesquinharia; ou se fosse sublime, iria saber por experiência própria, e poderia
apresentar um relato fiel em minha própria excursão.
Essa foi uma postura que retratava bem o pensamento romântico de precursores do
movimento preservacionista da época, uma retomada ao selvagem, ao natural, contrária a uma
corrida desenvolvimentista que já se instaurava. Mesmo não acontecendo de forma
generalizada, havia uma inversão do papel dos centros urbanos como locais propícios para se
viver que foram substituídos pelos espaços naturais para momentos de lazer e contemplação.
Era o selvagem retomando seu espaço primitivo frente ao doméstico ou cultural, aparecendo
como um ideal de nobreza e moral por ser o local do bom e do belo, que seriam simples e
puros. Nas palavras de Thoreau (2012, p. 44),
Enquanto a civilização andou melhorando nossas casas, ela não melhorou por igual
os homens que vão ocupá-las. Criou palácios, mas não foi tão fácil criar nobres e
reis. Se as metas do homem civilizado não valem mais do que as metas do selvagem,
se ele dedica a maior parte de sua vida a obter apenas as principais necessidades e
comodidades, por que haveria de ter uma moradia melhor do que o selvagem?
É neste século XIX que são criadas as primeiras Unidades de Conservação norte
americanas com o intuito de preservar da colonização do oeste americano grandes locais com
reconhecida beleza estética, como Yellowstone e Yosemite. Criações que serviriam de
modelo para o resto mundo em ternos de preservação ambiental10. Esses parques foram
criados, primeiramente, na tentativa de manter preservados espaços naturais de relevante valor
estético, e posteriormente com a criação do termo que se refere à grande diversidade
genética de fauna e flora - com grande riqueza de biodiversidade.
Frente à um mundo em constante desenvolvimento urbano e industrial, estas áreas
preservadas seriam mantidas para serem espaços onde o homem poderia se reconectar com a
natureza. Assim afirma Diegues (1994, p. 11),
[...] a única forma de proteger a natureza era afastá-la do homem, através de ilhas
onde este pudesse admirá-la e reverenciá-la. Estes lugares paradisíacos serviriam
também como locais selvagens, onde o homem pudesse refazer suas energias gastas
na vida estressante das cidades e do trabalho monótono. Parece realizar-se a
reprodução do mito do paraíso selvagem, lugar desejado e procurado pelo homem
desde sua expulsão do Éden.
10 A importação desse modelo por países com grande diversidade cultural trouxe uma série de implicações
negativas, como por exemplo, a expulsão de povos ditos tradicionais que habitavam estes espaços para que eles
ficassem sem nehum tipo de intervenção humana.
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Cria-se um mito moderno da natureza intocada que reforça a separação entre o mundo
cultural e o mundo natural (DIEGUES, 1994). Nesta relação já é possível identificar um
pensamento mítico e simbólico em relação a uma natureza sagrada. A concepção do local
selvagem e desabitado, segundo Diegues (1994), pode ter tido sua origem no mito do paraíso
terrestre, concepção cristã do final da Idade Média de paraíso de onde o homem havia sido
expulso após o pecado original.
Muito se passou desde o final do Século XIX onde se firmou essa ideia de que para a
natureza ser protegida ela deveria ser separada dos seres humanos, permitindo o contato para
momentos de lazer e pesquisas científicas. O Brasil adotou esse modelo já no século XX e por
ser um território possuidor de uma ampla diversidade de ecossistemas propícios para
preservação - tanto por interesses estéticos, como por interesses da proteção da biodiversidade
- e por ter uma grande variedade de habitantes tradicionais11, este cenário até hoje é palco de
disputas. O fato de estes espaços serem habitados por povos locais que muitas vezes vivem há
gerações em harmonia com a natureza e em um determinado são obrigados a deixar suas
terras porque elas necessitam serem preservadas reforçaria uma ideia de que ela é para uso de
alguns e não de todos12.
As condições dessas áreas no Brasil são muito diferentes das áreas norte americanas,
onde se iniciou o modelo atual de áreas de preservação/conservação. Algumas dessas áreas
não são desabitadas, mas sim ocupadas por povos tradicionais, como tribos indígenas,
ribeirinhos, caiçaras, seringueiros e camponeses. Possuidores de grande conhecimento de
fauna e flora locais, esses povos saberiam o melhor manejo dessas terras uma vez que
dependeriam delas para sobreviver. A legislação brasileira, assim como a norte americana,
prevê a retirada destas pessoas do interior das áreas, ocasionando problemas de caráter ético,
social, econômico, político, ambiental e cultural (DIEGUES, 1994).
A primeira iniciativa para a criação de uma área protegida no Brasil ocorreu em 1876,
como sugestão do Engenheiro André Rebouças de se criar dois parques nacionais: um em
11 O termo populações tradicionais tem sido bastante questionado sobre seu significado e delimitações. Em
virtude disso, para não entrar no mérito deste atual debate, tradicionais se referirá neste trabalho a povos
originários que vivem ou viviam há gerações em equilíbrio com a natureza nos espaços destinados a preservação
e/ou conservação.
12 Populações tradicionais, tribais ou nativas são preteridas em relação aos moradores urbanos que, estes sim
podem frequentar o local para entretenimento. Segundo Diegues (1994), alguns dos conflitos gerados se referem
ao fato das disputas entre as áreas para preservação e áreas para agricultura, e o reassentamento mal planejado
das pessoas. Muitas vezes esses grupos são realocados nos arredores dessas áreas ocasionando seu sobreuso e
quando permitem a permanência no local, as exigências e restrições são tantas que forçam a migração para
centros urbanos sem um plano de trabalho. Há perda de conhecimentos étnicos de manejo e da própria
diversidade cultural. Também por falta de fiscalização, muitas vezes essas áreas são invadidas por empresas
madeireiras e de mineração.
50
Sete Quedas e outro na Ilha do Bananal (MORSELLO, 2001). No entanto, data de 1937 a
criação do primeiro parque nacional brasileiro: o Parque Nacional de Itatiaia que tinha o
objetivo de incentivar a pesquisa científica e oferecer lazer às populações urbanas (DIEGUES,
1994). Atualmente o Brasil possui considerável extensão territorial de Unidades de
Conservação, atendendo aos seus diversos biomas, Floresta Amazônica, Caatinga, Cerrado,
Mata Atlântica, Pampa, Pantanal e mais recentemente Zona Costeira. Inclusive com
legislação exclusiva, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC)13, já conseguiu
muitos avanços em seus objetivos de preservação, mas ainda apresenta dificuldades para
conciliar as atividade humanas que existem ao redor e dentro das unidades, como por exemplo
moradia e subsistência, interesses econômicos e os próprios projetos de educação ambiental e
pesquisa científica.
De acordo com o SNUC, atualmente existem dois grupos de Unidades de
Conservação. As Unidades de Proteção Integral, que apresentam como objetivo básico a
preservação da natureza, sendo admitido apenas o uso indireto (não envolve consumo, coleta,
dano ou destruição) dos seus recursos naturais, são subdivididas em Estação Ecológica,
Reserva Biológica, Parque Nacional (ou Estadual, ou Municipal), ou Natural e Refúgio de
Vida Silvestre. As Unidades de Uso Sustentável que, por sua vez, apresentam como objetivo
básico compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus
recursos naturais, são subdivididas em Área de Protação Ambiental, Área de Relevante
Interesse Ecológico, Floresta Nacional (ou Estadual, ou Municipal), Reserva Extrativista,
Reserva de Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do
Patrimônio Sustentável14.
Essa valorização dos espaços naturais encontra bastante força nos dias de hoje nas
sociedades preocupadas em reinventar suas relações com o mundo. Um mundo que segue em
constante desenvolvimento científico e tecnológico, mas que reconhece a importância de um
comprometimento ambiental. É possível identificar um pensamento técnico-científico para a
conservação da biodiversidade misturando-se a um pensamento mítico dos que frequentam
uma natureza sagrada.
Em fevereiro de 2015, ano em que se comemorou seu 125º aniversário, foi realizada
uma visita ao Parque Nacional de Yosemite, Califórnia (EUA), onde foi possível coletar
13 O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) foi instituído em 18 de julho de 2000,
através da Lei Federal nº 9.985, sendo responsável por ordenar as áreas protegidas em nível federal. Para gestão
de unidades estaduais e municipais existe o Sistema Estadual de Unidades de Conservação (SEUC). Ambas as
legislações possuem caráter bastante similar (BRASIL, 2000).
14 Para maior detalhamento consultar o site do Ministério do Meio Ambiente: http://www.mma.gov.br/areas-
protegidas/sistema-nacional-de-ucs-snuc .
51
informações atuais de seu funcionamento, bem como conhecer os projetos educacionais
desenvolvidos lá. Por toda a relevância histórica desse parque, sua visita trouxe à pesquisa
importantes contribuições.
Uma dessas contribuições já pode ser percebida logo na entrada do parque. A
quantidade de carros no estacionamento em um dia de domingo expõe o que ja foi dito aqui: a
concepção dos parques como redutos preservados para quem gostaria de fugir do mundo
urbanizado e estressante. E esse acesso é facilitado por seu amplo estacionamento, hotéis,
locais para acampar, restaurantes e lancherias. Elementos humanos e não humanos formam a
paisagem do lugar e se cruzam o tempo inteiro. Frequentado durante todo o ano por turistas,
mas também por moradores locais, a área natural já sofreu uma série de intervenções
humanas para facilitar e tornar mais segura e agradável sua frequentação. Exemplo disso são
os percurssos das trilhas principais, que são asfaltados e os pontos do ônibus próprio do
parque que permite transitar de forma rápida entre pontos extremos. Parece até mesmo irônico
que apesar de toda essa invasão antropocêntrica, o parque peça aos visitantes para não
pisarem nas plantas para dar a elas uma chance de viver e não alimentem os animais para os
manter capazes de procurar seus alimentos na natureza selvagem. Ainda assim, parece se
manter a divisão cultura/natureza: o ser humano deve caminhar, refletir e descansar na parte
asfaltada, e a natureza deve crescer e se manter na parte preservada.
Entretanto, para aqueles humanos que quiserem ter experiências mais próximas do
sentido de wilderness, o parque também oferece diferentes níveis de escalada, caminhadas
fora das trilhas, trilhas a cavalo, acampamento e outras atividades permitidas no local. Para
sua manutenção o parque conta com a cobrança de taxas pelo tipo de visita e estadia e
também com doações de entusiastas do local. Para aproximar os visitantes dos seus objetivos
de conservação, o parque usa da política de que aqueles que o frequentam são seus guardiões
(Yosemite Guardians) e devem ajudar a zelar pela sua manutenção comunicando às
autoridades do parque qualquer ato não permitido que venha a prejudicar o parque, como por
exemplo, pessoas que alimentam e também tentam se aproximar dos animais selvagens, que
coletam plantas, borboletas, répteis, itens arqueológicos, que acampam fora dos espaços
reservados para isso, que andam de bicicletas fora das trilhas, ou adentram no parque em
carros não autorizados (YOSEMITE NATIONAL PARK, 2015).
Diversos programas educacionais são oferecidos pelo parque, entre eles o Parks In
Focus que é um programa destinado à jovens estudantes que usa da prática de fotografar
como ferramenta educacional para conectar os participantes à natureza. Também realiza
acampamentos de verão para o desenvolvimento de lideranças estudantis, programa destinado
52
tanto à alunos do rede básico de ensino, como para universitários. O programa Junior Ranger
também se destaca por formar centenas de estudantes como guarda-parques mirins depois de
aprender sobre conservação da natureza, ecologia e cuidados com o parque.
Destaque para o programa educacional Parks As Classrooms, destinado a jovens ou
grupos escolares da educação infantil até o ensino médio que visitam o parque com o intuito
de aprender sobre mudanças climáticas, gestão do parque, bacias hidrográficas, vida
selvagem, cultura indígena, entre outras atividades. Segundo publicação do parque, esse tipo
de programa permite ao estudante ter a experiência de aprender na prática (hands-on)
diretamento no espaço natural. Para aqueles grupos escolares que não podem visitar
Yosemite, pela distância ou outro tipo de impossibilidade, o parque desenvolveu a estratégia
de usar o skype dentro das salas de aula para tornar mais próximas suas pesquisas sobre os
parques nacionais e o contato com eles. Algumas universidades, como a Universidade de
Stanford e a Universidade da Califórnia (especificamente sua unidade em Merced15) também
estabelecem parcerias com o parque e usam do espaço para programas destinados aos
universitários.
Segundo Worster (2008), John Muir - o entusiasta da proteção da natureza selvagem e
um dos criadores do Parque de Yosemite - foi filho de uma revolução que buscava, no final
do século XVIII e início do século XIX, discutir os direitos humanos, liberdade individual e
equidade e justiça social, além da redescoberta da natureza, a apreciação do selvagem e a
visão de uma sociedade verde. Este tipo de postura assumida por ele e muitos outros
admiradores da natureza selvagem nos ajuda a compreender o surgimento do ambientalismo
moderno, baseado no respeito à alteridade da natureza e o entendimento da interdependência
material e emocional dos seres humanos e ela.
Frente ao breve histórico apresentado aqui se pretendeu contextualizar o cenário das
relações estabelecidas entre os seres humanos e o ambiente, sendo a intenção da pesquisa
contribuir para o entendimento atual desse relacionamento. Relacionamento que será
focalizado no uso de espaços verdes, construídos ou não, como os citados acima, de valor
estético e biológico, pelas universidades.
Pádua ressalta a existência de uma correspondência entre a herança romântica deixada
por alguns dos elementos que aqui timidamente foram retomados com o ecologismo
contemporâneo, que possuem em comum a “valorização do mundo natural, seja em termos
15 No capítulo sobre Primeiras Incursões foi retratado o exemplo da Universidade da Califórnia e seu Sistema de
Reservas Naturais, no caso do campus Merced uma das suas reservas é uma estação de estudos que está
localizada dentro do Parque Nacional de Yosemite.
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estéticos, espirituais ou éticos” (PÁDUA, 2005, p. 62). Representada pelas práticas
ecológicas, essa valorização tem na estética da ecologia certo grau de universalidade que
permite que ela esteja presente nas mais diversas esferas da sociedade, em maior ou menor
intensidade.
Certamente podemos relacionar, guardando-se as diferenças de escala e contexto
histórico, a sequência dos acontecimentos citados acima e suas consequências críticas a um
conjunto de dispositivos que passaram a não mais atender as necessidades estéticas, éticas e
até mesmo espirituais das sociedades em questão, com os acontecimentos contemporâneos
que transmitem o mesmo sentimento de insatisfação com os modelos de desenvolvimento
científico e tecnológico predominantes atualmente. Para Pádua, “o desconforto diante da
crescente arrogância da tecnosfera industrial, em seu projeto de domínio sobre as forças
naturais, aproxima o atual ecologismo da tradição romântica” (2005, p. 63). Da mesma
maneira que podemos vivenciar na atualidade críticas ao modelo de desenvolvimento
econômico vigente, produção de alimentos transgênicos, inseguranças da engenharia genética,
os grandes empreendimentos que não respeitem a natureza16, entre outros comportamentos
que estão se mostrando insustentáveis, já se podia enxergar esse tipo de censura aos ideais de
progresso e da modernidade na cultura romântica.
3.3 Educação na natureza e a natureza na educação
A natureza romântica de Rousseau
Por certo a utilização de espaços naturais como prática pedagógica não é recente. O
naturalismo rousseauniano apresentava a natureza como consciente e sábia, sendo ela a
própria essência viva do mundo. O naturalismo, enquanto corrente de pensamento, surge na
consolidação da época moderna e veio para se opor a duas correntes predominantes, mas
16 Em 05 de novembro de 2015, a barragem de rejeitos de minério de ferro da grande e lucrativa companhia de
mineração Samarco se rompe, ocasionando o que poderia ser chamado de o maior desastre ambiental causado
pelo homem no Brasil. Evento que ocasionou a morte e desaparecimento de moradores que não foram avisados
da enxurrada de lama que descia em diração à suas casas. Evento que ocasionou a contaminação de todo o solo
por onde a lama formada pelos rejeitos de minério de ferro passou e a contaminação do Rio Doce, matando
grande parte da biodiversidade existente ali. A falta de fiscalização dos órgãos responsáveis para o controle de
segurança das atividades da Samarco e a irresponsabilidade da empresa pela degradação ambiental não podem
ser mensurados, assim como não pode ser previsto um tempo para a recuperação dos estragos, tanto culturais
como ambientais (JARDIM, 2015.). Este acontecimento trouxe a tona, mais uma vez, o debate sobre um limite
necessário para o equilíbrio entre os empreendimentos e a condição salutar do meio ambiente.
54
divergentes entre si. O sobrenaturalismo17 vinha ancorado na tradição ocidental cristã que
colocava na natureza o peso das ações errôneas do comportamento humano e tirava dela seus
valores intrínsecos, sendo apenas um território de passagem e provação para que a “salvação”
humana fosse perseguida e atingida antes que ele pudesse chegar ao “reino dos céus” -
condição superior à da natureza. Os valores que caucavam o humanismo, a corrente oposta,
passaram a constituir o ideal humano de forma muito diferente. Aqui a figura do homem e
suas particularidades passaram a ser supervalorizadas, contrapondo-o à natureza e todos os
elementos que a formam. A existência humana vista como superior aos elementos naturais
passa a exaltar as produções vindas de áreas como literatura, ciência e arte, fomentando a
segregação natureza/cultura. A cultura aparece de forma mais valorizada pela capacidade do
ser humano de interferir e transformar a natureza para seu domínio.
Na contracorrente dos pensamentos acima expostos de forma breve, o naturalismo
surge como uma corrente que busca a afirmação dos valores humanos existenciais, indo de
encontro ao que pregava a tradição cristã sobrenaturalista. No enfrentamento com o
humanismo, o naturalismo bucou tirar o ser humano da sua posição central no Universo e
passou valorizar também os valores vitais não produzidos unicamente pelo homem. Dentro de
um aporte epistemológico, o naturalismo é separado em duas cosmovisões, o naturalismo
científico e o naturalismo romântico. O naturalismo científico consolidou o paradigma
científico que via a natureza como uma única realidade expressa através de leis e princípios
que deveraim ser desvendados/explicados pelo homem. A ciência passa a substituir as áreas
de artes, filosofia e religião, sendo a única capaz de atingir à verdade. O naturalismo
romântico, e aqui retornamos ao pensamento de Rousseau, não negava a existência de um ser
sobrenatural divino, mas transferia essa essência para a natureza. Essa corrente vai questionar
os métodos do paradigma científico, mas não necessariamente seu ideial pela busca da razão
enquanto verdade. Sua crítica mais contundente, e que custou caro a Rousseau, faz referência
à tudo que diz respeito à cultura humana, sendo esses elementos vistos como artificiais.
17 Cabanas (2002) conceitua sobrenatural enquanto uma das duas realidades dentro do transnatural (metafísico),
sendo oposta à realidade racional. O sobrenatural está relacionado com seres conscientes e operantes (espirituais)
de uma natureza superior à mundana, como seria o caso, por exemplo da Divindade. Enquanto corrente de
pensamento, o mesmo autor dirá “o sobrenaturalismo alude a toda tradição cristã, que tinha imprimido uma
cosmovisão generalizada em todo o mundo ocidental, pela qual se tirava valor à natureza, que aparecia como
‘decadente e corrompida’; além disso, o bem, a ‘salvação’ e o ideal do Homem colocavam-se numa ordem
superior à da natureza, a qual, por conseguinte, aparecia como sendo acidental e transitória para o Homem, para
não dizer também um perigo e um obstáculo a vencer e a superar” (CABANAS, 2002, p. 67).
55
O pensador18 que formulou esta corrente de pensamento bradava a bandeira de retorno
a natureza que era vista por ele como a expresão mais perfeita da realidade. Contrastando com
a dureza do naturalismo científico, que via a natureza apenas como uma realidade dinâmica
impulsionada por forças mecânicas e imparciais, o romantismo de Rousseau prega outro tipo
de naturalismo, como nos diz Cabanas (2002, p. 68):
O naturalismo romântico rousseauniano considera que a natureza contém tudo: a
matéria, a vida, a sociedade e a consciência; a energia que possui é de ordem vital, e
o seu dinamismo é finalista, como o é tudo o que é espiritual. Com isto deixa de ser
estranho ouvir Rousseau dizer que a natureza é boa e que faz tudo bem. Em
consequência disso, confiava plenamente na ação de tudo o que é natural, ao mesmo
tempo desconfiava de todas as iniciativas e criações dos homens.
As correntes do naturalismo científico e do naturalismo romântico possuem em
comum a valorização da natureza. Entretanto, o que as distingue são suas diferentes
cosmovisões. Enquanto o naturalismo científico assume o caráter positivista de desvendar as
leis presentes na natureza para sua organização e domínio, para o naturalismo romântico a
natureza já configura um ideal de perfeição que não necessitaria de intervenções humanas.
Na esfera pedagógica19, a teoria de Rousseau traz grandes mudanças, contribuições e
polêmicas, tendo ainda seus reflexos influenciado o movimento da Escola Nova que é vigente
em alguns modelos escolares até hoje o sucesso ou a ineficiência da aplicação dos objetivos
dessa teoria não serão discutidos aqui, não apenas por atingir as esferas da rede básica de
educação, que não são o alvo da pesquisa, mas pelo assunto merecer um amplo espaço de
discussão.
Na oposição entre o natural e o artificial (que seria o produto de ações humanas),
Rousseau (1973) defende que a natureza do desenvolvimento da criança possui esquemas
capazes de gerir sua formação e a intervenção educativa seria desnecessária e até mesmo
poderia desvirtuar esta formação. Assume o protagonismo da natureza em detrimento do
protagonismo do professor. Abordando resumidamente a perspectiva proposta por esta teoria,
ela pregava a aprendizagem de habilidades práticas ao invés da instrução intelectual
unicamente, o ativismo da criança e a experiência direta (na qual Rousseau vai dizer que a
natureza enquanto espaço físico para esta aprendizagem é o ideal).
18 Destaque para a obra Emílio, de Rousseau, escrita em 1762, onde ele aborda aspectos filosóficos e políticos da
relação do humano e a sociedade, incluindo elementos para uma educação ideal baseada no potencial da natureza
em manter o indivíduo um bom selvagem.
19 As teorias pedagógicas são inúmeras, vindo de diferentes correntes e influenciando diversos pensamentos
dentro do campo de Educação. Nos ateremos a tratar do naturalismo pedagógico romântico sob o viés de
Rousseau para expor sua relação emblemática com a natureza.
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Esta valorização da natureza resultou em duras crítcas ao pensamento rousseauniamo
do bom selvagem. A primeira delas, pode-se dizer, foi sobre como o pensador concebia o
conceito de natureza. Se natureza é tudo o que é dado espontaneamente, então também
devemos considerar naturais as situações relacionais entre as pessoas e que também existam
desigualdades entre os seres humanos. Além disso, alguns autores vão dizer que a valorização
que Rousseau faz da natureza é por demais exagerada/idealizada, pois se tomarmos a natureza
nela mesma (como algo espontâneo), ela é indiferente aos pressupostos do ser humano e isso
acarretaria na não possibilidade de gerar nele um ser ideal. A natureza teria um valor
intrínseco e as ocorrências dos fenômenos independeria da existência humana. Rousseau
também é condenado por suas duras críticas à cultura, sempre vendo ela como um retrocesso20
(CABANAS, 2002).
Salvas as criticas e contribuições deixadas para e por Rousseau, respectivamente, ele
nunca deixou de ver na natureza um lugar onde poderia refletir e dividir as agruras de um
filósofo incompreendido. Nunca deixou de ver nela um potencial preterido pelos avanços da
modernidade e ao final de sua vida fez dela um lugar de acolhida. Ele sempre pregou o ideal
da caminhada enquanto jornada de autoreflexões e busca individual pelo conhecimento,
prática metodológica recorrente em sua teoria, e fez algumas nos seus últimos anos de vida
que renderam reflexões para seu último livro, publicado postumamente em 1782, “Os
devaneios do caminhante solitário”. Nessas caminhadas ele confessa seus desafetos, mas
segue defendendo seus ideais de uma natureza idealizada: “essas horas de solidão e de
meditação são as únicas do dia em que sou eu mesmo por inteiro e pertenço a mim sem
distração, sem obstáculo, e em que posso dizer que sou o que a natureza quis.” (ROUSSEAU,
2014, p. 16).
Rousseau seguia defendendo seus argumentos, afirmava ter sido incompreendido por
seus contemporâneos e usava dos atributos encontrados nas florestas e bosques, onde fazia
suas caminhadas, para procurar sensações de bem-estar. Segundo ele (2014, p. 89):
As árvores, os arbustos e as plantas são o adereço e a vestimenta da terra. Não existe
nada mais triste que o aspecto de um campo nu e vazio que oferece aos olhos apenas
pedras, limo e areia. Revivificada pela natureza e coberta com seu vestido de
núpcias em meio ao curso das águas e ao canto dos pássaros, a terra oferece ao
20 Essa postura do pensador poderia ser vista dentro de um contexto histórico de uma época (século XVIII) em
que a sociedade européia está em pleno desenvolvimento de uma Revolução Industrial. As fábricas aumentam
em número e multiplicam suas produções, gerando novos problemas como poluição, e aumento populacional de
trabalhadores vindo para os centros urbanos. O ar das cidades passa a ficar insalubre. A natureza que antes
deveria ser domada e cultivada, agora passa a ter seu perfil selvagem idealizado, pois seria algo anterior a estes
problemas.
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homem, com a harmonia dos três reinos, um espetáculo cheio de vida, de interesse e
de encanto, o único espetáculo no mundo que nunca cansa seus olhos e seu coração.
Quanto mais o contemplador tiver a alma sensível, mais se entregará aos êxtases que
essa harmonia lhe provoca. Um devaneio doce e profundo se apodera de seus
sentidos, e ele se perde com deliciosa embriaguez na imensidão desse belo sistema
com o qual se sente identificado. Todos os objetos particulares lhe escapam; ele
nada vê e nada sente senão no todo. É preciso que alguma circunstância específica
restrinja suas ideias e circunscreva sua imaginação para que possa ver em partes esse
universo que se esforçava por abarcar.
Muitas das críticas também giravam em torno da oposição natureza-cultura, sendo a
cultura vista como a superação de um estado selvagem vinculado à natureza e esse processo
deveria ser conduzido através da educação, assim afirmavam os crítidos de Rousseau, que
acreditava justamente no contrário. Pouco se pode sustentar sobre a asserção de Rousseau que
todo ser humano nasce bom e é corrompido pela sociedade. Uma vez que a sociedade é
formada pelos seres humanos, se o homem nasce sendo bom, a sociedade assim deveria
continuar (CABANAS, 2002).
Fora as críticas sobre sua teoria de uma pedagogia que para muitos dava às crianças
demasiada liberdade, Rousseau poderia nos dias atuais encontrar vestígios de seus
pensamentos sobre o uso dos espaços naturais, ao ar livre, como promissores para o ensino,
tanto formal e/ou não-formal, como também as caminhadas como metodologia de abertura
para o processo de aprendizagem. Teorias atuais enxergam o movimento corporal como
componente essencial no alinhamento da mente e do corpo no processo de aprender. Uma
abordagem inicial será vista no tópico 2.5 Caminhar e aprender com os autores Ingold e
Masschelein.
A disciplina do Escotismo na natureza
O Escotismo, fundado pelo inglês Baden-Powell em 1907, é um bom exemplo de ideal
de moral vinculado à natureza. Diferentemente de Rousseau, Baden-Powell acreditava que as
crianças e os jovens necessitavam de uma orientação firme. Com o intuito a ajudar na
formação integral não-formal de jovens que viviam em uma Inglaterra passando por uma crise
econômica e social no início do Séc. XX, Baden-Powell deu início a um movimento que em
pouco tempo recrutou centenas de crianças e jovens, e atualmente abrange milhões de adeptos
ao redor do mundo.
Ao retornar a viver na Inglaterra, após seus serviços militares fora do país, Baden-
Powell que nutria um grande amor pela natureza e a aventura - escreve um manual
destinado aos jovens sobre como viver bem praticando atividades em meio a natureza.
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Paralelo a isso, na tentativa de testar a aceitação de suas ideias, o inglês realiza um
acampamento de oito dias na Ilha de Brownsea para 20 jovens que lá aprenderam a construir
abrigos, técnicas de vida ao ar livre, cantaram, jogaram, praticaram habilidades desportivas,
trocaram experiências e aprenderam como ajudar a comunidade, formando assim o primeiro
acampamento escoteiro. Em 1908 é publicado o livro emblemático de Baden-Powell,
Escotismo para Rapazes21, e a partir daí o Movimento Escoteiro passa a ganhar o mundo.
Presente ainda de forma consistente nos dias atuais do movimento, os ideais do
escotismo pregam uma série de regras a serem seguidas e uma promessa ao movimento22 que
envolvem compromissos éticos de respeito ao próximo, a Deus, aos animais e as plantas e
também de honestidade e confiança. Segundo conceito do Movimento Escoteiro
(ESCOTEIROS DO BRASIL, 2015), o propósito do escotismo é:
Contribuir para que os jovens assumam seu próprio desenvolvimento, especialmente
do caráter, ajudando-os a realizar suas plenas potencialidades físicas, intelectuais,
sociais, afetivas e espirituais, como cidadãos responsáveis, participantes e úteis em
suas comunidades, conforme definido pelo seu projeto educativo.
As atividades desenvolvidas pelos praticantes do Movimento Escoteiro são baseadas
na ideia do aprender fazendo e na prática de acampamentos em áreas naturais. O pensamento
de Baden-Powell sobre a natureza era que ela poderia auxiliar na construção do caráter e das
habilidades dos jovens. Em seu livro Guia do Chefe Escoteiro (BADEN-POWELL, 1982, p.
53) ele diz:
Uma vez que o interesse pelo contato com a natureza tenha penetrado e germinado
na mente de um jovem, sua observação, memória e capacidade dedutiva se
desenvolverão automaticamente e passarão a constituir parte integrante do seu
caráter. E isso persistirá nele eternamente, seja qual for o seu destino.
21 BADEN-POWELL, Robert Stephenson Smith. Escotismo para Rapazes. Edição da fraternidade mundial.
Porto Alegre: Ed Escoteira, 1975.
22 Segundo o texto original de Baden-Powell, a promessa escoteira diz: Por minha honra, prometo que farei o
melhor possível para cumprir o meu dever para com Deus e com o Rei, para ajudar o próximo em todas as
ocasiões, para obedecer a Lei do Escoteiro. Além da promessa, existe também a Lei do Escotismo, escrita em
10 artigos que devem ser incorporados/decorados na vida do escoterio: a honra para o escoteiro é ser digno de
confiança; o escoteiro é leal ao rei, à sua pátria, aos seus escotistas, aos seus pais, aos seus empregadores e aos
seus subordinados; o dever para o escoteiro é ser útil e ajudar o próximo; o escoteiro é amigo de todos e irmão
dos demais escoteiros, não importando a que país, classe ou credo o outro possa pertencer; o escoteiro é cortês;
o escoteiro é amigo dos animais; o escoteiro obedece sem vacilar as ordens de seus pais, do seu monitor (líder
da patrulha dos escoteiros) ou do seu chefe escoteiro; o escoteiro sorri e assobia sob todas as dificuldades; o
escoteiro é econômico; o escoteiro é limpo no pensamento, na palavra e na ação (BADEN-POWELL, 1975). É
importante destacar o contexto histórico em que o pensamento dos ideais do escotismo foi forjado. As
referências a Deus e a Pátria na figura do Rei correspondem ao arcabouço moral dos cidadãos da Inglaterra no
final do século XIX e inicío do século XX. Segundo Oliveira (2011, p. 29), Baden-Powell, nasceu e cresceu
durante a era Vitoriana, um período no qual as tradições, os costumes, a moral, a nação, a família eram exaltadas.
Desta forma, é perfeitamente compreensível que o movimento escoteiro, esta tradição inventada por um cidadão
vitoriano, traga em seu interior, aspectos de tal época.
59
Esse compromisso com o bom comportamento, boas ações, companheirismo e
habilidades manuais configura o ideal moral pregado pelo movimento. Há nos escritos de
Baden-Powell uma certa concepção de recrutamento/adestramento dos jovens para que
desenvolvam o melhor de si e com isso possam cumprir seus deveres para com sua Pátria. Há
também uma obrigação para com seus deveres espirituais e para com um deus (no contexto da
época, o Deus da Igreja Católica) que é expressão do bom e do belo. Para constituir a
formação do bom cidadão, os temas trabalhados são divididos em quatro partes fundandes que
não devem ser injetadas unicamente através aulas, conselhos e lições, mas devem
desabrochar de dentro para fora: caráter, saúde e vigor, habilidade manual e destreza e
serviço ao próximo. No aporte da relação da natureza, espiritualidade e a formação do ser
humano cabe destacar o que o fundador do escotismo idealizava (BADEN-POWELL, 1982,
p. 29):
1) CARÁTER que nós ensinamos por intermédio e através: do Sistema de
Patrulhas, da Lei escoteira, dos conhecimentos técnicos escoteiros, das artes
manuais, da habilidade e prática da vida de campo, da responsabilidade do monitor,
dos jogos coletivos ou de equipe e mais, por toda essa gama de recursos abarcados e
proporcionados pelos trabalhos de campo. Isto, naturalmente inclui: - a concepção
da obra de Deus Todo-Poderoso, através de Sua criação, e apreciação do belo, na
natureza, através do amor as plantas e aos animais, com os quais nos familiarizamos,
pela comunhão na vida ao ar livre. 2) SAÚDE e VIGOR Por meio de jogos,
exercícios físicos e conhecimento e aplicação da higiene pessoal e da alimentação.
3) HABILIDADE MANUAL e DESTREZA Eventualmente adquirida, em
trabalhos de sede, mas normal e especialmente nos acampamentos, praticando
pioneirismo, construindo pontes, tomando iniciativas, realizando expedientes e
exprimindo com habilidade e arte, aquilo que foi idealizado; em síntese auto-
expressão. Todos esses elementos concorrem para produzir adultos capazes de
enfrentar qualquer empreendimento. 4) SERVIÇO AO PRÓXIMO Pela prática, na
vida diária da religião, pelas “boas ações”, realizando tanto as pequeninas boas
ações como o serviço à comunidade; socorros a acidentados, salvamentos, etc.
Ainda presente nos dias atuais, e com bastante expressão segundo o Relatório Anual
de 2014 existem mais de 40 milhões de escoteiros no mundo e mais de 77 mil no Brasil
(ESCOTEIROS DO BRASIL, 2014) o escotismo vem atuando com ações voltadas aos
cuidados com o meio ambiente, como a realização de plantios e mutirões de recolhimento de
resíduos descartados em locais impróprios. Existe uma relação bastante forte com as áreas de
conservação, onde muitas vezes o grupo escoteiro utiliza esses espaços para suas práticas. Em
Porto Alegre temos o exemplo do Grupo Escoteiro Nimuendajú, localizado na zona sul da
cidade, que utiliza o Parque Natural Morro do Osso (primeiro morro de Porto Alegre
declarado como unidade de conservação) para suas práticas de trilha e acampamento.
60
Inclusive esse grupo escoteiro teve participação na elaboração do Plano de Manejo do parque
que ajudou a consolidar sua proteção.
Estudos sobre a educação ao ar livre
Vejamos o exemplo da educação ao ar livre23. O termo, sendo aqui abordado de forma
bastante ampla, não se refere unicamente às práticas educativas realizadas ao ar livre, como
por exemplo, o uso de pátios escolares, parques, saídas de campo resumidamente sair de
dentro da sala de aula para aprender as matérias curriculares. Abrange também e para
algumas tradições é o objetivo real - estudos fora das portas, fora dos padrões tradicionais dos
currículos escolares. Isso por que não estuda só a escola/universidade e seus conteúdos
formativos, mas envolve a questão experiencial através de jornadas e aventuras que
contribuem para o desenvolvimento de habilidades, autoavaliação e autoreflexão.
Os relatos e conceitos que serão apresentados nesta parte textual sobre outdoor
education foram coletados a partir de pesquisa bibliográfica sobre o tema e depoimento
através de entrevista e palestra de Ananda Casanova, mestranda do Programa Transcultural
European Outdoor Studies (TEOS). Este programa tem de inovador formar pós-graduados em
educação outdoor e também realizar esta formação em três países diferentes, Noruega,
Alemanha e Inglaterra, o que confere um caráter de mobilidade enriquecedora na formação
numa espécie de educação itinerante24. A constituição deste programa vem a contribuir com
esta pesquisa no momento em que trabalha com a educação e estudos ao ar livre através de
experiências vividas em espaços naturais e visa uma formação integral baseada na
aprendizagem através da experiência e corporeidade.
A origem dos estudos outdoor desde este mestrado europeu é apresentada como tendo
vindo de um princípio medieval alemão sobre a mobilidade acadêmica. O princípio era
baseado em leis que protegiam os aprendizes no ir e vir em busca do conhecimento. A
vontade e a curiosidade eram os elementos que moviam os estudantes na procura pelo
conhecimento, e essa espécie de peregrinação tinha respaldo que os protegia e abrigava na
busca pelos seus mestres.
23 Existem variações na origem e aplicabilidade de termos como outdoor education, outdoor studies,
environmental outdoor education. Muitas vezes variando de acordo com a tradição e local onde são aplicados
estes conceitos. Para fins da presente pesquisa, usaremos outdoor education para nos referirmos de maneira geral
a atividades em espaços naturais.
24 As universidades que integram este programa são University of Cumbria - Inglaterra, Norges Idrettshogskole -
Noruega e Philipps Universität Marburg Alemanha.
61
A tradição da outdoor education teria origem alemã, mas essas atividades foram
apropriadas de forma tão intensa pela Inglaterra que tentar fazer uma genealogia se torna uma
tarefa bastante árdua. Além da Alemanha e Inglaterra, a Noruega também possui uma tradição
bastante forte desses estudos, e as variações da relação com a natureza refletem a cultura de
cada país. A relação paisagem/cultura de cada lugar leva a diferentes práticas ao ar livre.
Podemos citar as caminhadas na Inglaterra, a prática de sky25 na Noruega e de canoagem na
Alemanha. A Noruega possui uma relação diferenciada entre a propriedade privada e os
espaços naturais. Lá eles pregam que a natureza não tem um dono e inclusive possui uma
legislação que permite às pessoas que acampem e façam pequenas colheitas em terras alheias,
segundo Casanova (2015):
Existem certas restrições, mas não tem ninguém policiando, é outra relação de
confiança. Pode acampar por uma noite e colher alimentos. Se quiser ficar mais de
duas noites tem que pedir autorização para o dono, mas isso é tranquilo. Tu podes
tomar banho nas águas, tu podes velejar nas águas, pode fazer tudo que é outdoor.
Desde que respeite a propriedade e a privacidade dos outros.
Na Inglaterra é comum a prática de expedições educativas, inclusive para fora do país
para que os estudantes conheçam diferentes culturas, mas realizam também expedições do
tipo residencial e se dedicam intensamente a fazer pesquisa em/para um único lugar. Essa
prática de educação baseada no lugar - ou place-based education, e aprendizagem situada
serão melhores discutidas no decorrer do capítulo. O envolvimento com este tipo de atividade
é tão representativo nestes países que, somente na Alemanha existem dois conceitos para
expressar diferentes tipos de experiência: erlebnis e erfahrung. O primeiro referente à
experiência imediata da aventura vivida numa relação corpo e paisagem, e o segundo
referente à ideia de experiência refletiva, como um movimento que a aprendizagem exige.
Com sua raiz no Romantismo, e com forte influência do escotismo, os estudos ao ar
livre possuem na sua origem certa negação do ambiente urbano, pregando que essas
experiências só poderiam ser vivenciadas em uma natureza intocável. A imersão na natureza
como fuga do contexto urbano que estaria causando o mal estar civilizacional, é uma
percepção originada no século XVIII, mas que caberia perfeitamente como uma percepção
atual.
Algumas observações devem ser feitas ao contexto espacial em que essas práticas são
realizadas. Podemos incluir aqui o Canadá e os Estados Unidos que também possuem tradição
25 A tradicional prática de esquiagem na Noruega despertou preocupações ambientais relacionadas ao fenômeno
do aquecimento global. Com o aquecimento, a espessura da neve já vem diminuindo e a perda dela significaria,
de certa forma, também a perda da identidade nacional.
62
em atividades outdoor. Sem dúvida são países com um contexto social e cultural bastante
específico, diferentes de outras realidades como a do Brasil e até mesmo em outros países
dentro da Europa. Por possuirem um ambiente favorável para a realização de práticas outdoor,
com níveis elevados de segurança pública e também um ótimo sistema educacional, a
percepção dos riscos é diferenciada. Nos países citados preocupa-se mais com a segurança
física nas atividades de aventura, alimentação e temperatura26. É um tipo de risco que é
manejado e as próprias crianças desenvolvem habilidades para prevê-los. Enquanto nesses
países pode imperar uma visão idílica e romântica da natureza, esta relação no Brasil passa
por enfrentamentos bem mais realistas sobre a segurança nos espaços públicos e os riscos que
isso envolve.
Ademais, uma crítica sobre o pensamento dualista sobre o ambiente natural e o
ambiente construído também poderia ser feita, uma fez que os estudos outdoor repassam a
ideia de que é preciso sair do ambiente urbano para poder viver uma verdadeira experiência
enriquecedora em uma natureza intocável. Guardadas as ressalvas, os estudos outdoor têm
muito a contribuir em projetos de educação ambiental e até mesmo na busca por uma
formação mais completa, com a aquisição de conhecimentos técnicos, mas também com o
desenvolvimento de habilidades que poderão auxiliar na criação de posturas ambientalmente
engajadas.
Educação baseada no lugar
Segundo o conceito de Sobel (2004), place-based education (PBE)27 é o processo de
usar comunidades locais e o ambiente como ponto de partida para ensinar conceitos em arte,
matemática, estudos sociais, ciências e outras disciplinas do currículo básico. O autor afirma
que enfatizando o aprender-fazendo (hands-on, prática), experiências de aprendizagem no
mundo real dentro da educação aumentam o desempenho acadêmico, ajudam os estudantes a
desenvolverem laços fortes com suas comunidades, melhoram a apreciação dos alunos pelo
mundo natural, e criariam um maior compromisso nas ações de cidadãos ativos.
26 Em recente visita ao Brasil, em abril de 2015, onde realizou um mini curso sobre outdoor education no Centro
de Pesquisas e Conservação da Natureza Pró-Mata (PUCRS), a Professora Janet McVittie da Universidade de
Saskatchewan demonstrou certa surpresa quando exposto para ela as percepções de risco existentes aqui.
Enquanto no Canadá as preocupações que ela enfrentava eram referentes às preocupações dos pais sobre
temperaturas negativas, ursos e picadas de cobras, aqui a segurança estava relacionada não só a evitar acidentes
similares, mas também (e talvez de forma mais relevante) situações de violência e assaltos.
27 Aqui traduzido por educação baseada no lugar.
63
Para Harrison (2010), um relacionamento de relevância entre indivíduos e lugares
deve evoluir do conhecimento para a intimidade de um lugar, podendo ser desenvolvidas as
concepções de lugar para criar vínculos ou lugar (enquanto unicamente um espaço físico)28
para falar sobre determinados assuntos que não ele próprio. Para ele, PBE envolveria a ideia
de um trabalho no, sobre e para o lugar para se aprender a viver melhor onde se vive,
conhecendo e entendendo este local.
A estratégia de usar contextos locais para se ensinar os assuntos escolares parece
devolver resultados para todos os interessados, alunos, comunidade, professores, escola.
Segundo Resor (2010), essa prática facilitaria a criação de alunos engajados, futuros cidadãos
melhores, comunidades melhores, conscientização sobre a preservação de ambientes naturais
e melhor desempenho acadêmico.
Os projetos de place-based education são normalmente multi e interdisciplinares.
Alguns exemplos de projetos possuem enfoque maior na área das ciências, como por
exemplo, o controle biológico de uma espécie de mosquito em Louisiana sem o uso de
pesticidas e as pesquisas em aquacultura no Maine. Entretanto, esses exemplos acabam
transcendendo a esfera biológica, pois abarcam inseparavelmente a esfera social/cultural
também. Existem outros exemplos que trazem um caratér socioambiental mais explícito,
combinando ciências com estudos sociais. Como é o caso de estudantes que trabalharam para
resgatar conhecimentos indígenas no Alasca criando missões de trabalho, com conhecimentos
geográficos, histórico e cultural do local e também projetos que investigam áreas
negligenciadas, seus fatores culturais e econômicos, e também os aspectos que produzem esse
declínio.
Para tentarmos entender o conceito e suas implicações é preciso compreender o
conceito de lugar (place). Surgido na área da geografia, onde poderemos obter maior aporte
teórico, ele tem sido usado das mais diversas formas, mas segundo Resor (2010), o conceito
de lugar pode ser claramente diferenciado dos conceitos de localização (location) e locale
(locale). A localização implicaria em uma ideia de coordenadas exatas de um determinado
lugar, como latitude e longitude ou indicações de um lugar usando pontos de referência e
distâncias, por exemplo a cidade tal está localizada no planalto central a tantos kms da capital
tal... É objetivo e raramente contestado. Locale seria a descrição de um local através de pontos
28 Algumas vezes, um envolvimento maior com o lugar não é considerado em projetos ao ar livre se utilizando
dele para atividades físicas, desenvolvimento pessoal, meditação, entre outros exemplos. A educação baseada no
lugar leva em conta aspectos históricos, ecológicos, geográficos, culturais e interações com a comunidade. Por
certo, ambas práticas citadas são de igual relevância, mas esta diferenciação é válida para melhor entendimento
do conceito.
64
relevantes de quem descreve, dependeria do nível de importância que damos e também de
nossas experiências.
Em contrapartida, a concepção de lugar se diferenciaria por envolver apontamentos
subjetivos que refletem sentimentos e emoções por um determinado lugar, podendo variar
desde sentimentos nostálgicos até sentimentos de horror. Lugar seria o oposto de espaço
(space), lugar tem significados, nós nomeamos lugares. Remete a lembranças. Por outro lado,
espaço não tem nome, nem significado. Ambos são conceitos subjetivos, uma vez que o que
pode ser lugar para mim pode ser espaço para outra pessoa. Lugar não é somente criado na
mente de um indivíduo, nossos conceitos individuais de lugar são influenciados por aqueles
que nos cercam e a cultura na qual vivemos. Lugar é um constructo social sense of a place
(RESOR, 2010). É neste aspecto subjetivo de lugar onde se enquadra o lugar de place-based
education.
Segundo os autores que trabalham com a educação baseada no lugar, ela poderia ser
distinguida das práticas convencionais de educação ambiental pela atenção direcionada que
seus praticantes dão aos aspectos, tanto naturais como sociais, do ambiente29. As ações de
PBE geralmente envolvem as seguintes ideias: (a) fenômenos que cercam a comunidade são a
base para o desenvolvimento curricular, (b) ênfase sobre os alunos tornando-se os criadores
de conhecimento e não apenas consumidores de conhecimento criados por outros, (c) questões
e preocupações dos alunos desempenham papéis centrais na escolha do que é estudado, (d) os
professores agem principalmente como co-alunos e "facilitadores" de recursos da comunidade
e as possibilidades de aprendizagem, (e) as paredes entre a comunidade e a escola são
cruzadas com freqüência, e (f) o trabalho do aluno é avaliado com base em suas contribuições
para o bem-estar da comunidade e sustentabilidade. Além disso, Woodhouse e Knapp (2000)
identificaram as seguintes características: (a) o conteúdo do currículo é multidisciplinar; (b) as
metas curriculares são mais amplas do que apenas "aprender a ganhar "; e (c) o currículo
integra self, os outros, e lugar e inclui uma dimensão ecológica, econômica, de várias
gerações, e multicultural.
Alguns exemplos de práticas: jornalismo cultural, aprendizagem expedicionária,
problematização, ensino e aprendizagem contextuais, investigações culturais e históricas,
monitoramento ambiental, soluções para problemas da vida real, empreendedorismo e
envolvimento nos procesoss públicos.
29 Pelos objetivos gerais das práticas de educação ambiental e educação baseada no lugar elas seriam mais
similares do que diferentes, não demonstrando nenhuma diferença intrínseca. Na realidade é bastante difícil fazer
uma distinção entre elas, revelando que esta diferença surge de uma nomenclatura que tem origens diferentes nos
processos históricos e contextos políticos de cada localidade.
65
A place-based education não se configura como um conceito novo, começou a
aparecer na literatura no final da década de 90, onde foi responsável pelo investimento na
educação no/do campo nos Estados Unidos, ajudando a reconhecer a importância das escolas
rurais usando o lugar como componente central na educação pública. Confunde-se e perpassa
os conceitos de educação outdoor, educação ambiental, educação da experiência, entre
outros... Possui também um cruzamento com o campo da Psicologia Ambiental e seus
conceitos de pertencimento, territorialidade e identidade.
Essas práticas permitem o deslocamento do aluno do espaço físico
escola/universidade, afastando-o de um habitus30 consolidado de único local de
aprendizagem. Entretanto, deve-se considerar em primeiro lugar as situações de violência
vividas dentros das instituições de ensino e fora delas aqui no Brasil. Existem problemas que
devem ser pensados antes de sair para ver a paisagem. Na tentativa de fugir do romantismo
ambiental que envolve essas práticas, adaptando para um contexto diferente de onde foram
concebidas, ainda se mostra importante considerar que na impossibilidade de realizá-las por
completo, identificar e tematizar os problemas que cirundam estes espaços é profícuo.
Trazendo a aplicabilidade dessas práticas para o contexto universitário
especificamente, Payne e Wattchow (2008) trabalharam com o conceito de slow pedagogy em
saídas de campo com alunos de graduação da Monash University em um projeto chamado
Experiencing the Australian Landscape (EAL)31. Este projeto envolvia dois momentos, um
composto pelo programa acadêmico e outro pelo programa de aprendizagem experencial. O
programa de aprendizagem experencial era composto por atividades ao ar livre, onde os
alunos passavam três dias acampando, o que segundo os autores, proporcionava a descoberta
de intensas percepções corporais e de consciência. Após algumas semanas, os alunos
retornavam ao local para redescobrir essas experiências e ficavam novamente imersos no
local por um tempo. Toda a parte de preparação e alimentação deveria ser preparada pelos
próprios alunos, com o incentivo para o consumo de produtos orgânicos e a prática da slow
food.
Payne e Wattchow (2008, p. 6) expõem os objetivos da preparação da disciplina que
objetivava, além de transmitir conteúdo técnico, também proporcionar aos estudantes
30 Conceito de Bourdieu (1996), habitus é um sistema de disposições duradoras e transponíveis que funcionam
como princípios geradores e organizadores de práticas e representações que podem ser adaptadas a seus
objetivos em circustâncias sem supor o ponto de vista consciente, objetivamente regulados e regulares, sem ser o
produto de obediência de regras, não se limitando só àquilo que reproduz, indo além.
31 Experienciando a Paisagem Australiana. Tradução minha.
66
vivências enriquecedoras que nem sempre são pensadas como necessárias na formação de
estudantes universitários:
Os três primeiros dias de aprendizagem experiencial da expedição32 ocorreram no
final do verão; os segundos três dias em maio, então essa variação sazonal de luz,
escuridão, humor, clima e temperatura e assim por diante, poderia ser conhecido
como resposta corporal perceptual/sensorial e comparação experencial. Os
sincronismos da aprendizagem experencial foram planejados para coincidir com a
lua cheia, por uma gama de razões exploratórias e de descobertas, incluindo razões
intrínsicas/estéticas [aesthetic]. Entretanto, um pouco estrategicamente, a
experiência da lua cheia permitiu aos alunos entenderem os contrastes da alta das
marés e trabalharam com a natureza onde a ‘natureza’ poderia ‘guiar’ algumas das
experiências de rock-pooling33, caminhadas na praia.
Entre os momentos experienciais, havia a parte curricular, na qual os alunos
aprendiam sobre o lugar onde estavam através de pesquisas sobre sua ecologia, geografia e
história. Mas isto tudo era conduzido pelos próprios alunos através de entrevistas com
moradores locais, peças teatrais realizadas por eles, poesias e se achassem importante, aulas
tradicionais conduzidas pelos professores. O artigo traz interessantes relatos das atividades de
momentos solo prática meditativa autoreflexiva e individual - e a autoavaliação dos
estudantes. Os autores ainda relatam que no primeiro momento, os alunos acreditavam estar
indo para uma atividade de liberdade e prazer, e ao se defrontarem com um programa bastante
estruturado, onde eles teriam diversas obrigações e responsabilidades, o sentimento foi de
frustração (PAYNE; WATTCHOW, 2008, p. 11). Sentimento que foi substituído pelo de
satisfação, pertencimento e dever cumprido ao longo das atividades. Este parece ser o mote da
slow pedagogy trazida neste relato. Ensinar sem pressa e sem a concepção de transmitir
informações, mas proporcionar sensações e atividades que permitam ao aluno participar de
uma co-produção de seu (auto)conhecimento.
Caminhar e aprender aprendizagem pelos caminhos
Ingold (2015b, p. 21) argumenta que “caminhar oferece um modelo de educação
alternativo que, ao invés de inculcar o conhecimento dentro das mentes dos alunos, os leva
para fora, para o mundo”. Nesta argumentação do autor poderíamos enxergar que há uma
segregação criticada por ele entre a mente e o corpo enquanto falamos de educação ou, mais
32 Os autores utilizam a palavra Discovery que aqui foi traduzida por expedição porque em português, dentro do
contexto do artigo, se mostram mais equivalentes.
33 Não foi encontrada uma tradução específica para este conceito. A atividade de rock-pooling poderia ser
descrita como observação e coleta de pequenos elementos (seres vivos e conchas) que são trazidos pelas ondas e
ficam retidos nas piscinas formadas pelas rochas. A ideia é, depois de conhecidos, devolvê-los ao mar.
67
especificamente, dos processos de aprendizagens. O conhecimento inculcado nas mentes dos
alunos está intimamente relacionado com o aprender dentro da sala de aula, na repetição do
padrão mais comum dos alunos sentados em suas classes e o professor em pé expondo o
conteúdo. Em contrapartida, o aprender lá fora por sua vez estaria intimamente ligado ao
corpo e ao movimento da caminhada no sentido de levar os aprendizes para conhecer o
mundo fora das paredes das instituições de ensino.
O autor vai comparar o percursso desta caminhada a um labirinto que não possui uma
visão de comando, nem um vislumbre do seu fim, o que vai exigir do seu caminhante um
estado contínuo de atenção e alerta para todos os elementos presentes no percursso. Estado
este que, segundo Ingold, perdemos ao crescer quando temos nossa curiosidade substituída
pela disciplina e “para recuperar o que foi perdido, temos que sair da cidade, caminhar pela
mata, campos ou montanhas governados por forças ainda não disciplinadas” (INGOLD,
2015b, p. 24). O caminhante deve ir para onde o caminho o leva, sem ter em mente o objetivo
de chegar ao sem final, sem a projeção de uma persperctiva a ser realizada ou de uma meta a
ser alcançada. Aquele que segue o caminho do labirinto não pode ter outro objetivo senão
continuar, seguir em frente e para fazê-lo sua atenção deve estar inteiramente voltada à sua
percepção com um monitoramento sempre vigilante do caminho, ouvindo e sentindo tudo que
há nele (INGOLD, 2015b).
Ingold afirma que seguir o caminho é muito mais atencional do que intencional,
fazendo uma referência clara ao seu conceito de educação da atenção (INGOLD, 2010). Aqui
o aprendizado humano não recairia sob uma simples transmissão de informações, mas uma
espécie de redescoberta orientada. Para este autor, um indivíduo não aprende e apreende as
coisas da vida simplesmente por questões da capacidade e competência, mas sim através de
um processo complexo do indivíduo por inteiro em um ambiente e sua experiência nele, o que
permitira o desenvolvimento de habilidades (skills). O conhecimento não é comunicado ou
transferido, mas construído quando o indivíduo segue os caminhos direcionados pelos
professores-predecessores. Quando o professor-mediador mostra ao aluno como se faz algo
fazendo, este irá copiá-lo, mas não no sentido de uma transmissão automâtica de um conteúdo
mental, mas de seguir o que as outras pessoas fazem e achar nos movimentos delas, sua
própria habilidade, seu próprio jeito. O iniciante observa, escuta e sente esses movimentos e
procura igualar seus movimentos corporais àqueles de sua atenção em uma espécie de
redescobrimento dirigido (INGOLD, 2010, p. 21):
68
O processo de aprendizagem por redescobrimento dirigido é transmitido mais
corretamente pela noção de mostrar. Mostrar alguma coisa a alguém é fazer esta
coisa se tornar presente para esta pessoa, de modo que ela possa apreendê-la
diretamente, seja olhando, ouvindo ou sentindo. Aqui o papel do tutor é criar
situações nas quais o iniciante é instruído a cuidar especialmente deste ou daquele
aspecto do que pode ser visto, tocado ou sentido, para poder ‘pegar o jeito’ da coisa.
Aprender, neste sentido, é equivalente a uma ‘educação da atenção’.
O ato de caminhar continuamente nos remove de qualquer ponto de vista, nos aparta
da ideia de ver o mundo através de uma ou outra perspectiva, mas sim de perspectiva
nenhuma. Para Ingold, a atenção do caminhante não vem da chegada a uma determinada
posição, mas de ser constantemente apartado dela, do próprio deslocamente, trata-se de ex-
posição. Este termo, que o autor vai buscar em Masschelein, significa caminhar na intenção
de estar fora da posição, o que permitiria ver as coisas sem nenhuma perspectiva, em uma
espécie de abertura plena para a experiência. Para Masschelein (2014, p. 43):
Nisso consiste o caminhar: um deslocamento do olhar permitido pela experiência,
uma submissão passiva (receber ordens do caminho) e, ao mesmo tempo, um esboço
(ativo) do caminho. Não que caminhar nos ofereça uma perspectiva (ou uma leitura)
melhor, ou uma compreensão mais verdadeira e completa, nem que nos permita
superar os limites de nossa perspectiva. O que dá sentido ao caminhar é a
possibilidade de olhar para além de qualquer perspectiva, uma visão ou um olhar
que nos transforma (e, portanto, é uma experiência) enquanto estamos sujeitos ao
que vemos. Caminhar nos permite ver além de qualquer perspectiva, uma vez que
‘uma perspectiva’ está ligada a um ponto de vista, isto é, uma ‘posição subjetiva’, à
posição de um sujeito em relação a um objeto ou um alvo. O importante, ao
caminhar, é por em movimento esse sujeito e essa posição. Caminhar é uma ex-
posição, um estar fora da posição.
Masschelein (2014) propõe a caminhada como uma prática educacional e filosófica,
onde não existem objetivos claros de tomadas de consciência e aquisição de conhecimentos,
mas sim o despertar da atenção do caminhante para conseguir pensar o presente. Seguir este
caminho não significaria realizar as intenções de alguém ou até mesmo as nossas, mas
justamente ao contrário, descentralizar nossas próprias intenções, suspendendo o que nos é
por demais familiar nos fazendo enxergar o que é estranho e até há pouco tempo
desapercebido. Assim, poderíamos nos abrir para a experiência que, segundo Masschelein
seria a abertura de “um espaço para estudar e para o indivíduo se expor, a fim de, como dizia
Bergson, não ver o que pensamos, mas pensar no que vemos, para expor o nosso pensamento
para o que está acontecendo (ao presente) e para superar nossas próprias reflexões, para
quebrá-las” (MASSCHELEIN, 2014, p.23).
69
Aqui caberia um destaque para uma prática34 que foi realizada na Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul e que corresponde a realização de trilhas pelo
campus da universidade com alunos de variados cursos. Em sua concepção original, a trilha
apresentava e conduzia por alguns pontos com aspectos relacionados aos projetos de gestão
ambiental e sustentabilidade, também da flora, da fauna e históricos do campus. Este roteiro
ainda se mantém, sendo realizado com turmas que demonstram interesse nos assuntos.
Entretanto, no ano de 2015, foi realizada com uma turma do curso de pedagogia uma trilha
diferenciada35. A concepção era trabalhar com os alunos uma caminhada não orientada, com o
objetivo de desenvolvê-la como uma prática educacional filosófica, assim como propunha
Masschelein. Os alunos tinham apenas a recomendação inicial que se abrissem para a
experiência e que buscassem estar atentos para as coisas que lhes chamassem a atenção. O
percursso percorrido foi o mesmo da trilha original, mas sem nada ser dito, e apesar de alguns
comportamentos relutantes no início, os estudantes pareceram ao final aceitar bem a
realização desta atividade fora da sala de aula. Como complemento da atividade, após os
alunos apresentarem para a turma suas percepções individuais da trilha com os aspectos mais
relevantes para cada um, a trilha original foi realizada. Assim puderam captar as diferenças
entre uma trilha guiada, totalmente intencional para que conhecessem os projetos de
sustentabilidade desenvolvidos e reparassem em alguns pontos interessantes do campus, de
uma trilha atencional, totalmente particular onde caberia a cada um despertar a atenção para
os elementos do campus que se apresentavam a eles.
Esses futuros professores tiveram contato com uma metodologia que pode contribuir
muito à educação pela retomada de reflexões filosóficas às suas práticas. E dentro deste
contexto, ressaltamos o potencial das áreas verdes como um local onde atividades deste tipo
poderiam ser desenvolvidas, atingindo os mais variados públicos, como o exemplo dos
estudantes de pedagogia. Por certo, tanto a prática de trilhas guiadas exaltando aspectos
relavantes de caráter histórico e ambiental do campus, quanto trilhas não intencionais
poderiam contribuir na formação integral dos alunos e aproximação da comunidade
acadêmica.
***
34 A prática das trilhas pelo campus foi elaborada na ocasião da produção da dissertação de mestrado em
Educação da Chalissa Wachhholz pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da PUCRS, em 2013.
35 Realizei estágio de docência com esta turma e tive a oportunidade de conduzir as trilhas citadas em conjunto
com a Professora Isabel Carvalho (Professora titular) e minha colega Nádia Castro.
70
Ao abordarmos, definitivamente de forma breve, as questões que envolvem a
formação de uma dicotomia entre ser humano e natureza, cultural e natural, a intenção foi
mostrar como esta relação influenciou e moldou a forma de gerar conhecimento dentro de
modelos de instituições universitárias ocidentais. Como já referido, por certo as referências à
Modernidade não podem ser reduzidas ao que aqui foi exposto, mas a pesquisa delimitou essa
abordagem por entender que as universidades estudadas neste trabalho reproduzem, assim
como muitas outras instituições, este modelo.
Também falamos sobre o princípio do ideal de isolamento de áreas naturais para
proteção e contemplação humana, e como esse projeto norte-americano foi importado por
diversos lugares do mundo, inclusive pelo Brasil. Este modelo caracteriza um tipo de
comportamento ecológico conservador que se faz necessário para a manutenção dessas áreas
com estes objetivos. Encontramos nas pesquisas iniciais e no cerne deste trabalho oito
universidades do Rio Grande do Sul universidades que se apropriaram de áreas verdes,
algumas naturais, outras construídas, e passaram a ser as responsáveis por sua gestão. Com
isso pudemos identificar como a estrutura burocrática, muitas vezes inflexível, que predomina
dentro das universidades, e que teve suas bases forjadas sobre a influência de uma ciência
dura, interfere na relação da gestão destes espaços verdes. Ao mesmo tempo em que as
universidades têm de estabelecer esta relação, dispositivos legais também foram criados e
implementados para a proteção de áreas verdes para além do Sistema Nacional de Unidades
de Conservação (SNUC). São as Áreas de Preservação Permanente (APPs) e Reservas Legais
(RLs), áreas com vegetação nativa, muitas vezes presentes nos espaços físicos das instituições
e que também estão impondo às universidades mudanças de comportamento.
Como vimos, o envolvimento de ações e atividades educativas com a natureza é
diverso e as possibilidades são múltiplas. Esse foi o objetivo de abordarmos as diferentes
inserções da educação na natureza, ou da natureza na educação. Base para que possamos
caracterizar e diferenciar os usos que foram encontrados das áreas verdes aqui estudadas.
71
4 NATUREZA, POLÍTICA E UNIVERSIDADES
A fundamentação teórica se propôs a fornecer elementos para que pudéssemos
entender como as questões das ideias preparam o solo para as questões da ambientalização.
Aqui a temporalidade de fundamentação passará dos aspectos históricos expostos no capítulo
anterior para os atores e as políticas no presente que desenherão no capítulo de análises o
enredo desta pesquisa.
Por certo a relação das sociedades ocidentais contemporâneas com a natureza vem
passando por transformações que se refletem nas preocupações com problemáticas ambientais
como por exemplo as mudanças climáticas, poluição, desmatamento, extinções, etc. Na
verdade estas transformações ultrapassam a materialidade dos eventos citados e exigem uma
revisão dos comportamentos e valores atuais. O primeiro tópico deste capítulo versará sobre
Ambientalização e Universidades, e discutiremos sobre as responsabilidades socioambientais
das universidades e seus compromissos com a formação integral dos seus estudantes. O que
irá se por em debate será a concepção de uma formação estritamente técnica e especializada,
herança de uma postura assumida pela ciência moderna, conforme mostrado no tópico da
Grande Divisão.
No tópico As políticas nas relações entre universidades e áreas verdes, as correlações
entre as universidades e seus espaços verdes são colocadas em tensionamento, trazendo à tona
questões norteadoras que auxiliaram na investigação a respeito de que tipo de configuração se
institui. Se as universidades reproduzem a ideia de uma natureza que deve ser intocada e
reforçam os padrões de exclusividade de seu uso, ou se as utilizam na intenção de promover
esses espaços de forma responsável e agregadora serão questões de fundamental relevância a
serem desveladas.
Resumidamente, mostramos o tópico da Grande Divisão e o tópico sobre Natureza
Intocada no primeiro capítulo para construir uma linha de pensamento que nos permitisse
chegar aos dias atuais e ver os reflexos do que foi discutido nas relações entre as áreas verdes
e as universidades. E questionaremos no segundo capítulo (especialmente o tópico As
políticas nas relações entre universidades e áreas verdes) se as relações das universidades e
suas áreas verdes mantém a concepção de uma natureza intocada e se isso realmente é eficaz
na relação estabelecida com os estudantes e seus projetos de sustentabilidade.
72
4.1 Ambientalização e Universidades
Neste cenário de preocupações com as questões ambientais, a ideia de sustentabilidade
passa a ser elemento norteador para diversas entidades, públicas e privadas, e para a sociedade
em geral. Políticas públicas têm sido criadas para incentivar esta ideia, pois a humanidade
percebeu a urgência de atitudes agora, e não para um futuro distante. Não podendo omitir-se
desta responsabilidade, as Instituições de Educação Superior também estão voltando-se para
políticas ambientais, sistemas de gestão ambiental e projetos de educação ambiental. Com a
criação da Agenda 21, durante a Rio 92, um aviso foi dado a elas:
A experiência trouxe uma lição clara: as universidades não devem se esquivar ao
desafio, pois se não se envolverem, se não usarem as suas forças combinadas para
ajudar a resolver os problemas emergentes da sociedade global, então serão
ignoradas no despertar de um outro motor de mudança, uma outra agência ou
estrutura será convidada a promover a liderança (TAUCHEN; BRANDLI, 2006, p.
505).
Como esperamos, os objetivos principais das universidades são o ensino e a formação
dos tomadores de decisão que irão atuar no futuro. Essas instituições deveriam possuir a
ferramenta interdisciplinar necessária, pois a questão ambiental não está isolada a apenas uma
área e, por serem promotoras do conhecimento, acabam assumindo um papel essencial na
construção de um projeto de sustentabilidade. Projeto este que deve percorrer desde uma
mudança curricular, inserindo conteúdos relacionados à temática nos currículos da graduação
e pós-graduação das mais diversas áreas; cursos específicos; extensão comunitária;
capacitação de funcionários; até medidas que se estruturam mais especificamente, como a
implantação de um projeto de gestão ambiental em todas as áreas dos campi. Este desafio
percorre um caminho que deve articular a área da pedagogia, as políticas públicas, de ensino,
e de governo, também dentro das salas de aula e pelos objetivos institucionais, caminho que
deve gerar debates sobre o papel do movimento ambientalista e do chamado desenvolvimento
sustentável (SORRENTINO et al., 2011).
Pesquisas desenvolvidas pelo Programa de Pós-Graduação em Educação e também
pelo Grupo SobreNaturezas (UFRGS) dão conta de investigar como acontecem esses
fenômenos chamados de processos de ambientalização36. Carvalho e Toniol (2010), explicam
36 Os autores Leite Lopes (2004, 2006), Jean e John Camaroff (2001) também utilizam este conceito.
73
este conceito como um, “[...] processo de internalização nas práticas sociais e nas orientações
individuais de valores éticos, estéticos e morais em torno do cuidado com o meio ambiente”.
Carvalho (2010, p. 6), afirma a importância ética e moral dos processos de
ambientalização:
no âmbito dos conflitos e nas práticas pedagógicas associados aos processos de
ambientalização a questão ambiental parece ser um importante operador de
legitimidade social, de crença e de identidade cultural. Esta questão traz consigo a
pretensão de expandir-se como um argumento ou idioma válido de orientação moral,
ética e estética para o conjunto da sociedade.
Neste contexto, podemos visualizar o potencial do uso de áreas verdes por
universidades para uma sensibilização ambiental através da experiência que é proporcionada
pela frequentação destes espaços. Sensibilização esta que pode ser alcançada não só por
estudantes das ciências ambientais, mas por todos, recolocando o ser humano junto a natureza
e não mais como um observador externo a ela.
Se esses espaços verdes se configuram como uma espécie de capital natural das
universidades que buscam um caráter de sustentabilidade, é de extrema relevância
compreender como eles se configuram dentro dos projetos de sustentabilidade das mesmas e
qual seu tipo de arranjo organizacional. Identificar como esses espaços se articulam com os
programas de educação ambiental e políticas de ambientalização dentro das universidades
poderá contribuir para a compreensão de suas potencialidades, como as experiências que
podem ser propostas para os alunos.
Experiência esta que poderia auxiliar na formação, enquanto Bildung37, para que o
indivíduo assuma modos de engajamento que se constituem de um conjunto de sensibilidades
ambientalmente orientadas para com o ambiente humano e não-humano e de posicionamentos
ético-políticos associados a padrões de responsabilidade e de cidadania ambiental. A
construção de um ambiente ético-moral produzido por normas de conduta ambientalmente
responsáveis e afirmação de valores de respeito e inclusão do ambiente (humano e não
humano) reiterados nas práticas de educação ambiental concorre para uma educação
ambiental como educação moral do cidadão para uma sociedade sustentável.
37 O termo Bildung possui uma longa trajetória de polissemias do uso de seu conceito que merecem ser
consideradas para que sua origem seja respeitada (GADAMER, 2008; HERMANN, 2010). Entretanto, no
presente trabalho, o significado deste termo busca referir-se à fundamentação na hermenêutica moderna de
Gadamer (2008). Neste sentido, Bildung “implica reconhecer a capacidade de luta do sujeito em se autoeducar,
em saber que ele pode reagir para além de todas as adaptações, para além de todos os projetos de sentido que lhe
são oferecidos por certos ordenamentos simbólicos e que nunca é totalmente aprendido pelos nossos esquemas
conceituais ou seja, a preservação da dimensão fundamental do conceito clássico de Bildung: a liberdade do
indivíduo para determinar seu processo de formação” (HERMANN, 2010, p. 120).
74
Este novo habitus ecológico38 assume a perspectiva da corporeidade, onde não mais há
uma dicotomia mente-corpo, indivíduo-sociedade, prática-estrutura, mas sim a experiência
humana no corpo que articula sujeito e objeto. Enquanto processo educativo, na medida em
que este habitus é corporificado, as questões ecológicas passam a constituir o sujeito. Assim,
não mais seria assumida a postura de dominação do ser humano sobre a natureza, onde há um
afastamento como se ela fosse um objeto fora do sujeito, mas fazer ressurgir uma relação
baseada na ética e estética de viver em harmonia com a natureza (CARVALHO; STEIL,
2009).
Diversos estudos têm pesquisado a respeito do uso de áreas de preservação/verdes e
seus múltiplos usos, tais como educação ao ar livre e educação baseada no lugar. As pesquisas
de Phillip Payne junto com seus colaboradores (PAYNE; WATTCHOW, 2008. PAYNE;
RODRIGUES, 2012) são um ótimo exemplo de como essas áreas podem ser utilizadas pelas
universidades para contribuir nas formações de estudantes com o uso de um novo tipo de
fazer ciência, menos conteudista e mais vivencial. Ingold (2010) e sua educação da atenção
também são ótimos aportes para trabalhar com esses espaços, conforme já foi exposto na
primeira parte.
Para compreender como se dá a percepção dos atores envolvidos com estas áreas
verdes e suas experiências, além dos autores já citados acima, nos acoramos principalmente
na fenomenologia de Merleau-Ponty (2007) e sua ideia de “a indivisibilidade do humano e a
natureza, da inseparabilidade da mente e do corpo”. Abram (1996) utiliza-se do conceito de
“carne” de Merleau-Ponty (2007) para tentar romper essa separação ser humano-natureza: o
sujeito aqui se apresenta como uma das expressões da “carne do mundo” que consiste no
mundo sensível, englobando a tudo que nele reside, sendo humanos e não-humanos, todos
possuem essa mesma essência.
Merleau-Ponty afirma que o mundo antecede o sujeito e a percepção não resulta da
associação de sensações como prega a tradição experimental. Segundo este autor
(MERLEAU-PONTY, 1999, p. 6):
A percepção não é uma ciência do mundo, não é nem mesmo um ato, uma tomada
de posição deliberada; ela é o fundo sobre o qual todos os atos se destacam e ela é
pressuposta por eles. O mundo não é um objeto do qual possuo comigo a lei de
constituição; ele é o meio natural e o campo de todos os meus pensamentos e de
todas as minhas percepções explícitas. A verdade não ‘habita’ apenas o ‘homem
interior’, ou, antes, não existe homem interior, o homem está no mundo, é no mundo
que ele se conhece.
38 Conceito criado a partir do conceito de habitus de Bourdieu (1996) que visa a internalização e incorporação de
comportamentos ambientais responsáveis (CARVALHO; STEIL, 2009).
75
Ingold apresenta uma grande influência de Merleau-Ponty e sua Fenomenologia da
Percepção (VELHO, 2001). Não mais a percepção é dada pelos sentidos, mas passa a ser vista
de uma forma mais sensível de um ser-no-mundo e sua experiência no (do) mundo. Esta é
uma visão de não mais perceber o mundo simplesmente por representações, mas através de
modos de ser e habitar o mundo.
Segundo Carvalho e Steil (2013, p. 6), a posição assumida por Merleau-Ponty da
percepção, designa “uma epistemologia que vai à contramão das perspectivas semióticas onde
o mundo se reduz ao que pode ser dito, nomeado e interpretado pela linguagem e o sujeito
humano está suspenso sobre uma teia de símbolos por ele mesmo criada”.
Através desta perspectiva teórico-metodológica, identificar as potencialidades do uso
das áreas verdes que foram estudadas, de pensar em sensibilizar e recolocar o ser humano no
mesmo patamar da natureza, desfazendo esta dicotomia entre ambos, pode auxiliar no papel
da universidade de formar não somente profissionais responsáveis com as causas ambientais,
mas também seres sensíveis e equivalentes a todas as formas humanas e não humanas.
Segundo Jonas (2006), faz-se necessário uma ética39 que pense em longo prazo nos
efeitos das técnicas desenvolvidas pelo seres humanos, boas ou más. Deve-se assim assumir
uma postura que pense nas gerações futuras, de seres humanos e não humanos, em uma ética
caucada no princípio da responsabilidade.
Com o avanço das inteligências e inventividades, a técnica humana evoluiu de forma a
permitir o que foi considerado o progresso. A techne desenvolvida pelo ser humano permitiu
a ele o uso e o domínio da natureza, a produção e o desenvolvimento de melhorias nas mais
diversas esferas das sociedades e seus efeitos não foram previstos em longo prazo. Inclusive
projetos utópicos, como prolongamento de vida e alterações genéticas, vislumbram em um
futuro muito próximo. Já enxergamos agora a possibilidade destes avanços prejudicarem a
vida no Planeta. Na perspectiva de Jonas (2006, p. 39), “isso impõe à ética, pela enormidade
de suas forças, uma nova dimensão, nunca antes sonhada, de responsabilidade”.
As éticas chamadas tradicionais40 por Hans Jonas contribuíram de forma
incomensurável para afinar e refinar as relações entre os seres humanos. É inegável a
39 Não é objetivo da pesquisa abordar e discutir as diferentes vertentes e implicações do conceito de ética.
Entende-se aqui especificamente a ética ambiental como um compromisso assumido frente à responsabilidade
ambiental.
40 Os exemplos de éticas tradicionais trazidos por Hans Jonas (2006) correspondem a ética do presente na teoria
do imperativo categórico de Kant; a ética da consumação do mais além, de caráter religioso; e a ética do
presente que também se expressa nas ações do estadista e do legislador. Ética do presente para contrastar com a
ética do futuro proposta pelo filósofo. Estas éticas tradicionais não abordam as questões futuras de
sustentabilidade socioambiental e também discorrem apenas sobre as relações intra e entre humanos, os
elementos não humanos não são considerados.
76
importância dos aportes normativos criados pelos preceitos de moral e ética conduzidos por
elas. Entretanto, também se mostra inegável o esgotamento de uma ética tradicional para
suprir as necessidades éticas e morais que vivenciamos agora e que necessiram prover
também um futuro imprevisto. Sem levar em conta os elementos extra-humanos e as relações
que estão imbricadas dentro deste cósmos, estas éticas parecem apresentar-se hoje em dia de
forma incompleta e insuficiente para lidarmos com problemas de responsabilidade que não
eram pensados antes. Nosso imperativo deveria se estender em direção a um previsível futuro
concreto, que constitui a dimensão inacabada de nossa responsabilidade. De acordo com
Jonas (2006, p. 33),
A natureza não era objeto da responsabilidade humana ela cuidava de si mesma e,
com a persuasão e a insistência necessárias, também tomava conta do homem:
diante dela eram úteis a inteligência e a inventividade, não a ética. Mas na “cidade”,
ou seja, no artefato social onde homens lidam com homens, a inteligência deve
casar-se com a moralidade, pois essa é a alma de sua existência. É nesse quadro
intra-humano que habita toda ética tradicional, adaptada às dimensões do agir
humano assim condicionado.
Faz-se necessário reconhecer que os novos tipos e limites do agir humano necessitam
de uma ética capaz de levar em conta a previsão destes atos e uma noção de responsabilidade
para os delimitar, e as universidades apresentam grande responsabilidade frente a isso. O
sentimento de responsabilidade com o modo como usufruimos dos recursos providos pela
natureza já está presente no conceito original de sustentabilidade, preocupado com um manejo
que permita às gerações futuras o necessário para sua vida não apenas sua sobrevivência.
Jonas (2006, p. 63) vai dizer que nossa grandeza tecnológica também irá nos incumbir de uma
responsabilidade, não levada em conta pela ética até então, para com um futuro não previsto:
Quando, pois, a natureza nova do nosso agir exige uma nova ética de
responsabilidade de longo alcance, proporcional à amplitude do nosso poder, ela
então também exige, em nome daquela responsabilidade, uma nova espécie de
humildade uma humildade não como a do passado, em decorrência da pequenez,
mas em decorrência de excessiva grandeza do nosso poder, pois há um excesso do
nosso poder de fazer sobre o nosso poder de prever e sobre o nosso poder de
conceder valor e julgar.
Em parte, trazer a ética ambiental junto aos processos de ambientalização serviu de
justificativa para entender porque as universidades assumem, ou deveriam assumir, o
compromisso de ambientalizarem-se frente a uma sociedade que anseia por novas posturas
ambientalmente corretas e vê nessas instituições elementos norteadores de comportamentos.
77
4.2 A política nas relações entre universidades e áreas verdes
Para fins de análise desta pesquisa, as áreas verdes foram enquadradas dentro de bens
naturais da sociedade e também como não humanos possuidores de valor intrínsico. Mesmo
que se configurem como espaços particulares no caso das universidades particulares, e
espaços públicos no caso das universidades públicas. Entende-se aqui que por se tratarem de
espaços pertencentes a universidades, os modos como se configuram e seus usos também
interessam à sociedade.
Na intenção de gerar categorias de análise para a pesquisa, tomamos a instituição
universidade, junto com todos seus integrantes tomadores de decisões e posturas, como o
sujeito social que possui uma capacidade de poder privilegiado de acesso ao capital material
representado pelos espaços verdes que gerem. Entretanto, esta relação não poderia ser
analisada unicamente neste espaço de apropriação material, sendo visto unicamente como
capacidade de aquisição de um bem, mas também está sendo pensado por este trabalho dentro
do espaço de apropriação simbólica. E esta apropriação simbólica pode possuir diferentes
relações que legitimam ou não esta configuração frente à sociedade. O projeto de
sustentabilidade dessas instituições pode ser um desses elementos justificantes dessa gestão
das áreas verdes, bem como o próprio cumprimento das leis ambientais.
Para compreender como se configuram as relações entre as universidades e suas áreas
verdes, se procurou identificar os múltiplos filamentos que podem estar presentes nestas
relações. A situação atual das áreas verdes e o poder relativo que as universidades têm sobre
elas, junto com os relatos encontrados nos dizem mais deste envolvimento do que somente a
lógica do discurso. Estas constatações ajudaram a identificar como as referências ao meio
ambiente ou natureza legitimam a apropriação e manutenção das áreas verdes.
Nesta articulação para legitimação da apropriação e gestão de áreas verdes podem
estar presentes elementos que agreguem valor a esta prática, entre eles investimentos nesses
espaços para recuperação de áreas degradadas, projetos de pesquisas e educação ambiental.
Em muitos casos estas ações podem mudar a percepção desta relação de uma forma positiva,
tanto dentro da esfera acadêmica, quanto da relação com a sociedade na qual estes espaços
estão inseridos. Cabe destacar que os critérios de avaliação e legitimidade destas práticas
estão em constante avaliação. A postura de natureza intocável, reservada unicamente para
pesquisadores com a competência de estudá-la e curá-la das interferências humanas já se
mostra insustentável em uma sociedade que buscar restabelecer laços ambientalmente
78
respeitosos com os espaços verdes. Até mesmo para aqueles espaços naturais que são
destinados unicamente para preservação, que foram violentamente degradados ou possuem
uma biodiversidade delicada, ou ainda que não tenham condições de acesso e infraestrutura
que permitam um uso mais ampliado; ainda assim é possível se pensar em atividades que
possam incluí-los em projetos de educação ambiental e gestão ambiental para aproximar os
elementos humanos e não humanos que compõem esta relação.
É relevante também compreender como as universidades enxergam esta relação com
suas áreas verdes frente ao Estado e sua legislação ambiental referente à Áreas de Preservação
Permanente, Reservas Legais e categorias do sistema de gestão das Unidades de Conservação,
como Refúgio de Vida Silvestre e Reserva Particular do Patrimônio Natural. Os jardins
botânicos possuem um regulamento e categorias próprias e também é relevante compreender
como as universidades se portam frente a isso. Como será visto nas análises, algumas
universidades desenvolvem estratégias para a manutenção das áreas verdes sob sua gestão,
não cedendo ao Estado. Entretanto, outras universidades acreditam ser vantajosa a
interferência do mesmo na relação universidade área natural/verde, permitindo que estas
áreas, ou parte delas, sejam transformadas em Unidades de Conservação efetivamente.
A ecologia científica presente dentro das universidades poderia ser um elemento
fomentador do campo de forças desta relação, legitimando-se frente ao público com sua
produção de conhecimento e aplicação em busca de um “equilíbrio ecológico”, seu
pedagogismo e a difusão do ideal de natureza pura e não perturbada. Entretanto, dentro desta
relação também poderá estar presente um uso do espaço natural diferenciado, que agregue um
sentido pedagógico no/do lugar para com os diferentes públicos envolvidos.
As universidades teriam as áreas verdes como lugares com potencial educativo que
valorizariam suas ações de ambientalização, ou esta relação seria apenas figurativa e não
ativa, configurando uma espécie de postura gerada no modelo de dominação da natureza?
Sendo a primeira alternativa verificada, como são incorporadas as áreas verdes em seus
projetos de sustentabilidade? Estas questões serviram de norte para a condução da pesquisa.
A apropriação da natureza material pelas universidades poderia estar ancorada no
modelo de natureza intocável, restrita a um público específico e habilitado. Seriam as posses
das áreas verdes uma solução autoritária para garantir a preservação ambiental já que elas
seriam instituições legítimas para isso? Uma espécie de autoritarismo ecológico?
As relações entre as universidades e áreas verdes são resultados de um contexto
histórico e espacial, sendo constantemente reavaliadas e legitimadas. Esses contextos
condicionam os padrões nas relações universidades/áreas verdes, e também como ocorrem a
79
percepção, julgamento e orientação que justificam/legitimam tais práticas nestas relações.
Este envolvimento das universidades e suas áreas verdes deve se valer de percepções que
possam legitimar socialmente suas ações. Em um enredo ideal, a ideia da sustentabilidade
aparece como uma categoria válida para justificar comportamentos. Como por exemplo, a
instituição universidade, enquanto estrutura de poder, quando se utiliza da concepção de
sustentabilidade para legitimar sua posse material de espaços verdes.
Seguir os envolvidos e ver o que compõe estas relações sem categorias prévias,
seguindo os atores e seus fluxos, articulações e redes que fazem as coisas acontecerem, e
permitir uma análise que levasse em consideraçção um agenciamento recíproco entre as
universidades e as áreas verdes. Dentro desta visão, a natureza teria valor em si mesma, se
fazendo também sujeito dentro do cosmos, entidade como sujeito político. Assim foram
gerados os resultados que serão apresentados a seguir.
80
5 APRESENTAÇÃO DO CAMPO DE PESQUISA
Neste capítulo trago os resultados do campo de pesquisa sobre áreas verdes de
domínio e gestão de oito universidades do Rio Grande do Sul e como estes espaços estão
inseridos em seus processos de ambientalização. Apresento e descrevo também quais os
projetos educacionais que são desenvolvidos nas áreas verdes para discutir seu potencial
como espaços para práticas educativas e de preservação ambiental. Ao leitor desta pesquisa a
intenção é descortinar quais os usos ainda se mantém de forma efetiva e quais foram
colocados em suspensão pela dificuldade do enquadramento das áreas verdes na estrutura
universitária.
5.1 Sobre a criação das áreas verdes: conjecturas sonhadas e contextos reais
Para a realização da pesquisa foram escolhidas oito universidades do estado do Rio
Grande do Sul que atendiam ao critério de possuir sob seu domínio e gestão áreas verdes.
Conforme já referido, o presente trabalho entende como áreas verdes, áreas naturais ou não,
incluíndo espaços construídos (como os jardins botânicos e fazenda experimental), áreas
destinadas por lei para preservação ambiental (Áreas de Preservação Permanente e Reserva
Legal), espaços verdes nos campi e Unidades de Conservação (Refúgio de Vida Silvestre e
Reserva Particular do Patrimônio Natural). Optou-se por chamar áreas verdes e não áreas
naturais pelo entendimento que algumas dessas áreas haviam sido modificadas pelo ser
humano, mas que adquiriram um estatus de áreas protegidas com relevante valor de
preservação ou conservação ambiental e potencialidade de lugares de práticas educativas. O
uso da categoria áreas verdes consegue abarcar os diferentes tipos de espaços encontrados.
Na Universidade Alfa a área verde sob o seu domínio é o Horto Botânico. Na
Universidade Beta, a área verde em questão é a Unidade de Conservação pretendida Refúgio
de Vida Silvestre que ainda necessita sua real implementação. A Universidade Gama traz o
exemplo do uso de uma Área de Preservação Permanente e uma fazenda experimental. Uma
vasta área verde é encontrada na Universidade Delta em espaços verdes no campus e Área de
Preservação Permanente. Além do Jardim Botânico presente na Universidade Épsilon, o seu
campus sede apresenta siginificativo espaço verde, conhecido como Bosque. Na Universidade
81
Zeta, em seu campus sede, também foi possível identificar vasto espaço verde e, na cidade de
em que está localizado seu campus sede, a universidade tem parceria na gestão do Jardim
Botânico. A Universidade Etá faz uso de suas Áreas de Preservação Permanente como
espaços educativos e é recentemente detentora de uma Reserva Particular do Patrimônio
Natural em seu campus sede. O mesmo tipo de Unidade de Conservação pode ser encontrado
sob o domínio e gestão da Universidade Teta.
A pesquisa traz um número significativo de universidades, mas por certo não
contempla todas as unidades acadêmicas de cada instituição. Entretanto, o trabalho trouxe um
inventário e diagnóstico destes espaços verdes e como está atualmente a relação deles com as
instituições as quais estão vinculados. Além da descrição das áreas verdes, a seguir são
apresentadas também um pouco da história, da situação atual, os projetos e ações de
ambientalização das universidades, onde se pode perceber qual o local das áreas verdes nesta
relação. Os textos foram elaborados através da triangulação das informações trazidas por
documentos, interlocutores e visitas in loco.
5.1.1 Horto Botânico Universidade Alfa
O Horto Botânico da Universidade Alfa teve sua criação em 1945, ele é formado por
diversos tipos de vegetação, incluindo um final de fisionomia de Mata Atlântica, campo
arenoso seco, banhado, mata arenícola e mata paludícola. Ele está localizado em uma área
pertencente a uma instituição pública de pesquisa vinculada ao Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento, adjacente a um dos campi da Universidade Alfa. A área do horto,
quando da sua criação, foi doada por esta instituição para a universidade. Dados relatam um
total de 100 hectares que compreendem a área da instituição pública e do Horto, deste total,
foram doados para a Alfa cerca de 13 hectares, ficando o restante para as atividades da
empresa.
A história da criação do Horto se funde à história da constituição do campus em que
ele está localizado e da Faculdade de Agronomia que ali iniciou suas atividades. Inicialmente
pertencente à Escola de Agronomia e Veterinária em 1926, os cursos separam-se em 1934,
tornando a Escola de Agronomia independente. No ano de 1943 é criado um instituto
agronômico, localizado na área que viria a ser o atual campus onde se encontra o Horto. Em
82
1945, a Escola de Agronomia e o instituto agronômico são integrados. É neste ano também a
criação do Horto sobre a tutela de um Irmão da Congregação Lassalista vindo da Espanha.
Na década de 1940, o então instituto agronômico (atual Universidade Alfa) chamou o
Irmão Lassalista41, um botânico de renome, com a intenção de que ele criasse um horto
florestal naquele local, algo inédito e inovador na época, segundo me diz o professor que foi
um dos meus interlocutores. Ele me diz também que o Irmão teria tido a sensibilidade de ver
naquele “mato” o potencial para transformar a área em um horto.
Andando pela via principal da área que costeia o Horto é possível ver do lado
esquerdo resquícios das construções de casas dos operários que lá moravam antigamente. Este
espaço era chamado de Estação Experimental Central, a instituição pública de pesquisa que
ocupava o local desativou as construções há pouco tempo, mandando destruir tudo. No lado
oposto está a área do horto com 13 hectares. Relatos afirmam que como o espaço foi no
passado bastante utilizado para outros fins e possui essa fisionomia de vegetação mista, era
chamado de “mato” (Imagem 1).
Imagem 1: O “mato” do Horto
Fonte: Muhle (2016).
No dia da visita uma garoa fina caia no campus da Universidade Alfa, mas dentro do
horto a mata estava tão fechada que não nos molhamos. Para entrarmos no horto, não
41 O Irmão espanhol da Congregação Lassalista, foi o responsável pelo estudo para a criação do Jardim Botânico
de Porto Alegre em 1952, vindo a ser o primeiro Diretor da instituição.
83
conseguimos usar o que antes era tido como a entrada principal, pois está tomada pelo
asparagus, espécie invasora trazida pelos visitantes e moradores que cresce rapidamente e
acaba fechando esta entrada. Entramos então pela outra entrada e no meio da caminhada por
entre as picadas, é possível ver onde havia uma grande clareira onde antes da criação do Horto
era possível fazer churrascos e festas. O espaço tinha um funcionamento de Jardim Botânico
in situ, era ainda uma concepção de um jardim organizado.
Durante a caminhada é possível observar onde deveriam estar as avenidas, nome dado
pelo Irmão fundador aos trajetos abertos que circundam cinco bosques que orientam o Horto.
Em cada um dos bosques delimitados por ele, foram abertas picadas, travessas e avenidas que
formam polígonos e elas receberam os nomes de grandes botânicos. Entre os nomes
escolhidos pelo Irmão, estão os nomes de pesquisadores do mundo inteiro, incluindo nomes
como o de Barbosa Rodrigues, Carolus Linnaeus e Auguste de Saint Hilaire42, em um total de
mais de setenta nomes. Quase não é possível mais identificar estes trajetos, pois a vegetação
encontra-se em regeneração e cresce de forma a unificar estes polígonos. Apenas as avenidas
maiores, por onde nos locomovemos, podem ser claramente identificadas.
Todo este planejamento idealizado pelo Irmão Lassalista pode ser visto em uma rara43
publicação de 1951 (Imagem 2), elaborado pelo Irmão e diversos colaboradores que o
auxiliaram a escrever de forma minuciosamente detalhada as espécies vegetais e de insetos
que poderiam ser encontrados no Horto. Na introdução do guia (LUÍS, 1951, p. 5) é possível
ler para quem ele foi pensado:
O visitante do ‘Horto Botânico [...]’, certamente, dedicar-se-á ao estudo da Botânica,
ou da Entomologia, ou da Patologia, ou da Ecologia, ou, simplesmente das Ciências
Naturais; (quem sabe?) será talvez um amante apenas da Natureza: para todos será
útil o ‘Horto Botânico [...]’. [...]. Finalmente, para aquele que gosta de apreciar as
‘belezas naturais’, o ‘Horto Botânico [...]’ será um lugar de legítimo prazer em que o
bom gosto se aprimora.
42 João Barbosa Rodrigues, nascido em 1842 em Minas Gerais, foi diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro
e estudou especialmente orquídeas e palmeiras. Carolus Linnaeus, que viveu entre os anos de 1707 e 1778,
nasceu na Suécia e foi o responsável pela criação do sistema binominal da nomenclatura botânica. Responsável
também pela descrição de diversos gêneros e espécies inéditas. Popularmente conhecido no Brasil por Lineu.
Auguste de Saint-Hilare era francês, nascido no ano de 1779 e falecido em 1853, esteve no Brasil entre os anos
de 1816 até 1822. Botânico, naturalista e viajante, possui no município de Viamão um parque municipal com o
seu nome.
43 Pude ter acesso a esta publicação, que seria o único exemplar ao qual se teria notícias ainda, através de minha
interlocutora.
84
Imagem 2: Imagens do livro sobre o Horto Botânico da Universidade Alfa
Fonte: Muhle (2016).
Segundo meus interlocutores, a universidade atualmente não disponibiliza recursos
financeiros para manutenção da área. Afirmaram também que a universidade não demonstra
nenhum tipo de interesse e envolvimento, apenas o Departamento de Biologia/Botânica.
Professores de Ecologia e Zoologia também costumam fazer uso do local, assim como
eventualmente os alunos da Agronomia e Biologia. O local também foi criado na intenção de
servir a comunidade, uma vez que a cidade em que está localizado e seu entorno, não
possuem muitas áreas deste tipo. No momento da pesquisa é relatado que as atividades de
educação ambiental e visitação ao Horto já não aconteciam há algum tempo.
5.1.2 O Refúgio de Vida Silvestre Universidade Beta
O Morro que abriga o Refúgio de Vida Silvestre da Universidade Beta está localizado
na zona urbana da cidade de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul (Imagem 3). Distante
apenas 12 quilômetros do centro da cidade, a área verde está localizada entre algumas das
maiores e mais movimentadas avenidas, a Avenida Bento Golçálvez, a Avenida Protásio
Alves e a Avenida Antônio de Carvalho, fazendo ainda limite com o município de Viamão.
Sua área de ocupação corresponde a aproximadamente 1.000 hectares, sendo que 600 hectares
85
são de propriedade da Universidade Beta. Dentro desta área pertencente à universidade, cerca
de 321 hectares correspondem à Unidade de Conservação.
Imagem 3: Vista aérea de parte do morro onde está localizado o Refúgio de Vida
Silvestre
Fonte: Backes (2016).
A Universidade Beta possui diversos campi espalhados por Porto Alegre e nesta região
do Morro está localizado um destes campi, onde atuam os cursos de Agronomia; Zootecnia;
Ciências Biológicas; Ciências da Computação; Ciências Socias; as Engenharias Ambiental,
Cartográfica, Civil, da Computação, dos Alimentos, de Energia, de Materias, de Minas, de
Produção (e muitas outras); Estatística; Filosofia; Física; História; Geografia; Geologia;
Matemática; Letras; Políticas Públicas; Química e Medicina Veterinária.
Este Morro é o ponto mais alto da cidade, com cerca 311 metros de altitude. Está
inserido em uma paisagem com fisionomias de bioma Pampa e bioma Mata Atlântica onde
possuem pontos de encontro e transição na região fitoecológica da Floresta Estacional
Semidecidual. Segundo Rolim e Guerra (2010), essas características elevam ainda mais sua
relevância ecológica. O local reúne um dos maiores potenciais de recursos da biodiversidade
da flora e fauna da região. Florestas de porte alto e baixo e suas espécies de origem tropical
representam os últimos remanescentes da Mata Atlântica no município e no topo do Morro
podemos encontrar campos de origem chacopampeana.
86
Por ser um local alto e ainda com pouca impermeabilização causada pela construção
de pavimentações e edificações, este Morro é um dos responsáveis pela regarga das águas
subterrâneas do município. No Diagnóstico Ambiental de Porto Alegre (2008), Hasenack e
seus colaboradores caracterizam a vegetação do Morro como campos que “refletem uma
formação relictual com predominância de um clima mais seco e frio em período de até
400.000 anos atrás, que favorecia o estabelecimento de uma vegetação herbácea do tipo
estépica”. Nos dias atuais, os campos no morro ocupam encostas com exposição solar
predominantemente voltada para o norte, onde o solo tem pouca umidade e matéria orgânica.
É possível encontrar campos rupestres e mata subxerófila na encosta norte e no topo do morro
(HASENACK et al., 2008).
Alguns trabalhos já foram realizados para identificar a biodiversidade presente neste
Morro, principalmente na área destinada pela Universidade Beta para conservação (PENTER
et al, 2008; FORNECK, 2001). Já foram registradas mais de 100 espécies de aves, cerca de 13
espécies de mamíferos e mais de 350 espécies vegetais, entre espécies de campo e de floresta.
Algumas das espécies encontradas são de grande relevância para a região. Compreende uma
região com importantes registros de ocorrência de espécies ameaçadas de extinção no RS,
apontadas pelo Livro Vermelho da Fauna Ameaçada de Extinção, como o gato-palheiro
(Oncifelis colocolo) e o sabiá-cica (Triclaria malachitacea).
Antigas pedreiras e saibreiras também podem ser encontradas nas encostas deste
Morro, o que ajuda a delinear seus contornos. Além da área de conservação idealizada pela
Universidade Beta - o Refúgio de Vida Silvestre - o Morro tem outras características que
constituem sua história e das pessoas que ali moram ou circulam. Afora o local de
conservação que a universidade vem tentanto implementar, o restante da área (a maior parte) é
composto pelas áreas construídas da universidade, moradias regulares e irregulares e até
mesmo território indígena.
Segundo fontes históricas, até 1700 o Morro era território tradicional indígena, onde
este grupo caçava, criava animais, e plantava. Esta área é ainda palco de disputa entre os
Kaingang e os não índios, no caso a instituição Universidade Beta. Os Kaingang afirmam que
existe sim um terrítório tradicional, cuja confirmação depende de estudos da Fundação
Nacional do Índio (Funai). A decisão apresentada no Agravo de Instrumento Nº 7807-
73.2010.404.0000/RS em 2011 defere a reintegração de posse em favor da Universidade Beta,
entretanto, permite o acesso dos indígenas à área em questão, para fins de extração da
87
matéria-prima de seu artesanato, fonte do seu sustento44. O Morro não é o único lugar em
Porto Alegre que é reivindicado como um território tradicional indígena45, sendo um local de
coleta de plantas medicinais, de matéria-prima para artesanato, prática de rituais, união com a
natureza e moradia.
O Morro também foi sede da sesmaria concedida à Jeronymo D`ornellas Menezes e
Vasconcelos, português vindo da Ilha da Madeira, em 1740. No Porto do Dorneles (atual
Porto Alegre), já se constituia essa sesmaria junto com outras duas, de Sebastião Francisco
Chaves, no Morro São José; e de Dionísio Rodrigues Mendes, com área que ia do Arroio da
Cavalhada até o Arroio do Salso. Juntos eles constituiam os povoadores e fundadores da
cidade de Porto Alegre, onde mais tarde se juntaram os açorianos (BARROSO, 2011, p. 115).
Esta sesmaria de Jeronymo D`ornellas se estendia do Município de Viamão até onde hoje está
localizada Usina do Gasômetro, em Porto Alegre. Alguns pesquisadores questionam se a sede
desta sesmaria teria sido realmente no ápide deste Morro. Segundo resgistros, as atividades
desenvolvidas na área correspondiam a práticas agropastoris.
De acordo com a instituição, a ideia de se ter uma postura diferenciada para conservar
a localização privilegiada do lugar parece ter surgido ainda na década de 1980, com a vontade
do Reitor da época em criar um Jardim Botânico e uma área de preservação dentro do campus
onde está localizada a área do refúgio. Objetivos esses fomentados pelos interesses científicos
e acadêmicos da universidade, uma vez que poderiam constituir de espaços ricos para
formação dos alunos e também para contribuição da preservação ambiental. A implantação
desses espaços nunca chegou a ser concretizada e aparentemente este assunto ficou preterido
por cerca de uma década.
Com a retomada dessa relação, em 2001, reconhecendo a importância da área, a
universidade denomina a Reserva Biológica da Universidade Beta criando uma comissão
constituída por professores, funcionários e alunos do Insituto de Biociências para dar
encaminhamento a implantação da Unidade de Conservação. Este projeto passou por estudos,
votação em conselho universitário, aprovação da Reitoria e 2004 sua criação foi aprovada.
Sob a premissa de promover “a manutenção dos ecossitemas e a proteção da biodiveridade” o
44 O documento também afirma que, se comprovado pelos estudos da Funai que se trata de território indigena, a
reintegração de posse será dada a comunidade Kaingang que lá residia.
45 Atualmente, o direito dos indígenas demarcarem suas terras no perímetro da cidade de Porto Alegre é
reconhecido pelo poder público municipal. As áreas da aldeia de sete hectares da Lomba do Pinheiro e a área da
aldeia de menos de um hectare da Agronomia já estão amparadas legalmente no caso fundiário específico
Kaingang. A essas se somam áreas domiciliares não reconhecidas pelo poder estatal, como a aldeia do Morro do
Osso, os domínios do Morro Santana (caracterizados por núcleos familiares extensos residentes das vilas Jarí,
Safira e Jardim Protásio Alves) e um núcleo familiar recentemente estabelecido no Morro da Glória (FUHR et al,
2012).
88
local ainda contruibuiria para a finalidade da universidade descrita em um dos artigos de seu
Estatuto: “a educação superior e a produção de conhecimento filosófico, científico, artístico e
tecnológico, integradas no ensino, na pesquisa e na extensão”.
Em 2006 a área passa a ser incluída na categoria de Refúgio de Vida Silvestre que
corresponde, dentro do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), uma unidade
de Proteção Integral, sendo apenas permitido o uso indireto de seus recursos naturais46. Cabe
ressaltar que, mesmo sendo uma unidade de proteção integral, a visitação pública ainda pode
ser permitida desde que obedeça às normas e restrições estabelecidas pelo plano de manejo da
área e órgãos responsáveis. O mesmo vale para a pesquisa científica e aqui podemos incluir a
educação ambiental.
Entretanto, a real implementação da área como uma Unidade de Conservação ainda
não ocorreu apesar de toda a tramitação dentro da instituição. Através do Sistema Eletrônico
do Serviço de Informação ao Cidadão (e-SIC) foi possível ter acesso ao projeto encaminhado
ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e o
parecer concedido à Universidade Beta. A resposta do IBAMA, que na época era o
responsável pelas questões referentes às Unidades de Conservação47, foi negativa, afirmando
que a instituição não teria interesse em manter uma área do tamanho diminuto da reserva, mas
reconhece como louvável a iniciativa da universidade. O órgão ambiental sugere que ainda
haveria a possiblidade da tramitação dentro das esferas Estadual e Municipal com seus
Sistemas de Unidades de Conservação específicos. Pelo tamanho da área, sua preservação
teria relevância local. Aqui se apresenta outro embate: a área pertecente a Universidade Beta é
de domínio federal, o que fugiria da competência dessas esferas, estadual e municipal.
A Assessoria de Gestão Ambiental é o setor responsável pela implementação e
acompanhamento do Sistema de Gestão Ambiental da Universidade Beta. Vinculada ao
gabinete do reitor, tem como principal atribuição acompanhar os processos que apresentem
aspectos relacionados ao meio ambiente. Este setor desenvolve ações principalmente visando
o descarte correto dos resíduos produzidos pela universidade. Esse também seria o setor que
teria responsabilidades sobre Refúgio de Vida Silvestre, entretanto uma entrevista referente a
este assunto foi negada à pesquisadora.
46 Segundo o prórpro documento do SNUC, Refúgio de Vida Silvestre tem como objetivo proteger ambientes
naturais onde se asseguram condições para a existência ou reprodução de espécies ou comunidades da flora local
e da fauna residente ou migratória.
47 Atualmente é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) quem coordena as
questões referentes às Unidades de Conservação.
89
5.1.3 Áreas de Preservação Permanente Universidade Gama
A Universidade Gama está localizada na região da metade sul do estado do Rio
Grande do Sul. Criada no início de 2008, atualmente a universidade conta com dez campi
localizados em Alegrete, Uruguaiana, São Gabriel, Bagé, Caçapava do Sul, Dom Pedrito,
Itaqui, Jaguarão, Santana do Livramento e São Borja. A mesorregião sul do estado faz
fronteira com a Argentina e o Uruguai e ainda contempla uma parte do litoral gaúcho. Em
termos de economia, esta área se caracteriza por apresentar uma estrutura agrária de grandes
latifúndios e pecuária extensiva.
A característica marcante da região é a presença do bioma Pampa, exclusivo do Rio
Grande do Sul dentro do Brasil. As paisagens naturais do Pampa são variadas, de serras a
planícies, de morros rupestres a coxilhas. O bioma exibe um imenso patrimônio cultural
associado à biodiversidade. Caracteriza-se pelo predomínio dos campos nativos, mas há
também a presença de matas ciliares, matas de encosta, matas de pau-ferro, formações
arbustivas, butiazais, banhados, afloramentos rochosos, etc. Por ser constituído de um
conjunto de ecossistemas muito antigos, o Pampa apresenta espécies de flora e fauna únicos e
grande biodiversidade, ainda não completamente descrita pela ciência. Em termos de
conservação, o bioma Pampa é o que apresenta menor porcentagem de áreas protegidas dentro
do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) em comparação com todos os
outros biomas.
Durante seu período de instalação a Universidade Gama contou com o auxílio de
universidades federais já consolidadas no estado48. Na cidade de Uruguaiana, uma
universidade particular de Porto Alegre sediava um campus que, conforme a própria
instituição apontou, não havia como manter os cursos de graduação por falta de alunos. Um
convênio de cooperação foi firmado com a Universidade Gama que passou ocupar o espaço
físico do campus. Algumas áreas destindas para a instalação dos outros campi compreendem
áreas que a instituição ganhou por doação, o que caracterizou alguns espaços como pequenos
e sem áreas verdes. O campus de Uruguaina, por já ter sido uma estrutura criada para ser um
campus de outra universidade, é o campus que atualmente apresenta mais infraestrutura e área
48 A Universidade Gama faz parte do programa de expansão das universidades federais no Brasil. Um Acordo de
Cooperação Técnica financiado entre o Ministério da Educação, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM)
e a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), prevê a ampliação do Ensino Superior na metade sul do estado do
Rio Grande do Sul.
90
verde. Assim me explica o professor que foi um dos meus interlocutores na Universidade
Gama:
“O Campus Uruguaiana, mesmo apresentando ainda a necessidade de adequações
de infraestrutura, é atualmente um local preparado para desenvolver as atividades
inerentes para um Campus Universitário. Hoje em dia conseguir áreas que sejam
interessantes para a construção de uma Universidade não é tarefa fácil na região,
especialmente em virtude da característica de produção do setor primário, desta
forma, tivemos uma excelente oportunidade para aproveitarmos as antigas
instalações do camnpus já existente aqui”.
No campus de Uruguaiana cruza um arroio que configura a área dentro do campus em
que está localizado, uma Área de Preservação Permanente (APP). Na parte do arroio que se
encontra dentro do campus foi feita uma barragem de cerca de três hectares (Imagem 4). A
presença dessa área tem permitido um uso didático para os alunos dos cursos de Ciências da
Natureza e Tecnologia em Acquicultura.
Imagem 4: Área de Preservação Permanente da Universidade Gama em Uruguaiana
Fonte: Muhle (2016).
O campus de Uruguaiana como um todo apresenta um potencial para aulas práticas
fora da sala de aula por apresentar uma configuração própria. Além da presença do arroio com
sua barragem, o local tem uma conformação própria do bioma Pampa, com sua vegetação de
campo. Por ser um campus onde ocorrem os cursos de Ciências da Natureza, Medicina
91
Veterinária, Tecnologia em Acquicultura, além dos cursos de Fisioterapia, Educação Física,
Enfermagem e Farmácia, no local também existem fazendas escolas, laboratórios
experimentais, cultivo de gado. São 250 hectares de área com potencial para ser explorado,
mas ainda muito incipiente, afirma o Diretor do campus.
Embora o campus de Uruguaiana tivesse sido o campus visitado com maior uso
didático dos espacos verdes, a pesquisa visitou também o campus de Dom Pedrito, de
Caçapava do Sul e de Alegrete. A visita realizada ao campus da Universidade Gama em
Alegrete permitiu uma conversa com o Pró-Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação.
Nesse encontro conversamos sobre as diferentes histórias de criação, construção e ambiente
natural dos diferentes espaços:
A primeira área do campus, porque a Universidade tem 10 anos, foi criada
em 2006 e a maioria desses terrenos, cada cidade teve uma história diferente,
de criação e de construção. Em Uruguaiana, por exemplo, era o campus que
foi comprado da universidade particular. Nos outros lugares, aqui em
Alegrete por exemplo foi criado do zero, não tinha nada aqui neste local,
aqui era área do antigo aeroporto que tava sobre o domínio da prefeitura e
depois passou pra universidade, mas aqui não tem nenhuma área de
preservação”.
Ainda vivenciando os processos de instalação e ocupação está também o campus em
Caçapava do Sul49. O local oferece os cursos de Engenharia Sanitária e Ambiental,
Licenciatura em Ciências Exatas, Geofísica, Geologia e Tecnologia em Mineração, os quais
no momento em que se deu a visitação dividiam um único prédio. Por estar localizado em
uma área muito pequena (cerca de 5 hectares), onde já não era possível a construção de novos
prédios, o campus ganhou uma segunda área bem próxima a primeira. Entretanto, enfrenta
dificuldades em conseguir um laudo que ateste as condições do banhado que está localizado
na área. Existe a dúvida se seria ou não uma Área de Preservação Permanente. A outra
dificuldade para a ocupação desta segunda área é a escassez de recursos financeiros, segundo
a Diretora do campus. O esqueleto de dois prédios onde seriam os laboratórios e a cantina já
estão contruídos, falta a verba para que seja possível teminar essas obras. Apesar destas
dificuldades, o campus de Caçapava do Sul ainda mantém futuros projetos - ainda que
pareçam distantes de serem possíveis em um curto ou médio prazo - da construção de uma
49 Estão em andamento os processos para a obtenção da Licença Ambiental nos campi de Caçapava do Sul, Bagé,
Dom Pedrito e Jaguarão. O campus de Santana do Livramento, que está em área totalmente urbana e localizado
em um quarteirão sem áreas verdes e naturais, foi a primeira unidade da Universidade Gama a obter esta licença.
92
casa de estudantes, quadras poliesportivas e um museu a céu aberto, no qual se poderia
observar e caminhar pelas rochas.
Em Dom Pedrito, o campus da Universidade Gama possui uma área que está
localizada dentro da cidade e uma área experimental (Imagem 5) afastada da cidade cerca de
oito quilometros. Esta área experimental50 foi adquirida recentemente e suas atividades ainda
estão no início, desde a instalação de energia elétrica, até a construção de uma infraestrutura
para a realização das atividades dos cursos de Tecnologia em Agronegócio, Zootecnia,
Enologia e as Licenciaturas em Educação do Campo e Ciências da Natureza. Em visita a estas
duas unidades do campus em Dom Pedrito foi possível identificar projetos de educação
ambiental. Em conversa com o Diretor do campus, ele faz referência a um possível futuro
projeto a ser desenvolvido ou na nova área experimental ou na sede na cidade:
“Nós temos os próprios cursos que trabalham a linha de educação, alguns
projetos que trabalham com educação ambiental que eles usam de algumas
temáticas pra trabalhar a educação ambiental, como a arborização por
exemplo, e que tem projeções de em algum momento utilizar. Se não essa
área, algumas estruturas que nós temos aqui que são duas estufas e ai a gente
poderia, por exemplo, usar as estufas pra poder também preparar as mudas...
O que poderia ser feito em algum momento lá ou aqui”.
Imagem 5: Fazenda experimental da Universidade Gama
Fonte: Muhle (2016).
50 Essa área experimental, também conhecida por fazenda experimental, será apenas citada nesta parte do
trabalho, não sendo incluída nas futuras análises.
93
Segundo o Pró-Reitor de Pesquisa, Pós-Graduação e Inovação, ações de gestão
ambiental devem ser pensadas dentro da Universidade Gama, mas a instituição ainda não está
em uma inserção profunda nisso. Ele acredita que estas discussões estejam ocorrendo
localmente, em cada campi, mas ainda não configura uma postura institucional por se tratar de
uma universidade muito jovem. Todos os prédios construídos nos campi da Universidade
Gama a partir de 2010 e 2011, já possuem captação de água da chuva que é armazenada em
cisternas e depois aproveitada nas descargas dos banheiros. A coleta seletiva dos resíduos
também é promovida pela Reitoria e ocorre em todos os campi. No entanto, segundo o Pró-
Reitor, nem todos os municípios da região possuem ainda este tipo de coleta. Sobre os
espaços verdes e naturais que são pesquisados neste trabalho ele diz que “é bom tu colocares
isso porque motiva também quem não esta organizado ainda a aproveitar esses espaços e não
achar simplesmente que é um problema, por não poder construir ali”.
5.1.4 Áreas verdes - Universidade Delta
Além do campus principal em São Leopoldo, a Universidade Delta está presente em
Porto Alegre, Caxias do Sul, Bento Gonçalves, Santa Maria e Canoas, no Rio Grande do Sul,
Florianópolis, em Santa Catarina, e Curitiba, no Paraná. É uma universidade com 47 anos de
funcionamento e que possui grande relevância na região Sul do Brasil. Criada oficialmente
em 1969 na cidade de São Leopoldo51, a universidade é mantida por uma entidade sem fins
lucrativos, vinculada à uma organização religiosa.
Para a criação do campus em São Leopoldo foi necessária uma grande alteração no
ambiente, inclusive com a abertura de uma avenida de 2,5km de estensão que liga o campus à
BR-116. A vegetação original da área tambem foi suprimida para que fosse possível a
construção da infraestrutura da universidade. No ano de 1992, a pedido de professores de
Botânica e Ecologia, entre eles o Professor e Padre Jesuíta entusiasta da ideia, a Universidade
Delta cria uma área de preservação no seu campus (Imagem 6). Com um total de 24.600
metros quadrados, a área foi criada com o obejtivo de ser um local para as aulas práticas e
para os alunos “que terão seu campo de estudo ao lado da sala de aula”.
51 Em 1953, a Sociedade Literária Padre Antonio Vieira funda a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de São
Leopoldo, germe da Universidade Delta, que data de 1969 (GRAZZIOTIN e KLAUS, 2016).
94
Imagem 6: Área de preservação da Universidade Delta no campus em São Leopoldo
Fonte: Muhle (2016).
Um grupo de estudos e pesquisas em educação ambiental que não é oficial, não é
extensão e é voluntário. Assim é o Grupo de Educação Ambiental da Universidade Delta
situado no Espaço Ambiente e Vida52, localizado no campus em São Leopoldo. Fundado por
um professor que via nas áreas verdes grande potencial educativo através da prática de
trilhas53, e posteriormente veio a ser conduzido pela Professora de Biologia que se tornou
minha interlocutora54, o grupo é frequentado alunos de diversos cursos da universidade. O
Grupo de Educação Ambiental não recebe nenhum auxílio financeiro da universidade, mas se
utiliza do espaço verde no campus para a realização de diversas trilhas com alunos da rede
básica de ensino e também universitários.
No campus da Universidade Delta em São Leopoldo existe uma Área de Preservação
Permanente por onde algumas trilhas passam e que faz divisa com a Reserva Florestal Padre
Balduíno Rambo55. A área de preservação da universidade apresenta um dossel de eucaliptos,
52 A criação do Espaco Ambiente e Vida foi financiada por um banco financeiro.
53 Falecido em julho de 2014.
54 Durante a realização da pesquisa a Professora de Biologia, uma das minhas interlocutoras, foi demitida da
Universidade Delta.
55 Balduíno Rambo foi um padre jesuíta de ascendência alemã que inspirou o movimento ambientalista gaúcho
com seus escritos sobre a flora existente no Rio Grande do Sul. Também botânico apaixonado, Rambo lançou
em 1942 “A Fisionomia do Rio Grande do Sul”, livro com a primeira descrição completa do meio físico em todo
o território gaúcho. Indentificou e classificou plantas, solos, acidentes geográficos e já naquela época defendia a
criação de parques para a preservção (BONES; HASSE, 2002). A Reserva Florestal do Parque Zoológico da
95
espécie exótica, mas sua vegetação de borda e interna já está apresentando espécies vegetais
diversificadas.
Há no campus também uma área chamada de península, localizada à margem leste do
lago de um dos centros da universidade. O que caracteriza esta península é uma praça que
recebe o nome do Padre Professor (Imagem 7), espaço no campus onde todas as árvores
teriam sido plantadas por ele. Lugar convidativo onde as espécies vegetais tanto nativas, como
exóticas, estão em uma distribuição planejada, para proporcionar a circulação contínua de
pessoas. O solo é todo coberto de gramíneas ou revestido por cascalho, além disso, a área
conta com bancos e lixeiras, o que indica a intenção de uso para lazer.
Imagem 7: Praça da Universidade Delta
Fonte: Muhle (2016).
A Universidade Delta foi a primeira universidade a receber a certificação internacioanl
ISO 14.00156 na América Latina no ano de 2004 e vem mantendo esta certificação até hoje.
Sendo normalmente empregada em empresas de outros seguimentos, como por exemplo o
Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul passa a se chamar, em 2002, de Reserva Florestal Padre Balduíno
Rambo em homenagem às contribuições dadas ao estado pelo professor e pesquisador (DECRETO Nº 41.891).
56 Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a NBR ISO 14.001 é uma norma aceita
internacionalmente que define os requistos para colocar um sistema da gestão ambiental em vigor. Ela ajuda a
melhorar o desempenho das empresas por meio da utilização eficiente dos recursos e da redução da quantidade
de resíduos, ganhando assim vantagem competitiva e a confiança das partes interessadas (ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2015).
96
ramo da contrução civil e o ramo alimentício, a Universidade Delta, que é uma empresa do
ramo educacional, viu nesta certificação uma forma de atestar “o comprometimento da
universidade com o controle dos impactos ambientais de suas atividades, produtos e
serviços”. Em entrevista com a Assistente Administrativa do Sistema de Gestão Ambiental da
Universidade Delta (SGA), ela afirma que no ano de 2002 se começou a busca pela
certificação, o que obviamente envolveu uma série de etapas e mundanças na gestão
ambiental da universidade e no ano de 2004 a certificação foi alcançada. Segundo ela, a
instituição religiosa que mantém a universidade sempre possuiu preocupação com as questões
ambientais e com o crescimento que a universidade buscava, o que exigiu um maior
comprometimento com essas questões.
Esta certificação não é obrigatória para a implantação da gestão ambiental nas
universidades que podem executar uma gestão sem este documento. Entretanto é inegável que
expõe o comprometimento da Universidade Delta, no campus de São Leopoldo, em tentar
gerar o menor impacto ambiental em suas atividades e sua responsabilidade com o ambiente
em que está inserida. A instituição, pioneira nesta ação, teve que estabelecer protocolos,
procedimentos, instruções operacionais e manter a conservação do campus, em um total de 90
hectares com edificações administrativas, laboratórios, cantinas, salas de aula, serviços, lagos
artificiais, estação de tratamento de efluentes, áreas verdes e estacionamentos. Para a
Assistente Administrativa,
“Então foi um passo assim, ousado pela universidade. Então o campus já era na
época 90 hectares. Então tudo isso faz parte da certificação. É uma virtude que eu
considero um diferencial muito grande. Porque as vezes até a implantação é mais
fácil, agora a manutenção desse certificado, não. É bastante trabalhoso”.
A universidade fez a padronização de seus procedimentos visando seguir as
legislações ambientais cabíveis e passou a somente estabelecer parcerias com empresas que
atendam a legislação ambiental. A universidade é auditada a cada três anos e cada vez novos
desafios são impostos. Quando questionada sobre o envolvimento da Reitoria na
implemantação deste tipo de gestão ambiental visando a ISO 14.001, a entrevistada me diz
que “tem que ter a colaboração de todo mundo, e tem que ter o aval do respaldo da alta
administração. Senão tu não consegues”.
Não há dúvidas sobre o êxito quando são relatadas as ações do SGA pela minha
interlocutora. Ela não nega as dificuldades que são enfrentadas para a manutenção desta
certificação internacional da ISO 14.001. Todavia, a universidade tem conseguido manter este
97
status desde 2004 e atualmente auxilia instituições que tenham este mesmo objetivo. A equipe
do SGA é composta por quatro membros e ele se configura como setor vinculado a Diretoria
de Administração e Infraestrutura. A Universidade Delta repassa verba ao setor através de um
orçamento previsto anualmente e quando há algum gasto imprevisto a coordenadora do setor
deve solicitar, o que algmas vezes é atendido ou não.
Sobre o envolvimento do SGA especificamente com as áreas verdes do campus e o
Grupo de Educação Ambiental que existe na universidade, e usa essas áreas verdes para a
realização de trilhas, ainda não há uma relação consolidada. O setor já fez a identificação do
que é área de conservação, do que é área de preservação permanente e o que é gramado no
campus, inclusive fez este georeferenciamento com a intenção de no futuro construir um
jardim botânico. Existe uma aproximação entre o setor de gestão ambiental e o pessoal do
curso de Biologia, incluindo aqui o Grupo de Educação Ambiental. A ideia é que quando da
existência do jardim botânico, as trilhas pelo campus sejam oferecidas como uma atividade do
jardim. Também já houve tratativas de tentar incluir as trilhas nos treinamentos do SGA.
Entretanto, esta parceria tem esbarrado e estagnado por questães de disponibilidade nas
agendas de ambas as partes. Com relação ao envolvimento da gestão ambiental com a
comunidade externa ao campus, as dificuldades são a demanda de recursos financeiros e
também pessoal. Na visão da Coordenadora do Grupo de Educacao Ambiental, o SGA é um
grupo pequeno que se vira com pouca verba para cumprir as normas da ISO 14.001.
Para a Assistente Administrativa do SGA, a postura da Universidade Delta no campus
de São Leopoldo se reflete sim nas pessoas que costumam frequentar a área. Segundo ela,
“Como o campus é aberto pra visitações então o pessoal, a comunidade, entra e sai
daqui do campus quando bem entende. Porque hoje nós não temos mais portões. O
que tem de gente de fora que vem caminhar dentro do campus, e eu falo isso com
convicção de que eles vão levar isso pra fora daqui”.
A Universidade Delta tem servido de modelo a outras instituições de ensino em
relação a sua gestão ambiental. Todavia, a assistente não deixa de reconhecer as dificuldades
na parte operacional que isso envolve. Além de uma equipe reduzida e de uma verba que,
apesar de existir, não é abundante, existe também a parte da fiscalização, da cobrança e da
insistência. Apesar de ser uma postura institucional, as mudanças no comportamento
ambiental ainda são individuais e nem sempre isso tem a mesma relevância para todos.
Segundo a entrevistada, isso faz parte, é algo inevitável, e uma vez que a universidade decidiu
assumir essa postura, voltar atrás seria um retrocesso.
98
5.1.5 O Jardim Botânico e o Bosque Universidade Épsilon
Seja consciente de seu papel como agente de transformação do planeta num local
agradável e habitável. Repense seu desejo de consumir, preferindo trazer frutas,
cereais integrais, sucos, verduras e legumes nos seus lanches. Substitua o plástico
pelo papel ou vidro, prefira o papel reciclado. Deixe de alimentar a sociedade de
consumo e assim gere menos lixo. De qualquer forma, não atire lixo no chão, temos
recipientes próprios para a coleta seletiva (Comunicado da direção do Jardim
Botânico aos visitantes).
O Jardim Botânico da Universidade Épsilon está localizado dentro do campus da
universidade em Santa Maria (Imagem 8). Criado em 1981 com a missão de ser um local para
a conservação das espécies florestais nativas do Rio Grande do Sul e também ser base de
apoio às atividades de ensino, pesquisa e extensão, o Jardim Botânico também é um jardim da
cidade, local de visitação gratuita e aberto ao público para visitação. Um dos seus objetivos
principais na época de sua criação era atender a rede de ensino municipal, estadual, pública e
privada e os próprios estudantes da universidade.
Imagem 8: Placa da entrada do Jardim Botânico da Universidade Épsilon
Fonte: Muhle (2016).
Nesta área é possível ver mais de 300 espécies vegetais dos mais variados locais do
mundo, desde uma palmeria-moinho-de-vento (Trachycarpus fortunei), originária da China
até o angico-branco (Albizia austrobrasilica) natural do sul Brasil. Apesar do grande número
99
de espécies exóticas, o jardim vem dando maior atenção às espécies nativas da região57. Há
espaço para a realização de trilhas, espaço para as plantas medicinais e as carnívoras. Existe
também uma infraestrutura construída para receber alunos e demais visitantes. É um lugar
com possibilidades de práticas de ensino e pesquisa.
O Jardim Botânico está enquadrado como órgão suplementar do setor responsável
pelas Ciências Naturais e Exatas da Universidade Épsilon e está sob a direção do Professor de
Botânica que foi um dos interlocutores da pesquisa. Por fazer parte deste setor, o Jardim se
mantém através de recursos vindos da Pró-Reitoria de Infraestrutura que fornece sua base de
apoio e logística. Os problemas que surgem no local que são de ordem técnica são resolvidos
pelo suporte técnico da universidade. O Jardim, enquanto instituição, se preocupa com a parte
da conservação vegetal, ensino e pesquisa. Segundo o Professor, a universidade fornece apoio
financeiro e técnico suficiente para o funcionamento do lugar. “Aqui ele é reconhecido como
Jardim Botânico da Universidade. É um espaço que é reconhecido como um espaço de
educação pública, de extensão”.
O local oferece visitas monitoradas com agendamento prévio para escolas ou grupos,
mas a visitação não guiada é livre, sem precisar de agendamentos. Para as escolas que querem
visitar a área, normalmente é feita uma atividade personalizada buscando juntar questões
ambientais, o Jardim Botânico e alguma matéria que estejam trabalhando em sala de aula
quando a escola pede por auxílio no desenvolvimento de algum conteúdo. Segundo o site
institucional do Jardim, esta preparação pré-trilha é vista como um plano de visitação que
“serve como referência para o guia estudar e se preparar, desenvolvendo a escrita e a
imaginação na hora de elaborar a trilha”. As atividades são guiadas pelos estagiários do
Jardim e muitas vezes acompanhadas também pelo Professor Diretor.
A equipe do Jardim Botânico, conta com o Diretor, um Biólogo, um Secretário
Administrativo e dois ou três estagiários (mais os funcionários responsáveis pela manutenção
do espaço). A interação do Jardim com as escolas já passou por diversas tentativas de uma
relação mais profunda e contínua de projetos de educação ambiental, entretanto por problemas
de ordem prática, orçamentários, de logística e diponibilidade, não foram implementados.
Atualmente a equipe do Jardim está trabalhando com oficinas bem direcionadas aos interesses
da escola. No Jardim também é possível visitar o espaço das plantas carnívoras (Imagem 9).
57 Segundo resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) nº339/2003 presente no Manual de
Orientação para Solicitação de Registro e Enquadramento dos Jardins Botânicos, de acordo com o Quesito VI os
Jardins Botânicos devem possuir coleções especiais representativas da flora nativa, em estruturas adequadas
(PEREIR; CONTI, 2012).
100
Imagem 9: Viveiro e setor das plantas carnívoras do Jardim Botânico da Universidade
Épsilon
Fonte: Muhle (2016).
Uma nova sede está sendo construída no local com o objetivo de atender melhor as
escolas, com possibilidade de se trabalhar mesmo em dias de chuva, local para a projeção de
vídeos e para o lanche. A ideia é também centralizar nesta nova sede, a salas do Secretário
Administrativo, do Biólogo e a coleção do herbário, que atualmente ficam no prédio do curso
de Biologia.
Com relação a percepção dos colegas de áreas distantes da Botânica e Biologia sobre a
existência do Jardim Botânico dentro da universidade, o Professor Diretor me afirma que há
uma relação positiva:
“Todo mundo aqui entende que o Jardim Botânico é um espaço de extensão. Um
espaço que é mantido pra visitação. Inclusive espaço didático. Tem muitos que dão
aula ali. Então é um espaço de extensão, um espaço de ensino. Mesmo porque assim
boa parte está em conservação in situ, principalmente a parte que tem ali os
córregos, onde tem mata nativa. E as outras partes onde é cultivado, onde é mantida
a grama então é espaço de visitação”.
Segundo o Professor Diretor, o Jardim Botânico da Universidade Épsilon não poderia
ser considerado um ponto turístico da cidade. Para ele, apesar da divulgação no site próprio e
redes sociais, o conhecimento do local ainda é restrito. Por questões trabalhistas o Jardim não
abre aos finais de semana, o que pode dificultar a sua visitação pelo público geral. Porém, o
campus de Santa Maria fica aberto aos finais de semana e suas áreas verdes, além do Jardim
Botânico, são atrativos para a população. Para o meu interlocutor: “o campus em si é o ponto
101
turístico. É um lugar agradável, o pessoal vem sábado e domingo pra passear, traz criança,
traz cachorrinho, anda de bicicleta. E aí tem atividades também que a Reitoria organiza no
Viva o Campus, que é extensão”.
O campus da Universidade Épsilon em Santa Maria possui vasta área verde, o que o
torna realmente atrativo para visitações e práticas de exercícios, principalmente no local que é
conhecido como o Bosque da Universidade. Criado em 1977, certamente o Bosque é um dos
locais preferidos por quem visita o campus. Lá podem ser vistos jacarandás, cedros, ipês roxo
e amarelo, aroeiras, corticeiras, timbaúvas, entre outras. No ano da criação do Bosque essas
espécies vieram a partir dos próprios viveiros da cidade, e foram plantadas com o objetivo de
compensar as espécies vegetais que foram abatidas (CHAGAS, 2015).
A Universidade Épsilon está localizada no centro geográfico do Rio Grande do Sul e
foi a primeira universidade federal criada fora de uma capital brasileira, assim o estado foi o
primeiro da Federação a ter duas universidades federais. O campus central da universidade,
que é o campus em Santa Maria, tem sua sede localizada na Cidade Universitária, onde
acontece a maior parte de suas atividades acadêmicas e administrativas e foi o local visitado
durante a presente pesquisa, uma vez que hospeda o Jardim Botânico e o Bosque. A
universidade possui, ainda, quatro campi fora de sede, um em Frederico Westphalen, um em
Palmeira das Missões, um em Silveira Martins e outro em Cachoeira do Sul.
Em termos de gestão ambiental, a universidade tem o que denomina de Planejamento
Ambiental, composto por duas frentes: o Setor de Planejamento Ambiental, órgão da Pró-
reitoria de Infraestrutura, e a Comissão de Planejamento Ambiental. Em termos resumidos, o
primeiro é o responsável pela parte operacional e infraestrutura ambiental, e o segundo pela
parte consultiva e de planejamento. Ambos os setores trabalham em conjunto, sendo que o
Setor de Planejamento Ambiental, apesar de ter estrutura física, uma sala, é composto
atualmente por uma pessoa. Já a comissão apresenta um número maior de participantes e é
coordenada por uma professora da universidade. A Comissão de Planejamento Ambiental é
um órgão consultivo, voluntário, formado por professores, técnicos administrativos e alunos.
Meus interlocutores, a Professora e Coordenadora da Comissão e o Engenheiro
Químico Chefe do Setor de Planejamento Ambiental, afirmam que os trabalhos se
complementam uma vez que as atribuições do setor são muitas. A parte de pensar a
universidade, planejar e tentar resolver questões ambientais é feita pela Comissão. A parte do
que fazer, o mais concreto é com o Setor de Planejamento Ambiental. Segundo a Professora:
“Na verdade assim, a questão da gestão ambiental eu acho que ela está funcionando
102
de uma forma melhor e assim eu acho que a gente está vendo várias coisas
acontecerem pela facilidade que a gente tem de trabalhar em conjunto. Não que a
estrutura facilite, entendeu [...]. Ela não tem espaço físico, ela não tem estrutura
administrativa, ela não tem nada. Então na verdade dentro da estrutura de
universidade é aquele setor que quando um incêncio toma proporções tu tem alguém
pra tentar tecnicamento encontrar uma explicação pra amenizar a questão. Isso
sempre foi assim”.
Existe a união e parceria entre as partes que compõem o Planejamento Ambiental da
Universidade, o que já resultou em algumas ações de sucesso. Entretanto, as frustrações e
dificuldades também são comuns, como o caso da separação de resíduos que até junho de
2016 a universidade não realizava. Em cumprimento ao Decreto nº5940, publicado em 25 de
outubro de 2006, e que “institui a separação dos resíduos recicláveis descartados pelos órgãos
e entidades da administração pública federal direta e indireta, na fonte geradora, e a sua
destinação às associações e cooperativas dos catadores de materiais recicláveis, e dá outras
providências” (BRASIL, 2006), a universidade está somente tendo sucesso na sua
implementação no ano de 2016. Após algumas tentativas fracassadas e projetos que iniciaram
e estagnaram, agora a universidade está conseguindo cumprir o decreto. Segundo a Professora
Coordenadora da Comissão de Planejamento Ambiental, “nós estamos trabalhando fortemente
na coleta seletiva que a universidade até então não tinha separação de resíduos. O decreto já é
de 2006. Nós estamos 10 anos atrasados.”
Existe um projeto maior na universidade que visa abarcar todas estas questões
referentes à gestão ambiental do campus. Intitulado de Plano de Logística Sustentável (PLS),
o projeto foi criado a partir do Decreto 7746 de 05 de junho de 201258. Esse plano pretende
iniciar um sistema de medição de consumo de água e energia elétrica para posteriormente
propor medidas de redução. Outra iniciativa realizada a partir do Plano de Logística
Sustentável foi a criação de um projeto visando a união de todos os setores da universidade
voltados para a questão ambiental. Este projeto visa divulgar, através do seu site, as iniciativas
institucionais de responsabilidade ambiental, os objetivos e campanhas em prol do ambiente.
A iniciativa também visa dar visibilidade à uma imagem de universidade sustentável da
Universidade Épsilon, percepção que a Professora e o Engenheiro Químico corroboram:
58 O Decreto 7746 institui, entre outras coisas, que “a administração pública federal direta, autárquica e
fundacional e as empresas estatais dependentes deverão elaborar e implementar Planos de Gestão de Logística
Sustentável, no prazo estipulado pela Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação”. Neste plano são
exigidos no mínimo a atualização do inventário de bens e materiais do órgão e identificação de similares de
menor impacto ambiental para substituição; práticas de sustentabilidade e de racionalização do uso de materiais e
serviços; responsabilidades, metodologia de implementação e avaliação do plano; e ações de divulgação,
conscientização e capacitação (BRASIL, 2012a).
103
“Com certeza. A imagem, com absoluta certeza. O trabalhar essa imagem, de que se
tem essa preocupação isso é responsabilidade social, socioambiental. Então a gente
tem trabalhado direto nisso e a gente percebe, por exemplo, a própria influência
considerando Santa Maria que é uma cidade onde a universidade é maior empresa da
cidade. A universidade tem uma grande influência sobre a cidade como um todo.
Então tu percebes que as coisas que a gente faz aqui dentro elas servem de referência
pra muitos seguimentos. [...] A gente serve como exemplo, a gente serve como
referência, a gente tem que ter uma responsabilidade no fazer melhor e no fazer bem
feito. Não estamos vendendo um produto porque não somos uma universidade
privada, mas vendemos uma imagem sim porque a gente tem consciência da
influência que a universidade tem e da própria coerência que tu tem que ter em
termos de ensinar e fazer” (Professora e Coordenadora da Comissão de
Planejamento Ambiental).
“E tem a preocupação com o próprio recurso, a origem do recurso que na verdade é
um recurso originário da população. A gente tem que ter a melhor eficiência pra isso
aí” (Engenheiro Químico Chefe do Setor de Planejamento Ambiental).
Com relação ao Jardim Botânico não há nenhum tipo de gerência destes setores.
Como o Setor de Planejamento Ambiental está ligado à Pró-Reitoria de Infraestrutura e as
questões de licenciamento e licitações da construção da nova sede no espaço do Jardim devem
passsar por ele, este é o tipo de relação que os envolve: infraestrutura e construção.
Teoricamente a Comissão de Planejamento Ambiental também não tem nenhum
envolvimento com o Jardim Botânico, mas a coordenadora afirma que acabam participando
por entenderem que é necessário. Para ela essa não obrigatoriedade é um grande equívoco da
estrutura não formal que a Comissão possui.
5.1.6 O Jardim Botânico de Caxias do Sul Universidade Zeta
O Jardim Botânico de Caxias do Sul (JBCS), localizado na cidade de Caxias do Sul
(RS), possui cerca de 70 hectares e está situado na Bacia Hidrográfica do Arroio Dal Bó,
junto à Represa São Paulo. Criado em 1992, o lugar foi pensado com o objetivo principal de
seguir a missão dos Jardins Botânicos: promover a conservação, preservação e pesquisa da
flora, dando ênfase às espécies ameaçadas de extinção, e realizar atividades educacionais que
visem conscientizar a comunidade sobre a importância de conservar a biodiversidade e
proteger o meio ambiente (MIRANDA, 2009).
Para transformar a área em um Jardim Botânico foram realizados diversos estudos
conduzidos pelo Professor da Universidade Zeta59 que incentiva a criação de Jardins
Botânicos. Através de levantamentos e diagnósticos, tanto em relação a criação da área de
59 Falecido em janeiro de 2014 na cidade de Caxias do Sul.
104
preservação, como com relação aos recursos que seriam necessários para tal implantação, ele
foi o responsável por iniciar este processo. Com o apoio do então Gabinete Municipal de
Planejamento e Secretaria da Agricultura em 4 de abril de 1990 é proposta sua criação pela
Lei Orgânica do Município. Sua implementação se dá apenas 7 de dezembro de 1992
(Imagem 10).
Imagem 10: Vista da entrada do Jardim Botânico de Caxias do Sul
Fonte: Muhle (2016).
No local há um Cactário (Imagem 11) que abriga diversas espécies de cactos de
diferentes regiões do mundo, inclusive de espécies nativas e ameaçadas de extinção. Através
de sua missão preservacionista, o Jardim executou o projeto “Salvando os Cactos” que lhe
rendeu um prêmio internacional no ano de 2005. A premiação em dinheiro permitiu a
construção do Cactário e coleta dos exemplares para cultivo, sendo inaugurado no ano de
2006. Posteriormente ao cultivo, a ideia do projeto era a reintegração ao meio ambiente de 26
espécies de cactos pertencentes ao gênero Parodia, ameaçadas de extinção no RS. A intenção
também era manter alguns espécimes na Coleção do JBCS.
105
Imagem 11: Cactário do Jardim Botânico de Caxias do Sul
Fonte: Muhle (2016).
Em 1996 foi criada a Coleção de Coníferas e a inauguração da Praça das Coníferas,
por ser a vegetação predominante na área. No ano de 2007, por ocasião dos 300 anos de
nascimento de Carl Von Linneu, foi inaugurado o “Jardim de Lineu” que possui uma coleção
de plantas, cujos nomes científicos foram dados pelo referido botânico. Existe também no
Jardim infraestrutura para receber seus visitantes que vão na intenção de lazer e
contemplação, como um deck próximo ao lago, bancos de madeira e sanitários.
A Associação Jardim Botânico de Caxias do Sul é a responsável pela administração do
Jardim Botânico. Ela é constituída por três frentes: a Prefeitura Municipal de Caxias do Sul,
por meio da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SEMMA), Fundação que mantém a
Universidade Zeta e Serviço Municipal de Água e Esgoto (SAMAE). A área do Jardim
Botânico está localizada no entorno da bacia de captação Dal Bó, e por estar neste entorno de
uma bacia de captação, esta área fica sob gestão do poder público, que neste caso é a
Prefeitura de Caxias do Sul, mais especificamente o setor da Secretaria Municpal do Meio
Ambiente que lida com estas questões. Entretanto, na cidade de Caxias do Sul quem lida com
o tratamento e distribuiçãoo da água que é captada no Arroio Del Bó e faz a distribuição de
água para zona urbana e rural da cidade é o Serviço Autônomo Municipal de Água e Esgoto
(SAMAE), que é uma Autarquia. A Universidade Zeta, por sua vez, é uma instituição
educacional particular. De fato, o Jardim existe e necessita uma parceria entre estas frentes
para sua manutenção. Ou como afirma minha interlocutora, uma política de boa vizinhaça:
106
“Então assim, o que que eu posso te dizer da gestão do Jardim Botânico, por direitos
e por lei ele não existe, porém como ele foi criado ele é gerido dentro de uma
política de boa vizinhaça da universidade com o apoio técnico, da prefeitura com o
funcionário. Nós também participamos com a capacitação de alguns monitores,
sempre que necessário nós vamos ao Jardim Botânico, produzimos material didático
aqui e levamos ao Jardim Botânico. Então o que a gente consegue fazer do ponto de
vista da gestão hoje é um trabalho de educação ambiental em parceria com a
Universidade e com o setor de Educação Ambiental da Secretaria Municipal de
Meio Ambiente”.
Minha interlocutora é a professora da Universidade Zeta que assumiu o papel nesta
relação após a saída do Professor idealizador. A Professora é parte representante da
universidade nas questões envolvendo o Jardim Botânico, e também coordena o Museu de
Ciências Naturais da Universidade Zeta que realiza projetos de educação ambiental com o
Jardim.
Em um trabalho sobre educação patrimonial e prática turística qualificada, o Jardim
Botânico foi identificado como distante das categorias de jardins botânicos previstos pela
CONAMA na Resolução 339/200360, ficando longe de atender todas as exigências para
receber este título. A avaliação do referido trabalho afirma que existe a falta de cuidado pela
parte gestora do Jardim do Botânico que carece de reparos imediatos. Afirma também que existe a
falta de cuidado pela população visitante do local, que deposita resíduos no chão e também
depedra as estruturas físicas. Entretanto, no dia em que o local foi visitado pela pesquisadora61
estava limpo, com lixeiras para resíduos secos e orgânicos e as estruturas, como o deck, bancos e
sanitários, estavam preservadas. Não há uma vigilancia constante no local, no dia em que a área
foi visitada, além de dois funcionários da jardinagem, não havia mais ninguém. O serviço de
jardinagem é feito por funcionários da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, que conseguem
manter a manutenção desta parte do Jardim. Existe no Jardim a possibilidade da realização de
trilhas, todavia não há no local uma pessoa para guiar pelos trajetos. Para que isso ocorra é
necessário um agendamento prévio com o setor de Educação Ambiental da SEMMA para grupos
60 Segundo esta resolução para que um espaço possa ser classificado como jardim botânico, ele deve levar em
conta alguns critérios como possuir quadro técnico-cientifico compatível com as suas atividades e de
pesquisadores; objetivos; localização; infra-estrutura; dispor de serviços de vigilância e jardinagem, próprios ou
terceirizados; manter área de produção de mudas, preferencialmente de espécies nativas da flora local; dispor de
apoio administrativo e logístico compatível com as atividades a serem desenvolvidas; desenvolver programas de
pesquisa visando à conservação das espécies; possuir coleções especiais representativas da flora nativa, em
estruturas adequadas; desenvolver programas na área de educação ambiental; possuir infraestrutura básica para
atendimento de visitantes; ter herbário próprio ou associado com outra instituição; possuir sistema de registro
para o seu acervo; e oferecer apoio técnico, científico e institucional, em cooperação com as unidades de
conservação; a partir dos quais essas áreas serão avaliadas e categorizadas como “A”, “B” e “C”.
61 A visita foi realizada dia 23 de setembro de 2016, uma sexta-feira pela manhã. O pico da movimentação do
Jardim Botanico, segundo os funcionários da jardinangem da Secretaria Municipal do Meio Ambiente presentes
no local é aos finais de semana. Durante a semana são as escolas que mais frequentam para as atividades de
educação ambiental. Fatores que podem ter contribuído para a limpeza no local.
107
e isso depende da disponibilidade dos mesmos, que possuem outras demandas. Atualmente só há
na cidade uma linha de ônibus que leve até o Jardim Botânico e seu horário é esparso.
De acordo com a resolução do CONAMA, o Jardim Botânico somente atenderia a alguns
requisitos, como possuir um serviço de jardinagem, ter uma área de produção de mudas nativas,
ter um programa de educação ambiental, dispor de apoio administrativo e logístico (apesar de
muito reduzido) e por fim, ter herbário em associação com a Universidade Zeta. Apesar disso,
estes atributos não seriam suficientes para o enquadramento da área em nenhuma das categorias
(A, B ou C) para jardins botânicos.
Nos próximos anos a vida do Jardim Botânico mudará radicalmente. Na área adjacente
à área onde está localizado o Jardim, existe o projeto de um ecoparque que já está em fase em
construção. Segundo o Secretário Municipal do Meio Ambiente de Caxias do Sul, será um
dos maiores ecoparques urbanos do Brasil. Serão 187 hectares de área destinados a este
projeto, com a previsão de 1,7 mil metros quadrados de área construída. A concepção do
parque é representar “o conceito de parque urbano que, preservado dentro do perímetro
urbano, é frequentado e utilizado como área de lazer, convívio, contemplação, prática de
esportes, além de se tornar um importante ponto turístico do Município”. Estão previstas as
construções de estacionamentos, pórtico, guarita, cercamento, passarela (que ligará o
Ecoparque ao Jardim Botânico), pavimentação de vias e passeios, praça de alimentação, pista
de caminhada, ciclovia, academia, batistério, cascata, altar para cerimônias, bicicletário,
rampa para o lago, espaço para observação do pôr do sol, playgrounds, espaço pet, túnel
verde, fontes, anfiteatro, entre outros. Na entrada do Jardim é possível ver propagandas deste
grande empreendimento que será financiado com recursos do SAMAE (Imagem 12).
108
Imagem 12: Cartazes com as promessas do Ecoparque Caxias
Fonte: Muhle (2016).
A Universidade Zeta, representada na figura da Professora, participou em parte na
elaboração do projeto do parque. Apesar de admitir que a decisão da criação de um ecoparque
no local foi uma decisão muito mais política do que técnica, pois envolve a destinação de um
local para a recreação da população e não um local de preservação ambiental, ela vê
vantagens para o Jardim Botânico:
“Pretendemos ampliar o nosso vínculo com o jardim porque ele agora está passando
por um momento, digamos assim, de ampliação grande. Foi aprovado, durante os
dois últimos anos foi trabalhado o projeto de um parque. Foram os técnicos da
prefeitura os responsáveis pela elaboração, nós fomos convidados, eu faço até parte
do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente, nós juntos pensamos um
pouquinho essa ideia do Ecoparque. E a ideia futura é que esse parque seja a porta
de entrada para o Jardim Botânico”.
A Professora garante que os princípios do Jardim Botânico serão mantidos e vê no
futuro a possibilidade de novos investimentos nesta área, como a criação de um centro de
pesquisas. Atualmente o Jardim só possui sua portaria de criação, e necessita da regulação de
seus documentos para sua real implementação. Muito diálogo e consultorias jurídicas estão
sendo feitas entre as três frentes, SEMMA, SAMAE e Universidade, para tentar resolver esta
109
situação. A Professora toma a frente nesta ação, pois afirma que o interesse da Universidade é
manter a existências da área.
A Universidade Zeta, criada em 1967, é uma universidade localizada na região
nordeste do Rio Grande do Sul. Tem grande representatividade em seu número total de alunos
e é possuidora de unidades universitárias nas cidades de Caxias do Sul (campus sede), Bento
Goncalves, Vacaria, São Sebastião do Caí, Canela, Farroupilha, Guaporé e Nova Prata.
O campus de Caxias do Sul abriga os cursos das áreas de conhecimento das Ciências
da Vida, Ciências Exatas e Engenharias, Humanidades, Ciências do Solo, Ciências Jurídicas,
Artes e Arquitetura. Possui um total de área de cerca de 649.082 metros quadrados, entre
áreas construídas e áreas de preservação. São prédios, teatro, museu, estacionamentos, ruas,
pontos de ônibus e calçadas que dividem o campus com áreas verdes, córregos, Áreas de
Preservação Permanente e um zoológico.
No ano de 1999 a universidade cria o Instituto de Saneamento Ambiental (ISAM)
visando intitucionalizar e centralizar as ações referentes aos resíduos sólidos e recuperação
dos solos, que já eram desenvolvidos desde o início da década de 1990. Através do Programa
de Gerenciamento Ambiental, o ISAM vem consolidando a política ambiental da
universidade. Este programa desenvolve ações nas áreas de Gerenciamento de Resíduos
Sólidos, Gerenciamento de Resíduos Líquidos, Uso e Ocupação de Solos, Racionalização do
Uso de Águas, Gerenciamento Energético e Educação Ambiental. Sua equipe é formada por
profissionais multidisciplinares, entre eles técnicos e professores. O instituto também atende a
demandas de empresas públicas e privadas para consultorias e elaboração de projetos que
tratem especialmente do gerenciamento de resíduos sólidos e gestão do solo. Os professores
que colaboram com o ISAM lecionam disciplinas vinculadas ao gerenciamento ambiental e
resíduos sólidos para os cursos de graduação e pós-graduação, desenvolvendo também
projetos em parceria com os alunos.
O instituto é o responsável pelo planejamento, pela implantação e operacionalização
de todo o Gerenciamento Ambiental da Instituição. Em sua gestão, a universidade já
conseguiu, no ano 2000, a aprovação de seu Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos;
Licença de Operação para sua Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) em 2002; Licença de
Operação e Aprovação do Plano Urbanísitico da Cidade Univeritária no ano de 2003.
Diante da pró-atividade do setor, minha interlocutora fala das intenções da
universidade em buscar a certificação internacional da ISO 14.001. Algumas ações obrigaram
a mudanca no Plano Diretor do campus, delimitando as áreas verdes e o processo de
licenciamento obrigou a redefinição das Áreas de Preservação Permanente (Imagem 13). O
110
campus de Caxias do Sul também está tratando de adensar suas áreas com espécies nativas e
substituir progressivamente as espécies exóticas, bem como revitalizar e recompor suas áreas
verdes próximas aos córregos. A diretora admite que as ações de educação ambiental são
esparsas embora promovam atividades com funcionários e alunos. Como é uma demanda do
licenciamento ambiental e da própria ISO 14.001, o setor tem a intenção de estender estas
atividades.
Imagem 13: Uma das Áreas de Preservação Permanente da Universidade Zeta
Fonte: Muhle (2016).
Um dos objetivos do ISAM é inserir estas ações em todas as unidades acadêmicas da
Universidade Zeta e ele não possui nenhum tipo de ingerência sobre a gestão ou projetos do
Jardim Botânico, ficando esta relação exclusivamente a cargo do Museu de Ciências Naturais
sob a tutela da Professora que coordena o Museu e representa a universidade na tríplice gestão
do Jardim, como já mencionado.
111
5.1.7 Reserva Particular do Patrimônio Natural - Universidade Etá
Em uma votação unânime, a assembleia composta por representantes do colegiado, da
Reitoria e da fundação que mantém a Universidade Etá, decidiu por acatar a proposta de
criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) localizada no campus da
Universidade Etá, em Passo Fundo (RS). Um projeto pensado por cerca de oito anos dentro
da instituição e encabeçado por professores das Ciências Biológicas e Agronomia. A partir
desta decisão, toda a documentação necessária foi encaminhada para o ICMBio para que os
trâmites legais fossem tomados. No momento da pesquisa, a universidade aguardava a
publicação desse status no Diário Oficial, mas os envolvidos já comemoravam esta
conquista.
“Um exemplo para os alunos se tivessem uma área dessas”, diz por telefone62 o
Professor de Ciências Biológicas, ao elencar os motivos da criação deste tipo de reserva.
“Queremos utilizar como sala de aula para vários cursos. Realização de pesquisas. É
importante para a comunidade, para a manutenção do arroio”. A área em questão, cerca de
32,2 hectares (Imagem 14), está localizada em um centro de pesquisas agropecuárias e
extensão, centro que por sua vez compreende cerca de 121 hectares. Estas áreas fazem parte
do campus em Passo Fundo da Universidade Etá. No local também se encontra um arroio que
possui relevante importância no abastecimento de água e economia da cidade (JORGE, 2004).
O centro é bastante utilizado para pesquisas experimentais principalmente na área da
Agronomia, mas o local escolhido para a reserva é uma área que há algum tempo não é
utilizada para pesquisa e produção pela Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária pela
presença de gado bovino, por exemplo. Parte disso se deve ao fato de a área já estar
enquadrada em duas categorias de áreas naturais protegidas: Área de Preservação Permanente
e Reserva Legal.
62 O primeiro contato com este Professor foi via e-mail, posteriormente via telefone e também nos encontramos
pessoalmente na Universidade Etá.
112
Imagem 14: A seta indica ao fundo da imagem a Reserva Particular do Patrimônio
Natural da Universidade Etá
Fonte: Muhle (2016).
A gestão da área onde está o centro de pesquisas63 é de responsabilidade da Faculdade
de Agronomia e Medicina Veterinária, por isso uma boa relação entre o Instituto de Ciências
Biológicas (ICB) e esta faculdade era fundamental para esta tomada de decisão. Isto se deu na
pessoa do Professor da Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária, na época da criação
do projeto também presidente da fundação responsável Universidade Etá. Em conversa com
este Professor, ele me diz que durante alguns anos, mesmo tendo sido protocolado pela
fundanção, o processo acabou não andando. Diversas discussões foram geradas sobre o
assunto e dúvidas sobre quais os usos da área seriam permitidos ou não surgiram. No seu
último ano da presidência da fundação, junto com o Professor e sua colega e esposa, a
também Professora do Instituto de Ciências Biológicas, eles iniciam os trabalhos para a
criação da RPPN. É ele quem me leva até a área mais próxima da reserva, e sobre ela o
professor afirma:
“Então dentro do que tu estás pesquisando, nossa ideia era transformar essa área,
que já era uma área de preservação, ela possa assim ter uma visibilidade maior,
provocar um uso maior pela instituição na área de pesquisa, de visitação de aula, de
ensino. Porque tem área de banhado, tem área que está em regeneração natural, tem
área que é mata nativa e sempre foi, tem vertentes, enfim tem todos aqueles itens
que a gente gostaria de discutir com os alunos. Então a gente tem que organizar essa
vistação, as trilhas ainda não estão nem definidas, o que tem ali são trilhas naturais
63 Existe no interior do centro de pesquisas agropecuárias propriedades particulares e o Professor de Agronomia
acredita que talvez com o inicio da divulgação da criação da RRPN eles consigam convencer seus lindeiros a
fazer o mesmo, transformar as áreas em RPPNs.
113
de pessoas que acabam vindo pescar. Ainda não tem um cercamento. E é claro que
com isso provocar outros produtores da região, talvez os nossos lindeiros ou outros
tomando conhecimento também se motivem a criar RPPNs”.
O passo seguinte foi conseguir o apoio da Reitoria para que fosse realizada a
assembleia geral. Como se tratava de uma área do patrimônio da instituição era necessária a
aprovação também pelo Ministério Público Estadual para que fosse registrada na forma de
RPPN. No dia da assembleia, a Reitoria estava presente, assim como diversos professores e a
atual presidência da fundação; e como já dito, a decisão pelo consentimento da criação da
RPPN foi unânime. Na sequência o pedido foi encaminhado ao ICMBio e mesmo antes da
aprovação formal, a RPPN já aparecia no site do instituto64.
Segundo o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), uma RPPN é uma
categoria de Unidade de Conservação de Uso Sustentavel e “é uma área privada, gravada com
perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica” (BRASIL, 2000). No
documento criado e repassado à comunidade acadêmica sobre a criação da reserva, ao qual a
pesquisadora teve acesso, são elencados benefícios para além da conservação da
biodiversidade, muitos com caráter educativo: reconhecimento da sociedade regional pelo
exemplo de área de conservação da natureza por uma instituição de ensino superior; proteção
integral de um fragmento do território do Planalto Médio com sua biodiversidade; proteção
dos recursos hídricos que deságuam no arroio; possibilidade da realização de aulas práticas de
diferentes áreas do conhecimento, realização de pesquisas de graduação e pós-graduação com
a biodiversidade regional; possibilidade de atuar como um laboratório natural multidisciplinar
de estratégias de manejo e educativas para a conservação da natureza; implantação de um
Programa de Uso Público com caráter educativo; possibilidade de estágios acadêmicos; e a
possibilidade da fundação universitária captar recursos de outras fontes para a conservação da
natureza.
A Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Etá não possui ainda
nenhuma estrutura. No momento seu acesso é dificil, mas a intenção no futuro é que sejam
criadas condições de visitação guiada e auto-guiada da área, seja por alunos e pesquisadores
ou pelo público em geral, respeitando as orientações de preservação do ambiente. Em
conversa com o casal de professores de Ciências Biológicas sobre as vantagens da criação da
RPPN pela universidade eles afirmam que o número de reservas particulares no Brasil é muito
64 Cabe a reflexão: Para o ICMBio é interrante ter uma universidade criando uma RPPN, pois por ser
propagadora pode influenciar outras propriedades particulares a fazer o mesmo. Isso dividiria a responsabilidade
da preservação de áreas naturais pela União com setores privados. Para a universidade, constar no site traz
também uma visibilidade positiva, uma vez que figura como uma instituição preocupada com o ambiente.
114
baixo, e isso está certamente relacioando a fatores econômicos, mas para eles também
representa à baixa conscientização dos proprietários. Neste contexto, eles incentivam o setor
privado a fazer o papel do poder público em preservar áreas. Segundo a legislação referente a
esta criação, para os proprietários que decidirem por perpetuar a preservação de suas terras
criando uma RPPN, existe o direito a isenção do Imposto Territorial Rural e prioridade no
acesso aos recursos rurais. Também permite a área concorrer à editais de cunho ambiental
para captação de recursos. Para a Professora, “mas o mais importante é a vontade do
proprietário em criar RPPNs preservando-as em caráter perpétuo, ou seja, para sempre”.
Ambos professores admitem que esta ação é uma boa propaganda para a universidade,
entretanto o que realmente importa para eles é a conservação e manutenção da
biodiversidade.
É importante destacar que as Áreas de Preservação Permanente e as áreas de Reserva
Legal, são áreas que por lei não podem ser usadas para outros fins que não os previstos na
legislação. A liberação dessas áreas para outro tipo de uso depende da legislação específica e
medidas de compensação são previstas e impostas pelo órgão ambiental. De acordo com a Lei
Nº 12.651 de 25 de maio de 2012 (BRASIL,2012b), Área de Preservação Permanente (APP) é
“área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo
gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”. Na
área existe a presença do arroio, que configura a APP e preserva o arroio e seu entorno. Para a
mesma lei, Reserva Legal significa área localizada no interior de uma propriedade ou posse
rural, com a função de assegurar o uso econômico de modo sustentável dos recursos naturais
do imóvel rural, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos e promover a
conservação da biodiversidade, bem como o abrigo e a proteção de fauna silvestre e da flora
nativa. Uma área da vegetação do campus deve ser preservada obrigatoriamente.
Não é só a RPPN da Universidade Etá que servirá para usos didáticos e educacionais.
Antes mesmo de seu projeto de criação, as áreas verdes e Áreas de Preservação Permanente
(APPs) do campus de Passo Fundo já eram usadas para isso (Imagem 15). Por certo o campus
da Universidade Etá é utilizado por uma gama muito grande de disciplinas e de professores,
como por exemplo: Entomologia, Ecologia, Comportamento Animal, manejo de Vida
Silvestre, Sivicultura, Botânica e outras tantas da Faculdade de Agronomia e Medicina
Veterinária. As Áreas de Preservação Permanente existentes no local se tornaram também
espaços de aula.
115
Imagem 15: Uma das Áreas de Preservação Permanente da Universidade Etá no campus
de Passo Fundo
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Fonte: Muhle (2016).
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As professoras que foram interlocutoras da peosrquisa afirmam que as atividades que
desenvolvem nestas áreas misturam gestão, pesquitshae, ensino e extensão. Parece haver
disponibilidade de recursos financeiros para as atividasdues desenvolvidas nas APPs, como por
exemplo, a compra das armadilhas fotográficas que fomram pagas com verba da fundação que
mantém a Universidade Etá.
ma
Existe o desafio de incorporar as APPs de formy a transversal e para isso a educação
ambiental está sendo pensada com maior ou menorf inserção em alguns programas de
extensão. Para as professoras é “uma contínua sensibialinzação do outro”. Ambas afirmam que
algumas das inciativas com relação às áreas de preserviançtãeo foram tomadas para a obtenção da
licença ambiental da FEPAM. Entretanto, não precisarrieasm ter feito tudo o que fizeram, pois a
licença não exigia tanto, mas avançaram. Descrevem atibnoga articulação que tem com o setor de
Saneamento Ambiental - e por sua vez pela questão gpeorei ncial da gestão ambiental de toda a
universidade. Destacam neste momento o interesse dantR. eitoria para a divulgação dos dados
produzidos. Questiono a elas se este interesse e apoio dYaoinstituição nas atividades teria algum
interesse na busca da Universidade Etá em ser vista coumo uma universidade sustentável e elas
respondem que não é somente uma busca, mas uma intceannção real.
pos
itio
n
116
A Universidade Etá está próxima de completar 50 anos, data que será comemorada em
2018. Criada na intenção e desejo de suprir a demanda de cursos superiores na região sul do
estado do Rio Grande do Sul, a Etá é uma universidade particular e comunitária que
atualmente conta com seu campus sede em Passo Fundo e com outros seis campi, localizados
nos municípios de Carazinho, Casca, Lagoa Vermelha, Palmeira das Missões, Soledade e
Saradi. Assim como outras universidades, vem desenvolvendo políticas de gestão ambiental
para corresponder à demandas da comunidade em que está inserida e também à demandas de
responsabilidade socioambientais que uma instituição de ensino superior deve atender.
A Divisão de Saneamento Ambiental da Universidade Etá foi criada no ano de 2004
para acatar às diversas demandas ambientais que chegavam até o Centro de Ciências
Ambientais - centro que possuía um caráter de Extensão. Como o centro não era capaz de
responder a todas as demandas, os professores reivindicaram a criação da divisão. Sob a
responsabilidade da Pró-Reitoria Administrativa, o setor vem se consolidando ao longo dos
anos.
O setor é o responsável pelos processos de reciclagem, coleta seletiva, sistema de
esgosto, cuidados com o solo, fauna e flora da Universidade Etá. Com o objetivo de
regulamentar as atividades da instituição e conseguir as licenças do órgão ambiental, o setor
foi institucionalizado para ser estruturado com caráter técnico e dedicação exclusiva a essas
demandas. Possui um departamento e uma equipe multidisciplinar, incluindo estagiários
acadêmicos dos cursos de Biologia e Química normalmente. A Divisão também conta com o
auxílio dos professores da universidade para a elaboração dos relatórios sobre a fauna e a
flora, e também sobre a geração dos resíduos.
Para manter sua licença ambiental, a universidade sofre a cada dois anos uma auditoria
externa e tem conseguido manter a licença de sete campi através de melhoramento constante.
A Coordenadora do setor afirma que é somente questão de organização da documentação para
a universidade submeter o pedido da certificação internacional da ISO 14.001, pois já fazem
todo o processo necessário. Ela me diz que é grande o apoio e interesse da parte
administrativa da universidade, mas é um trabalho que exige dedicação: “ou tu te envolve, ou
a coisa morre... A gente tem que trabalhar bastante e não deixar a peteca cair”.
Existe uma relação positiva entre os professores que trabalham na universidade com as
Áreas de Preservação Permanente e a gestão ambiental desenvolvida pela Divisão de
Saneamento Ambiental. Aparentemente não há conflitos nesta relação, e juntos buscam a
regularização de todas as áreas verdes do campus de Passo Fundo e também nos demais
117
campi da universidade. Para além do espaço universitário físico, a Divisão também auxilia as
secretarias ambientais de cada município em que as unidades acadêmicas estão inseridas.
A Divisão de Saneamento Ambiental realiza trabalhos em parceira com o Centro de
Ciências e Tecnologias Ambientais. Segundo o site oficial da universidade, este setor é um
dos centros da Universidade Etá supervisionado pela Vice-Reitoria de Extensão e Assuntos
Comunitários, com programas e projetos relacionados à área ambiental, tendo por objetivo o
desenvolvimento de atividades de extensão e pesquisa nas áreas de ciência e tecnologia
ambientais.
5.1.8 Reserva Particular do Patrimônio Natural - Universidade Teta
A Universidade Teta possui sob seu domínio e gestão uma Unidade de Conservação
da categoria Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). A área preservada, inaugurada
em 2006, apresenta 221,39 hectares, e junto com 82,3 hectares de campos experimentais,
completam esta área verde da universidade localizada no município de Sinimbu, cerca de
48kms da cidade de Santa Cruz do Sul (Imagem 16).
Imagem 16: Entrada da Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade
Teta
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Fonte: Muhle (2016).
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118
A criação da reserva ocorreu através de uma doação feita por uma empresa produtora
de cigarros e exportadora de fumo e tabaco, para a Universidade Teta65. A empresa doou os
valores necessários para a compra das áreas e também para construção da sede. Assim, no ano
de 2005, se inciam as tratativas para instituir a primeira RPPN de uma universidade e a maior
desta categoria em domínio da Mata Atlântica no Brasil. Na época da aquisição da área, mais
da metade de área doada era constituída por áreas virgens, ou seja, que não tiveram nenhum
tipo de intervenção humana, o restante era composto por áreas secundárias e capoeiras em
regeneração, e terras recentemente ocupadas pela agricultura e pecuária em minifúndios da
região do entorno. Hoje, praticamente já não há capoeiras na área e a vegetação se
desenvolveu bastante. No entanto, existem espécies exóticas invasoras inseridas. Um dos
objetivos da criação da reserva é manter o possível da conservação deste ecossitema,
abrigando a área de transição entre a Floresta Estacional Decidual e a Floresta Ombrófila
Mista do Rio Grande do Sul. Por este seu perfil, o local é capaz de abrigar grande diversidade
de fauna e flora locais, o que reforça seu valor de conservação.
A área de conservação já está devidamente implementada e institucionalizada pela
Universidade Teta, possuindo inclusive site próprio para a divulgação de suas atividades e
agendamentos de visitas. No ano de 2006, é inaugurado o Centro de Visitantes no local, com
a intenção de receber as pessoas interessadas para a realização de cursos e palestras sobre
meio ambiente, conservação e atividades de educação ambiental (Imagem 17). Através da
publicação de sua Portaria no Diário Oficial da União em março de 2009, a criação da
Reserva Particular do Patrimônio Natural da Univiersidade Teta foi oficialmente concluída.
65 Através do Sistema Eletrônico do Serviço de Informação ao Cidadão (e-SIC) foi possível ter acesso à
informação de que a doação da área pela empresa não se tratava de compensação ou multa ambiental.
119
Imagem 17: Centro de Visitantes da Reserva Particular do Patrimônio Natural da
Universidade Teta
Fonte: Muhle (2016).
Segundo o Coordenador da Área Ambiental da universidade, os objetivos da Teta em
criar e manter a reserva foram para que a universidade pudesse “contribuir com a conservação
da Mata Atlântica, oportunizar um ambiente para visitação, pesquisas e ensino, envolvendo
universitários, alunos e professores da rede escolar, comunidade local e visitantes para que se
integrem ao local e compreendam a importância de se preservar a natureza”.
Em visita realizada à RPPN no ano de 2016 foi possível atestar sua beleza cênica e seu
impactante perfil de área preservada (Imagem 28). O acesso ao local se dá através de estradas
de chão batido e de difícil acesso, levando cerca de duas horas da universidade em Santa Cruz
do Sul até a RPPN. Com a orientação da gestora do local e um estagiário que costuma
acampanhar as idas até lá, realizamos a visita. Fizemos uma parada no caminho para comprar
lanches, e a gestora me diz que por mais que isso não fosse necessário, ela gosta de fazer esta
parada em Sinimbu para manter uma interação com os moradores do município, assim eles
sabem que a universidade está presente e podem de forma informal saber sobre as atividades
desenvolvidas na RPPN.
A infraestrutura presente no local é capaz de receber grupos e também abrigar alunos e
pesquisadores para suas atividades de campo. Com mesas, cadeiras, banheiros e cozinha é
120
possível desenvolver diversas atividades na sede66. Na área da reserva também é possível
realizar uma séries de atividades em meio a natureza. Algumas trilhas já estão demarcadas na
área, como a Trilha Biodiversidade em Reconstrução e a Trilha Ecossitema. Alunos e
pesquisadores também vão até a reserva para a realização de pesquisas sobre a fauna e a flora,
como por exemplo, o trabalho sobre o levantamento florístico das criptógamas da RPPN
(MELO; PUTZKE & PUTZKE, 2014), e o trabalho sobre a avifauna presente na reserva
(OLIVEIRA & KÖHLER, 2010).
Próximo à área da reserva da Universidade Teta existe um local com quedas d’água do
Salto do Rio Pardinho (Imagem 18). O local atrai diversos visitantes que usam o espaço para
lazer e contemplação. Entretanto, no local é possível ver resíduos como garrafas, latas de
alumínio, embalagens plásticas e papéis, descartados no chão. A gestora da RPPN afirma que
é de interesse da universidade também realizar trabalhos de educação ambiental com este
público e fazer campanhas para o descarte correto dos resíduos.
Imagem 18: Quedas d’água do Salto do Rio Pardinho
Fonte: Muhle (2016).
Além da ida até a reserva para realização do inventário de fauna e flora, professores da
Teta muitas vezes iam ao local para usá-lo como uma sala de aula ao ar livre e também para a
66 No dia em que a visita foi realizada o local estava sem água, o que impedia o uso dos banheiros e da cozinha.
O problema já ocorria há alguns dias e por isso a visitação das escolas estava suspensa.
121
realização de suas pesquisas. As atividades de educação ambiental na RPPN ocorrem através
de duas frentes: através de agendamentos feitos pelo site da reserva e que tem o
acompanhamento de bolsistas, normalmente do curso de biologia, que desenvolvem
atividades lá; ou como parte de um programa de educação ambiental maior desenvolvido
pelos professores e estudantes da Universidade Teta, inclusive dentro das escolas.
Atualmente a Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Teta está
fechada para visitações. De fato, quando a visita para a presente pesquisa foi realizada, a
visitação pelas escolas já não estava sendo permitida pela falta de água. Segundo o
Coordenador da Área Ambiental da universidade, questões de infraestrutura e as dificuldades
no acesso à área dificultam as visitações com segurança à reserva. Para ele, as maiores
dificuldades para a gestão da reserva são:
“O fato de estar distante da sede da universidade, o estado da conservação do acesso
a RPPN, a falta de suporte de fiscalização e incentivo financeiro por parte do setor
público. Internamente, o cenário econômico nacional que atinge o setor da educação
(inclusive as de ensino superior) limitam os investimentos”.
A responsável pela gestão da reserva corrobora com as preocupações de seu
coordenador:
“Os investimentos necessários são altos. Abastecimento de água, manutenção do
acesso, entre outras questões. Estamos contidos e tomando medidas de redução de
custos, devido a situação econômica, que não está favorável para as instituições de
ensino superior. O momento é de incerteza”.
No início do contato com universidade, a RPPN tinha sua gestão subordinada à Pró-
Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento Institucional. Desde o inicio de 2017, a reserva
passou a integrar a Área Ambiental, setor responsável pela gestão ambiental da universidade.
Assim, reuniu-se esforços em manter a RPPN mais próxima ao objetivo de conservação do
bioma, e também lincada às decisões sobre questões ambientais da universidade. Segundo o
Coordenador da Área ambiental, “uma está vinculada a outra [a RRPN e a Área Ambiental da
universidade], porém as ações são estratégicas frente as limitações atuais”.
Em termos legais, a RPPN pertence à uma associação de ensino de Santa Cruz do Sul,
mantenedora da universidade. A reserva participa da Associação Gaúcha de Proprietários de
RPPN, onde compartilha com outros proprietários de áreas protegidas experiências positivas e
também as dificuldades e frustrações relativas ao gerenciamento das áreas. Também participa
do Comitê Estadual da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica do Estado do Rio Grande do
Sul, uma vez que a Mata Atlântica é a fisionomia predominante da área. Por manter ativas
122
estas atividades na associação e no comitê, a universidade tem procurado desenvolver em
conjunto com outras esferas da sociedade instrumentos para a conservação da biodiversidade
e manter um diálogo positivo sobre a existência da RPPN mesmo com sua visitação fechada
atualmente. Segundo o Coordenador, “não está aberta a visitações, porém desempenha o seu
papel fundamental de conservação ambiental”.
Apesar das dificuldades enfrentadas no momento, os plano futuros para a Reserva
Particular do Patromônio Natural da Universidade Teta são continuar monitorando as ações
antrópicas junto aos limites da RPPN, abrir novamente para visitação e ampliar o número de
estudantes e pesquisadores que vão até a área para realizar suas pesquisas e aulas práticas.
A Universidade Teta é uma universidade particular e comunitária que está localizada
na região do Vale do Rio Pardo. Além do seu campus sede em Santa Cruz do Sul, também
possui outros quatro campi nas cidades de Capão da Canoa, Sobradinho, Venâncio Aires e
Montenegro. A Universidade Teta teve sua origem através de faculdades que eram integradas
na região e que foram criadas e mantidas pela mesma instituição de ensino que hoje em dia
continua sendo a mantenedora da universidade. No ano de 1992 estas faculdades são extintas
para dar lugar a criação da Universidade Teta, desejo inicial de sua mantenedora.
Com relação a sua gestão ambiental, a universidade conta com o setor Área
Ambiental. Como já citado anteriormente, a Área Ambiental é atualmente a responsável pela
gestão da Reserva Particular do Patrimônio Natural. O setor desenvolve projetos que visam
adequar as atividades da instituição aos parâmetros de sustentabilidade exigidos pela
sociedade e também pela legislação atual. Executam projetos que procuram atender à ideia da
Logística Reversa e que venham ao encontro à Política Nacional de Resíduos Sólidos
(PNRS), estabelecida pela Lei nº 12.350, de 2 de agosto de 2010 (BRASIL, 2010). A Área
Ambiental também realiza a Campanha Descarte Correto, visando promover o descarte
correto dos resíduos gerados no campus, principalmente nos setores de alimentação usados
pelos alunos.
123
5.2. Sobre como são utilizadas as áreas verdes
Neste tópico são apresentados os diferentes usos que são feitos das referidas áreas
verdes. Por certo a primeira parte da descrição do campo é inseparável desta - os uso que são
ou foram feitos destas áreas verdes, mas optou-se por esta divisão para que fosse possível
enfatizar esta parte e a relevância em termos de projetos e usos educacionais que foram ou
ainda são feitos nestes espaços.
Estas áreas se constituem lugares repletos de potencial ou espaços vazios a partir do
uso que é feito delas, e esta relação está muito mais presente entre as áreas verdes e as pessoas
professores dedicados - do que das áreas com as instituições universidades. São trajetórias
que desenham a percepção das áreas verdes pelas pessoas e pelas instituições.
5.2.1 Um lugar de amor - Horto Botânico da Universidade Alfa
“Esta árvore aqui possui uma história muito forte... Nela cresceu uma figueira e a
figueira morreu”. Assim diz a Professora de Botânica da Universidade Alfa ao nos
aproximarmos da entrada do Horto Botânico pertencente à univerdade.
A figueira que cresceu na árvore67 da entrada do horto (Imagem 19) é conhecida como
figueira-mata-pau (Ficus clusiifolia). Ela cresce e se desenvolve tendo outras espécies de
árvores como hospedeira e depois que ela consegue atingir o solo com suas raízes ela inicia
um processo de estrangulamento da árvore na qual tinha seu suporte. Este estrangulamente, na
maioria das vezes, acaba matando a espécie hospedeira, ficando somente a figueira-mata-pau.
Este processo é tão intenso pela força com que a figueira cresce e domina sua hospedeira que
após algum tempo não é possível ver nenhum vestígio dela. Por isso a admiração da
Professora de Botânica ao me contar que um dia chegou ao Horto e viu que a figueira-mata-
pau que já estava instalada na árvore havia morrido. Segundo ela, um processo bastante
67 A árvore hospedeira em questão é açoita-cavalo (Luehea divaricata), árvore cuja madeira é resistente,
extremamente flexível e tolerante à seca. Árvore de aspecto rústico com galhos e folhas rígidas que ganhou este
nome popular porque antigamente seus galhos eram usados por cavaleiros para açoitar seus animais que ficavam
presos ao tronco da árvore. Planta muito usada na medicina popular por conter diversos compostos fitoterápicos,
presentes tanto no tronco, como nas folhas e flores.
124
incomum que talvez possa ser explicado por um raio que atingiu as árvores, mas essa é apenas
uma teoria que poderia explicar este acontecimento.
Imagem 19: A árvore que venceu a figueira-mata-pau na entrada do Horto Botânico
Fonte: Muhle (2016).
A vivacidade e o sentimento com que ela me conta esta história são o retrato da
resistência do horto em se manter nos dias atuais. A Professora me diz, enquanto caminhamos
por dentro de um Horto já com sua vegetação bastante densa e fechada, que está tentando com
a Direção da Biologia a retomada da extensão universitária no uso deste espaço. Segundo ela,
a área possuía uma parte de visitação e uma parte fechada, reservada para pesquisa. Sendo
uma área grande haveria espaço para desenvolver os dois tipos de atividades. “Seria muito
bom poder voltar a usar a área para visitação, principalmente com as escolas, as crianças
gostam muito. Aqui é o único lugar na cidade que pode ser usado assim”. Pergunto a ela se
houve uma época em que as escolas vinham até o Horto e ela me responde que sim e que em
bastante quantidade e que pararam de vir há pouco tempo, justamente porque a universidade
parou de ter pessoas que cuidassem do Horto. Ela mesma vinha com os alunos e hoje em dia
se restringe a usar uma parte do horto que está mais aberta e próxima da entrada (a parte pela
qual nós caminhamos). Ela conta que quando traz seus alunos universitários, em um
determinado ponto do Horto, que segundo ela é onde está o ar mais puro, faz os alunos
respirarem fundo e tentarem perceber a diferença no ar. Para ela, aquele espaço de
preservação é um lugar de amor (Imagem 20).
125
Imagem 20: Um lugar de amor
Fonte: Muhle (2016).
Pergunto se ela achava que deveria haver uma pessoa responsável pelo uso do horto
através da extensão universitária, recebendo as escolas e planejando as atividades e ela me diz
que este trabalho era realizado por ela e também outros professores. “Isso a gente faz, nós
professores. Eu sempre fiz, mesmo dando aula. Eu marcava, eu tinha monitores que faziam o
acompanhamento, que explicavam. Mas sabe... Com o passar do tempo... Foram assim,
aquela coisa né... demais... vai deixando, vai deixando de lado...”. Não há na universidade um
responsável para conduzir estas atividades. As demandas acadêmicas e atribuições
burocráticas da professora impediram a continuação das atividades. Por estes motivos, nem
mesmo a comunidade visita mais o local.
O Horto Botânico da Universidade Alfa foi criado com a intenção de ser um lugar para
amantes da natureza contemplarem e pesquisadores desbravarem. O local possibilitou, desde a
sua criação, trabalhos acadêmicos sobre as espécies botânicas e entomológicas existentes lá.
O local ainda recebe estudantes universitários para a realização de estudos práticos e
pesquisas, inclusive durante a pesquisa foi possível ver pelo caminho diversas marcações na
vegetação que correspondem a pesquisas que continuam sendo desenvolvidas ali. Estas
atividades continuam acontecendo em virtude dos professores de Botânica e Biologia que
veem no espaço potencial para aulas práticas e pesquisas.
Em reportagem publicada em julho de 1999 em um jornal local, as atividades no Horto
são destacadas como algo promissor (Imagem 21). A reportagem diz que neste local pouco
conhecido pelos moradores do município em que ele está localizado é possível estar em
126
contato com uma natureza preservada pela universidade e se aventurar por trilhas escondidas.
Nesta época em que a matéria foi publicada, as informações trazidas reforçam o que os
professores haviam me relatado, que houve um período em que as atividades no Horto eram
intensas e disputadas pelas escolas e grupos de admiradores de ambientes naturais. A
reportagem também explica como funcionava a dinâmica das atividades de educação
ambiental. A Professora de Botânica, com o auxílio de cinco monitores (estudantes dos cursos
de Biologia normalmente), explicava conceitos de botânica e biologia, e falava sobre a
importância das árvores e áreas verdes para a nossa vida. As crianças realizam também trilhas
e os monitores reforçavam o que fora visto através de jogos e teatrinhos.
Imagem 21: Reportagem sobre o Horto Florestal no jornal Diário da Manhã
Fonte: Muhle (2016).
O Professor com quem converso conta que em sua época de estudante do curso de
Agronomia assistira uma palestra ministrada pelo Irmão Lassalista, que na época estava
fundando o Horto na Faculdade de Agronomia, e ficara impressionado com a paixão pela
Botânica. Ao se formar recebera o convite para trabalhar com essa área e foi quando firmou
amizade e o teve o Irmão como um mestre exemplar para o seu desenvolvimento em
Morfologia e Taxonomia Botânica. É nesta época que as vidas do Irmão Lassalista e do
Professor se aproximam, enquanto colegas e professores que dividem a paixão pela botânica.
Meu interlocutor relata que tinha um grande envolvimento com o Horto. Quando ocorria
algum incêndio o chamavam para tomar providências, e conseguiu fazer com que parassem de
depredar o espaço e caçar na região. Conta com orgulho que em determinada ocasião
127
conseguiu impedir o plantio de arroz em um banhado no interior do Horto, ameaçando levar a
história para as emissoras de rádio e televisão.
Com relação às atividades educacionais do Horto Botânico, o Professor me diz que seu
sonho sempre foi que os alunos de escolas públicas e privadas, e também do ensino
universitário frequentassem o horto, tamanho era seu entusiasmo pelo local e suas
potencialidades. Segundo ele, o Horto Botânico subsistiu até hoje por um ato de amor de seus
operários e familiares. Por longa data o local recebia crianças de escolas da cidade em
visitação programada, mas isso foi sendo perdido pela falta de recursos humanos e
financeiros. Chegou até mesmo a compor uma música que ensinava aos alunos quando iam
visitar o Horto, para ele uma tarefa emocionante:
“Todos juntos alegre, contentes o Horto Botânico vamos visitar.
De mãos dadas alegres, contentes, entraremos na mata todos a cantar!
Que beleza a mãe natureza que é uma princesa vestida de verde
De braços abertos pra nos abraçar
Pra nos abraçar
Vamos amar
A mãe natureza que é uma princesa cheia de esperança
Que cada criança lhe faça sorrir e nunca chorar!”
O Professor explica que após cantarem essa parte perguntava às crianças: “quando é
que a mãe natureza chora? Quanto é que a mãe natureza ri?” e a partir das respostas ia
trabalhando conceitos e assuntos típicos da educação ambiental, como por exemplo descarte
errado dos resíduos, desperdício de água e depredação das áreas verdes. Este tipo de relação
não ocorre mais.
Em termos da conservação do espaço físico, a área onde está localizado o Horto está
preservada. Uma vez que o espaço não está sendo utilizado de forma intensa, foi possível uma
expressiva recuperação da vegetação. Entretanto, isso encobriu as avenidas idealizadas pelo
Irmão Lassalista e dificulta a circulação pelo local e consequentemente seu uso pelas escolas.
Se a intenção é retomar esta atividade, é necessária a manutenção do horto, mas isso é uma
resolução que depende da instituição e de suas prioridades. Não há no Horto Botânico áreas
invadidas ou usadas para outros propósitos. Também não há no local descarte de resíduos.
128
5.2.2 Um laboratório ao ar livre O Refúgio de Vida Silvestre da Universidade Beta
Quando minha interlocutora é questionada sobre os usos pedagógicos do Refúgio de
Vida Silvestre da Universidade Beta, a Professora reflete uma certa empolgação por algo que
foi feito no passado com muita dedicação:
“Uso pedagógico tem muitos! Foi pedagógico de várias formas... Até nós ganhamos
dos escoteiros uma plaquinha como prêmio no tempo das atividades. Até nos finais
de semana os alunos davam aulas de educação ambiental baseado nos potenciais do
morro. Então nós temos inúmeras atividades...”
Mesmo convivendo com a escassez de recursos para o desenvolvimento das
atividades, o morro permitia seu uso com pouco. Segundo a Professora: “então como era
quase tudo possível de se fazer quase sem dinheiro, conseguindo o apoio da guarda para subir
o morro, a aluno subia com seus sanduíches no bolso e suas pernas, andava na trilha e não
gastava nada. Porque o que é caro são as expedições de campo.”
O projeto de pesquisa de uma vida de dedicação, que reflete perfeitamente a situação
do Refúgio de Vida Silvestre, foi o projeto “Implantação e Gerenciamento de Unidades de
Conservação em Áreas Urbanas” idealizado pela própria Professora e submetido à um
programa de apoio a núcleos da universidade em 1997. A proposta incluía, além do projeto, a
formação de um núcleo de pesquisas integradas que uniria áreas das Ciências Exatas e da
Terra, Ciências da Vida e Ciências Humanas e Sociais para a elaboração de um plano de
manejo para o Morro em que o refúgio está situado que levasse em consideração todas estas
esferas. Assim como a reserva, seu valor foi reconhecido por muitas instituições, entretanto
nunca foi de fato implementado integralmente. Usando o que havia de mais avançado na
época em termos de software e hardware para a sobreposição de imagens, ela tinha a certeza
de que elaboraria o melhor plano de gerenciamento para a reserva da Universidade Beta. Seus
pedidos de financiamento não foram atendidos nas inúmeras tentativas de aplicar o projeto
que envolveria além de diversos departamentos da universidade, a Secretaria Municipal do
Meio Ambiente de Porto Alegre (SMAM), Secretaria de Educação do Estado do Rio Grande
do Sul (SEC), Fundação Zoobotânica do estado do Rio grande do Sul (FZB) e três instituições
internacionais. O parecer do programa reconheceu sua boa articulação integrando técnicas e
metodologia adequadas, mas o recusa alegando baixa produção intelectual da equipe:
129
[...] entretanto o grupo apresenta baixa produção científica, irregular quanto a
frequência e publicada quase que exclusivamente em revistas nacional de impacto
regional. Não existem publicações em revistas internacionais de alto impacto. Não
há nenhum pesquisador equivalente ao Nível I do CNPq. Concluindo, o projeto não
se enquadra no escopo [...].
Por certo os estudos do Morro geraram diversas produções científicas como trabalhos
de conclusão de curso, dissertações de mestrado e teses de doutorado, além de artigos
publicados sobre a área alguns inclusive utilizados neste texto para caracterização da área.
Produções didáticas, incluindo material para trabalhar educação ambiental também foram
elaborados a partir dos usos do Morro. A área também ficou conhecida por permitir aulas
práticas bem próximas às salas de aula dos prédios do campus da universidade localizado na
região. Alunos dos cursos de Biologia, Geografia, Geologia e História subiam o Morro com
seus professores para aproveitar esse ‘laboratório ao ar livre’. Os estudantes das áreas
ambientais usavam a área do Morro, adjacente ao campus, para realização de aulas práticas e
coleta de materiais referente à fauna e flora do local. Atividades de educação ambiental, como
trilhas, também estavam sendo realizadas lá.
Um dos ganhos do grupo que se interessou pela reserva, composto pela comissão
instituída para sua implementação, professores, alunos e funcionários da universidade, foi
conseguir montar e manter uma espécie de pelotão com cavalos para a vigilância do Refúgio e
acompanhamento dos pesquisadores. Com o apoio da gestão na época, essa guarda foi
instituída e para minha interlocutora “graças a isso é uma das garantias de que o morro ainda
existe e que ninguém invadiu o morro, pelo menos em grandes extensões”. Os cavalos foram
doação da Brigada Militar que ficaram sob a responsabilidade da Guarda e passaram a ser
também personagens da história da reserva. Atualmente eles possuem seu próprio alojamento
no campus. Uma vitória da própria Guarda, visando contribuir com os trabalhos no Morro e
qualidade de vida dos animais.
Para que grupos de pesquisadores e alunos consigam o acompanhamento da Guarda
Montada é necessário um agendamento prévio, pois a guarda não é vasta e ainda divide as
atividades de segurança campus/morro. Durante a pesquisa, o auxílio desta guarda para subir
o Morro pareceu ser primordial nos dias atuais. Entretanto, alguns depoimentos relatam que
mesmo em anos passados a insegurança lá já se fazia presente. Isto inclusive tem inibido
alguns professores da universidade a levarem seus alunos.
130
Na dissertação de mestrado intitulada “O potencial das atividades físicas de aventura
na natureza em Porto Alegre”68, o Morro onde está localizado o refúgio da Universidade Beta
aparece como um local onde seria possível a prática de esportes de aventura como rappel,
escalada (especificamente na parte da antiga pedreira), prática de moutain bike e trekking.
Entretanto a pesquisa identificou fatores negativos para o desenvolvimento destas atividades
como agressões, furtos e assaltos69. Conforme dito anteriormente, a preocupação com a
segurança quando da visita a este morro não é uma preocupação recente. Neste mesmo
trabalho, depoimentos relatam que já na década de 1980 praticantes de modalidades
esportivas como essas sofreram assaltos frequentes, o que os levou a suspender a prática no
local.
Além dos usos didáticos, de pesquisas e de conservação ambiental o Morro também
possui filamentos que tecem outros tipos de envolvimento. E essa trama é o que o constiui.
Longe de ser o laboratório natural idealizado, com uma paisagem idílica e presevada, dentro
do Morro pulsam outros fatores que o caracterizam. O fato da área do Morro estar localizado
em uma parte bastante urbanizada e povoada da capital implica em uma série de
circunstâncias que desenham essa relação Morro-Universidade.
Moradores do entorno do campus podem ser vistos fazendo exercícios físicos, como
corrida e caminhada nos espaços pavimentados da universidade que contornam o Morro,
principalmente aos finais de semana. Este tipo de prática, usar o campus universitário, quando
bastante arborizado, como uma espécie de parque urbano pelas pessoas tanto da comunidade
acadêmica como público em geral, apresentou-se também em outras universidades visitadas
neste projeto. Destaque para a Universidade Zeta, Universidade Épsilon e a Universidade
Delta. Kaingangs também adentram o Morro para coletar matérias-primas como cipó para
seus artesanatos e também plantas medicinais. Lá também mantém seus rituais e relações com
os não-humanos que lá habitam (JAENISCH, 2010).
Existe também no entorno do Morro, ocupações irregulares de moradias (Imagem 22),
bem como uma alta especulação imobiliária. Como o espaço não é cercado e não há uma
fiscalização efetiva, esse controle na ocupação fica defazado. Essa falta de fiscalização acaba
acarretando, além dos problemas de ocupação ilegal supracitados, um sério problema na
68 Dissertação de mestrado em Ciências do Movimento Humano Escola de Educação Física (UFRGS) de
Alcides Vieira Costa. Título completo: O potencial das atividades físicas de aventura na natureza em Porto
Alegre: um estudo integrado dos parâmetros paisagísticos, socioambientais, infraestrururais e de risco (2006)
69 Cabe destacar que esta pesquisa citada não identificou essas características negativas apenas neste morro,
outros morros de Porto Alegre, como Morro São Pedro, Morro da Polícia e Morro do Osso também apresentaram
riscos de violência. A insegurança está presente em Porto Alegre, tanto em seus ambientes naturais. quanto em
seus centros urbanos.
131
segurança pública da área. Histórias sobre isso são muitas e algumas se perdem entre o real e
o imaginário. Crimes de assalto, roubos e assassinatos já foram registrados na área do Morro.
Imagem 22: Ocupação irregular no Morro
Fonte: Guerra (2012).
Segundo análise documental, o Morro também apresenta problemas com o descarte
incorreto de resíduo residencial e esgoto não tratado (Imagem 23). O Morro é o ponto onde se
dividem três nascentes (do Arroio Dilúvio, Arroio Feijó e Arroio Passo das Pedras), e muitas
vezes esse descarte é feito nesses pontos. A entrada de pessoas não autorizadas, que vão até o
local para passeio a pé ou de motocicletas acaba contribuindo com a aceleração dos processos
de erosão do solo e desmatamento na parte destinada à reserva da Universidade Beta.
Eventuais picos propositais de incêndio também são verificados no local, muitas vezes para
queima de resíduos e até mesmo por vandalismo. A existências de áreas onde são realizados
pequenos cultivos e a criação de animais também parece dificultar o uso da área com o intuito
de preservação. Parece não haver, ou não ser efetivo um diálogo com a comunidade do
entorno sobre os objetivos da área de conservação.
132
Imagem 23: Descarte incorreto de resíduos nos arroios do Morro
Fonte: Guerra (2012).
O grupo da universidade envolvido com a área tem demonstrado esforços para
divulgar a existência do Refúgio de Vida Silvestre e seus objetivos, dentro da comunidade
acadêmica e para a comunidade do entorno através de pesquisas de percepção ambiental
dentro da Instituição e atividades de educação ambiental nas escolas próximas. Material para
ajudar na divulgação da área, como folders informativos, também foram elaborados e
distribuídos dentro da universidade. Atividades de extensão para estudantes universitários no
Morro também já foram realizadas com visitação do espaço e realização de trilhas. A pesquisa
que abrangeu mais de 400 participantes e visava identificar a percepção ambiental da
comunidade acadêmica do campus sobre a existência do Refúgio de Vida Silvestre mostrou
dados muito relevantes sobre a distância perceptual presente entre territórios tão próximo. Os
dados apontaram que mais de 70% dos entrevistados desconhecem a existência da unidade de
conservação, isso incluía professores, funcionários e alunos dos diversos cursos realizados no
campus. Dos menos de 30% que sabiam da existência do REVIS, muitos eram alunos e
professores de cursos como Ciências Biológicas e Geografia que faziam saídas de campo lá e
funcionários que moravam no entorno da área (CERCINÁ et al., 2009).
133
5.2.3 O Pampa com potencial Universidade Gama
No campus da Universidade Gama em Uruguaiana a Área de Preservação Permanente
descrita, que está no entorno do arroio, é usada como um lugar de práticas de ensino. Um dos
professores da universidade utiliza o arroio para fazer algumas práticas de iniciação para os
alunos da aquicultura, por exemplo, como entrar na água ou como vestir um macacão, como
colocar uma rede, como montar um caniço (Imagem 24).
Imagem 24: Alunos do curso de Tecnologia em Acquicultura em aula prática no arroio
dentro do campus Uruguaiana da Universidade Gama
Fonte: Muhle (2016).
O Professor que me acompanha, um dos interlocutores da Universidade Gama, diz que
costuma fazer uma atividade pelo campus muito significativa pela possibilidade ver in loco
espécies típicas do Pampa da qual os alunos apreciam muito:
“Explorar o potencial paisagístico e ambiental das áreas do Campus é uma
oportunidade que não pode ser desperdiçada. Entre as disciplinas que ministro,
existe a denominada de Ecossistemas da Terra, onde efetuo variadas ações referentes
ao estudo da fauna e da formação ambiental, típica do Bioma Pampa. Assim, nas
primeiras aulas costumo fazer uma trilha no campus, para reconhecimento dos
espaços. Como essa disciplina é de um curso de licenciatura e ocorre a noite, muitas
vezes os estudantes acabam desconhecendo as instalações fora dos espaços
construídos. Assim, pedimos para os estudantes virem mais cedo para as aulas, ou
utilizados os sábados a tarde. Desta forma conseguimos explorar bastante os espaços
e trabalhamos a vegetação, a formação do solo, as comunidades acompanhantes.
134
Como trata-se de uma disciplina voltada a ecologia o uso da trilha proporciona que
os espaços sejam uma atividade prática de consolidação dos conhecimentos teóricos,
então vamos caminhando, parando, discutindo sobre líquens, decomposição e etc.
Nunca uma aula é igual a outra. Esta é uma prática que a prática que a gente
costuma fazer.”
A prática da trilha pelo campus parece permitir, além da aquisição de conhecimentos
relacionados à ecologia, o conhecimento também da própria instituição como aponta o
professor em seu depoimento. Os alunos tendem a frequentar e conhecer somente o local
específico do seu curso, seu prédio, seu laboratório e um tipo de atividade como a trilha
permite ampliar essa visão.
No campus também existe um grupo que estuda movimento e meio ambiente e realiza
caminhadas e trilhas nos meios urbanos e naturais de Uruguaiana e arredores. A realização
dessas caminhadas no interior do campus é também é muito incipiente, mas o espaço poderia
ser melhor explorado também para isso.
Outro aspecto interessante no campus de Uruguaiana é a presença da obra de arte do
artista Nelson Félix intitulada de Mesa (Imagem 25). A obra faz parte do Projeto Fronteiras70
que foi financiado pelo Itaú Cultural e em 2009 foi doada de forma perpétua ao local quando
ainda pertencia à universidade particular Este projeto foi feito em comemoração aos 500 anos
do Brasil onde foram convidados artistas de renome nacional e internacional para projetarem
trabalhos de arte permanentes, em locais fronteiriços com o Brasil, depois restritos à região do
Mercosul. No Rio Grande do Sul encontramos metade destas obras, localizadas em locais de
fronteira com a Argentina e Uruguai: Mesa, de Nelson Félix, em Uruguaiana; Minuano, de
Nuno Ramos, em Barra do Quaraí; Aleph, de Ângelo Venosa, em Sant’Ana do Livramento; e
Três Livros e Meio, de Arthur Barrio, em Chuí e Santa Vitória do Palmar (ALVES, 2010.)
A Mesa consiste em uma placa de aço inoxidável de 51 metros comprimento por dois
metros e 51 centímetros de largura e quatro centímetros de espessura, de cada lado da placa
foram plantadas onze mudas de figueira. A proposta de artista é que ao crescerem, as árvores
elevarão a chapa de aço.
70 O Projeto Fronteiras foi uma iniciativa pioneira no país no conceito land art, instalando obras de arte
contemporânea em paisagens distantes e em locais de difícil acesso. A ideia era também proporcionar a doação
destas obras de arte para 'comunidades afastadas dos grandes polos culturais' (ALVES et al, 2012). Entretanto,
passado um pouco mais de uma década da concepção dessas obras, o público parece pouco conhecer: “Vasto
Pampa, descampados, clareiras escondidas, praias gélidas, fronteira com orientais e correntinos. Ainda que
poucos saibam, nas divisas do Rio Grande do Sul com a Argentina e o Uruguai existem arrojadas obras de arte
contemporânea, implantadas há pouco mais de um decênio. Não são obras quaisquer, apesar da escassa
divulgação e (pouca) memória das notas veiculadas, aqui e ali. São de autoria de importantes artistas brasileiros,
[…]" (ALVES, 2010.).
135
Imagem 25: Mesa de Nelson Félix no campus de Uruguaiana da Universidade Gama
Fonte: Muhle (2016).
Apesar do desconhecimento da obra de arte fora da área do campus universitário, o
Professor afirma que em suas trilhas no local aproveita a presença da obra para fazer da trilha
também uma atividade cultural, unindo a história da proposta do projeto e os aspectos
econômicos da região.
A Universidade Gama assumiu a responsabilidade de zelar pela obra e como se trata
de uma doação perpétua toda e qualquer construção física desenvolvida perto do local deve
levar em conta a presença da obra. Uma obra de arte em constante construção e movimento,
um processo longo e ainda com resultados imprevisíveis. Segundo o Diretor do campus:
“Essas figueiras já cresceram, [...] está aqui a chapa e a chapa já está sendo
incorporada pelo tronco da figueira e qual é a ideia? A medida que essa figueira
agora se desenvolva, ela creça e consigo levante essa plataforma de aço inoxidável,
vai ficar bonito... Não sei se vai crescer na mesma proporcionalidade, imagino que
talvez invergue isso, aqui venta muito. Quem segura vento? Vento e água ninguém
segura. Então de repente o vento forte pode deslocar isso do lugar. Mas é importante
cuidar pra que esse material seja preservado”.
A área em torno do arroio tem a característica de ser uma Área de Preservação
Permanente, sendo obrigatório por lei sua preservação. A área onde está inserida a obra de
arte Mesa também não pode ser alterada. No entanto, como dito acima, professores desse
136
campus encontraram uma maneira de usar de forma didática essa área de proteção. Justamente
por ter cursos das áreas de Ciências da Natureza e Acquicultura, o espaço se tornou favorável
por oferecer elementes de estudo.
No campus da Universidade Gama em Dom Pedrito é desenvolvido o Projeto Biomas,
um projeto de pesquisa realizado em parceira entre a Confederação da Agricultura e Pecuária
do Brasil (CNA), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e insituições de
ensino e pesquisa nos seis biomas brasileiros. No caso do bioma Pampa a parceria com a
instituição de ensino e pesquisa é feita com a Universidade Gama, justamente por estar
localizada na região de predomínio deste bioma. O objetivo inicial do projeto é “apresentar
aos produtores rurais modelos de uso da árvore com fins econômicos e ambientais”
(PROJETO BIOMAS, 2017) e a parceria com a universidade em Dom Pedrito se deu com a
instalação de um viveiro de mudas no campus (Imagem 26). A criação do viveiro abriu
espaço para novas ideias a serem contempladas além do Projeto Biomas e que estão sendo
pensadas pela universidade. Uma delas seria a produção de mudas nativas da bacia do Rio
Santa Maria visando a recuperação da mata ciliar de alguns pontos do rio, bem como a criação
de mudas para a recuperação vegetal da área experimental da Universidade Gama.
Imagem 26: Viveiro de mudas nativas no campus Dom Pedrito da Universidade Gama
Fonte: Muhle (2016).
As ações buscariam, segundo o professor da Universidade Gama e que também é
coordenador do Projeto Biomas, dar um caráter também extensionista e de ensino, além do
caráter de pesquisa para estas atividades. A área do campus em Dom Pedrito foi usada para a
137
construção destes viveiros, que por sua vez produzirão mudas que serão utilizadas pelo
projeto e também tem o potencial de serem usadas no reflorestamento das áreas verdes da
própria universidade, envolvendo nisso projetos de educação ambiental dentro da
universidade.
5.2.4 As trilhas Áreas verdes da Universidade Delta
Como já citado na apresentação da área, o campus em São Leopoldo da Universidade
Delta possui o Grupo de Educação Ambiental, grupo voluntário conduzido pela Professora de
Biologia que utiliza as áreas verdes do campus como lugares para a realização de práticas
educativas. O grupo recebe escolas da rede básica de ensino, tanto públicas quanto
particulares, da região de São Leopoldo e áreas próximas para trabalharem com temas da
educação ambiental e fazer uma das suas diversas trilhas: Trilha do Lago, Trilha da Divisa,
Trilha do Gambá, Trilha Terra. Somado a estas atividades, o grupo também conduzia trilhas e
minicursos sobre ecossistemas durante os dias de vestibular de verão para alunos, familiares e
amigos que aguardavam o período da prova. As trilhas no campus também eram realizadas
com alunos de graduação da disciplina Laboratório de Ciências, visando mostrar aos
estudantes o uso didático desta prática. Segundo a Professora, usar trilhas como recurso
didático já era conceito empregado e utilizado pelo Professor fundador do grupo.
Durante a realização da presente pesquisa algumas atividades do Grupo de Educação
Ambiental foram acompanhadas, como encontros de estudos, orientações, atividade de
educação ambiental dentro do Espaço Ambiente e Vida e duas trilhas, a Trilha da Divisa
(Imagem 27) e a Trilha do Lago (Imagem 28). A Trilha da Divisa foi realizada com alunos
universitários e a Trilha do Lago foi realizada com alunos do 5º ano de uma escola particular
da região. A Trilha da Divisa, desenvolvida por uma das alunas de Biologia em seu trabalho
de conclusão de curso, percorreu um caminho passando por prédios e estacionamentos, mas
também pelas áreas verdes e pelo local onde estão plantas medicinais e árvores frutíferas com
placas de identificação. As abordagens durante o caminho também buscaram identificar quais
seriam as ações antrópicas positivas e negativas presentes na trilha. A Trilha do Lago
percorreu caminhos ao redor do lago com vegetação mais fechada e também trouxe mais
elementos trabalhados de educação ambiental.
138
Imagem 27: Trilha da Divisa Universidade Delta
Fonte: Muhle (2016).
Imagem 28: Trilha do Lago Universidade Delta
Fonte: Muhle (2016).
139
Existe uma parceria informal entre o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a
Docência (PIBID)71 presente na universidade e as escolas que participam deste programa
recebendo alunos para estágio na realização das atividade de educação ambiental do Espaço
Ambiente e Vida. Por receberem alunos para o estágio de docência, principalmente da área do
curso de Biologia, as escolas tem a comunicação facilitada entre atividades que são oferecidas
pela universidade e podem ser conduzidas e agendadas pelos alunos de estágio.
Estas atividades oferecidas pelo Grupo de Educação Ambiental proporcionavam uma
relação próxima com a comunidade escolar e uma interação com o ambiente universitário. Era
uma relação que contemplava a responsabilidade social e ambiental da universidade uma vez
que se estendia à comunidade externa. É possível e bastante provável que a demissão da
professora responsável pelo grupo culmine a extinção destas atividades.
Como a universidade mantém suas portas abertas inclusive aos finais de semana, sua
vasta área verde também serve de local de práticas de exercícios e atrai visitantes que estão
em busca de áreas calmas para contemplação.
5.2.5 Mais do que uma trilha com nomes Jardim Botânico da Universidade Épsilon
O Jardim Botânico da Universidade Épsilon é aberto ao público e também recebe
escolas e grupos para visitação guiada, como já exposto no texto da descrição da área
(Imagem 29). No passado houve a tentativa de interação com as escolas de duas maneiras.
Inicialmente os trabalhos que se faziam no Jardim Botânico eram trilhas baseadas nos
aspectos botânicos do Jardim, apresentando as plantas com seus nomes científicos, nomes
populares, botânica econômica e curiosidades, o que para o Professor Diretor tinha se tornado
algo muito restrito “a uma trilha com nomes”. A primeira tentativa de mudança foi articular
um projeto de educação ambiental que permitisse o acompanhamento das escolas que
visitassem o Jardim para que o envolvimento não se restringisse à uma única vez. Por motivos
71 O programa oferece bolsas de iniciação à docência aos alunos de cursos presenciais que se dediquem ao
estágio nas escolas públicas e que, quando graduados, se comprometam com o exercício do magistério na rede
pública. O objetivo é antecipar o vínculo entre os futuros mestres e as salas de aula da rede pública. Com essa
iniciativa, o PIBID faz uma articulação entre a educação superior (por meio das licenciaturas), a escola e os
sistemas estaduais e municipais (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2016b).
140
da falta de estrutura das escolas e uma difícil abertura no currículo escolar este projeto não foi
adiante.
Atualmente as escolas tem a disponibilidade para uma breve visita e então a equipe
apresenta os diferentes aspectos que são desenvolvidos no Jardim Botânico, quais são seus
objetivos e uma trilha rápida para conhecer brevemente a área, as plantas medicinais e
carnívoras. “Um tour para conhecer o Jardim”, como me diz o Professor. Quando há mais
tempo para a visita é possível conhecer a variedade da vegetação e curiosidades como o
bambu comestível, o túnel de bambu, a árvore do viajante; e ainda aprender sobre as plantas
medicinais, as carnívoras e as alimentícias.
Algumas vezes as visitas realizadas pelas escolas tendem a conciliar a vista ao Jardim
Botânico com outros espaços da universidade, como por exemplo o Herbário e o Planetário.
Quando as escolas são de cidades do interior, muitas vezes conciliam a visita com idas a
locais fora da universidade também72. Este tipo de visitação casada pode ocorrer para que
haja a otimização de fatores como o gasto para o transporte e disponibilidade dos professores.
Entretanto, acaba comprometendo a qualidade das atividades realizadas pela redução no
tempo. O Professor Diretor gostaria de ter mais tempo para que os alunos pudessem se
expressar e interagir, saindo um pouco do modelo monólogo das aulas expositivas.
“A gente vê assim como uma saída é uma coisa limitada, porque tu tenta ver o
mundo numa saída. [...] E a gente vê uma demanda de conhecer mais os estudantes
que estão visitando, de conhecer mais os professores, de tentar ajudar eles e a
frustração é não conseguir ir mais além”.
O projeto também desenvolvido pelo Jardim Botânico e que segundo o professor tem
dados bons resultados é o projeto onde a equipe vai até às escolas. Esta metodologia permite a
possibilidade de uma interação maior com os alunos, uma vez que essa visita se repete para a
realização de diversas atividades de educação ambiental. Para o meu interlocutor isso tem
funcionado mais, pois eles têm conseguido fazer esse acompanhamento, entretanto apesar
deles irem à escola, o palco, que seria o Jardim Botânico não está lá: “a gente pode até levar
plantas do Jardim Botânico pra mostrar, mas é uma coisa um pouco diferente de eles entrarem
lá dentro, pisarem, caminharem e olharem lá”.
72 No dia em que acompanhei a visita de uma escola ao Jardim Botânico, a professora responsável pediu ao
Professor Diretor que encurtasse a visita ao Herbário e ao Jardim Botânico, pois o grupo ainda gostaria de visitar
o shopping center de Santa Maria. Como era uma escola do interior do estado, as crianças nunca tinham visitado
um shopping center.
141
Imagem 29: Trilha pelo Jardim Botânico da Universidade Épsilon
Fonte: Muhle (2016).
Princípios da permacultura também estão presentes no Jardim Botânico da
Universidade Épsilon (Imagem 30). Em parceria com o Professor Diretor, o secretário
administrativo desenvolve com grupos escolares oficinas de permacultura, como a
bioconstrução da estrutura feita com bambu localizada no Jardim. Neste tipo de atividade são
abordados temas sobre os recursos naturais e sustentabilidade.
Imagem 30: Bioconstrução de bambu no Jardim Botânico da Universidade Épsilon
Fonte: Muhle (2016).
142
Com relação ao uso didático universitário, os professores tem no Jardim Botânico um
espaço disponível para montarem suas aulas. Todavia, esta é uma prática pontual, que ocorre
uma ou duas vezes durante um semestre. O Professor Diretor, que é professor de Botânica
Sistemática, costuma fazer uso do espaço para suas aulas, alternando o laboratório com o
Jardim Botânico como salas de aula. Além da visitação das escolas e das aulas universitárias,
o Jardim Botânico também é frequentado por instituições de educação infantil, por pacientes
convalescentes73, turmas da educação especial, observadores de aves e grupos da terceira
idade. No local também realizam-se diversas pesquisas, como por exemplo pesquisas nas
áreas de entomologia e fenologia de aves. Por ser um local com beleza cenográfica, o Jardim
também atrai fotógrafos, como o grupo de fotógrafos formado por professores, técnicos,
estudantes da universidade, gente de fora e gente de dentro da universidade. Segundo meu
interlecutor “vem de tudo que é curso: Física, Filosofia, Matemática, História, gente da cidade
que quer visitar”.
Turmas dos cursos de Arquitetura, Terapia Ocupacional, Geografia, Química,
Farmácia e Veterinária também já visitaram o jardim com a intenção de aproveitar um lugar
diferente na universidade. Por certo estas visitas são escassas, não é toda dia, não é todo ano.
Algumas vezes as visitas ocorrem com a intenção de criação de projetos, ou vendo a
possibilidade de encaixar algum conteúdo curricular nesta atividade, ou muitas vezes por
curiosidade. As possibilidades são variadas, mas o uso do Jardim Botânico para atividades
acadêmicas para além do curso de Biologia ainda são tímidas.
O campus da Universidade Épsilon possui vasta área verde, o que o torna realmente
atrativo para visitações e práticas de exercícios. Esta parte verde do campus é conhecida como
o Bosque da Universidade Épsilon, criado em 1977 com uma ampla área verde e cortado por
uma pista de caminhada (Imagem 31). Certamente o bosque é um dos locais preferidos por
quem visita o campus. E a universidade também incentiva o uso do bosque e do próprio
campus através de projetos realizados inclusive aos finais de semana.
73 O campus em Santa Maria também abriga o Hospital Universitário.
143
Imagem 31: Bosque da Universidade Épsilon
Fonte: Ramos (2016).
O curso de Artes Cênicas da Universidade Épsilon já utilizou o Bosque para a
realização de um piquenique e dinâmicas de integração para o acolhimento dos alunos
calouros (DAMAZIO, 2015). Assim como o Jardim Botânico, o bosque é bastante admirado
por seus atributos cênicos naturais, além de convidativo para a prática de esportes, como
caminhadas e corridas, também é convidativo para momentos de contemplação de um espaço
arborizado e calmo no meio de um campus universitário movimentado. O Bosque também
tem potencialidade de ser uma sala de aula ao ar livre, assim como o Jardim.
5.2.6 Áreas verdes da cidade Jardim Botânico e campus da Universidade Zeta
O Jardim Botânico de Caxias do Sul (JBCS) é um local turístico da cidade e aos finais
de semana costuma receber visitantes que vão até lá para ter contato com espaços verdes, uma
vez que a cidade não dispõe de muitos parques e áreas afins (Imagem 32). Durante a semana o
Jardim Botânico recebe escolas para a realização de atividades de educação ambiental que são
realizadas pela parceria entre a Prefeitura Municipal, através do setor de Educação Ambiental
da Secretaria Municipal do Meio Ambiente, e a Universidade Zeta.
144
Imagem 32: Caminhos do Jardim Botânico de Caxias do Sul
Fonte: Muhle (2016).
Por estar localizado junto à Represa São Paulo, o Jardim Botânico atua na preservação
da Bacia Hidrográfica do Arroio Dal Bo, uma vez que sua existência contribui diretamente
para a recuperação da vegetação nativa que cobre as margens do arroio. O local também já
serviu de inspiração e campo de pesquisa para trabalhos universitários, como trabalhos de
conclusão de curso e dissertações de mestrado. Existe uma forte parceria entre o curso de
Ciências Biológicas da Universidade Zeta e o JBCS, que disponibiliza aos professores
pesquisadores e alunos matéria prima para suas pesquisas. Projetos de educação ambiental
também são desenvolvidos para aproximar as escolas do Jardim Botânico e seus objetivos.
Desde 2006, o Jardim Botânico de Caxias do Sul realiza o projeto “O Jardim Botânico
Vai à Escola, projeto criado pela Comissão de Educação Ambiental da Rede Brasileira de
Jardins Botânicos e que é uma iniciativa de um projeto maior e internacional, Investing in
Nature do Botanic Garden Conservation International (BGCI), coordenado aqui no Brasil pelo
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro e a Rede Brasileira de Jardins
Botânicos, com patrocínio do Banco Mundial HSBC (ACOSTA, 2013). O projeto contempla
escolas públicas de Caxias do Sul e região do entorno, auxiliando os professores a
desenvolverem projetos com as questões ambientais como tema transversal. O projeto
também incentiva o uso do Jardim Botânico como um espaço educativo.
145
Os monitores que executam as atividades de educação ambiental no Jardim Botânico
são pagos pela Prefeitura de Caxias do Sul e muitos são alunos do curso de Ciências
Biológicas da universidade. Segundo a Professora que atualmente é a responsável pela
cogestão do Jardim: “nós não somos os responsáveis. Nós somos, digamos, gestores junto
com a SEMA do programa de educação ambiental que existe no jardim. É hoje o nosso
envolvimento como instituição naquela área verde”. A Professora também faz do espaço um
local para suas práticas em ecologia e botânica, levando seus alunos até o Jardim para fazerem
atividades de campo e experimentações. Segundo ela, outros professores colegas seus,
também usam a área verde com este fim, de trabalhar seus conteúdos curriculares.
O campus sede da Universidade Zeta na cidade de Caxias do Sul atrai visitantes aos
finais de semana para passeio, caminhadas, piqueniques e visitas ao zoológico. Durante a
semana é possível encontrar escolas e demais grupos visitando o campus, o zoológico e o
Museu de Ciências Naturais. Os espaços verdes no campus são convidativos para usos
diferenciados, como por exemplo um piquenique (Imagem 33).
Imagem 33: Alunos da Educação Infantil usando as áreas verdes do campus da
Universidade Zeta para um piquenique após visita ao Zoológico
Fonte: Muhle (2016).
Como a cidade de Caxias do Sul não possui muitas áreas verdes que possibilitem a
visitação, o campus da universidade se mostra como uma opção de lazer. A área possui vasta
área verde, bastante arborizada e com lagos artificiais que atraem visitantes. Junto com o
146
Jardim Botânico, a Universidade Zeta está envolvida com gestão de representativas áreas
verdes da cidade.
5.2.7. Espacos de aula APPs e RPPN da Universidade Etá
As áreas verdes existentes no campus sede da Universidade Etá são utilizadas de
diferentes formas por diversos professores. Entretanto, para a presente pesquisa, foram
elencados alguns personagens. As Professoras de Zoologia e Ecologia e o Professor de
Agronomia fazem das Áreas de Preservação Permanente verdadeiras salas de aula ao ar livre.
Quando do desenvolvimento de suas estruturas, a área da Reserva Particular do Patrimônio
Natural criada pela universidade se somará às APPs que já são usadas como lugares de
práticas educativas.
As interlocutoras da pesquisa sobre o uso das áreas verdes na Universidade Etá são
professoras e pesquisadoras do Instituto de Ciências Biológicas da universidade. Também
trabalham como técnicas para a manutenção das licenças de operação que envolvem as Áreas
de Preservação Permanente presentes no campus em parceria com a FEPAM. Ambas dão
aulas dentro das APPs, uma das professoras trabalha com a parte da ecologia de populações e
comunidades, avaliação da qualidade de água, sucessão/ restauração ambiental e uso público;
e a outra professora com aulas sobre anfíbios, répteis, mamíferos e especificamente com as
disciplinas de zoologia costuma realizar junto com os alunos o monitoramento da fauna
existente no campus. Segundo ela, já foi possível indentificar no campus a presença de
graxains, gatos do mato, gambás, quatis e até mesmo de veados através de rastros como
pegadas, armadilhas fotográficas e até mesmo por visualização. Resultados estes inclusive
divulgados em jornal local do município (Imagem 34).
147
Imagem 34: Resultados da pesquisa com armadilhas fotográficas no campus da
Universidade Etá em jornal local
Fonte: Muhle (2016).
As professoras destacam que as áreas verdes em que trabalham já eram classificadas
como Áreas de Preservação Permanente em sua vocação original. Elas citam a conquista com
o uso destes lugares da construção de corredores ecológicos entre duas áreas de APPs com a
colocação de placas e redutores de velocidade (Imagem 35). Segundo elas, conseguiram unir a
questão legal, das áreas já estarem protegidas por lei, com a sensibilização da comunidade
acadêmica pela fauna presente no campus. Por existirem diversas espécies de animais que
vivem e circulam pelo campus, usar as Áreas de Preservação Permanente como refúgios
interligados para estes animais foi, para os professores, uma decisão acertada em termos
ecológicos e educativos. Segundo o Professor da Agronomia,
“A gente tem procurado não só manter as APPs, mas usar elas, mostrar o que que
está errado, o que pode dar certo. Hoje está tudo identificado, as Áreas de
Preservação Permanente. Tem identificação, se tem passagem de animais. A gente
não vê durante o dia, mas a noite tem bastante aqui. De vez em quando as
Professoras registram algum atropelamento. Mas ainda assim é raro com todo esse
movimento que tem a noite dentro do campus, eu esperaria mais. Porque tem
veados, graxaim... E eles vem, a cidade está ali do lado”.
148
Imagem 35: Placas de atenção aos animais no campus da Universidade Etá. Uma das
conquistas do uso das Áreas de Preservação Permanente
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Fonte: Muhle (2016). or
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Para a criação deste corresduor, junto com o Professor de Agronomia, estão implantando
um sistema agroflorestal com ervma-mate e usando o espaço como um espaço para aula, neste
caso específico com alunos do cmuraso de Agronomia. Segundo o Professor, as áreas são ricas
em conteúdos didáticos:
ry
“Bom, entãoofnós temas essas áreas de APPs dentro do campus, próximo a nós, que é
o que eu maanis uso. Sou professor de Fruticultura, Silvicultura e Propagação. Nessa
parte da silvicultura eu utilizo essas áreas de APP pra falar sobre mata-ciliar,
corredor ecionltóegico, nós tínhamos aqui áreas que tinham plantadas pinos que foram
cortados e a área já está em regeneração total. A gente enriqueceu algumas áreas,
outras naturaelms ente foram evoluindo e tem muitas espécies”.
ting
As Professoras de Ecologpioai e Zoologia afirmam que as atividades que desenvolvem
nestas áreas misturam gestão, penstq. uisa, ensino e extensão. Parece haver disponibilidade de
recursos financeiros para as ativiYdaodes desenvolvidas nas APPs, como por exemplo, a compra
das armadilhas fotográficas quue foram pagas com verba da fundação que mantém a
universidade.
can
As professoras também pdoessenvolvem trilhas pelas APPs, e em algumas áreas é
possível inclusive ver traçados pirtioontos de uso público. A intenção das professoras com esse
trabalho é falar sobre os impanctos ambientais que podem ser causados no ambiente se
utilizados sem cuidado e atravéthsedas trilhas é possível fazer o monitoramento. Como o
campus fica aberto aos finais dteexstemana recebe muitos visitantes que vão ao local fazer
box
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149
diversas atividades. Caminhadas, roda de chimarrão e piqueniques são algumas destas
atividades. Entretanto, as Áreas de Preservação Permanente também são visitadas para pesca,
o que não é permitido. É um trabalho que envolve educação e a responsabilidade social da
universidade. As professoras mantém também uma constante campanha para o descarte
correto dos resíduos, isso com a parceria da gestão ambiental da universidade. A cada nova
turma que ingressa, essas questões são trabalhadas. Como me diz uma das professoras:
“princípios de comunidades educativas e aprendentes”.
O envolvimento do casal de professores não se restringe à criação da RPPN da
universidade, mas também a trabalhos desenvolvidos no campus de Passo Fundo como um
todo. É desenvolvido na área um projeto de monitoramento e anilhamento das diversas aves
presentes no campus, o que tem permitido a identificação e acompanhamento destas espécies.
Para a Professora “este belo local também serve para a realização de práticas através das
disciplinas de Zoologia, Comportamento Animal, Ecologia, Manejo de Vida Silvestre e
Silvicultura. Este trabalho tem possibilitado a realização de pesquisas com a avifauna e
também a realização de aulas práticas com alunos que se aproximam das aves para
identificação e comportamento.
5.2.8 Lugar de conservação - Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Teta
Em conversa com a Professora da Universidade Teta que visita de forma sistemática a
Reserva Particular do Patrimônio Natural com suas alunas do curso de Pedagogia, ela afirma
que além de permitir o contato com um ambiente natural da região, a visita à reserva também
é uma saída com baixo custo:
Então a reserva pra isso é legal porque a gente não precisa pagar, o ônibus Linha
Almeida é perto daqui, e muitas sendo dessa região não conhecem o que tem aqui
em volta. A maioria nem valoriza o ambiente natural aqui em volta.
Esta disciplina na qual a Professora leva as alunas à RPPN da universidade - e
segundo ela para outras áreas naturais também trabalha com questões específicas da
educação ambiental, como diretrizes e políticas, para além do planejamento de atividades e
programas. Ela afirma que um dos programas estruturantes da Coordenadoria Estadual de
Educação do Rio Grande do Sul envolve a questão da Educação para a Sustentabilidade, o
que tem tornado expressivo o número de projetos de educação ambiental nas escolas da
150
região. “A questão é bem forte nas escolas. Acho que não tem uma escola que não tenha pelo
menos um projeto ligado ao lixo, reciclagem, por exemplo”. Dentro deste contexto, ela
acredita que as saídas para áreas naturais, como a RPPN, ajudam a despertar o interesse pelas
questões ambientais. Além das futuras pedagogas trabalharam isso na disciplina, também as
auxiliam na elaboração de projetos nas escolas em que trabalham.
A Professora não deixa de salientar que a percepção dela e das pessoas que gostam da
área ambiental é diferente das alunas que muitas vezes acabam indo sem maiores
entusiasmos. A ida à reserva não é obrigatória, mas para as alunas que não participam da
saída é solicitado um trabalho escrito, o que para a professora “obviamente é muito mais
chato que caminhar...”. Então as alunas acabam indo e quando abertas para a experiência,
voltam com outra percepção. Para a Professora:
“Está se criando uma cultura, porque na medida que elas vão vendo que criam
outros vínculos, que percebem outras coisas e que já estão mais ou menos
acostumadas com essa prática, elas vão. E agora com Base Nacional Comum
Curricular toda a ênfase que a área de Ciências da Natureza está recebendo também
tem uma ressignificação das experiências para além da sala de aula. [...]. Sempre que
a gente pode a gente faz. E também porque as meninas tem algumas que nem
conhecem Porto Alegre... Então é uma forma de mostrar, de ver o mundo um pouco
diferente, maior. Então a gente faz isso...
Questionada sobre seu envolvimento com a reserva e se ela acreditava no potencial
educativo e formativo do lugar, a Professora afirma que sim. Principalmente em termos da
recuperação vegetal, a reserva está cumprindo seu papel de conservação. Entretanto, não
deixa de identificar alguns problemas que existem na RPPN e sua gestão que podem estagnar
sua potencialidade educativa:
Obviamente que sim, como espaços desse tipo talvez o que falte, e é um problema
das comunitárias, é uma estrutura econômica pra dar consolidação aos programas e
projetos que tem. Tem sem dúvida potencial, aquela região. Por exemplo, eu vejo
com as alunas cada vez que a gente vai a gente vai acompanhando o processo de
recuperação do ambiente, na própria trilha, muito esforço. E mesmo quem vai pela
primeira vez já consegue ver toda a sucessão. O que faltaria era ter mais
infraestrutura. Por exemplo, mais possibilidade de utilização, mais dinheiro pra fazer
projetos mais permanentes. Embora nós temos uma situação de pesquisa e extensão
diferenciada em relação à outras universidades. Porque o professor que é do regime
tem um determinado número de horas pra fazer pesquisa e projetos que ele pode
aprovar. Mas ainda não é suficiente pra poder aproveitar todo o potencial que o
espaço tem.
151
Dois professores da Universidade Teta74 participaram da elaboração dos laudos de
qualidade da área para a compra do terreno pela Souza Cruz. A área foi escolhida
especificamente para se tornar uma Reserva Particular do Patrimônio Natural que seria
gerenciada pela Universidade Teta. Após determinação da área para a compra e a doação da
área para a universidade, participaram da elaboração do plano de manejo sobre como a área
deveria ser utilizada. Além do envolvimento adminstrativo e nestes trâmites iniciais, o
envolvimento de um destes professores com a reserva continua atuante. Este professor foi um
dos interlocutores da pesquisa. Ele relata seu envolvimento com o lugar:
“Eu e o meu colega usamos de duas maneiras: uma é a educação ambiental, isso
significa então não só alunos da própria universidade, mas também escolas e outros
que visitam conosco ou junto com nossos alunos a área pra fazer visitação e
educação ambiental. E o outro, que nós usamos a área pra fazer as pesquisas nossas,
já que eu sou zoólogo nós usamos pra coleta de animais, levantamentos, observações
e diversas atividades lá em campo. Então já tive alunos de estágio, de monografia,
então tem vários que já utilizaram essa área pra fazer estudo da biodiversidade.
O projeto de educação ambiental desenvolvido pelos professores e universitários,
acontece com escolas públicas e privadas da região de Santa Cruz e arredores, atendendo
ensino fundamental e médio. O Professor vai até a escola para dar palestras sobre animais,
especialmente os animais da região; e o seu colega ministrava palestras sobre Botânica,
também com ênfase na flora regional. Os alunos da universidade auxiliam no preparo dos
materiais, mas as palestras são ministradas pelos professores, cada uma atendendo o perfil
etário de seu público. Estas atividades costumam ocorrer frenquetemente durante o ano letivo,
chegando ao ápice de até duas palestras semanais nas escolas para os professores.
Este projeto já rendeu a publicação de pequenos livros (Imagem 36) que são
distribuídos nas escolas: Insetos (Artrópodes), Mitos e curiosidades sobre os animais,
Ecossistema Marinho, em um total de oito títulos. São livretos para colorir com informações e
atividades educativas sobre estes assuntos. De acordo com o Professor:
Então nós temos todos os ecossistemas pra pintar, informações biológicas corretas
sobre animais nativos da região. É bem focado aqui, nós evitamos na verdade falar
de elefante, girafa e leão. E por isso o assunto normalmente das palestras está
vinculado com isso para os alunos e o professor poderem seguir adiante.”
74 Durante a execução da pesquisa, um destes professores passou a não estar mais associado à Universidade
Teta.
152
Imagem 36: Publicações do Projeto de Educação Ambiental da Universidade Teta
Fonte: Muhle (2016).
Segundo o Professor, a cada dois anos eles publicam uma nova edição. Ele mesmo
quem publica os livros e procura parceiros dispostos a financiar a impressão das cópias e
assim as escolas recebem gratuitamente este material. O argumento utilizado para conseguir
esta parceria é que as empresas também fazem parte da comunidade e devem zelar pelo meio
ambiente. A associação mantenedora da Universidade Teta, também auxilia. Segundo ele, as
escolas podem pedir, mandar e-mail e ele se responsabiliza em enviar. Material este que já foi
solicitado em escolas de Canoas, Porto Alegre e até mesmo Curitiba, no Paraná.
Com relação as visitas à RPPN o Professor me explica que esta é uma fração ínfima de
todo o trabalho de educação ambiental que desenvolvem com as escolas. Para ele, as visitas
nas escolas, a publicação do material didático e as atividades que os estagiários de docência
desenvolvem na própria instituição levando suas turmas de alunos75, são muito mais
expressivas e efetivas que a visita à reserva em si. “Então isso é muito mais educação
ambiental que nós estamos fazendo do que através da RPPN. São 95% e a RPPN apenas 5%
digamos assim.
Esta proporção se dá em relação aos custos que são despendidos para uma visita à
reserva. Isto é devido aos custos com o transporte até o local da reserva, custos com a
75 Normalmente os estagiários da Disciplina Estágio em Biologia trazem suas turmas de alunos para o campus
universitário, uma vez que seu acesso é dentro da cidade e o custo do transporte é relativamente baixo. No
campus eles tem a possibilidade de realizar um turno de atividades (visitas à laboratórios, coleções, herbário)
com mais facilidades do que em uma visita à RPPN.
153
alimentação dos alunos e professores, e de conseguir a disponibilidade dos dois turnos, manhã
e tarde, dos alunos e principlamente dos professores (que muitas vezes trabalham em mais de
uma escola) para a realização da visita. Isto acaba dificultando e encarecendo o passeio.
Embora a sede dos visitantes ofereça cozinha, que poderia facilitar esta questão, como o
Professor diz “é um problema do envolvimento que algumas escolas não querem ter. É mais
trabalho do que dando aula normal na escola. Situação similar a enfretada pelo Professor
Diretor do Jardim Botânico da Universidade Épsilon.
Quando questionado se essas atividades que eles exercem nas escolas enquanto
professores teriam algum incentivo da universidade ou alguma obrigação, o Professor me
responde:
Vem um pouco pelo sistema universitário de ser comunitário. [...] E aqui nós temos
muito esse contato com professores ex-alunos e realmente não existe um incentivo
pra fazer, mas do outro lado também não existe uma barreira para não fazer. Então
nós temos essa libedade de atender as escolas dentro da nossa carga horária na
insituição.
Apesar destas dificuldades, o programa de educação ambiental não inviabilizou suas
ações, mas encontrou desde sempre uma maneira mais efetiva de trabalhar com as escolas nas
próprias escolas. E a busca pelo projeto é grande, como o Professor afirma, cerca de 70% dos
professores de Biologia do município e região foram formados ou fizeram algum tipo de pós-
graduação na Universidade Teta, o que facilita o contato e acesso ao projeto de educação
ambiental e ao uso dos próprios espaços no campus universitário.
154
6 TONS DE CINZA NAS RELAÇÕES ENTRE AS UNIVERSIDADES E AS ÁREAS
VERDES
A seguir serão apresentados quatro eixos de análises que foram elaborados a partir dos
dados apresentados no capítulo da Descrição do Campo. O eixo Das Instituições, que propõe
uma reflexão sobre como a pouca flexibilidade nas estruturas burocráticas presente em alguns
modelos universitários pode ser a responsável pela situação atual das áreas verdes. Este eixo
está subdividido em Como tornar invisível um lugar, Como tornar um lugar opaco, e
Construção de espaços ou lugares? O segundo eixo, intitulado Dos Usos, sintetizará como se
dão os usos das áreas verdes pelas instituições e pelas pessoas. Solitude Ambiental, o terceiro
eixo, apresentará as histórias dos personagens envolvidos na criação, idealização e
manutenção destas áreas. Por último, o quarto eixo, Da Gestão Ambiental, pretende discutir
sobre o lugar que estas áreas verdes ocupam nos processos de ambientalização das
universidades.
6.1 Das Instituições
Existe uma tendência, que vem desde o final da Idade Média e início da Modernidade
Ocidental, que é a produção de uma concepção de conhecimento acadêmico estreitamente
vinculada à ciência normal e ao conhecimento objetivo. Do mesmo modo, a universidade,
lugar por excelência onde se produz este conhecimento, é parte do sistema formal de
educação, com toda sua carga de formalização, disciplinamento do tempo e espaço e
abstração da vida do dia a dia. Neste modelo, a ciência e a educação corroboram para criar um
ambiente onde o pensamento científico e acadêmico deve se constituir em oposição ao senso
comum. E, para se manter assim, deve ser protegido das inconstâncias do cotidiano, dos
corpos, da vida da rua, dos jardins, das florestas e dos bosques, enfim, de tudo que está do
lado de fora da sala de aula e dos laboratórios. A academia, instituída como agente da Razão,
em sua missão civilizadora, acabou gerando como efeito colateral, um conhecimento que
quanto mais se distancia da vida, mais corre o risco de se tornar, neutro, duro, excessivamente
racional, descolado do mundo vivido. As estruturas universitárias que se mantém até os dias
atuais nas sociedades Ocidentais sofreram esta influência e vivem o dilema de estarem
155
voltadas para a compreensão da vida a partir de um modelo de conhecimento que não pode
aproximar-se demais das imprevisibilidades e aberturas do mundo que deseja compreender.
Embora com algumas tentativas de mudanças estruturais, efetivamente nunca se deixou de ser
mais do mesmo modelo. Este é o ethos dessas estruturas. Na busca por estabilidade e solidez,
também emerge no plano administrativo a dimensão da burocracia como questão de ordem se
fez necessária e predominante nestas instituições. “Uma burocracia montada para sobreviver a
sublevações” (SENNETT, 2006, p. 40) que configura um caráter de impermeabilidade a estes
modelos de universidades.
Esta estrutura universitária, com suas durezas e burocracias, muitas vezes inviabiliza e
invisibiliza as relações com as áreas verdes, como demonstrado ao longo da descrição do
campo. Muito embora com diferenças nas relações, existem padrões recorrentes nas histórias
apresentadas. Estas relações entre as universidades e suas áreas verdes dependem da
conjectura em que se encontram. Apesar de terem uma relação permanente, as percepções das
universidades sobre suas áreas verdes, mudam em relação ao contexto, uma hora tomando-as
marcos históricos e promissores na sua criação, e na sequência tornando estas áreas espaços
invisíveis, opacos ou anulados na sua grandiosidade inicial. A insustentabilidade desta relação
está diretamente ligada à estrutura burocrática das universidades que mantém este conceito de
conhecimento indoor como o único válido, e ao fato de que quando faltam as personagens
idealizadoras das áreas verdes, estas áreas perdem seu suporte.
Fazendo uma analogia com a visão de Sennett a respeito das instituições, da
burocracia e das pessoas, é possível enxergar o mesmo mecanismo acontecendo em relação às
áreas verdes. Pensando simetricamente os indivíduos e as àreas verdes - não humanos,
podemos enxergar que os desafios descritos por Sennet para a sociedade também foram
impostos às áreas verdes. O autor discorre sobre três desafios impostos para indivíduos que
desejam prosperar em condições sociais instáveis e fragmentárias. As estruturas burocráticas
das universidades, parecem tender a isolar suas áreas verdes e não integrá-las no coração do
sistema de gestão, o que resulta que estas permanecem à margem de fontes permanentes de
recursos financeiros e quadros gestores, permanecendo demasiadamente dependente dos
indivíduos ambientalmente engajados e envolvidos diretamente com estes espaços verdes.
Neste sentido, o primeiro desafio se apresenta com relação ao tempo, como lidar com
algo que foi pensado para ser duradouro e, no entanto, as instiuições já não proporcionam um
contexto de longo prazo, neste contexto “o indivíduo [ÁREAS VERDES] pode ser obrigado a
improvisar a narrativa de sua própria vida, e mesmo a se virar sem um sentimento constante
de si mesmo” (SENNETT, 2006, p. 13).
156
O segundo desafio imposto às áreas verdes é “como desenvolver novas capacitações,
como descobrir capacidades potenciais, à medida que vão mudando as exigências da
realidade” (SENNETT, 2006, p. 13). E como fazer isso sem ter alguém que olhe para essas
áreas e que tenha poder de decisão. Se faz necessário o poder de reinvenção e ressignificação
destas estruturas, uma vez que se já é curta a vida útil de tecnologias e da própria ciência, é
preciso recriar a importância das áreas para evitar sua extinção por completo. Como diz
Sennett “a cultura moderna propõe um conceito de meritocracia que antes abre espaço para as
habilidades potenciais do que para realizações passadas”. Como fazer com que estas
realizações do passado continuem demonstrando suas potencialidades e se mostrem
relevantes? A questão vai muito além da capacidade deste trabalho, mas por certo ele propõe
a reflexão. É preciso reconhecer também o mérito dos professores que idealizaram as áreas
verdes, mas mais ainda aos professores que ainda utilizam as áreas verdes como lugares de
práticas educativas e espaços de conservação ambiental.
Como se reinventar a partir do passado? O terceiro desafio de Sennett nos faz pensar
sobre a universidade que se mostra como instituição ávida por novidades tecnológicas e, ao
mesmo tempo, tem dificuldade para manter e dar visibilidade às áreas verdes. Como equiparar
a validade dos conhecimentos proporcionados pela tecnologia e pelas atividades educativas
das áreas verdes? Por certo a concepção de ciência teve variações ao longo do tempo e estes
momentos históricos já foram brevemente descritos no início desta tese. Longe de querer
aprofundar a dimensão de historicidade deste processo, nossa análise indica que em diferentes
momentos houve diferentes inserções da relevância dessas áreas verdes nas universidades,
atestando maiores aberturas da concepção da Ciência em determinados momentos e um maior
reducionismo desta concepção em outros.
A seguir serão apresentadas três grandes categorias sobre a relação das universidades
com suas áreas verdes geradas a partir da análise dos resultados da pesquisa. Apesar de cada
história apresentar suas individualidades, foi possível encontrar três padrões nas relações das
áreas verdes com as instituições. A primeira categoria apresentada intitula-se Como tornar
invisível um lugar e pretende refletir sobre como as estruturas universitárias podem ter o
poder de anular e preterir a existência das áreas verdes. A segunda categoria, Como tornar
opaco um lugar, destaca a fragilidade de algumas relações entre as áreas verdes e as
universidades, que apesar de existiram não são aproveitadas na sua totalidade e dependem da
força de vontade de pessoas engajadas. Por último neste capítulo, trago a categoria
Construção de espaços ou lugares? para mostrar duas universidades que estão desenvolvendo
e estruturando suas relações com as áreas verdes.
157
Antes da sequência de análises, é preciso retomar os conceitos de lugar e espaço
citados no início desta tese. Este trabalho faz um recorte dos significados destes conceitos
dentro de áreas como Geografia, Psicologia e Educação Ambiental, trazendo para a análise
visões que interessam ao campo da Educação. Para Resor (2010), lugar seria justamente o
oposto de espaço. A concepção de lugar seria algo que envolveria sentimentos, apontamentos
subjetivos que envolvem emoções, nostalgias e significados. Lugar seria um constructo social.
Espaço por sua vez não teria significado, nem emoções. Segundo Ingold (2015a, p. 215), o
conceito de espaço é “de todos os termos que usamos para descrever o mundo em que
vivemos, trata-se do mais abstrato, do mais vazio, do mais destacado das realidades da vida e
da experiência”. Tratam-se de dois conceitos subjetivos que são construídos através das
percepções dos indivíduos, pelas influências e cultura que nos cercam.
O conceito de espaço descreve o mundo em que vivemos de forma abstrata e fria,
diferentemente do conceito de lugar, que envolve a sensação de pertencimento e acolhimento.
A lógica da inversão (INGOLD, 2015a, p. 215) explicaria como que lugares poderiam ser
reduzidos a espaços no congelamento das linhas e fluxos que os formam. De acordo com o
autor,
A inversão transforma as vias ao longo das quais a vida é vivida em limites dentro
dos quais está encerrada. A vida, de acordo com esta lógica, é reduzida a uma
propriedade interna de coisas que ocupam o mundo, mas estritamente falando, não o
habitam. Um mundo que seja ocupado, mas não habitado, que está cheio de coisas
existentes, em vez de tecido a partir dos fios do seu devir, é um mundo de espaço.
As áreas verdes estudadas foram criadas como lugares de amor, de experiências, de
aprendizagem dentro de um contexto idealizado pelas pessoas que as perceberam assim.
Entretanto, como foi identificado nas análises, em algumas situações, esta condição de lugares
habitados passou a ser a condição de espaços dentro das universidades. Lugares habitam,
exercendo seu devir; espaços ocupam, sem a possibilidade de tecer as tramas que os deveriam
constituir.
6.1.1 Como tornar invisível um lugar
O caso do Horto Botânico da Universidade Alfa exemplifica como, em 1945, sua
criação foi considerada algo inovador e promissor em termos de pesquisas e educação
ambiental. Entretanto, o fôlego para continuar dependeria do olhar sensível das estruturas
158
administrativas da universidade, repassando recursos financeiros e humanos para a
manutenção das atividades no local. Os professores que lá ainda adentram para levar seus
alunos e realizar pesquisas já estão tomados de outras obrigações acadêmicas e
adminstrativas. Diante das dificuldades enfrentadas pelas universidades públicas e da
impregnação desta concepção de conhecimento científico válido que é exigido destas
instituições, o Horto Botânico ficou esquecido no fundo do campus onde está localizado.
De certa forma parece que, tanto o Horto Botânico da Universidade Alfa, quanto o
Jardim Botânico de Porto Alegre, preconizados pelo Irmão Lassalista, estão atualmente sendo
preteridos pelas instituições que os detém. A Universidade Alfa parece manter o Horto como
um empreendimento marginal sob a ótica da Ciência que predomina dentro de uma
universidade. No caso do Jardim Botânico de Porto Alegre, ele parece não constar dentro das
prioridades de um governo76. Em algum momento a Ecologia que se pretendia fundamental e
normativa passou a figurar em segundo plano nos casos citados. O que em um primeiro
momento foi pensado e idealizado como símbolos de locais importantes para pesquisa e
conservação, atualmente não são mais prioridade.
A Universidade Alfa também falha com a comunidade onde está inserida. O horto era
um local onde o grande público podia frequentar, um lugar de lazer em contato com a
natureza e um lugar onde as escolas podiam promover em parceria com a universidade, uma
atividade outdoor.
O Morro também foi invisibilizado pela Universidade Beta, tanto que é um assunto
caro e incômodo para a instituição, salvo os professores dedicados à causa do Refúgio. O
Refúgio de Vida Silvestre não deixa de estar em um espaço nebuloso e obscuro dentro da
gestão ambiental da universidade. Durante esta pesquisa o assunto Refúgio se mostrou algo
desconfortável dentro da esfera administrativa da universidade. Uma entrevista sobre o
assunto com o responsável pela gestão ambiental da Universidade Beta foi negada, e em
decorrência desta recusa, uma entrevista com a professora que atualmente compõe a comissão
sobre o Morro também foi negada. Atualmente a universidade afirma através de seu site que a
manutenção da área tem se dado através de monitoramento e levantamento de dados sobre
fauna e flora.
76 Não é apenas o Governo do Estado do Rio Grande do Sul que está revendo suas prioridades. A nova gestão da
Prefeitura Municipal de Porto Alegre, assumida em janeiro de 2017, também na intenção de enxugar a máquina
pública e diminuir seus gastos, decide agrupar a Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAM) que foi a
primeira secretaria do meio ambiente do Brasil, criada em 1976 com outras secretarias, tendo agora o nome de
Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Sustentabilidade. Com esta fusão foram elencadas funções e
funcionários que deveriam permanecer trabalhando, o que não foi o caso do Centro de Educação e Informação
Ambiental (CEIA), no qual iniciei meu trabalho com educação ambiental.
159
Cabe ressaltar a importância de compreender por onde percorrem os caminhos
burocráticos que impedem a efetivação do Refúgio de Vida Silvestre como uma Unidade de
Conservação. Existe uma relação tripartida entre universidade, Morro e Estado. Nesse pedido
para tornar o Refúgio uma Unidade de Conservação de fato e de direito, a universidade
pretendia não ceder ou transferir seu poder de uso e gestão. Seria importante identificar como
a Universidade Beta se posiciona mesmo falhando esta relação com o órgão federal
responsável pela gestão e implementação das Unidades de Conservação (SNUC-ICMBio), e
também com a possibilidade de que a universidade ainda poderia delegar o Refúgio para
administração Municipal ou Estadual de Unidades de Conservação, o que a forçaria abrir mão
de um bem material/natural já tido como seu.
Independente da morosidade burocrática para resolver este impasse ou da omissão da
Universidade Beta em lidar com este assunto, o fato é que a instituição enfrenta dificuldades
próprias tanto na conservação ambiental da área, quanto no uso educacional que era feito na
área do Refúgio, fosse para pesquisas ou educação ambiental.
O Jardim Botânico de Caxias do Sul foi idealizado e criado, mas de fato a sua real
implementação nunca foi concluída. Sua gestão feita a partir de três instâncias com
finalidades institucionais diferentes dá um caráter particular a gestão da área. A Universidade
Zeta, Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SEMMA), e Serviço Municipal de Água e
Esgoto (SAMAE) são as instituições responsáveis pela manutenção da área do Jardim
Botânico, mas suas partes não são divididas de forma igualitária. Uma instituição privada, um
órgão público, e uma autarquia respectivamente: instituições com visões, objetivos e
comportamentos diferentes. O poder de ação da universidade está centrado nos projetos de
educação ambiental que desenvolve lá, e atualmente é restrito a isso.
Não por acaso que a real implementação do Jardim Botânico de Caxias do Sul como
uma figura jurídica nunca ocorreu. Atualmente sua gestão não existe de fato e de direito em
termos legais. Entretanto, apesar destas questões de ordem burocrática, o Jardim existe em sua
forma física e material. Sua contribuição para a cidade enquanto área verde pública e local de
pesquisa e ensino é inegável. Por isso, pela sua existência factual, ele exige uma gestão de
parceria entre estas instiuições.
De fato o Jardim Botânico de Caxias do Sul nunca atendeu as exigências mínimas
previstas na regulamentação do CONAMA 339/2003 para receber o título de Jardim
Botânico. Segundo a pesquisa sobre educação patrimonial, como o Jardim foi eleito e esteve
sempre sobre o domínio de seu Professor idealizador que fazia parte da Rede Brasileira de
Jardins Botânicos, não lhe foi retirado o título em consideração à figura do professor atuante
160
(SA et al, 2014). Entretanto, não se pode retirar dele o mérito de ser um local de pesquisas e
de educação ambiental. Lá estudantes universitários e estudantes da rede básica de ensino são
contemplados com este lugar, que pode ser usado de uma forma educativa. Contempla
também os moradores e visitantes da cidade com uma área verde para momentos de lazer e
contemplação.
O Jardim Botânico de Caxias do Sul enfrentará um grande desafio frente a construção
do Ecoparque adjacente à sua área de localização. Um grande empreendimento financiado por
uma de suas partes gestoras, a SAMAE, e apoiado fortemente por outra parte gestora, a
Prefeitura de Caxias do Sul, não restou outra posição à Universidade Zeta do que apoiar este
projeto e tentar extrair algo de positivo para o Jardim Botânico. Não há dúvidas de que a
Professora que assumiu o lugar do Professor idealizador está tentando manter uma sobrevida
ao lugar, mas desde a sua idealização o Jardim Botânico só possui enquanto documento sua
Portaria de Criação, o que o torna frágil frente ao ideal da cidade de construir grandes parques
urbanos. É necessária a regulamenteção de seus documentos para sua real implementação e
minha interlocutora garante que há uma movimentação para isso.
6.1.2 Como tornar opaco um lugar
Apesar de ter sido a 1ª universidade da América Latina a receber a ISO 14.001, a
Universidade Delta ainda não conseguiu unir as linhas que compõem os processos de
ambientalização. A universidade atende a cada auditoria os requisitos duros de uma linha de
exigências necessárias para a manutenção desta certificação. Contudo, ainda não conseguiu
inserir em toda a sua potencialidade as áreas verdes do seu campus em São Leopoldo e as
atividades desenvolvidas pelo Grupo de Educação Ambiental. Apesar de serem esferas que
visam os mesmo ideais, trabalham de forma apartada. E nas tentativas que tiveram para tentar
unir as frentes, a burocracia da universidade estagnou esta relação.
Com a demissão da Professora responsável pelo Grupo de Educação Ambiental o
futuro da continuidade deste grupo voluntário e não oficial é incerto. Bem como a
continuidade do próprio Espaço Ambiente e Vida. A permanência da Professora em um
momento de rearranjo na universidade foi preteriada com relação a permanências de
professores com outras formações não ligadas diretamente a Educação.
Dentro deste contexto, provavelmente a relação próxima com o PIBID quando os
estagiários docentes levavam suas turmas para o campus para fazer trilhas irá decair. Também
161
fica incerta a participação das escolas da região nos projetos de educação ambiental e a
possibilidade de fazer as trilhas. Com isso é possível que toda potencialidade de usar as áreas
verdes do campus como lugares educativos se percam.
A Universidade Delta possui a certificação internacional que qualifica sua gestão
ambiental e tem todo o mérito disso, inclusive servindo de modelo para outras insituições.
Todavia, como já foi demonstrado na sua apresentação, o Sistema de Gestão Ambiental
(SGA) não consegue abarcar todas as frentes, seja por fatores finaceiros, de recursos
humanos, ou mesmo de prioridades. Como já referido havia um interesse do SGA nas
atividades que eram desenvolvidas pelo Grupo de Educação Ambiental, mas o engessamento
da estrutura universitária não permitiu incluir a potencialidade das áreas verdes na gestão.
Parece haver aqui uma similaridade entre a concepção de gestão ambiental que vem
legitimada por uma certificação com a dureza e objetificação dos princípios acadêmicos
válidos. Por outro lado, a educação ambiental se mostra frágil, descartável.
O Jardim Botânico da Universidade Épsilon tem suas portas abertas durante a semana
para a visitação das escolas, estudantes universitários e público em geral. Lá são cumpridas as
exigências para a área ter o título de Jardim Botânico e melhorias estão sendo feitas para
receber seus visitantes. A potencialidade do Jardim não esbarra em questões de infraestrutura
e disponibilidade, uma vez que suas atividades estão em funcionamento e quando há a
necessidade de recursos básicos, eles parecem ser atendidos pela instituição. Entretanto, sua
potencialidade de lugar de práticas educativas parece ser cerceada pela estrutura rígida das
escolas que o visitam e da própria estrutura universitária com professores que pouco utilizam
a área para suas práticas.
Conforme o que foi observado, e os relatos trazidos pelo Professor Diretor do Jardim
Botânico da Universidade Épsilon, um projeto mais denso de educação ambiental que
conseguisse ter um acompanhamento das escolas foi frustrado. O projeto não se mostrou
possível especialmente por dois fatores. Este projeto deveria contar com o envolvimento das
escolas para que seus alunos visitassem o Jardim Botânico mais de uma vez ao ano para que
fosse possível a realização de uma avaliação, ou como se refere o professor um feedback,
para que a equipe conseguisse mensurar o que estavam fazendo e se estavam tendo sucesso no
que pretendiam. O outro fator necessário para a realização do projeto era a abertura da escola
e dos professores para se trabalhar o currículo escolar em conjunto. A frustração veio com
essa não abertura para esta flexibilização na maneira de como seria trabalhado o currículo. A
sobrecarga dos professores, já com obrigações em demasia, a falta de experiência em integrar
matérias e um currículo engessado foram motivos dados pelas escolas para não aderirem a
162
este modelo de projeto. Outra realidade apresentada foi a dificuldade das escolas em retornar
ao Jardim, a percepção do professor é que se elas conseguirem vir uma vez por ano, já está
excelente para elas. E isso muitas vezes se dá pelas verbas escassas para transporte e
disponibilidade dos professores. Quando escolas vêm de longe ainda precisam arcar com a
alimentação dos alunos.
As visitas casadas, que juntam idas ao Planetário, ao Herbário, ao Jardim Botânico e
outros espaços na cidade em um mesmo dia, diminuem o potencial do Jardim Botânico uma
vez que sua visitação tem o tempo bastante reduzido. Apesar de terem um projeto que vai até
as escolas, o Jardim Botânico deixou de ser o palco, a sala de aula ao ar livre, o laboratório
vivo onde as práticas deveriam acontecer.
A mesma reflexão vale para o corpo docente e técnico da Universidade Épsilon que
fazem pouco uso do lugar. Seriam as questões contratuais da carga horária, as diversas
demandas universitárias e da produção científica que são exigidas que acabam inviabilizando
a programação de atividades no Jardim Botânico pelos professores universitários; ou
simplesmente este é também um lugar invisibilizado pela epistemologia racional que impera
nas atividades universitárias e vê no Jardim um espaço com pouca credibilidade acadêmica?
Poderíamos acrescentar mais uma questão que caberia a todas as instituições analisadas aqui:
afinal, por qual motivo elas deveriam enxergar em suas áreas verdes algum potencial?
Não existe no momento nenhuma relação entre o Jardim Botânico e a gestão ambiental
da Universidade Épsilon de cunho educacional, de pesquisa ou extensão. Talvez o Jardim
pudesse ser utlizado como uma ferramenta de propagação das preocupações ambientais e
preservação, uma vez que é um espaço verde protegido dentro da universidade. Talvez estas
duas frentes pudessem se apoiar neste movimento, mas esta é só uma consideração da
pesquisadora sem a intenção de responder às questões acima.
A Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Teta cumpre a sua função
de preservação da área natural em que está inserida. A existência da RPPN na região e sua
proteção permite que a vegetação permaneça intacta e a que foi explorada se recupere.
Permite também que a fauna ali presente seja mantida. Sem dúvidas as pesquisas ambientais
realizadas ali para inventariar o que de fauna e flora ali habita possuem relevante importância.
Entretanto isso não contempla por inteiro às potencialidades de uma área verde como esta.
A universidade iniciou muito bem sua relação com a àrea verde recebendo escolas,
alunos universitários e outros grupos de visitante; cumprindo seu papel de disseminadora de
conhecimento. Sua visitação por estes grupos está suspensa devida a dificuldade no acesso, a
falta de água e de uma infraestrutura segura para manter este tipo de atividade. Os
163
responsáveis pela gestão da RPPN afirmam, como já demonstrado na apresentação da área,
que os recursos disponíveis para sua manutenção são escassos, quando muito ausentes, e a
reserva necessita de altos investimentos. A situação econômica financeira do Brasil, que
reflete também nas instiuições de ensino superior, é um dos agravantes e ratifica que as áreas
verdes não são prioridades de investimento dentro das universidades. A falta de fiscalização
dos órgãos competentes e a falta de incentivos financeiros vindos do setor público também
corroboram para a fragilidade do Sistema de Unidades de Conservação como um todo.
Não se negam as dificuldades, nem o fato de que a RPPN esteja cumprindo seu papel
de preservação ambiental. A participação na Associação Gaúcha de Proprietários de RPPN e
no Comitê Estadual da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica do Estado do Rio Grande do
Sul, são ações que representam um envolvimento da Universidade Teta com entidades que
trabalham com a proteção de áreas naturais. Entretanto, esta relação parece estar sendo
periférica, externa à RPPN, uma vez que a universidade enquanto instituição gestora da área
não está lá dentro. Para a preservação da área verde não é preciso que nenhum humano lá
esteja, seu isolamento permite isso. A participação nas reuniões e encontros na associação e
no comitê exigem a presença da universidade, mas isso ainda não traz a universidade para
dentro da reserva. A universidade ocupa a área da RPPN, mas não a habita.
Por participar da Reserva da Biosfera, a Reserva Particular do Patrimônio Natural da
Universidade Teta deveria ter como um de seus objetivos básicos, além da preservação e
monitoramento ambiental, a educação ambiental e a melhoria da qualidade de vida das
populações do entorno da área (BRASIL, 2000). De acordo com a legislação, a Universidade
Teta pode explorar a imagem da RPPN, o que transmite à universidade um caráter de
instituição preocupada com o ambiente. Para manter este caráter da forma mais legítima
possível, a universidade deveria elevar sua relação com a área, voltando a promover as ações
de educação ambiental e as melhorias necessárias, uma vez que assumiu o compromisso
perpétuo de possuir uma RPPN e possui responsabilidades sociais e ambientais com a
sociedade.
6.1.3 Construção de espaços ou lugares?
Até o momento foram apresentadas situações recorrentes nas universidades de tornar
invisíveis ou sem brillho as suas áreas verdes. Esta insustentabilidade tem sua base na
consolidação racional de uma epistemologia que predomina dentro das universidades e sua
164
estrutura burocrática que negligencia a existência dessas áreas verdes. Muitas delas foram
grandes e promissores projetos no passado, mas foram sendo, ao longo do tempo, esvaziadas
deste seu sentido e potencial.
Das universidades abordadas nesta pesquisa, duas apresentaram um envolvimento
diferenciado com relação à suas áreas verdes, a Universidade Etá, e a Universidade Gama.
Conforme já relatado, a Universidade Etá criou há pouco sua área de preservação em
seu próprio campus em Passo Fundo. O que esta universidade fez, através de professores
engajados, foi unir estas áreas que de certa forma já estavam protegidas, e seus usos para
outros fins além da preservação eram limitados, e transformou-as em uma Unidade de
Conservação de fato e de direito, no caso uma RPPN que tem um caráter perdurável, eterno.
Conseguiram através deste projeto o apoio da mais alta cúpula da universidade e de toda
comunidade acadêmica. As Áreas de Preservação Permanente (APPs) da universidade
também já eram usadas em seu potencial de lugares educativos.
A Universidade Gama, por ser uma universidade muito jovem, ainda está construindo
sua relação com suas áreas verdes. No campus em Uruguaiana, professores da área ambiental
conseguiram também fazer de uma Área de Preservação Permanente um lugar de prática, e a
própria área verde do campus um local de aprendizagem. Contudo, como já foi visto, esta
relação depende do peso do tempo decorrido, e como a implementação dos campi ainda não
está de fato concluída fica difícil vislumbrar como predominará a relação da universidade com
suas áreas verdes.
Cabe ressaltar que todas as iniciativas apresentadas da constituição de áreas verdes a
serem geridas pelas universidades foram vistas como grandes iniciativas no momento de sua
criação. Entretanto na falta dos atores que as idealizaram, a estrutura universitária dura
imperou e tirou destes projetos seus potenciais. Fica a reflexão se o mesmo acontecerá com
estes projetos.
***
Diante do cenário atual, todas as universidades fizerem menção às dificuldades
financeiras enfrentadas. No caso das universidades públicas, elas têm que lidar com o baixo
repasse de verbas do Governo Federal, e as universidades particulares alegam que enfrentam
uma significativa diminuição nos repasses financeiros vindo de programas como o Programa
Universidade para Todos (PROUNI) e o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES). Frente a
isso, frente a esta contingência de recursos, os investimentos nas áreas verdes nunca serão
165
prioridade. A estrutura universitária exige que sua excelência acadêmica venha de outras
frentes que sempre serão mais significativas enquanto esta estrutura se mantiver.
Em sua publicação “Áreas protegidas do Rio Grande do Sul: o esforço para a
conservação” Albano Backes77 cita o Horto Botânico da Universidade Alfa, junto com o
Parque Nacional de Aparados da Serra, como uma das primeiras Unidades de Conservação no
Rio Grande do Sul, tendo sido implementada pelo Governo Federal. Nesta mesma publicação,
Albano também cita além da área do Horto Botânico, as áreas do Centro de Pesquisas e
Conservação da Natureza Pró-Mata - PUCRS, Jardim Botânico de Porto Alegre e Jardim
Botânico de Caxias do Sul como áreas importantes para a conservação da biodiversidade do
RS.
O desaparecimento quase total dos biomas originalmente existentes no Estado do
Rio Grande do Sul, a disponibilidade de áreas para desenvolver programas ou
projetos de pesquisa, de educação ambiental, de lazer junto à natureza selvagem,
ficou restrita, em sua quase totalidade, ás áreas protegidas, que são Parques
Nacionais, Estações Ecológicas ou outras categorias de Unidades de Conservação.
Como já previa Cahalane (1947, 1962): ‘chegará o dia em que os Parques Nacionais
e áreas similares serão as únicas onde as pessoas encontrarão solidão e onde terão a
possibilidade de usufruir e sentir-se inspiradas por uma paisagem autêntica’
(BACKES, 2012, p. 237).
Houve, muitas vezes, uma preocupação por parte dos responsáveis de, por assim
dizer, esconder essas áreas do grande público e mesmo do público especializado,
como os cursos de pós-graduação, institutos de pesquisa, centros de educação
ambiental, etc., talvez para não tornar de conhecimento público os graves problemas
de gestão, legais, fundiários, de infraestrutura, de acessibilidade, muitos sem solução
até hoje. No entanto, em sua grande maioria essas áreas são ou deveriam ser de
direito público e só vão poder cumprir suas funções primordiais quando as suas
potencialidades forem colocadas à disposição da sociedade de forma organizada e
disciplinada (BACKES, 2012, p. 237).
Os dados aqui trazidos demonstram as dificuldades no desenho de gestão das áreas
verdes. A falta de integração entre estruturas de gestão, parcerias e a falta de recursos técnicos
e financeiros, são as grandes lacunas que permitem a invisibilidade das áreas verdes. As áreas
são desconfortáveis para as instituições, quando não cabem nas suas estruturas fins. Esta
invisibilidade não se aplica somente à estrutura universitária, mas se reflete também na
população uma vez que nesta situação, as áreas também são escondidas dela, bem como é
77 Albano Backes e o Irmão Lassalista tiveram uma relação bastante próxima, tanto pela formação lassalista,
quanto pela dedicação botânica. Albano participou ativamente na implantação do Jardim Botânico de Porto
Alegre vindo a assumir sua direção no período de 1974 a 1987, após a saída do Irmão em 1964. Neste intervalo
de tempo a administração do Jardim Botânico passou por um período de descontinuidade, tendo com Albano
uma reformulação e reorganização. Teve seu primeiro artigo científico publicado na revista do extinto Instituto
Geológico de Canoas em 1962. Tornou-se profesor das disciplinas relacionadas a Botânica na Unisinos e foi
responsável pela construção de diversas pesquisas para a conservação da flora e paisagem do Rio Grande do Sul
(MAUHS, 2013).
166
trazido na reflexão de Backes. Áreas de solidão e autenticidade pelo valor intrínsico que as
área verdes possuem, mas na verdade escondidas do grande público pela precariedade
institucional de gestão que poderiam revelar.
6.2 Dos Usos
Algumas das formas como os usos das áreas verdes se dão, iniciaram de forma
bastante promissora e ricos em potencial, entretanto isto se esvaiu ao longo dos anos dentro de
uma estrutura burocrática universitária que torna as áreas invisíveis, como por exemplo o
Horto Botânico da Universidade Alfa. O Refúgio de Vida Silvestre da Universidade Beta
também tem invisibilizadas e inviabilizadas suas ações, colocando em suspenso suas
atividades educativas. Enquanto os usos do morro que foram idealizados são preteridos,
outros usos são feitos da área do Refúgio. A área é usada para a coleta de materiais pelos
Kaingang, para oferendas religiosas, entre outros. De fato as pessoas continuam ocupando
este lugar, circulando por ele e o habitando. Dentro destes usos devamos incluir também
ações que vão diretamente de encontro com os objetivos da proteção do Morro, como por
exemplo, o descarte de resíduos, a poluição das águas e as ocupações ilegais.
Alguns destes usos das áreas verdes correspondem à atividades que foram pensadas
como os objetivos principais de sua criação, por exemplo, o caso do Jardim Botânico da
Universidade Épsilon, que segue suas atividades mesmo com suas frustrações. Já o Bosque da
universidade está sendo ocupado pelos moradores da cidade que querem praticar exercícios e
momentos de lazer em meio à natureza. O Jardim Botânico de Caxias do Sul e o campus da
Universidade Zeta também continuam sendo utilizados pelas pessoas. Apesar do futuro
incerto do Jardim, atividades com escolas e visitas acadêmicas continuam sendo feitas, além
dos visitantes que vão até lá procurando contato com locais verde. A área verde do campus
sede também é ocupada por visitantes e pessoas que procuram um ambiente assim.
A Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Teta segue com seu
objetivo de conservação, entretanto, pelas questões apresentadas, não consegue manter suas
atividades educacionais na área. Apesar disso, o lugar continua a ser parte da comunidade e
no seu entorno existem áreas que são vistas por ela como espaço de lazer.
A Universidade Delta é vista pela população do seu entorno como um local para
práticas de exercícios e que está sempre com seus portões abertos. A comunidade ocupa este
167
lugar para corridas e caminhadas. Com relação às trilhas que eram desenvolvidas lá pelo
Grupo de Educação Ambiental é bastante provável, como já relatado, que sua realização fique
em suspenso. Pelo menos até que outra pessoa dedicada assuma.
A Reserva Particular do Patrimônio Natural da Universidade Etá no momento está em
fase de estruturação, mas possui grandes objetivos no uso da área. Todavia, tanto no campus
sede dessa universidade, quanto na Universidade Gama existem usos que correspondem a
tipos criativos e que vão além da sala de aula como lugares de aprendizagem, como o caso das
universidades que usam suas Áreas de Preservação Permanente como lugares para aulas
práticas.
A força da tradição que instituiu o formato sala de aula e o ensino como sendo
equivalente a educação indoor, contribui para que estas áreas verdes se tornem corpos
estranhos às finalidades educativas das universidades. Com exceção de alguns professores de
áreas afins que usam as áreas verdes, seus usos parecem ser subjugados pelas instituições.
Todavia, estas áreas verdes mostram outra paisagem das estruturas universitárias que mesmo
que não seja vista pelos olhos acadêmicos é vista e usada pela população em geral. Quanto às
potencialidades, estas aparecem muito claras para seus defensores, porta-vozes, mas parecem
pouco claras para quase todos os outros atores das universidades, e em alguns casos, das
próprias cidades envolvidas em que estas áreas estão localizadas.
6.3 Da Solitude78 Ambiental
Esta tese iniciou visando identificar as relações entre as instituições e as áreas verdes,
mas fui tomada e surpreendida pelas relações entre áreas verdes e as pessoas. Apresento aqui
então histórias de alguns personagens, pessoas que acreditaram no ideal das áreas verdes e o
perseguiram. Ao longo do texto será possível perceber que algumas conseguiram resultados
positivos e outras, frustrações, em uma relação que se constitui de diversos filamentos e não é,
de forma alguma, linear.
78 A palavra solitude tem sua origem no Latim, mais precisamente da palavra solitudo que significa solidão,
retiro, abandono (BUSSARELLO, 1998). Porém, algumas vezes esta palavra é usada em oposição ao conceito de
solidão, por ser considerada uma ação de isolamento proposital do indivíduo, sem que isso seja necessariamente
algo ruim. Inclusive podendo ser considerado algo próximo a plenitude enquanto satisfação consigo mesmo.
Nesta pesquisa, usaremos solitude como entendida pelo isolamento das pessoas que se envolveram com a criação
das áreas verdes e que ainda estão envolvidas na sua manutenção. O isolamento a que nos referimos diz respeito
à relação afetiva entre estas pessoas e as áreas verdes, o que algumas vezes não se estende à estrutura
universitária.
168
Conforme trazido na apresentação do campo é possível identificar que a constituição
das áreas verdes nas universidades sempre esteve ligada à pessoas que são suas defensoras
para dentro e para fora da instituição e, quando estas faltam ou tem muitas outras atividades,
estas áreas ficam frequentemente sem proteção/finalidade. Estas pessoas estão inseridas na
região filosófica que forma a orientação do sujeito ecológico. Este conceito compreende um
tipo ideal que sintetiza um horizonte de preceitos ecologicamente orientados que guiam as
pessoas que se identificam com estes valores. Segundo Carvalho (2002), este conceito de
sujeito ecológico pode ser associado, em sua versão mais idealizada, às trajetórias que
ganham um sentido grandioso, heróico, de vanguarda e representam o ambientalismo como
um movimento histórico, herdeiro de tradições políticas de esquerda e protagonista de um
novo paradigma político existencial.
Ao se vincularem com grande entusiasmo a estas áreas verdes, estes atores que terão
suas narrativas sobre este envolvimento expostas aqui, confirmam sua orientação ecológica,
acreditando na potencialidade e valor intrínseco destas áreas. Estas pessoas conseguiram,
mesmo que de forma provisória e por algum tempo, tornar as áreas verdes lugares, e não
espaços. As áreas verdes são lugares de práticas destes outsiders da sua época.
A Universidade Alfa tem três personagens fundamentais para a existência do Horto
Botânico, com destaque para o próprio Irmão Lassalista que foi o seu criador. Além da
criação do Horto, o Irmão trouxera diversas contribuições para o estado do RS em termos de
pesquisas ambientais, entre elas a implantação do Jardim Botânico de Porto Alegre em 1957,
onde permaneceu na direção até 1964. Atualmente o Núcleo de Educação Ambiental do
Jardim Botânico possui o seu nome, uma homenagem aos seus esforças e dedicação para
defender o uso sustentável da flora regional. Entretanto, em 2016, foi sancionado o projeto de
lei 246/2016, que propõe a extinção da Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul79 e
diversas outras fundações e órgãos sob a premissa da necessidade do estado diminuir seus
gastos para dirimir uma chamada crise econômica. Por o Jardim Botânico ter sido declarado
em 2003 como Patrimônio Cultural do Estado do Rio Grande do Sul, sua área verde de 39
hectares não será afetada em um primeiro momento, permanecendo aberta para a visitação do
público. Com a provável demissão dos funcionários e a extinção das atividades e pesquisas
desenvolvidas pelo Museu de Ciências Naturais muito se teme pelo retrocesso ambiental que
isto causará (BRACK, 2015).
79 Em 1972 foi criada a Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul, que passou a coordenar em 1974 o Jardim
Botânico e o Museu de Ciências Naturais, localizados na mesma área.
169
O que presenciamos no ano de 2017 é a provável estagnação do Jardim Botânico de
Porto Alegre, uma vez que suas atividades educacionais de pesquisa e educação ambiental
estão em processo de extinção apesar dos manifestos e apelos de diversas instituições
educacionais, organizações não governamentais e da sociedade civil. Este estado de
estagnação não está muito distante do que vive hoje em dia o Horto Botânico da Universidade
Alfa, dois projetos idealizados pela mesma pessoa em uma época em que foram considerados
exponentes de pesquisa e educação, mas não conseguiram manter sua vivacidade.
Na sequência dos acontecimentos da criação e utlização do Horto veio a pessoa do
Professor colega do Irmão Lassalista, uma figura doce que me recebe nos seus 85 anos de
vida, para contar em muitos pormenores e detalhes seu envolvimento com a universidade, o
Horto e o Irmão. Estas histórias já foram contadas no capítulo que fala sobre a criação e os
usos do Horto e mostram uma vida acadêmica de dedicação ao ensino e ao uso dessa área
como um lugar de práticas educativas. O Professor desenvolveu ferramentas para trabalhar
com as crianças naquele lugar, como a música apresentada e também levava seus alunos
universitários para ter aulas lá. Assim como seu mestre e colega, o Irmão Lassalista, ele via
muito potencial naquele “mato”, como foi reduzido por muitos a área verde do Horto.
Nos dias atuais, ainda persistindo no uso do Horto e tendo a sensibilidade de ver nele
um lugar de amor, está a figura da Professora de Botânica que me conduziu para descobrir
esses caminhos que constituem a história do Horto. Como já relatado, existe muito sentimento
entre ela e essa área verde e ela tem realizados esforços para tentar retomar as atividades de
educação ambiental, mesmo com toda a demanda institucional que já é exigida dela.
Por todo seu engajamento e dedicação durante seu tempo ativo na Universidade Beta,
a Professora aposentada foi peça fundamental para relatar aqui a história da relação entre o
Morro e a universidade, resgatando sentimentos e frustrações que dão a este envolvimento sua
própria cosmologia. “Eu fiquei contente que tu escolheste este tema, pela coisa da nossa
reserva, foi uma saga, uma grande luta.
A Professora sempre foi uma pessoa dedicada e atuante na efetivação da área no
Morro enquanto Reserva Biológica e depois Refúgio de Vida Silvestre e foi quem aceitou
falar a respeito deste assunto incômodo para a universidade. Entusiasta da ideia conduziu e
liderou grupos e comissões junto a outros nomes do Instituto de Biociências da Universidade
Beta para tentar concretizar esse seu objetivo que até os dias atuais ainda não tem o final
esperado de consagrar o Refúgio de Vida Silvestre um laboratório ao ar livre e um local de
conservação ambiental.
170
Pouco antes de se aposentar, ela recebeu uma homenagem da Universidade Beta pelos
seus esforços para a implemtação do refúgio80. Apesar da frustração com a não concretização
do projeto de sua vida “Implantação e Gerenciamento de Unidades de Conservação em Áreas
Urbanas”, que visava elaborar um plano de manejo do refúgio inovador para a época, ela
nunca desistiu de seguir elaborando projetos para essa área verde:
“Não ganhamos dinheiro, fomos pelos nossos próprios custos mesmo e pequenos
auxílios que mais tarde ganhamos. Fomos levando adiante a fizemos investigações
científicas, orientação de dissertações e de doutorado também. E depois também de
educação ambiental. E muitos deles feitos de forma espontânea pelos alunos, ex-
alunos de mestrado e de doutorado aqui da universidade.”
A Professora de Biologia da Universidade Delta, desde o início dos nossos contatos,
se mostrou aberta e disponível para me contar um pouco das atividades do Grupo de
Educação Ambiental da universidade, como eles se utilizavam das áreas verdes do campus
para suas atividades de educação ambiental e também como ela utilizava para práticas das
disciplinas que lecionava. Quando levava seus alunos para realizar as trilhas queria que eles
“vivenciassem a experiência”. Como já foi relatado, com sua saída o futuro do Espaço
Ambiente e Vida e do grupo é incerto. Segundo ela, sua saída pode resultar no encerramento
das atividades do grupo:
“Eu realizava muitas coisas no amor mesmo, ou seja, sem receber. Acho difícil
alguém continuar o trabalho. Talvez isso seja resultado para a tua tese, uma vez que
eu era a única com formação em Educação Ambiental e Educação. Sabíamos que
algumas demissões ocorreriam, porém acreditei que a minha formação, por ser
única, me seguraria”.
Esta já é a segunda perda do grupo, que no ano de 2014 enfrentou o falecimento do
Professor que foi o fundador do Grupo de Educação Ambiental, do Espaço Ambiente e Vida e
do uso das trilhas enquanto práticas pedagógicas. Professor das disciplinas de Educação
Ambiental e Práticas de Ensino foi muito admirado por seus alunos por sua dedicação à
educação ambiental e no ensino como algo integrado. Foi também um dos criadores das
trilhas realizadas pelo grupo e acreditava no uso de trilhas interpretativas como instrumentos
de educação ambiental. Segundo um de seus ex-alunos que hoje é professor e trabalha com
educação ambiental, o Professor:
80 Em seu discurso de agradecimento a esta homenagem, a Professora cita os nomes de pessoas que ajudaram a
concretizar “um sonho de anos que não foi só meu, mas de muitos que me antecederam”. Cita também nome de
pessoas que trabalharam concomitante com ela para a implementação da reserva e alunos e funcionários da
Universidade Beta. Estes nomes serão suprimidos para a manutenção do anonimato das instituições e dos
indivíduos.
171
Fazia-nos entender que a Educação Ambiental era como uma agulha com linha, que
tecia os fragmentos de cada área compartimentada para que as pessoas pudessem
entender e valorizar o todo. Acreditava em uma educação com sentido, não só
falada, mas com dinâmicas e construção de materiais concretos que sensibilizavam
os sujeitos a uma sustentabilidade individual e coletiva.
Mais uma vez este grupo ficará a deriva, esperando pela chegada de uma nova figura
que aceitará enfrentar os desafios de manter um grupo de educação ambiental que não é
oficial, não é extensão e não recebe recursos da universidade.
Falecido em abril de 2003, o Padre Professor da Universidade Delta era sacerdote
jesuíta natural de Santo Cristo no Rio Grande do Sul. Bacharel em História Natural e
especialista em Fisiologia Vegetal e Ecologia foi professor e um dos responsáveis pela criação
do curso de Biologia na universidade. O Padre Professor também foi responsável pela
manutenção da ecologia presente no campus de São Leopoldo. Seu interesse pela Botânica o
aproximou das plantas medicinais e sua intenção era repassar o conhecimento adquirido sobre
as plantas medicinais através de cursos, palestras, conversas informais, manuseio e jornal.
Com uma linguagem acessível a todos, escrevia as receitas caseiras e populares do uso dessas
plantas. Além da sua preocupação com a preservação do campus universitário, criou um
jardim de plantas medicinais, um herbário e uma coleção de sementes de plantas medicinais.
O Padre Professor sempre acreditou na recuperação ambiental após a construção do
campus e via potencialidades na criação da área de preservação em recuperar as espécies
vegetais nativas e manter a fauna característica do local. Ele acreditava que “a vegetação não
é original, mas está se recuperando bem e poderá se recompor”. Anos depois, a coordenadora
do Grupo de Educação Ambiental confirma a pretensão do Padre Professor, pelo menos nas
áreas onde são realizadas as trilhas pelo seu grupo, o ambiente está recuperado. Segundo ela,
“toda a natureza da trilha foi recuperada depois da construção do campus onde se retirou tudo
para construir. A vegetação pode voltar a crescer em um campus universitário”.
O Professor Diretor do Jardim Botânico da Universidade Épsilon, como já exposto,
gostaria que a interação com as escolas fosse diferenciada. Inicialmente os trabalhos que eram
feitos eram trilhas baseadas nos aspectos botânicos do Jardim, apresentando as plantas com
seus nomes científicos e nomes populares, o que para o Professor era apenas uma trilha com
nomes, como já relatado. A tentativa inicial de mudança, como já citado na descrição das
atividades do Jardim, foi articular um projeto de educação ambiental que permitisse o
acompanhamento das escolas com o Jardim Botânico para que o envolvimento não se
172
restringisse a uma única vez. Segundo o Professor, “o ideal seria saber o retorno dessas
crianças quando elas fazem a visita. O que elas levam? O que elas trazem? A segunda vez que
elas vêm como é que seria?”. Um assunto de determinada matéria seria visto em sala de aula e
também no Jardim. Um exemplo que o Professor me dá é sobre Geografia:
“Eu gostaria de trabalhar com Geografia para associar com Botânica, com a origem
onde ocorrem aquelas espécies, quais os países... Daí professora iria entrar no
Jardim Botânico e ser uma sala de aula. Ela ia usar aquele espaco pra trabalhar, pra
trabalhar com mapas, pra trabalhar com jogos, pra trabalhar com várias coisas, mas
usar o espaço, o momento, em que estão diante de numa situação concreta. Tem uma
espécie que de repente eles passam na cidade, encontram essa planta e saber 'pô, mas
essa planta veio lá da China', onde é que é a China? Essa planta veio da Índia, onde é
que é a India? Dá pra trabalhar várias coisas”.
Por motivos da falta de estrutura das escolas e uma difícil abertura no currículo escolar
este projeto não foi adiante. Esta é uma das frustrações presentes no Jardim Botânico da
Universidade Épsilon, não conseguir otimizar suas potencialidades educativas. A mesma
vontade vale para o uso do espaço de Jardim pelos seus colegas professores universitários.
Para o meu interlocutor seria algo que enriqueceria o conhecimento dos alunos e ele gostaria
que visitas deste tipo acontecessem mais vezes. Para o Professor Diretor:
“É uma abertura pra questão do conhecimento como uma coisa mais ampla. Que tem
interfaces [...]. É que é assim, a questão toda, é muitas vezes uma preocupação que
se tem de seguir muito rigidamente o conteúdo. Dá pra trabalhar o conteúdo abrindo
um pouquinho com as interfaces, daí tu consegue. Mas não é todo mundo, é uma
opção né. Mas que o espaço está aberto, está aberto”.
O Professor, que trabalhou por mais de trinta anos como pesquisador e professor de
Botânica na Universidade de Zeta, também foi um dos iniciadores do curso de Ciências
Biológicas e do Herbário da universidade que possui grande representatividade. Falecido em
janeiro de 2014, ele foi um grande pesquisador na área da Botânica e incentivador na criação
de jardins botânicos como espaços educativos. Na Universidade Zeta é possível encontrar
homenagens que se referem a ele como um professor que “não semeou flores, ele plantou
jardins. Jardins Botânicos criados e incentivados por ele. Jardins de sonhos plantados no
coração de todos que tiveram o privilégio de conviver e aprender com ele”.
Foi este o Professor que idealizou o Jardim Botânico da cidade de Caxias de Sul, e
com todo o prestígio que possuía conseguiu na época a criação do lugar. Mesmo sem a sua
real implementação e sem conseguir atender à todos os requisitos das categorias dos jardins
botânico, o espaço se tornou um lugar de visitantes e estudantes. A ideia inicial, quando ainda
173
sonhada pelo Professor, era transformar o complexo do Arroio Dal Bó em um parque de
preservação, onde no interior estaria localizado o Jardim Botâncio de Caxias. Entretanto, esta
concepção preservarcionista do professor ia de encontro com os interesses políticos atuais da
cidade, de criar áreas públicas para recreação de seus moradores. A cidade de Caxias do Sul
não possui muitas áreas verdes e a criação do Ecoparque foi uma iniciativa de proporcionar à
população um local onde pudessem usufruir dos benefícios de se conviver com áreas verdes.
A Professora que assumiu o lugar do Professor idealizador acredita que a atual gestão do
município começou a mudar nos últimos anos, passando a enxergar de uma maneira diferente
a relação com o ambiente. Passou a ver esta relação como um sinal de qualidade de vida, e se
preocupar em como dar uma qualidade de vida melhor a seus moradores, por isso a parceria
com a criação do Ecoparque seria para ela uma decisão acertada.
Os próximos passos dessa relação Jardim Botânico x Ecoparque são incertos e resta
acompanhar se o Jardim conseguirá evoluir na sua gestão, continuará estagnado ou, na
hipótese mais pessimista, encerrará suas atividades.
O casal ecológico formado pelos professores da Universidade Etá foi o idealizador da
ideia da criação da Reserva Particular do Patrimônio Natural da universidade, e levaram a
cabo o encaminhamento desta proposta da qual são incentivadores. Para o Professor, a criação
de RPPNs é uma forte ferramenta para a preservação da biodiversidade. Desde 1991, ele e sua
esposa, também professora da universidade, coordenam um projeto ambiental, cujo objetivo
principal é a conservação do Papagaio-Charão (Amazona pretrei) e do Papagaio-de-Peito-
Roxo (Amazona vinacea), espécies típicas da região sul que estão ameaçadas de extinção.
Este projeto de pesquisa, extensão e que também envolve o ensino, da Universidade
Etá, também conta com o apoio de uma associação em prol do meio ambiente, criada e
mantida pelos professores, e envolve diversas ações já realizadas em mais de 26 anos de
existência. Uma das ações básicas do projeto é a preservação do ecossitema Florestas com
Araucárias, onde estas espécies de papagaios, e muitas outras, são encontradas. A araucária,
(Araucaria angustifolia) ou pinheiro-brasileiro, também possui a condição de ameaçada e seu
corte é proibido. Sua semente, o pinhão, faz parte da cultura do sul do país e também é um
dos alimentos do papagaios-charão e do papagaio-de-peito-roxo. Como a ocorrência destes
papagaios está intimamente relacionada com a ocorrência da araucária, é necessária a
preservação deste tipo de ecossitema81. O projeto identificou que a população do papagaio-
81 Estas espécies de papagaio sofrem outras ameças além da diminuição das Florestas com Araucária. Outro
motivo é a captura dos filhotes nos ninhos, para servirem como animal de estimação, fato ainda comum nas
principais regiões de reprodução da espécie. A deterioração dos ambientes florestais, através das atividades de
174
charão - que antes habitava a Estação Ecológica de Aracuri, e muitos municípios do Rio
Grande do Sul - havia migrado para a região do planalto catarinense, em busca de alimento. A
partir de então, começaram uma série de trabalhos junto aos proprietários de terras e ao poder
público para a criação de áreas protegidas para a preservação da Floresta com Araucárias.
Com o sucesso deste projeto, o casal ecológico tem sido convidado a falar sobre a
criação das RPPNs e suas vantagens para a biodiversidade. Realizam atividades direcionadas
aos proprietários de terras, divulgando a eles a estratégia de conservação de seus ambientes
naturais em caráter de perpetuidade, através da destinação de parte de suas terras, em especial
de áreas de Reserva Legal e Áreas de Preservação Permanente em Unidade de Conservação
da categoria Reserva Particular do Patrimônio Natural. Exatamente o que ocorreu no campus
de Passo Fundo da Universidade Etá. Como disse o Professor, eles deveriam ser o exemplo.
Nos últimos anos o casal tem buscado apoio financeiro no país e no exterior, em
países como a Holanda e Estados Unidos, para a criação da Reserva Particular do Patrimônio
Natural Papagaios de Altitude na serra catarinense. Mostraram com muito entusiasmo e
dedicação fotos das áreas que pretendem transformar em áreas protegidas e os materiais
produzidos pelo projeto ambiental.
6.4 Da Gestão Ambiental
Dentro dos objetivos da pesquisa estava a intenção de localizar onde estavam inseridas
as áreas verdes dentro dos projetos de gestão ambiental desenvolvidos pelas universidades.
Em todas as universidades acompanhadas por este trabalho foram identificadas ações de
gestão ambiental, algumas visando o cumprimento de leis e resoluções, outras, iniciativas de
pessoas engajadas. Como já referido no início desta tese, a ambientalização universitária tem
se feito necessária pela responsabilidade social e ambiental que as universidades em sua
grandeza devem atender. E de fato, as universidades visitadas estão conduzindo estes
processos de ambientalização da maneira que lhes é possível, enfrentando as durezas
burocráticas e a escassez de recursos financeiros e humanos.
pastoreio e da extração seletiva de madeira, compromete a natural regeneração desses ecossistemas,
empobrecendo gradativamente sua estrutura vegetal, diminuindo a oferta de alimentos e de cavidades adequadas
para a reprodução dos papagaios (MARTINEZ & PRESTES, 2008).
175
Entretando, conforme o que foi descrito na apresentação do campo com relação à
gestão ambiental e as áreas verdes, podemos perceber que esta ambientalização parece ser
fragmentada. De um lado a gestão ambiental, dura, esquematizada, necessária, visível aos
olhos das instituições universitárias, com ações já implemetadas ou em processo de
implementação. Do outro lado as áreas verdes, muitas vezes invisíveis, que não possuem uma
relação profícua com a gestão ambiental universitária, não além do que a legislação exige.
Nas universidades públicas pesquisadas foi possível identificar a preocupação da
gestão ambiental principalmente com o descarte correto dos resíduos gerados pelas
instituições, muito em decorrência da Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei 12.305, de 2
de agosto de 2010, (BRASIL, 2010). O Decreto 7.746 de 5 de junho de 2012 (BRASIL,
2012a) que fala sobre a obrigação das instituições públicas criarem um Plano de Gestão de
Logística Sustentável também tem feito com que as universidades públicas vivenciem
processos de ambientalização. Nas universidades particulares também se constatou estas
preocupações e das quatro universidades particulares visitadas, uma possui a certificação ISO
14.001 e outras duas pretendem adquiri-lá.
Os eixos de economia de energia elétrica, de água, de capacitação dos recursos
humanos, preocupações com o solo, compras responsáveis, tratamento de esgoto, e destinação
correta dos resíduos gerados correspondem a alguns dos indicadores de sustentabilidade que
muitas vezes podem ser utilizados dentro das instituições universitárias para indicar seu
comprometimento com estas questões. Em alguns casos estes indicadores também são
utlizados como ferramentas para a avaliação das áreas nas quais são necessárias melhorias e
novas ações. Existem instrumentos de avaliação criados especificamente para Instituições de
Ensino Superior (IES), como por exemplo, o Campus Sustainability Assessment Framework,
criado em 2003 para avaliar as IES americanas e canadenses, o Auditing Instrument for
Sustainability in Higher Education (AISHE); o Higher Education 21 (HE21) com um
conjunto de indicadores específicos para boas práticas de sustentabilidade nas universidades,
criado no Reino Unido em 1997; o GreenMetric World University Ranking com uma
metodologia criada pela Universitas Indonesia (UI) em 2010; e a Red de Indicadores de
Sostenibilidad en las Universidades (RISU), criada em 2012 com o objetivo de definir
critérios e indicadores aplicáveias ao contexto latino-americo (WACHHOLZ, 2017).
Estes indicadores ambientais estão adentrando a gestão ambiental das universidades
por serem capazes de gerarem avaliações positivas sobre o comprometimento ambiental das
instituições. Há ainda, complementar a estes indicadores ambientais, um ranqueamento que
posiciona a universidade de acordo com seu nível de sustentabilidade. A participação nestes
176
rankings não é obrigatória, existem universidades com ações preocupadas com a
sustentabilidade ambiental que não participam disto, mas é algo que tem se consolidado aos
poucos no Brasil e pode representar uma boa propaganda no setor educacional.
Na Universidade Beta, o Refúgio de Vida Silvestre está ligado à gestão ambiental da
universidade, mas esta relação não pode ser por total dimensionada pelo silenciamento deste
assunto junto ao setor. Na Universidade Alfa, especialmente no campus onde está localizado o
Horto Botânico, a gestão ambiental se mostrou muito frágil e a articulação referente a esta
área verde parece estar unicamente nas mãos da Professora de Botânica e o departamento de
Biologia. A Universidade Gama, por ser uma universidade recente, está em fase de construção
de suas políticas ambientais e tem basicamente cumprido as leis referentes às instituições
públicas. Tem também buscado se adaptar a implantação dos campi e cumprir as
regulamentações sobre as Áreas de Preservação Permanente. A Universidade Delta possui a
certificação da ISO 14.001, o que lhe confere o caráter de comprometimento com os
requisitos exigidos por este órgão para a gestão ambiental. Com relação as suas áreas verdes,
já realizou o georeferenciamento das áreas, mas admite não ter uma relação efetiva com o
grupo que realiza atividades nestes espaços. Na Universidade Épsilon, o setor responsável
pela gestão e planejamento ambiental da universidade tem se desmembrado para cumprir as
exigências ambientais, inclusive as referentes às áreas verdes do campus como o Bosque, mas
não possui nenhuma ingerência sobre o Jardim Botânico. A gestão ambiental da Universidade
Zeta é responsável pelas Áreas de Preservação Permanente do campus e visa a ISO 14.001, e
a cogestão do Jardim Botânico de Caxias fica a cargo do Museu de Ciências Naturais da
Universidade. Na Universidade Etá a gestão ambiental cuida das Áreas de Preservação
Permanente e mantém uma relação positiva com os idealizadores da criação da Reserva
Particular do Patrimônio Natural. Também visam a ISO. A gestão ambiental da Universidade
Teta passou a ser responsável pela gestão da Reserva Particular do Patrimônio Natural da
universidade e tem enfrentado dificuldades para manter o funcionamento da mesma de acordo
com os objetivos iniciais.
O parágrafo acima demonstra como são diversas as relações entre a gestão ambiental
universitária e suas áreas verdes. A questão aqui não é buscar uma comparação entre as coisas
que possuem uma constituição diferente, tampouco buscar as diferenças de aspectos entre as
coisas similares. Estas idiossincrasias parecem inferir que dentro da gestão ambiental
universitária e especificamente dentro dos processos de ambientalização destas instituições
não há um lugar claro para as áreas verdes. Dentro da dureza da lei as Áreas de Preservação
Permanente, Reservas Legais e Reservas Particulares de Patrimônio Natural demonstraram
177
estarem sendo conduzidas pelas universidades da forma exigida por estes instrumentos
normativos. Todavia, as áreas verdes que não estão sendo respaldadas por alguma legislação,
como por exemplo o Refúgio da Universidade Beta que nunca foi implementado e o Horto
Botânico da Universidade Alfa parecem estar pospostas dentro das instituições. Os Jardins
Botânicos possuem sua legislação específica para o recebimento deste título como já foi
brevemente trazido aqui, e não tem relação com a gestão ambiental das universidades com as
quais estão envolvidos.
Estas relações não se dão de forma direta, elas perpassam múltiplos caminhos e fluxos
que resultaram nestas configurações. Estas relações são também reflexos da estrutura pouco
flexível que forja as universidades e prevê um ordenamento dos sistemas que as incorporam.
Existe um campo acadêmico, um campo científico e um campo burocrático e parece que
nenhum deles contempla as áreas verdes para além de obrigações legais. O caso da
Universidade Etá se mostra uma exceção no momento, pois está em fase de implementação de
sua RPPN. Com a sua história recente, fica o questionamento sobre como se dará esta relação
na falta das pessoas que idealizaram a reserva. Anteriormente à Universidade Etá, a
Universidade Teta teve a mesma iniciativa de criar uma RPPN e tem enfrentado a dureza da
falta de repassses financeiros.
Em seus Planos de Desenvolvimento Institucionais (PDIs) ou até mesmo nos sites
oficiais das instituições, as universidades demonstram um comprometimento com a questão
da sustentabilidade. No PDI da Universidade Alfa 2015 2020 um dos dezenove objetivos
estratégicos trazidos pelo documento traz “Atuar e comprometer-se com a formação da
consciência socioambiental para a sustentabilidade”. Traz também os objetivos de
“Desenvolver ações de forma articulada com a rede de educação básica visando qualificação e
desenvolvimento mútuos”; e “Intensificar as relações entre universidade e sociedade”. Ações
estas que de certa forma eram promovidas pelo Horto Botânico no campus onde está inserido
quando ocorriam os projetos de educação ambiental e as visitas das escolas da rede básica e
comunidade. O plano propõe ações com vistas ao uso racional e sustentável dos recursos,
como a implementação e o fortalecimento dos programas de uso racional de água e energia;
redução no consumo de papel nos processos administrativos e na geração dos resíduos
solídos, além de se comprometer a elaborar um Plano de Desenvolvimento Sustentável, e
provomer e difundir ações que fortaleçam a consciência ambiental. Especificamente ao
campus onde está localizado o Horto Botânico é possível identificar a necessidade da
implementação de diversas estruturas básicas, como a elaboração de um Plano Diretor que
supra as demandas de saneamento básico como abastecimento de água, esgoto sanitário e
178
pluvial, o que reforça as dificuldades enfrentandas pela universidade. Com demandas desta
ordem para serem cumpridas neste campus, destinar recursos para esta área verde parece não
ser prioridade.
No documento PDI 2016 2026 da Universidade Beta um dos seus objetivos de
impacto social é “Fortalecer as práticas de sustentabilidade social e ambiental da
Universidade”, demonstrando que a universidade também está assumindo um compromisso
com as questões ambientais. O documento também afirma ser de extrema importância dar
continuidade na implantação da sustentabilidade, ampliando as ações concretas já realizadas
dentro da universidade, mantendo um sistema de gestão ambiental que envolva ações no
campo da educação ambiental, diagnósticos e planos de gestão ambiental. Um dos objetivos
organizacionais da instituição é “Adequar e qualificar os espaços existentes para suporte
acadêmico”, apesar de não citar quais seriam especificamente estes espaços, o Refúgio de
Vida Silvestre poderia estar incluído neste eixo, fica o questionamento.
Como já foi referido algumas vezes, a história institucional da Universidade Gama é
recente e ela passa por processos de implantação dos seus dez campi. Entretanto, no seu PDI
2014 2018 o eixo de aperfeiçoamento institucional tem como objetivo de planejamento
“Promover a Sustentabilidade Ambiental” e para isso pretende criar o Plano de Logística
Sustentável e um Comitê de Sustentabilidade ou Educação Ambiental. Neste documento a
instituição afirma que tem avançado na implantação de políticas de sustentabilidade, citando
ações nas áreas de eficiência energética, aproveitamento de água e conforto térmico, para que
seu crescimento “seja consciente e responsável”. A Área de Preservação Permanente usada
como lugar de práticas educativas no campus de Uruguaiana segue preservada por força das
leis ambientais, mas contribui para as práticas pedagógicas diferenciadas também previstas no
PDI.
Como também já foi referido, a Universidade Delta possui grande envolvimento com a
gestão ambiental universitária, o que é exposto por sua certificação. Em seu site institucional
este compromisso é reafiramdo e ela expressa seu comprometimento em reduzir os impactos
ambientais gerados e assume sua “Responsabilidade Social Universitátia”. Para tanto, diz
utilizar procedimentos e políticas de gestão e planejamento ambiental.
No PDI da Universidade Épsilon, a universidade reconhece que até o ano de 2015 seu
envolvimento com os objetivos de sustentabilidade era tímido, reconhecendo as lacunas na
gestão ambiental. Nos novos planos e diretrizes veem estas questões como desafios a serem
enfrentados, inclusive reconhecendo a necessidade de maiores investimentos orçamentários.
No documento lança o compromisso de desenvolver ações no campo do licenciamento
179
ambiental, destinação de resíduos, compras sustentáveis, eficiência energética,
sustentabilidade hídrica, educação ambiental, entre outros eixos. A universidade se
compromete também a proteção, recuperação e revitalização de suas áreas verdes,
reconhecendo seu valor paisagístico e procurando atender aos requisitos legais. Em todo o
PDI, o Jardim Botânico é citado uma única vez, entre parênteses, quando o nome do diretor é
citado na listagem dos integrantes da Comissão Técnica de Responsabilidade Ambiental.
No site institucional da Universidade Zeta está detalhado os objetivos do Programa de
Gerenciamento Ambiental, com preocupações a respeito do gerenciamento responsável dos
resíduos sólidos e líquidos, uso e ocupação dos solos, uso racional de água e energia elétrica,
entre outros eixos. Como já foi dito anteriormente, a universidade tem a intenção de submeter
sua gestão ambiental ao processo para a obtenção da certificação internacional da ISO 14.001.
Reiterando, a gestão ambiental da universidade não possui nenhuma relação com Jardim
Botânico de Caxias, com o qual a universidade tem cogestão. Esta cogestão se dá através do
Museu de Ciências Naturais da instituição.
A partir da criação do seu PDI 2012-2016 a Universidade Etá amadureceu seu
comprometimento com a gestão ambiental, elaborando a Política de Desenvolvimento Social
e Ambiental da instituição. Neste documento a universidade assume metas e ações visando
integrar as áreas social e ambiental, fomentando o compromisso pela busca da
sustentabilidade. As ações focam nas atividades administrativas, de ensino, pesquisa e
extensão orientada por uma política ambiental clara e objetiva, em torno dos eixos
conservação, preservação e sustentabilidade ambiental; gestão de resíduos e combate à
poluição; eficiência energética; urbanização e ocupação racional; educação e comunicação
ambiental. Com a organização das ações que já são desenvolvidas, a universidade Etá também
visa obter a certificação ISO 14.001. A universidade também tem se comprometido a manter
regularizada a situação com suas áreas verdes, sendo elas as Áreas de Preservação
Permanente, Reserva Legal e a atual Reserva Particular do Patrimônio Natural.
No site institucional da Universidade Teta também há um espaço dedicado às
atividades da Área Ambiental, setor que é atualmente o responsável pela gestão da Reserva
Particular do Patrimônio Natural. O setor desenvolve projetos que visam adequar as
atividades da instituição aos parâmetros de sustentabilidade exigidos pela sociedade e também
pela legislação atual. Executam projetos que procuram atender a ideia da Logística Reversa e
que venham ao encontro à Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), estabelecida pela
Lei nº 12.305, de 2 de agosto de 2010. A Área Ambiental também realiza a Campanha
180
Descarte Correto, visando promover o descarte correto dos resíduos gerados no campus,
principalmente nos setores de alimentação usados pelos alunos.
Podemos pensar em como estes espaços poderiam contribuir nos PDIs para os eixos de
ensino, pesquisa e extensão. No tópico em que foram expostas as atividades e projetos de
educação na natureza muitas ideias para os usos destes espaços foram trazidas. Também no
campo de práticas de aprendizagem, as áreas verdes poderiam ser lugares de aprendizagem e
ensino, lugares de experiências práticas.
Com os dados localizados nos documentos e sites das instituições estudadas é possível
identificar que elas estão assumindo compromissos com a gestão ambiental, procurando
desenvolver políticas que contemplem estas ações. Nas visitas realizadas também foi possível
visualizar alguns destes compromissos assumidos, principalmente no que diz respeito ao
descarte correto dos resíduos gerados e campanhas para redução no consumo de água e
energia elétrica. As ações identificadas se concentram principalmente nos eixos que também
estão presentes nos rankings, como Água, Energia Elétrica, Solo...
Seja por cumprimento de exigências legais, intenção de implantação de uma gestão
ambiental básica ou até mesmo a busca por uma certificação internacional, as universidades
parecem atentas para a necessidade de assumir uma política ambiental que assegure e ateste
frente à comunidade sua responsabilidade ambiental, ainda que estes processos sejam muitas
vezes incipientes.
Estes processos de ambientalização estão deslocando para áreas não muito visíveis os
espaços verdes, como hortos, jardins botânicos e reservas, outrora símbolos da preocupação
ambiental. Se no momento de sua criação estes espaços foram vistos como ideais de um
compromisso ambiental e ecológico, eles estão sendo substituídos pela necessidade da criação
de políticas ambientais para a implementação de ações ecologicamente orientadas como
gestão ambiental, educação ambiental, pesquisa ambiental entre outras. A manutenção das
áreas verdes, à exceção das áreas protegidas por lei, está se mostrando insustentável frente a
estes novos desafios impostos às universidades, a dureza da estrutura universitária não tem
favorecido que as instituições pensem as áreas verdes como ferramentas para a gestão
ambiental.
181
7 A INSUSTENTABILIDADE DA ECOLOGIA MAIOR E A RESSIGNIFICAÇÃO
DOS ESPAÇOS
As áreas verdes que foram o campo de estudo deste trabalho, no momento de suas
criações, foram expressões máximas de uma Ecologia que objetivava a conservação dos
espaços naturais. Em um contexto que via estas ações como o ápice de um comprometimento
ecológico, as universidades viram nestas áreas grandes potenciais de estudos e pesquisas e
também uma visibilidade positiva para as instituições. Estas áreas serviram e ainda servem em
menor ou maior intensidade, como lugares para práticas de ensino, atividades ao ar livre,
pesquisas ambientais, contemplação, disseminação de conhecimento e emoções.
Poderíamos dizer que neste momento de concepção os Jardins Botânicos, o Horto, as
Reservas e o Refúgio eram ilhas, ilhas que formavam arquipélagos de inovação e de espaços
que seriam conservados para contribuir com os objetivos da Ecologia que pretendia isolar e
organizar áreas verdes para que fossem salvos. Ato meritório das universidades que
despertaram para o frescor destas ideias quando da sua proposta.
Entretanto, estas ilhas foram absorvidas pelos estratos que formam a estrutura
burocrática inflexível dos modelos universitários que já citamos aqui. Segundo Godoy (2008),
estes estratos são capturas, buracos negros sem luz que uma vez que se está dentro não se
pode sair. Esta sucessão de emaranhamento nos estratos causa um processo de estratificação,
gerando camadas fixadas em determinados pontos que aprisionam singularidades e
particularidades. A partir da busca pelo ordenamento que estas estruturas universitárias
invocam, criaram-se limites imutáveis para a gestão das áreas verdes. O pensamento desta
Ecologia que fixou estas áreas e isolou-as, reduziu a vida destas às finalidades fixadas pelo
conhecimento acadêmico e subordinou o pensamento para sua gestão a uma vida limitada.
Talvez um pensamento idealizado para o próprio bem destas áreas, mas que as deixou aquém
das potencialidades a serem vividas.
Como foi trazido no início desta tese, áreas naturais foram isoladas para que seu
potencial paisagístico fosse preservado para momentos de reflexão e contemplação, lugares
para se recarregar energias. Posteriormente, locais preservados para estudos e pesquisas. Este
modelo de conservacionismo foi incorporado nas políticas ambientais e na criação dos
espaços naturais protegidos. Contudo, segundo Godoy (2008, p. 162). “não importa de que
182
tipo de Paraíso se fala, pois o óikos paradisíaco sempre guarda esta contrapartida
administrativa ou de gestão”
Aos poucos estes Arquipélagos foram sendo aprisionados e acabaram se tornando
Continentes. Continente é um conceito trazido por Godoy para se referir a razão, ao
conhecimento. Os Continentes não derivam, eles traçam rotas e itinerários para organizar os
percursos inventados. Com esta organização, estes percursos são endurecidos e enrijecidos.
Esta codificação criada é do interesse das universidades, mas também é desta Ecologia Maior,
no sentido de querer dominar as coisas visando sua conservação. A ideia nesta reflexão não é
abrir mão dos ganhos desta Ecologia Maior, mas pensar que ela é “um sintoma de uma
concepção e um modo de relação com o mundo e as coisas” (GODOY, 2008, p. 22). Estas
áreas verdes idealizadas da forma que foram pelos seus idealizadores ou não concretizaram ou
não se sustentaram, indicando que esta concepção, nestes contextos universitários, tem
demonstrado uma insustentabilidade. Segundo Godoy (2008, p. 23), “problematizar a
ecologia é abrir espaços de vida por ela interditados pela idealização da vida como algo
possível de ser apreendido pelo conhecimento”. A ecologia deve ser permitir a vida na sua
totalidade.
Enquanto os Continentes criam itinerários e rotas para estabilizar e fixar os percursos,
os Arquipélagos derivam. Estas derivas são libertações para os percursos que estão por vir.
No período de concepção e pré-implementação as áreas verdes foram ilhas surgidas a partir
do engajamento das pessoas que habitavam no mundo o lugar do sujeito ecológico. Naquele
momento a percepção era de abertura total para o mundo, uma ação que poderia contribuir
para salvar o Planeta. Entretanto, para manter estes ideais, a Ecologia Maior - que é a
ecologia que existe dentro das universidades - exigiu deles uma codificação. Se pensarmos as
universidades como figuras representantes do papel do Estado e nesta Ecologia Maior como
uma tarefa que também necessita de ordenamento, podemos observar onde a força da
codificação congela ambas as estruturas, gestão das universidades e áreas verdes. Segundo
Deleuze “os Estados não são compostos apenas de homens, mas de florestas, campos ou
hortos, animais e mercadorias” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p. 58) e para gerenciar estes
tão diferentes componentes quanto mais organização houver, mais fácil se faz este trabalho.
De acordo com Godoy (2008, p. 99):
Trata-se de legislar e de fazê-lo segundo leis que o conhecimento dá à vida e que a
separam daquilo que ela pode, limitando-a, medindo-a, modelando-a segundo
finalidades e funções, preenchendo, dessa maneira, as tarefas de conservação da
vida, de adaptação e utilidade, de regulação e reprodução.
183
Estas relações são relações de submissões que o conhecimento científico impõe para
estabelcer certos limites justificados pela Razão. Proibições, normas e comportamentos
virtuosos são impostos e incentivados para o bom funcionamento tanto das estruturas
universitárias, quanto desta Ecologia Maior.
Ajuda nesta questão pensar sobre as áreas protegidas por lei que foram citadas neste
trabalho: Áreas de Preservação Permanente, Reserva Legal e Reservas Particulares do
Patrimônio Natural. Elas existem porque uma codificação criada para isso foi necessária, pois
se entendeu que era importante manter estas áreas verdes protegidas. Esta é uma forma de
tornar permanente a existência destas áreas, pela imposição legal, em formato Continente,
engessado e com normas. Um mesmo ordenamento foi imposto às outras áreas verdes, hortos
e jardins, no intuito de criar o conhecimento que é visado dentro das universidades. Com isso,
estes lugares também deixaram de ser Ilhas e se tornaram Continentes presos a uma estrutura.
Esta mudança implicou na sobreposição das forças-continente sobre as forças-
arquipélago. Esta relação de pensamento versus corpo, respectivamente, se definem nestas
relações bipartidas entre Estado e Nômade, no sentido das regras que se fazem necessárias
para o ordenamento da instituição universitária e das áreas verdes/Ecologia Maior - versus
a deriva que leva a caminhos inesperados da vida. Segundo Godoy (2008), a própria
concepção de conservação que está presente fortemente na Ecologia Maior, vai de encontro
com a concepção de expansão, neste caso na expansão das possibilidades de ecologias
menores. Nestas dicotomias, se delineiam as diferenças que embasam a ideia de uma Ecologia
Maior (Continente) e a ideia de ecologias menores (Arquipélogos):
Contrapõem-se, assim, as forças-continente e as forças-arquipélago ante a variação:
a primeira propõe-se a dominar a variação como a única garantia possível da vida
exprimindo a superioridade da conservação, pois limita seu enfoque a uma questão
de organização, desenvolvimento ou formação; a segunda abre o mundo à variação
para que a vida afirme a potência de invenção (GODOY, 2008, p. 40).
Como manter estas áreas verdes vivas e habitando o mundo enquanto os lugares que
foram idealizados? Longe de querer desmerecer as vitórias desta Ecologia Maior de outrora,
esta pesquisa gostaria de propor a reflexão de como tormar sustentáveis estas áreas e talvez as
menores ecologias possam indicar um caminho.
Com os resultados da pesquisa pudemos observar as dificuldades das estruturas
universitárias de inserir em seus organogramas funcionais as áreas verdes que possuem,
mesmo que elas ainda sejam usadas para práticas de aula e visitação. Os rankings e
indicadores de sustentabilidade aparecem como os novos objetivos de comprometimento
184
ambiental. Apesar de estes compromissos aparecerem nos sites institucionais e nos Planos de
Desenvolvimento Institucional, nestes documentos a existência das áreas verdes é suprimida.
As áreas verdes sofrem com sua inadequação às estruturas duras e estreitas da burocracia das
instituições universitárias. Um tipo de antropocentrismo institucional, onde este tipo de
mundo vivo não tem mais representação. São invisibilizadas e secundarizadas em sua
importância, apesar do discurso ecológico parecer uma unanimidade, em nível do macro
discurso institucional. Esta relação tem mostrado esta insustentabilidade porque de tempos em
tempos as práticas e prioridades são substituídas. Como dissemos quando remetemos aos
desafios citados por Sennett (2006), como reinventar e tornar interessantes estes lugares?
Como trazer eles à luz das instituições universitárias? Por certo, para as pessoas que os
idealizaram e usufruem destas áreas, elas continuam lugares de práticas, mas como ampliar
este sentimento? Poderíamos tentar aqui, no contexto desta pesquisa, o que Godoy propõe
sobre experimentar outra ecologia para tentar superar os bloqueios da Ecologia Maior:
Uma estranha ecologia: ao ser atravessada pelas forças que tomam a arte e o
pensamento, que as utilizam como meio, traça uma linha de escritura, de música ou
de pintura que descreve maneiras de habitar, uma ecologia que se faz na invenção,
que não filia, não funda, não concilia. As forças pelas quais ela é atravessada são
capazes de dominar o instinto do conhecimento (a crença na verdade), de confrontar
suas condições de possibilidade, afirmando a vida e tudo aquilo que nela é terrível,
problemático e pavoroso e, desta, forma abrir a casa às forçãs do Fora (GODOY,
2008, p. 82).
As forças-continente e as forças-arquipélago trabalham e interagem sobre um mesmo
plano. Poderia se dizer que os continentes não existiriam se não fossem os arquipélagos
surgirem em um primeiro momento. Entretanto, os arquipélagos são capazes de refazerem-se,
escapando da tentativa de unificação e padronização impostas pelas estruturas da Ciência e
Estado. Mesmo depois da constituição do continente, o arquipélago pode retornar. Esta é a
afirmação da força imanente das ilhas, reinventarem-se. Neste sentido, esta pesquisa que se
propôs a fazer este retrato das áreas verdes e as instituições universitárias, gostaria de
contribuir com uma forma de pensar diferente estes espaços verdes. Por certo se trata de um
assunto polêmico que muitas vezes é silenciado pelas instituições, e este diagnóstico
reconhece que esta é uma relação constituída por vários elementos que transcendem os
objetivos e a capacidade deste trabalho. Não se trata também de querer substituir as ações da
Ecologia Maior, com seus ganhos e legislações que se fazem primordiais desde seu início até
os dias atuais e provavelmente futuros. Contudo, podemos dizer que se trata de propor um
185
pensamento que possa trazer estas áreas de volta à vida, otimizando seus potenciais no campo
educacional dentro das universidades.
Estas áreas verdes trazidas por este trabalho deveriam ser lugares no sentido trazido
por Ingold dentro das universidades junto com os espaços de sala de aula, laboratórios e
salas administrativas, lugares de práticas que as pessoas habitam. Dentro destas áreas verdes
também existem sentimentos que constituem outros lugares: lugar de amor, laboratório ao ar
livre, lugares de aula, lugares de trilhas. O sentimento para identificar estes espaços como os
lugares citados dependerá de quem o vivencia, o habita.
As universidades, muito em função da sua estrutura inflexível, separam as áreas verdes
em um sentido hierárquico, de cima para baixo. Não há simetria, mas um afastamento em que
não as enxergam, tirando delas o conceito acolhedor de lugar e a colocam em um espaço
abstrato (INGOLD, 2015a). Estas áreas existentes apenas como espaços, e não como lugares
habitados, não cumprem o seu devir. As áreas verdes se tornaram espaços vazios, longe de
serem os lugares sonhados pelos seus sonhadores.
Assim como as ilhas que derivam, existe um movimento que constitui os lugares.
Como foi dito: esses lugares já foram ilhas! É uma trajetória em movimento que contrasta
com a concepção de espaço enquanto um perímetro estático. É necessário pensar os lugares
formados a partir de caminhos ou trilhas ao longo dos quais sua existência se dá. Uma vez que
estes caminhos e trilhas cessam seu movimento, incorre-se o riso da contenção das
potencialidades do lugar e na transformação dele no espaço abstrato, estático, com suas
delimitações bem definidas. Vidas são vividas não dentro de lugares, mas através, de, em
torno e para lugares. Segundo Ingold (2015a, p. 219):
Prosseguindo ao longo do caminho, cada habitante, deixa uma trilha. Onde
habitantes se encontram, trilhas são entrelaçadas, conforme a vida de cada um
vincula-se à de outro. Cada entrelaçamento é um nó, e, quanto mais essas linhas
vitais estão entrelaçadas, maior é a intensidade do nó.
Lugares não deveriam ser estáticos, pois dependem da movimentação destas linhas
para sua formação. Lugares, para Ingold, são como nós, seres humanos, formados no
entrelaçamento de fios que se cruzam e nos formam. Sendo assim, poderíamos dizer que os
lugares tem vida, e dependem desta movimentação de linhas para manté-los vivos e
interligados com outros lugares. Quanto mais filamentos compuserem esta malha82, mais
82 Ingold (2015a) faz uma diferenciação entre o conceito de rede e seu entendimento para o conceito de malha.
Para ele, as redes também são constituídas de fios, mas estes fios são conectados por pontos, enquanto os fios de
uma trama formam um emaranhado, um nó. “A chave para esta distinção é o reconhecimento de que as linhas da
malha não são conectoras. Elas são o caminho ao longo dos quais a vida é vivida. E é na ligação de linhas, não
186
denso será este nó que se formará. Por isso é necessário que os lugares sejam habitados, pois
estes habitantes trarão o movimento necessário para constituir o lugar uma vez que trarão
linhas conectadas a outros nós de outros lugares. “É uma malha de trilhas interligadas ao
longo das quais as pessoas vivem suas vidas” (INGOLD, 2015a, p. 220). São destes encontros
que devem ser feitas as relações entre as áreas verdes e universidades. Fios entrelaçados e
complexamente unidos, onde cada fio é um modo de vida, que ao se entrelaçarem nesta malha
formam os nós e cada nó é um lugar.
Existe uma relação entre o conceito de lugar abordado aqui, a ideia de movimento e a
produção do conhecimento. Conhecimentos são produzidos em lugares ou de lugares em
lugares, isto vale tanto para o conhecimento produzido pela Ciência que domina as estruturas
universitárias, quanto para o conhecimento que pode ser produzido nas áreas verdes. Por certo
aquilo que se produz por aquela Ciência não é feito em um espaço vazio, mas em lugares
constituídos pelas pessoas e filamentos que formam esta trama. Entretanto, estas produções de
conhecimento operam de forma distinta. Na produção do conhecimento da Ciência, que
muitas vezes se inicia em uma coleta de dados em determinados pontos e se estende em um
laboratório (que também é um lugar, pois é habitado e envolve sentimentos das pessoas que
ali habitam), são gerados dados que são submetidos a análises que buscam de forma
progressiva um marcador universal. Existe uma integração lateral entre os dados obtidos a
cada ponto e vertical na padronização das descobertas destes cientistas e a partir daí o
conhecimento é produzido.
O conhecimento produzido pela vivência nas/das áreas verdes é forjado em
movimento, em experiências na/da vida. É um conhecimento trazido pelos habitantes dos
lugares e não possui uma integração lateral, pois não é delimitado por pontos fixos que se
conectam, mas por filamentos que escorregam e desenham a malha. Segundo Ingold (2015a,
p. 227), este conhecimento produzido pelos habitantes:
Tampouco seu conhecimento das coisas é verticalmente integrado. Pois as coisas
que o habitante conhece não são fatos. Um fato simplesmente existe. Mas para o
habitante as coisas não tanto existem quanto ocorrem. Repousando na confluência
de ações e respostas, elas são identificadas não pelos seus atributos intrínsecos, mas
pelas memórias que evocam. Assim, as coisas não são classificadas como fatos, ou
tabuladas como dados, mas narradas como histórias. E todos os lugares, como um
conjunto de coisas, é um nó de histórias.
na conexão de pontos, que a malha é constituída” (INGOLD, 2015a, p. 224). Para Ingold não é possível ir de um
lugar ao outro por saltos, de um ponto conector para outro, mas podemos ir ao longo dos fios que constituem
esta trilha.
187
Neste sentido, o movimento que existe na produção do conhecimento da Ciência
aparece como um acessório importante para a coleta ponto a ponto de dados que depois serão
processados e transformados em conhecimento. Todavia, o movimento na produção do
conhecimento pelo habitante é indispensável. “O movimento é ele mesmo a maneira do
habitante conhecer” (INGOLD, 2015a, p. 228). Opondo-se as ideias de uma integração lateral
ou vertical, poderíamos dizer que este conhecimento é integrado transversalmente, dando a
ideia de uma malha que se enreda e se espalha simetricamente, sem hierarquia e de forma
contínua, não ponto a ponto. Poderíamos dizer uma integração rizomática.
Esta produção da Ciência é idealizada, na tentativa de se mostrar neutra e padronizada
como exigem algumas práticas. Entretanto, cada cientista também é um habitante, não há na
realidade um isolamento quanto a isso. Ambas as práticas envolvem lugares, movimento e
conhecimento e são formadas pelo emaranhado de malhas. Porém, a produção de
conhecimento que se sobrepõe dentro das universidades é a da Ciência, que procura ocupar
um espaço sem sentimentos, estéril, com limites pré-estabelicidos e uma suposta?
neutralidade, mesmo que de forma idealizada. Por outro lado, como dar a mesma legitimidade
a ambos os conhecimentos e permitir que as áreas verdes sejam vistas pelas universidades
com olhos mais atentos?
Voltemos à concepção da ecologia menor. Nela também pode existir o habitar um
lugar, promovendo uma abertura para as experiências. Segundo Godoy (2008, p. 259),
esse habitar já não se confunde com o recolhimento ou retraimento [...], e tampouco
se reduz a e não se explica por estar em determinado lugar habitualmente. O habitar
é inseparável de uma experimentação de si do corpo e da casa, a qual não se
reduz mais o estreitamento da proximidade, visto ela se fazer onde o mundo está
presente, fluxo de vida, fluxo do tempo que não se confunde com as coisas nas quais
se efetua.
Menor aqui significa o mais baixo em uma hierarquia, ou melhor dizendo, menor
corresponde a uma simetria longitudinal, algo íntimo, interior, ao mesmo tempo sem
doutrinas e regras. Conceito trazido por Godoy (2008) para contrapor com a Ecologia Maior,
o conceito de ecologia menor foi criado a partir de Deleuze e Guattari em seus escritos sobre
literatura menor83. Para estes autores uma literatura menor é capaz de desterritorializar uma
língua, desintegrando esse real e nos arrrancando desse território. “Uma literatura menor faz
com que as raízes aflorem e flutuem, escapando desta territorialidade forçada. Ela nos remete
83 (DELEUZE; GUATTARI, 2003).
188
a buscas, a novos encontros e novas fugas. A literatura menor nos leva sempre a novos
agenciamentos” (GALLO, 2003, p. 76). Enquanto uma literatura maior tenta a todo custo
territorializar-se, a literatura menor seria um ato revolucionário, um desafio a um sistema já
instituído e fechado.
Esta pesquisa por sua vez, traz a abertura do conceito de menor para pensar ao longo
das e para as áreas verdes. A Ecologia Maior presente na criação das áreas verdes cumpre seu
papel, mas necessita de algo que transcenda sua normatização. O isolamento das áreas e a
invisibilidade que algumas apresentam para suas instituições não deveria ser algo
naturalizado, pois suprime as potencialidades dos lugares. Entretanto, também não se trata de
buscar uma ecologia ou prática ecológica melhor ou mais evoluída, pois isso apenas reforçaria
a moral ecológica do isolamento e punição, a consciência ecológica. Trata-se de pensar uma
ecologia menor que pudesse subverter e transformar esta relação, delegando aos lugares
verdes a competência da produção de conhecimento e contribuição na formação discente
dentro de uma perspectiva ambiental. De fato podemos afirmar que esta ecologia menor é
ideologia, mas nos permite pensar dentro do campo filosófico sobre aspectos educacionais,
uma vez que os elementos que podem intregrá-la também intregam uma formação por inteiro.
Para Godoy:
A menor das ecologias, ali na borda, é dos homens livres, não é para todos. A
aliança com a literatura, a arte, faz-se na medida em que nelas encontra as forças que
potencializam a liberdade, que deslocam os saberes afirmando o Outro do mundo, o
outro da “casa”, pois já não se trata do que se conhece sobre ela ou sobre seu
funcionamento, mas de algo que se sabe dela: seu desfuncionamento. É na
descontinuidade entre a ecologia e o mundo que ela se instala, ali onde nada está
fixo por regras predefinidas, em que “casa”, o mundo, tornam-se outros... (GODOY,
2008, p. 165).
Colocadas em um contexto contemporâneo, as relações entre as universidades e suas
áreas verdes, neste trabalho apresentadas, sofreram ambas enquanto vítimas de um sistema
político e institucional que acabou por anular o Outro. Este Outro é aqui materializado por
estas áreas que não conseguem concorrer enquanto prioridades dentro das universidades. As
universidades, por sua vez, enfrentam desafios burocráticos, financeiros, e sofrem pressão
pela busca e implementação de novas tecnologias para a produção do conhecimento.
Estes lugares resistem a uma situação que é considerada injusta pelos sujeitos dessas
histórias. Estas narativas de resistência (Informação verbal)84 que foram trazidas aqui neste
84 Conceito retirado da palestra de Marcos Reigota intitulada “Perspectiva ecologista de educação e narrativas de
resistência”, apresentada no dia 2 de dezembro de 2017 em São Francisco de Paula no I Encontro da Rede
SEIVA.
189
trabalho correspondem a leitura de mundo que os personagens fazem de acordo com suas
trajetórias de vida e seus envolvimentos com a criação e manutenção destas áreas. Este
componente subjetivo, as histórias e seus personagens, se fez necessário nesta pesquisa para
dar vida e sentimentos que também constituem as áreas verdes. Quando da descrição do
campo, falou-se sobre a árvore açoita-cavalo que sobreviveu ao estrangulamento da figueira
mata-pau e que simbolizava a resistência do Horto Botânico. A árvore açoita-cavalo também
é produtora de subjetividade (Informação verbal)85, ela carrrega sua própria narrativa e ao
mesmo tempo que sua narrativa integra a história do Horto. Fazendo uma analogia, ela é o
Horto que luta e sobrevive ao estrangulamento não da figueira mata-pau, mas da rigidez da
burocracia que impera dentro da estrutura universitária predominante.
Como resistir a uma situação como esta que já foi chamada aqui de insustentável? Isso
exigirá um processo de re-existir, de ressiginificar estes espaços dentro de uma ecologia
menor. Processos de criação se fazem necessários: literatura, música, dança, narrativas,
encontros, conversas e trocas. Estes processos devem estar presentes na vida das áreas verdes
e nas suas relações com as universidades, uma vez que estes processos também deveriam
integrar a formação e vida universitária. Um bom exemplo retomado aqui são as inúmeras
atividades desenvolvidas no pequeno jardim didático da Universidade de Saskatchewan, as
caminhadas e aulas de teatro no Bosque, e as aulas nos jardins botânicos. Encontros com as
narrativas e rituais dos povos indígenas, oficinas de arte na natureza com futuros professores,
criação de poesia a partir de elementos presentes no jardim são bons exemplos.
A intenção é dar vazão à educação da atenção por mais controverso que possa
parecer. A educação da atenção permite a abertura para as experiências não direcionadas que
podem despertar grandes descobertas. É permitir experiências coletivas e individuais do
tempo real, em oposição à busca pela conscientização ambiental baseada na domesticação e
doutrinação pela imposição da verdade. Em consonância com a Ecologia Maior reafirmo que
estamos em um tempo limite da destruição do Outro, seja do Planeta, dos recursos naturais,
das relações interpessoais. Contudo, não nos constituímos na negação deste Outro e talvez
precisemos dos agenciamentos da ecologia menor para resistir.
A relação de externalidade dos seres humanos com relação ao ambiente configura sua
intenção de dominação do mundo, de transformá-lo em continente com suas rotas e itinerários
já estabelecidos e organizados. Todavia, como disse Merleau-Ponty (2007), somos também a
carne do mundo, mesma carne que forma as estrelas, as plantas, os outros animais, o solo, o
85 Idem nota de rodapé da página anterior.
190
ar, todo o mundo. Somos ambiente e devemos buscar a simetria e continuidade entre humanos
e não humanos. Talvez devêssemos reconhecer que a alteridade da natureza, aqui
representada pelas áreas verdes, não pode ser reduzida às pretensões humanas. Como já foi
dito, é possível fazer um continente voltar a ser arquipélago. Segundo Godoy, “fazer derivar o
continente e inventar um arquipélago é o processo no qual o corpo se afirma como
multiplicidade, e assim também se afirmam, subversivamente, as potências do corpo da
Terra” (GODOY, 2008, p. 166).
Universidade e Responsabilidade
Do outro lado temos os processos de ambientalização visando as políticas ambientais
universitárias acontecerem, seja pela adaptação à legislação vigente ou pelas exigências das
responsabilidades ambientais e até mesmo por ambas as frentes. Contudo, parece existir uma
segregação entre esta gestão ambiental e a gestão das áreas verdes. Fato este que é expresso
pela não relação ou relação debilitada entre ambas as gestões, conforme apresentado. A
universidade não é vista como um ambiente inteiro dentro deste contexto que está sendo
mostrado aqui.
De acordo com as políticas educacionais para a construção de uma escola sustentável,
é necessária a construção do tripê espaço físico, currículo e gestão, três esferas que também
fazem frente aos processos de ambientalização universitária. Apesar de não ser um dos
objetivos da pesquisa identificar quais seriam os processos de ambientalização presentes nas
universidades, o trabalho localizou ações de ambientalização nos eixos espaços físicos e
gestão. A busca pela ambientalização curricular fugia do escopo da pesquisa, entretanto,
mesmo que indiretamente, o eixo da gestão foi contemplado uma vez que a pesquisa buscava
identificar como estavam inseridos nos programas de gestão das universidades as áreas
verdes. Junto a este objetivo, também foi possível identificar a existência de políticas
ambientais em ação ou em fase de elaboração. Com relação aos espaços físicos, a pesquisa
entende que as áreas verdes deveriam fazer parte desta categoria, no entanto, as questões de
ambientalização universitária e sustentabilidade não foram identificadas para estas áreas, uma
vez que as gestões se apresentaram apartadas. Reiteramos aqui que as universidades que
foram campo de estudo desta pesquisa se mostraram comprometidas em regulamentar e
191
manter de acordo com a legislação suas áreas protegidas, Áreas de Preservação Permanente,
Reservas Legais e Reservas Particulares do Patrimônio Natural.
Existe uma movimentação nas universidades visitadas para atender as exigências com
relação a processos de ambientalização, o que pode ser ser visto principalmente em ações de
gestão. Contudo, também se identificou que estes processos de ambientalização não se
estendem às áreas verdes. Talvez haja uma exceção com relação à Universidade Etá e sua
Reserva Particular do Patrimônio Natural, que acabou de ser criada e a Universidade Gama,
com suas áreas verdes em fase de implementação, mas isso será algo observável no futuro,
será que na falta de seus idealizadores, as áreas continuarão cumprindo seus potenciais e
objetivos como lugares de práticas educativas? De fato, as áreas como o Refúgio de Vida
Silvestre da Universidade Beta e o Horto Botânico da Universidade Alfa parecem estar
distantes de projetos de ambientalização. O Jardim Botânico da Universidade Épsilon vive sua
vida e cumpre seu devir de forma mediana, mas teria o potencial de promover parcerias
profícuas com as escolas que o visitam, mas não consegue pela estrutura rígida que também
rege estas instituições. A Reserva Particular do Patrimônio Ambiental da Universidade Teta
está com suas atividades suspensas por falta de recursos. As atividades nas áreas verdes da
Universidade Delta tem seu futuro incerto, pois o grupo de educação ambiental responsável
por elas corre o risco de ser extinto e a gestão ambiental da universidade não as incorporou.
Incerto também é o futuro do Jardim Botânico de Caxias do Sul, que é cogerido pela
Universidade Zeta e que dividirá seus espaço com um ecoparque.
É preciso reconhecer que existe uma logística importante dentro da relação
universidades e suas áreas verdes. Sem este diagnóstico poderíamos incorrer no risco de
afirmar antecipadamente que as áreas verdes próximas, ou até mesmo no interior das
instituições teriam capaciadade de serem melhores geridas. Entretanto, não foi isso que
localizamos neste trabalho. A área verde da Universidade Beta é em um dos campi da
universidade; o Horto Botânico da Universidade Alfa também é no interior de um dos seus
campi; bem como o Jardim Botânico da Universidade Épsilon e as áreas verdes das
universidades Delta, Gama e Etá. As áreas verdes não localizadas em campi universitários
foram o Jardim Botânico de Caxias do Sul da Universidade Zeta e a RPPN da Universidade
Teta. A pesquisa não gostaria de forçar comparações entre áreas e estruturas tão diferentes,
como por exemplo, áreas verdes como uma Área de Preservação Permanente que é gerida de
acordo com uma legislação e um Jardim Botânico que possui prerrogativas diferentes. A
intenção é mostrar a multiplicidade das relações e como elas se inserem nas questões
ambientais das universidades.
192
Ultrapassando os muros das universidades há uma relação de responsabilidade com a
comunidade de seu entorno. Algumas das áreas verdes, como já foi relato, eram visitadas pela
comunidade externa, que foi obrigada a interromper este uso por animosidades, como o
fechamento dos espaços, ou falta de segurança. Inclusive uma das áreas é usada por grupo
indígena que necessita do lugar para coleta de ervas e rituais. Outras áreas verdes são locais
usados pela comunidade em geral para ter um contato maior com ambientes mais próximos do
natural e isso deve ser mantido e incentivado.
Retomamos aqui o que se falou brevemente no início da tese sobre a responsabilidade
ambiental e social que deve estar presente na gestão das universidades e na formação dos
futuros profissionais. A busca da ética clamada por Hans Jonas, uma ética que ainda busca
respostas para seu agir, não é de toda distante das realidades cotidianas. As preocupações
ambientais estão presentes nos domínios da vida pública e privada e estão sendo
internalizadas por escolas, universidades, políticas públicas, empresas privadas, pessoas
jurídicas e físicas. A sacralização da natureza como um modelo de ética e moral a ser seguido,
apesar de reforçar a Ecologia Maior, tem servido para demonstrar a insatisfação com o
crescente mal estar civilizatório gerado, em parte, a partir desses avanços desenfreados da
técnica.
As universidades são locais onde técnicas e tecnologias são pensadas e criadas e é sua
responsabilidade incentivar o bom uso delas. As áreas verdes já foram vistas como grandes
tecnologias quando da sua criação, e se é do interesse das universidades sua manutenção, é de
responsabilidade destas instituições sua boa gestão para que atendam e contribuam com a
comunidade acadêmica e externa.
Além da responsabilidade material representada pelas áreas verdes, dentro deste
contexto de engajamento ambiental, se destaca o papel de responsabilidade das universidades
em formar futuros profissionais cientes das suas obrigações para com o ambiente. A
universidade deve ser capaz de desenvolver em seus estudantes uma orientação
ambientalmente responsável, uma vez que estes serão os tomadores de decisões em um futuro
próximo. Comportamento este que deve ser talhado não somente em cursos próximos às
questões ambientais, mas que atinja todas as áreas de formação, do biólogo ao engenheiro
mecânico, para que sejam profissionais capazes de invocar a humildade citada por Jonas
quando o poder da techne for tentador.
A missão das universidades excede a formação de especialistas e pesquisadores, ela
também está presente no modo como ela se posiciona frente às suas responsabilidades
socioambientais. Projetos de gestão sustentável para o campus e demais espaços de sua
193
responsabilidade são necessários como se vem falando ao longo desta pesquisa, assim como
se mostra necessário um envolvimento de toda comunidade acadêmica funcionários,
professores, alunos, pesquisadores, gestores, reitores para o sucesso destas ações. Desta
forma, a relação afetiva com as áreas verdes não ficaria restrita aos personagens como os que
foram apresentados no tópico Solitude Ambiental. Estes processos de ambientalização devem
estar presentes na elaboração curricular, ensino, pesquisa, extensão e na própria gestão
universitária, destacando aqui as áreas verdes, objeto desta pesquisa, como uma ferramenta
que poderia enriquecer estas ações.
Aquelas universidades que possuem sobre sua gestão ou que tenham a oportunidade de
se utilizar de espaços verdes, naturais ou construídos, podem ter nelas uma considerável
ferramenta para coconstrução desta ética ambiental que deve balizar as políticas ambientais.
Sem dúvidas que este sentimento de responsabilidade deve ser desenvolvimento em todo e
qualquer cenário e que não podemos delegar unicamente às áreas verdes a capacidade de
inspirar experiências transformadoras, que por sua vez são pessoais e intransferíveis.
Entretanto, se as universidades quiserem dar um sentido mais amplo em suas relações com
estes espaços, é de se considerar objetivos não só técnico-científicos, mas também ético-
estéticos, aproveitando as experiências sensíveis que estes locais podem ser capazes de
proporcionar uma vez que são habitados.
Carvalho e Steil (2013, p. 107) confirmam isso quando afirmam,
essa potência mística atribuída à natureza, vai pouco a pouco forjando uma
sensibilidade ambiental que se incorpora como uma característica dos sujeitos
modernos ecologicamente orientados. Nesse jogo de oposições, a natureza,
imaginada como selvagem e prístina, passa a ocupar o lugar da divindade, como
fonte de referência ética e estética.
A universidade necessita ser um local de formação de indivíduos responsáveis,
engajados ambientalmente para que possam enfrentar as exigências de uma sociedade que
vive e está aprendendo a lidar com as questões ambientais. Estas questões não estão
unicamente materializadas nas emissões de poluentes, no descarte incorreto de resíduos ou na
produção de alimentos com agrotóxicos (elementos combatidos pela luta da Ecologia Maior),
mas que também estão presentes dentro das relações inter-humanas e dos humanos com
elementos não humanos, muitas vezes expressas pelo esvaziamento dos sentimentos, da arte,
da empatia (elementos a serem resgatados pela ecologia menor). A educação necessita se
fazer presente para balizar esse enfrentamento. Nas palavras de Hermann (2005, p. 20):
194
Quando a sociedade vive um período de crise mais adensada, a educação recebe por
inteiro as conseqüências da anomia e da perda de sentido. Isso se torna
particularmente problemático, porque, desde sua significação mais originária, a
educação pretende desenvolver uma ação que tenha sentido, formar homens que se
sintam partícipes de uma comunidade moral e que sejam capazes de construir-se
como sujeitos autônomos.
Esse período de enfrentamento das questões ambientais que a sociedade moderna
ocidental vive não se encerra em uma esfera ambiental. É por certo uma crise ambiental muito
séria materializada nos eventos já citados como exemplos, mas tem como base uma crise de
esvaziamento de sentidos e valores. O projeto da modernidade prometia a capacacidade do ser
humano de passar por um processo de autodeterminação consciente onde ele seria capaz de
conduzir livremente seu próprio destino. O tema histórico do iluminismo era caucado na ideia
de emancipação, onde o humano evoluiria de um estado de imaturidade para a maturidade, da
heteronomia para autonomia e chegar ao mais alto nível de desenvolvimento moral. Tudo por
causa da razão, todos esses objetivos seriam alcançados pelo fato do ser humano ser um ser
racional. Quando as expectativas emancipatórias e as promessas de progresso da modernidade
não se realizaram pelo menos não na totalidade e equidade, se faz necessária uma crítica à
força regulatória da razão instrumental que escanteou os sentimentos e sentidos estéticos da
vida ética (HERMANN, 2005). Essa perda de sentido e anomia precisam ser superadas pela
educação para que ela possa recuperar sua justificação ética e legitimação.
Neste ponto a pesquisa parece ter chegado a um paradoxo quando tenta promover a
abertura de fluxos e linhas através da ecologia menor sem estratificações para as áreas verdes,
e também tenta promover uma ética ambiental, por sua vez com seus códigos, para guiar as
ações de ambientalização universitárias. No entendimento deste trabalho, ambas as esferas são
entendidas como necessárias, uma vez que uma das prerrogativas da pesquisa é o uso das
áreas verdes como espaços não convencionais educativos que podem contribuir em uma
formação na perspectiva ambiental. Para isso é preciso dar vida e uso às áreas verdes, e nesta
relação proporcionar o engajamento ambiental. É reforçado aqui que estas áreas poderiam
contribuir nos processos de ambientalização das universidades, tanto na parte acadêmica,
como na extensão e pesquisa.
Quanto à questão paradoxal, a pesquisa traz o conceito de rizoma para pensar a
multiplicidade que está presente nestas relações e como elas podem ser compostas ao mesmo
tempo, de modo contínuo e complementar para estarem juntas a ecologia menor e a ética
ambiental.
195
Dentro da botânica, rizoma86 é definido como um dos elementos presentes em algumas
plantas, e que está ligado à questão de armazenamento (FONT QUER, 1953). Rizoma seria a
extensão do caule que une sucessivos brotos, estes brotos podem se ramificar em qualquer
ponto e se transformar em tubérculos ou bulbos. Apresentam formas geralmente cilíndricas e
crescimento horizontal. (MONDIN, 2008). Do rizoma partem o caule, pseudobulbos e raízes e
sua localização pode estar no subsolo e até mesmo na superfície do solo, variando sua
extensão de curta a bem-expressiva como no caso de algumas espécies que podem possuir
grande amplitude horizontal. O rizoma não possui raízes pivotantes que apresentam um eixo
principal bem desenvolvido e que penetram no solo quase de forma perpendicular, emitindo
raízes secundárias. Os rizomas também possuem um papel importante na reprodução
assexuada das plantas, pois irão nutrir as novas mudas até que consigam sobreviver sozinhas.
Além disso, quando um rizoma é dividido, ele tem a capacidade de rapidamente criar novas
ligações e ramificações. O rizoma também consegue, por ocupar territórios mais amplos,
habitar locais heterogêneos. Por causa da rede formada pelos rizomas conectados, algumas
espécies, como, por exemplo, de grama, conseguem se nutrir de forma satisfatória mesmo
com adversidades.
Os rizomas, de forma geral, não apresentam uma hierarquia de distribuição, uma vez
que crescem horizontalmente. Também são capazes de conectar vários pontos, rizomas com
brotos, rizomas com caules, rizomas com raízes, rizomas com rizomas, rizomas com a terra,
rizomas com a grama que é rizoma. Não existe um eixo central no rizoma que organize estas
conexões, elas necessitam coexistir, para que o vegetal se alimente, cresça e se reproduza.
Diferentemente de uma árvore, o rizoma não possui um eixo central e é capaz de conectar um
ponto a qualquer outro, muitas vezes assumindo papel de talo, raiz ou ramo.
São estas características dos rizomas que irão definir o uso deste conceito no campo
filosófico e educacional. Estas caracterísitcas inspiraram Deleuze e Guattari (1995) a
fundamentar novos conceitos, capazes de pensar a contemporaneidade em sua multiplicidade,
princípio também pensado por eles. O rizoma pode ser visto como um sistema aberto na
construção de um conceito que visa às cirscustâncias e não mais a essência rígida na sua
aplicação, para ajudar a pensar o conceito de multiplicidade. A descrição feita por Deleuze e
Guattari (1995, p. 15) sobre os rizomas ajuda a ilustrar como este conceito consegue abarcar
inúmeras relações e funções, sem possuir um eixo estrutural primordial:
86 A descrição de rizoma aqui apresentada foi adaptada do capítulo de livro escrito pela pesquisadora e publicado
pela Universidade de Caxias do Sul em 2017.
196
Um tal sistema poderia ser chamado de rizoma. Um rizoma como haste subterrânea
distingue-se absolutamente das raízes e radículas. Os bulbos, os tubérculos, são
rizomas. Plantas com raiz ou radícula podem ser rizomórficas num outro sentido
inteiramente diferente: é uma questão de saber se a botânica, em sua especificidade,
não seria inteiramente rizomórfica. Até animais o são, sob sua forma matilha; ratos
são rizomas. As tocas o são, com todas suas funções de hábitat, de provisão, de
deslocamento, de evasão e de ruptura. O rizoma nele mesmo tem formas muito
diversas, desde sua extensão superficial ramificada em todos os sentidos até suas
concreções em bulbos e tubérculos. Há rizoma quando os ratos deslizam uns sobre
os outros. Há o melhor e o pior no rizoma; a batata e a grama, a erva daninha.
Animal e planta, a grama é o capim pé-de-galinha.
Há um movimento presente neste conceito, o rizoma não é algo isolado e
independente, e ele se compõe de incontáveis relações e fluxos. É neste sentido que o conceito
de rizoma pode permitir o paradoxo da ecologia menor e ética ambiental de existirem juntos e
abertos, sem contradições e anulações. O conceito de rizoma não se esgota em sua
materialidade, mas envolve também o solo, o ar, o humano que coleta o tubérculo, a árvore
com que o rizoma divide o espaço. Segundo os autores, por isso o rizoma poderia ser visto
como um sistema aberto, e seu potencial de análise pode ser aplicado para superar uma lógica
do pensamento binário e hierarquista, mente-corpo, sujeito-objeto, natureza-cultura. É aqui,
na oposição ao modelo da árvore e à lógica dualista, que esta reflexão contribuirá para pensar
esta relação (áreas verdes/universidade, ecologia menor/ética ambiental) na sua
multiplicidade. O rizoma não possui um ponto de partida, nem um fim, sendo assim, não
possui um ponto de origem ou princípio primordial, e os autores delegam estas características
para o pensamento que supera a binariedade do modelo da árvore. A crítica a este modelo se
dá porque ele prevê uma centralidade baseada no sujeito, o que confere a ele uma hierarquia,
uma vez que a genealogia que se cria a partir deste modelo, sempre partirá deste sujeito, e o
terá como eixo estruturante. Para Deleuze e Guattari (1995), as árvores ou as raízes se fixam
em um ponto com este eixo estruturante, uma ordem, e as outras relações são secundárias87.
Em contrapartida, qualquer ponto do rizoma pode ser conectado a qualquer outro ponto, não
fixando ordens, há apenas linhas e trajetos de inúmeras esferas, estados e coisas. A isto os
autores vão chamar de princípios de conexão e heterogeneidade. Estes princípios poderiam
87 Deleuze e Guattari trazem o exemplo da árvore linguística de Chomsky, que começa num ponto S e segue por
dicotomia suas análises. A crítica é feita a este modelo linguístico por ele não conseguir contemplar todas as
esferas que podem envolver a linguagem. (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 15): “Não se criticarão tais
modelos lingüísticos por serem demasiado abstratos, mas, ao contrário, por não sê-lo bastante, por não atingir a
máquina abstrata que opera à conexão de uma língua com os conteúdos semânticos e pragmáticos de enunciados,
com agenciamentos coletivos de enunciação, com toda uma micropolítica do campo social.” Uma árvore
classificatória que pressupõe hierarquia e relações secundárias, um modelo de árvore que necessite de um eixo
estruturante, do qual partirão as demais relações. E, mesmo que estas relações secundárias fossem muitas, ainda
assim não seriam uma multiplicidade, pois partiriam do mesmo uno, o mesmo eixo estruturante.
197
nos ajudar a pensar que a busca pelo voltar a derivar das áreas verdes não precisaria ser
anulada pela também busca de uma ética ambiental. Assim como os rizomas, nesta relação
não haveria uma hierarquia e a estrutura rizomática poderia permitir a existência das duas
frentes, ou até mesmo de novas outras frentes. Não é necessário que tenham o mesmo eixo-
estruturante.
O pensamento rizomático também poderia contribuir na gestão das áreas verdes e
gestão ambiental das universidades para serem integradas. Uma gestão vertical das áreas da
parte superior (estrutura universitária) para a parte inferior (áreas verdes) não tem se mostrado
inteiramente satisfatória. Uma gestão das áreas verdes também verticalizada, mas com o
sentido contrário, da parte inferior (professores e idealizadores) para a parte superior
(estrutura universitária), se mostra sem fôlego. Se é da intenção das universidades a
manutenção destas áreas verdes porque não passar a pensar em uma gestão rizomática
transversal “donde, entra-se por qualquer lado, nenhum vale mais do que o outro, nenhuma
entrada tem qualquer privilégio” (DELEUZE; GUATTARI, 2003, p. 19) que integre os
esforços?
Segundo Deleuze e Guattari (1995, p. 16), “uma multiplicidade não tem sujeito nem
objeto, mas somente determinações, grandezas, dimensões que não podem crescer sem que
mude de natureza (as leis da combinação crescem então com a multiplicidade)”. É possível
reconhecer que estas relações discutidas aqui possuem uma multiplicidade política que forma
bulbos, e estes bulbos evoluem por hastes e fluxos subterrâneos, que serão expressos de
diferentes formas na superfície. As relações das universidades e suas áreas verdes podem ser
tomadas em sua multiplicidade, sem precisar ser contidas dentro de classificações estanques,
sem precisar virar continentes.
Os rizomas também são conhecidos pela sua plasticidade, o que poderia nos ajudar a
pensar esta multiplicidade que compõe as áreas verdes, instituições universitárias, humanos,
não humanos, ecologia menor e ética ambiental. Um rizoma pode ser rompido, quebrado ou
separado em diferentes partes e ainda assim retoma seu cresimento, pois consegue fazer novas
conexões e nutrir a planta. Para Deleuze e Guattari (1995, p. 18),
todo rizoma compreende linhas de segmentaridade segundo as quais ele é
estratificado, territorializado, organizado, significado, atribuído, etc; mas
compreende também linhas de desterritorialização pelas quais ele foge sem parar.
Há ruptura no rizoma cada vez que linhas segmentares explodem numa linha de
fuga, mas a linha de fuga faz parte do rizoma. Estas linhas não param de remeter
umas às outras. É por isto que não se pode contar com dualismos ou uma dicotomia,
nem mesmo uma forma rudimentar do bom e do mau.
198
Analogamente à plasticidade rizomática, as áreas verdes, quando pensadas em sua
multiplicidade, também poderiam se estabelecer e se reinventarem através de novas linhas e
conexões. Ao reinvindicarem sua legitimidade ou reinventarem suas práticas, acabariam por
ocupar e habitar novos territórios ou retomariam a habitar territórios antigos. Estas rupturas,
que formam novas linhas, assim como nos rizomas, possuem a capacidade de, em algum
momento, se cruzarem e se complementarem. Se enxergarmos a multiplicidade das áreas
verdes espalhadas de forma rizomática pelas mais diferentes esferas, unindo a ecologia menor
e a ética ambiental, a veremos fortalecida, mesmo que suas formas de ação sejam as mais
diversas, pois cada novo nó, ou bulbo, terá uma reserva de nutrientes de onde poderá retirar
forças para seguir uma jornada muitas vezes já desacreditada. Sendo rizomas, elas poderão
seguir em incontáveis direções; romper ou criar linhas; conjugar, alongar e variar os fluxos;
criar linhas de fuga; criar novos círculos de convergência; reconhecer suas singularidades e se
fortalecer com elas. Como já exposto, os contextos e as prioridades também são diversos, e as
práticas precisaram atender a esta ampla demanda. “As multiplicidades são a própria
realidade, e não supõem nenhuma unidade, não entram em nenhuma totalidade e tampouco
remetem a um sujeito” (DELEUZE; GUATTARI, 1995, p. 8).
Esta perspectiva rizomática pode nos ajudar a refletir a nossa relação com o Outro,
tanto o outro natureza como o outro humano. Pensar também na estratificação das relações e
como a busca pelo ordanamento da vida é necessário, mas também pode tirar dela muitas
possibilidades. Como diriam Deleuze e Guattari, perguntar para aonde se vai, de onde se vem,
e aonde se quer chegar são questões inúteis, são buscas por um fundamento que implica uma
falsa ideia de movimento.
Ecologia menor, educação menor
Já não se trata de querer ser índio, voltar a uma cabeça primitiva, mas de associar-se
às forças selvagens e libertar os traços de rostidade, de paisageidade, de
picturalidade, de musicalidade, inventando outras combinações que não passam pela
sujeição, tampouco pela dominação, e não reponham as hierarquias melhor ainda:
esconjurem todos os processos de sujeição. Traços, linhas partidas, cujos arranjos
móveis e fugitivos descrevem percursos em que a cabeça e a floresta encontram uma
estranha semelhança, pois ambas não param de se inventar. A floresta deixa de ser
um labirinto no qual nos perdemos, para se tornar um labirinto afirmador da
multiplicidade de percursos [...] (GODOY, 2008, p. 216)
No início da tese trouxemos alguns exemplos de como a natureza se fez ou ainda se
faz presente no campo da educação, esta relação com sua expressão maior através da
199
educação ambiental. De fato a educação ambiental tem diversas frentes, e algumas destas
frentes possuem uma conexão direta com o pensamento da Ecologia Maior, em termos de
normatizações do que é permitido ou proíbido, estratificação de certas liberdades,
responsabilidade e punição, seja por legislação ou pela moralidade relacioanda à preservação
da natureza. Todavia, também podemos enxergar a educação ambiental de forma rizomática,
pensá-la em toda sua multiplicidade. De forma transversal, podemos ver como os pontos se
conectam, coexistem e se complementam.
Pela educação ambiental possuir esta multiplicidade, ela também pode abarcar o
conceito de menor, de uma ecologia menor, de uma educação menor. A concepção da ideia de
menor trazida aqui procura trazer as singularidades em uma multiplicidade, atentando para a
diversidade como um elemento positivo na produção dos conhecimentos, “mas que,
justamente por atender ao apelo da diversidade, [as singularidades] ficam marcadas pelas
diferenças, entre si e com os outros” (GALLO, 2003, p. 32). Uma educação menor e uma
ecologia menor não necessitam de padrões ou estratificações, se enriquecem na diversidade de
suas práticas e contextos. Por isto esta concepção é trazida nesta pesquisa: pensar na
multiplicidade que compõem as áreas verdes apresentadas aqui, cada uma com sua
especificidade, para ver nelas potenciais de uso. Usos que podem ser através de projetos de
educação ambiental, de gestão ambiental, de música, de artes, de literatura, de criação.
Todavia é necessário manter e/ou dar vida novamente a estes lugares, e uma vez que as
universidades assumiram este compromisso, o devem fazer de forma correspondente ao devir
grandioso destas instituições.
Conforme referido no início desta tese, a educação da atenção (INGOLD, 2010) é uma
forma não intencional de se abrir às possibilidades das experiências de/na vida. Este não
direcionamento vem ao encontro da ideia de uma educação menor, um sistema aberto que
permite viver as multiplicidades de forma atencional e ocasional. É no percorrer dos caminhos
incertos de um labirinto que nossa atenção deve estar na jornada e não na chegada. Da mesma
forma, também abordamos no início da tese o caminhar como uma ferramenta filosófica para
a ex-posição de Masschelein (2014), o que remete ao movimento da educação e ecologia
menor e os processos de desterritorialização.
A literatura menor88 de Deleuze e Guattari (2003) possui três caracterísitcas principais
que podem ser definidas pela desterritorialização da língua, como já referido anteriormente; a
88 Gallo (2003) traz a título de exemplo para um melhor entendimento do que é a literatura menor para Deleuze e
Guattari, as primeiras obras literárias escritas no Brasil por escritores brasileiros após a colonização. Segundo
ele, estes eram exemplos de literatura menor, pois faziam da língua portuguesa já estabelacida como uma
200
ramificação política; e o valor coletivo. Timidamente esta tese desloca estes conceitos
filosóficos para pensar o campo educacional dentro do contexto apresentado aqui das áreas
verdes e as universidades.
Pensar em uma educação menor implica também pensar movimentos, processos e
acontecimentos. Demasiadamente longe de querer abordar o campo da ou das filosofias da
educação, a pesquisa propõem pensar estes múltiplos planos - educação ambiental, gestão,
artes, formação de foma rizomática, em complementaridade ao pensamento dominante do
campo educacional dentro das universidades. Segundo Gallo, a educação dita tradicional
neste contexto de se enxergar como uma educação menor, poderia ser:
Um campo que poderia primar pela multiplicidade, já que é atravessado
transversalmente pela filosofia, pelas diversas ciências, pela arte, tem historicamente
buscado uma identidade única, sob o argumento de tornar-se científico, sucumbindo
a esta vontade de verdade, a este mito moderno, criado pelo positivismo (GALLO,
2003, p. 68)
A educação menor nos leveria sempre a novos agenciamentos pela sua capaciadade de
desterritorialização, ou seja, capaz de tirar as bases fixas de um território consolidado e
colocá-lo à deriva. A educação menor também seria um ato político (por mais que a educação
maior muitas vezes afirme ser neutra, isto já configura seu ato político). A existência da
educação menor é política pelo seu próprio agenciamento de não fixar tradições e normas. A
própria existência dessa educação menor é um desafio ao sistema instituído. Uma vez que esta
educação menor resgatasse para dentro das áreas verdes a literatura, as artes, a música, as
narrativas e os encontros; aí poderia se dar a desterritorialização. Experiências que poderiam
arrancar as bases de uma tradição de isolamento destes lugares para remeter a novas buscas,
novas fugas, novos agenciamentos; “de modo criativo... ao serviço de uma sobriedade, de
uma expressividade, de uma nova flexibilidade, de uma nova intensidade” (DELEUZE;
GUATTARI, 2003, p. 49). Em uma educação menor, tudo adquiriria um valor coletivo, que
influenciaria e pertenceria a toda uma comunidade. Assim como a literatura menor não fala
exclusivamente por si mesma, mas fala por milhares, por toda a coletividade (GALLO, 2003),
assim também seria o poder de coletividade da educação menor.
literatura maior (bem estabelecida), um novo uso, “sob novos parâmetros na busca de uma nova literatura com
cheiro da nossa terra”. Gallo (2003) afirma que ao longo tempo nossa literatura foi se “desenvolvendo” e aquele
uso novo do português deixa de ser algo inovador e vira tradição, tornando-se também literatura maior. Neste
mesmo sentido, Godoy (2008) traz a literatura de Guimarães Rosa com suas particularidades no modo de escrita
para exemplificar a literatura menor. É possível enxergar a relação direta entre literatura maior e continente, e
literatura menor e arquipélagos.
201
A educação maior é aquela das políticas públicas de educação, dos parâmetros e das
diretrizes, da Lei de Diretrizes e Bases; pensada e produzida pelas “cabeças bem-pensantes do
poder” (GALLO, 2003, p. 78). É a educação instituída e que quer fazer-se presente, fazer-se
acontecer, é necessária. É a educação dos grandes projetos e mapas, produzida na
macropolítica, nos gabinetes e expressa através de documentos. Por sua vez, a educação
menor é um ato de resistência contra os fluxos instituídos, resistências às políticas impostas, e
até mesmo um ato de revolta. Está no âmbito das micropolíticas, expressa nas ações
cotidianas de cada um. Lembremos dos conceitos de rizoma e multiplicidade, não é a intenção
aqui elencar quais das educações é a ideal, mas propor a reflexão que ambas são
complementares e uma vez que a educação maior ocupa maior espaço, dar uma maior
visibilidade à educação menor neste contexto. Talvez por estar localizada nos microcosmos,
representar a coletividade e ter o poder da resistência, a educação menor poderia dispor de
uma movimentação, uma desterritorialização que acabaria por refletir na educação maior.
Segundo Gallo (2003, p. 82), “a educação menor cria trincheiras a partir das quais se promove
uma política do cotidiano, das relações diretas entre os indivíduos, que por sua vez exercem
efeitos sobre as macro-relações sociais”.
O contexto em que aqui ousamos empregar estes conceitos é o de pensar as áreas
verdes como lugares educativos para a formação universitária e gestão ambiental das
universidades. A educação menor poderia agir justamente na brecha que existe entre a
estrutura universitária com sua educação acadêmica, e o uso das áreas verdes; e fazer emergir
possibilidades que escapem a qualquer controle.
A ressignificação utilizada aqui diz respeito a dar novos significados e sentidos às
áreas verdes. É desterritorializar os espaços e transformá-los novamente em lugares,
ressiginificando-os. As Áreas de Preservação Permanante que são utilizadas como lugares de
práticas educativas são exemplos desta ressignificação. Poderíamos até dizer que a junção do
Jardim Botânico de Caxias do Sul com um ecoparque também poderia corresponder a uma
ressignificação, pois existe uma movimentação neste processo que pode influir na relação de
apatia. Assim como a criação das novas RPPNs pelas universidades também pode ser visto
como processos de ressiginificação do compromisso destas instituições com as áreas verdes.
Vimos nesta pesquisa exemplos de literatura, arte e teatro dentro das áreas verdes,
como os exemplos trazidos pelo Prairie Habitat Garden da Universidade de Saskatchewan, do
Bosque da Universidade Épsilon e do campus de Uruguaiana da Universidade Gama com sua
obra artística Mesa. Também vimos exemplos de como usar estes espaços verdes como locais
de práticas educativas para os cursos das áreas ambientais. Entretanto, também vimos lugares
202
impactados por questões de gestão, de falta de recursos. Impactados pela falta de um olhar
que percebesse as possibilidades da educação menor.
Podemos pensar na desterritorialização da concepção de área intocável como ideal de
conservação dentro destes espaços universitários, já que em alguns dos casos apresentados
esta conservação não existe. “Deste modo, constituí-se uma conjunção de fluxos de
desterritorialização que ultrapassa a imitação que é sempre territorial” (DELEUZE;
GUATTARI, 2003, p. 34). Ultrapassa o mito moderno da natureza intocável norte americana
que também se institui nas relações das universidades e suas áreas. Desterritorializar a ideia
de isolamento destas áreas verdes sem perder o objetivo de conservação e preservação, mas
trazendo as vidas humanas e não humanas para dentro destes lugares. Por certo não falamos
aqui em mudanças de leis, mas mudanças de usos. Fazer estas áreas voltarem a derivar e
serem usadas em sua potência “gerando possibilidades de aprendizagem insuspeitadas
naquele contexto” (GALLO, 2003, p. 81). Fazer com que as pessoas habitem estes lugares e
deem vida a eles para que eles sejam vistos e não mais invisibilizados. Flexibilizar este fator
de controle.
A educação menor é rizomática, segmentada, fragmentária, não está preocupada
com a instauração de nenhuma falsa totalidade. Não interessa à educação menor
criar modelos, propor caminhos, impor soluções. Não se trata de buscar a
complexidade de uma suposta unidade perdida. Não se trata de buscar a integração
dos saberes. Importa fazer rizomas. Viabilizar conexões e conexões; conexões
sempre novas. Fazer rizoma com os alunos, viabilizar rizomas entre os alunos, fazer
rizomas com projetos de outros professores. Manter os projetos abertos [...].
A Ecologia Maior nos seus objetivos de preservação e conservação pressupõe uma
transcendência suposta de leis que se relacionam com a culpabilidade, com o inconhecível,
com sentenças, enunciados e isolamento para proteção. Esta culpabilidade se estende a todos,
culpados ou inocentes, das agruras ambientais. São tentativas de ordem que transcendem o
objeto uma vez que são leis que legislam sobre pura forma: meio ambiente. É algo que escapa
aos domínios do conhecimento e se funda na exclusividade prática absoluta89. Na tentativa
deste controle, este enunciado é um “enunciado no próprio real, no próprio corpo e na própria
carne; enunciado prático que se opõe a qualquer proposta especulativa” (DELEUZE;
GUATTARI, 2003, p. 82). Com a eliminação do sentimento de culpabilidade e punição deste
89 “O padre na catedral explica que ‘ninguém é obrigado a julgar como verdadeiro tudo o que diz o guardião,
basta que aceite como necessário’”. A Ecologia Maior criou no ser humano a culpabilidade pelas questões
ambientais, o que da fato não está errado, mas isso também fez com que o mesmo congelasse sua relação com o
ambiente na intenção de não prejudicá-lo mais. As proibições já nem eram mais questionadas, apenas aceitas,
pois a Ciência é a detentora deste saber. Com isso perde-se muito das multiplicidades das ecologias.
203
tipo de ecologia, é possível voltar ao movimento das ecologias menores, com menos leis e
mais vida.
É importante deixar claro que quando nos referimos a estas questões estamos
propondo uma discussão sobre as áreas verdes pertencentes às universidades, não nos
referimos a grandes territórios de unidades de conservação, que na atual conjectura continuam
sendo grandes conquistas da Ecologia Maior, e o aprimoramento e execução das suas leis se
faz imprescindível. Falamos aqui de espaços pertencentes a universidades, que por sua vez
foram instituições que se comprometeram em manter estas áreas. Estes espaços deveriam ser
lugares de práticas educativas e também conservação. É neste contexto que criticamos a
incorporação de alguns princípios da Ecologia Maior pelas universidades, principalmente o
isolamento e a proibição.
Por possuir um valor coletivo, todo o ato da educação menor não é um ato solitário,
um ato isolado. Assim, o indivídio que optar por este tipo de educação, estará envolvendo
vários outros com os quais irá trabalhar. Este envolvimento se dá uma vez que a educação
menor é resistência e é um exercício de produção de multiplicidades. A concepção da
produção de um valor coletivo por esta educação menor seria capaz de horizontalizar as
relações entre as universidades e suas áreas verdes e até mesmo equiparar as forças
despendidas para a manutenção destes lugares, trazendo para a cena outros atores além dos
personagens dedicados apresentados aqui. Segundo Gallo:
A educação menor é uma aposta nas multiplicidades, que rizomaticamente se
conectam e se reconectam, gerando novas multiplicidades. Assim, todo ato singular
se coletiviza e todo ato coletivo se singulariza. Num rizoma, as singularidades
desenvolvem devires que implicam hecceidades. Não há sujeitos, não há objetos,
não há ações centradas em um ou outro; há projetos, acontecimentos, individuações
sem sujeito. Todo projeto é coletivo. Todo o valor é coletivo. Todo fracasso também
(GALLO, 2003, p. 84).
É importante manter em mente que a ecologia menor e a educação menor não estão
sendo propostas como imperativos para solução dos problemas aqui relatados. Os problemas
também são parte dos rizomas, segundo Deleuze e Guattari (2003, p. 20) “entenda-se que
mesmo um impasse é bom, enquanto puder fazer parte do rizoma”. São filamentos que
constituem as relações entre as universidades e suas áreas verdes. Reconhecemos aqui que
não podemos ser ingênuos de pensar que esta ecologia menor e esta educação menor não
correm riscos, elas podem voltar a ser continentes: aqui também corremos o risco de uma
reterritorialização que implicaria novamente em uma ecologia maior, uma educação maior. O
204
que se quer aqui é por em movimento um pensamento já outrora instituído que estratificou
estas relações. Para Godoy,
A questão já não é o conhecimento investido, mas o desconhecimento conquistado,
perdido e novamente conquistado, que nos põe diante do desconhecido, acessível à
palavra aepnas enquanto não for compreendido ou identificado. O desconhecido nos
dispõe ao surpreendente, ao imprevisível, ao ainda não dado à visão, mas que nem
por isso é inexistente. Não diz respeito à luz lançada pelo conhecimento, mas ao
tanto de obscuridade ainda possível de ser extraído, e implica perder o chão sobre o
qual a casa se sustenta, mas também as telhas que a mantém fechada para o mundo,
ou mantém o mundo velado, não para soçobrar, mas para reinventar-se nesta
errância (GODOY, 2008, p. 237)
É neste movimento que as educações, a maior e a menor, são complementares e
contíguas. Quando os processos da educação menor sofrerem a estratificação e consequente
estagnação virando processos da educação maior, novamente a desterritorialização de uma
educação menor deve por em movimento estes processos ou novos processos achando linhas
de fuga. São os continentes voltando a derivar e se tornando ilhas, e essas ilhas
consequentemente fixando continente.
205
8 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta tese se propôs a identificar a situação atual das áreas verdes de oito universidades
do Rio Grande do Sul e de que modo as instituições estão usando estes espaços. A pesquisa
buscou por áreas verdes que eram usadas com algum intuito educacional e de gestão
ambiental. Com isso, encontramos diversos tipos de áreas, algumas naturais, outras não. Estas
áreas correspondiam à Áreas de Preservação Permanente, Reservas Legais, Reservas
Particulares de Patrimônio Natural, Refúgio de Vida Silvestre, Horto Botânico e Jardins
Botânicos. Como foi exposto, cada um destes lugares era detentor de características
individuais e usos variados, e também se relacionavam de formas específicas com suas
gestoras na figura das universidades.
Vimos como o Horto Botânico e os Jardins Botânicos apresentados aqui foram, no
momento das suas criações, lugares gerados a partir de projetos grandiosos de pesquisa e
expressão ecológica e como atualmente este sentimento não tem se perpetuado nas altas
administrações das universidades. Situação similar à do Refúgio de Vida Silvestre que
encontra suas atividades educacionais suspensas pelas difuculdades que se apresentam em sua
gestão. Ao mesmo tempo, vimos como áreas protegidas por lei podem ser ressignificadas e
transformadas em lugares de práticas educativas. O fato é que todos estes lugares apresentam
desafios: como se manterem interessantes para as universidades; como lidar com a falta de
recursos financeiros e técnico, como usá-los em potencial, como sobreviver sem seus
defensores, e como superar elementos negativos já instituídos e que não dependem
unicamente das universidades para sobreviver, como por exemplo a insegurança pública.
É importante para essas Instituições de Educação Superior legitimar a posse e a
manutenção de suas áreas verdes frente aos seus compromissos ambientais e com a sociedade.
E esta legitimação não pode estar baseada em valores vazios e não efetivos. As universidades
precisam habitar esses espaços, transformando-os em lugares. A inserção da gestão destes
espaços nos processos de ambientalização poderia legitimar esta relação e dar um novo
sentido a ela. As universidades apresentadas aqui estão defrontando-se com as exigências de
políticas e gestão ambientais, entretanto, em algumas delas muito pouco foi encontrado na
pesquisa sobre a aproximação destes processos com as áreas verdes dentro de um contexto
educacional. Todavia, também vimos exemplos que corroboram com o potencial de uso
206
educativo destes lugares, como as aulas práticas, nas Áreas de Preservação Permanente e as
visitas escolares nos Jardins Botânicos.
Pessoas de dentro e de fora das universidades usam essas áreas verdes, apropriam-se
destes lugares das formas mais variadas. Estes espaços também correspondem a pequenas
ilhas de natureza que a população usufrui. Entretanto, existe valor intrínsico destas áreas
verdes e deveria também existir um sentido real nesta apropriação pelas universidades. Como
vimos nesta tese, as relações entre as áreas verdes e as universidades são múltiplas, e variam
desde um esvaziamento deste sentido, até a ressignificação destes espaços. Como já foi
exposto aqui, as áreas protegidas por lei e as Unidades de Conservação ganham novos
significados através de seus usos educativos, mas apesar de uma proteção firmada por leis
nem por isso deixam de enfrentar desafios. O mesmo vale para os Jardins Botânicos e o Horto
Botânico: redescobrir seus valores dentro das universidades onde estão inseridos.
As histórias trazidas aqui através dos interlocutores da pesquisa ajudaram a perceber
estas áreas verdes como lugares de amor, laboratórios e lugares de aula ao ar livre, lugares
onde eram realizadas trilhas. Lugares que no momento da sua concepção eram vistos como
repletos de potencial.
Constatamos a insustentabilidade do modelo de gestão de algumas destas áreas que
através de seu isolamento se tornaram invisíveis aos olhos da estrutura universitária inflexível
e também da sociedade. Constatamos também a existências de processos de ressignificação
destes espaços. Objetivamos com isso contribuir com o diagnóstico dentro do campo
educacional destas áreas verdes e suas relações com as universidades que as mantém.
Objetivamos também descortinar como estas áreas verdes estavam inseridas na gestão
ambiental universitária e nos processos de ambientalização.
Enquanto reflexão, na ciência de que este tema não se esgota aqui, mas abre campo
para outras investigações, a tese propôs pensar em uma ecologia e uma educação menores.
Pensar nestes elementos para agregar, de forma rizomática, ao conhecimento dominante
dentro da academia, diferentes formas de habitar as áreas verdes, através da literatura, música,
artes, projetos de educação e educação ambiental como os exemplos trazidos no início da
fundamentação da tese. Por certo, estas ações poderiam contribuir na formação universitária
de pessoas engajadas ambientalmente e também nos processos de ambientalização das
universidades, reforçando o comprometimento social e ambiental destas instituições.
207
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APÊNDICE I - TERMO DE ESCLARECIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
216
APÊNDICE II - Fotos de arte e poesia em áreas verdes universitárias (Muhle, 2017):
217
ANEXO I SISTEMA DE RESERVAS NATURAIS DA UNIVERSIDADE DA
CALIFÓRNIA
218
ANEXO II CENTRO DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA E DIVULGAÇÃO
AMBIENTAL DA GALÍCIA (CEIDA)
219